STJ DECIDIRÁ SE DESCONSIDERAÇÃO DA PJ PODE SER APLICADA AO DIREITO TRIBUTÁRIO
Bárbara Mengardo
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deve decidir, por meio de recursos repetitivos, a possibilidade de aplicação do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ) ao Direito Tributário. Cinco recursos serão analisados através da sistemática, obrigando as demais instâncias do Judiciário e o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) a seguirem a orientação da Corte Superior.
O debate, que não tem data para ir à pauta da 1ª Seção, consta no Tema 1.209, que abrange os REsps 2.039.132, 2.013.920, 2.035.296, 1.971.965 e 1.843.631. Os ministros decidirão se o IDPJ é compatível com a execução fiscal, e em caso positivo, em quais situações ele deve ser aplicado.
Constante entre os artigos 133 e 137 do Código de Processo Civil (CPC), o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica possibilita, em qualquer fase do processo, que a personalidade jurídica seja “quebrada” para responsabilização de terceiros, como, por exemplo, o sócio ou administrador. Neste caso, abre-se o prazo de 15 dias para manifestação da pessoa física ou jurídica, com suspensão do processo durante o período.
Em casos tributários, o redirecionamento é realizado, por exemplo, em situações em que uma empresa que responde por um débito fiscal é fechada irregularmente, o que faz com que a Fazenda busque pessoas físicas ou jurídicas relacionadas para responder pela dívida. Por meio do repetitivo, a 1ª Seção definirá se em situações como esta é necessária à instauração do IDPJ.
O advogado Luiz Eduardo Costa Lucas, do Martinelli Advogados, explica que alguns juízes entendem que o IDPJ é restrito ao Direito Privado, não podendo ser aplicado ao Direito Tributário. “Será definido neste repetitivo se cabe o IDPJ, dentro da execução fiscal, que é matéria regulada pela Lei de Execuções Fiscais [Lei 6830/80], e, uma vez cabendo, quais são os requisitos para que se instale o IDPJ”, afirma.
O relator dos recursos afetados como repetitivo ministro Francisco Falcão apontou que há divergências entre a posição da 1ª Turma e da 2ª Turma do STJ sobre o assunto. Para a 2ª Turma, o redirecionamento da execução fiscal não precisa ser precedido do IDPJ, porém é necessário que seja disponibilizada a possibilidade de defesa prévia ao contribuinte.
A posição foi adotada por unanimidade, por exemplo, no Aresp 2.216.614, analisado em maio de 2023 pelo colegiado. O relator, ministro Herman Benjamin, considerou que “há verdadeira incompatibilidade entre a instauração desse incidente [de desconsideração da personalidade jurídica] e o regime jurídico da Execução Fiscal”.
Já a 1ª Turma considera que o IDPJ deve ser aplicado em algumas situações em que há redirecionamento da execução. O posicionamento consta no REsp 2.006.433, julgado por unanimidade pelo colegiado em abril de 2023. O relator, ministro Benedito Gonçalves, defendeu que o incidente deve ser utilizado quando o nome do terceiro ao qual o débito está sendo direcionado não constar na Certidão de Dívida Ativa (CDA) ou quando “a responsabilização de terceiros não encontrar apoio nas regras de responsabilização do Código Tributário Nacional”. Segundo Gonçalves, nestas situações é preciso comprovar que houve abuso de personalidade, sendo necessário o IDPJ.
Para a advogada Daniella Zagari, sócia do Machado Meyer e coordenadora do comitê tributário do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), a instauração do IDPJ é positiva para que os contribuintes não sejam “pegos de surpresa” com o redirecionamento de uma dívida. “É criada uma fase preliminar, antes dessa responsabilização, para que se possam produzir provas, seja da Fazenda, seja do contribuinte”, diz.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Naciona (PGFN), por outro lado, considera que o uso do CPC é subsidiário no Direito Tributário, apenas para os casos em que não há tratamento expresso na legislação específica. No caso das execuções, está em vigor a Lei de Execuções Fiscais, o que afastaria o instituto do IDPJ.
O procurador Thiago Luis Eiras da Silveira, coordenador-geral de atuação perante o STJ da PGFN, defende ainda que a utilização do IDPJ vai contra a celeridade que a execução fiscal exige. “Incidentes [processuais] são sempre lentos, eles fogem ao curso normal [do processo], e consequentemente podem dificultar a recuperação do crédito”, afirma.