SOBREPARTILHA NO INVENTÁRIO
Rodrigo Mazzei
RESUMO
O Código de Processo Civil de 2015 traz, em seus artigos 669 e 670, disposições acerca da sobrepartilha de bens no inventário. Contudo, há de se ter em mente que o Código Civil de 2002 também já tratava do assunto. Em suma, a sobrepartilha consiste em uma nova distribuição de bens e/ou direitos do espólio que não foram objeto de partilha anterior ocorrido em inventário causa mortis já encerrado. Em outras palavras, a sobrepartilha é um inventário de natureza suplementar, impulsionado e justificado por nova arrecadação de bens e/ou direitos que não foram alcançados pelo desfecho do inventário já encerrado.
BREVES NOÇÕES SOBRE A SOBREPARTILHA NO CPC DE 2015
O tema do trabalho (sobrepartilha sucessória) está regulado no CPC em vigor nos arts. 669 e 670, não se notando grande mudança nos dispositivos em relação à codificação de 1973 (arts. 1.040 e 1.041). Registre-se, na verdade, que o assunto também está tratado nos arts. 2.021 e 2.022 do Código Civil (CC). Ainda que não se vislumbre áreas de conflito entre dois os diplomas, o posicionamento topográfico é distinto, uma vez que o CPC encaixa a sobrepartilha na Seção X (Disposições Comuns a Todas as Seções) do Capítulo VI (Do Inventário e Da Partilha), considerando-a, assim, como instituto comum a qualquer modalidade de inventário, ao passo que o CC trata do assunto no trecho específico sobre partilha (Capítulo V do Título IV – Do Inventário e Da partilha).[1]
De um modo geral, notadamente na prática forense, a concepção de sobrepartilha está atrelada a uma dimensão voltada ao direito material, no sentido de propiciar nova distribuição de bens e/ou direitos do espólio[2] que não foram objeto de partilha anterior ocorrido em inventário causa mortis já encerrado. A sobrepartilha, todavia, sob o aspecto processual, se notabiliza como novo processo sucessório, ainda que com feições de ‘inventário suplementar’, que é impulsionado (e justificado) pela arrecadação de bens e/ou direitos que não foram alcançados pelo desfecho do inventário já encerrado, consoante se infere do texto do art. 670 do CPC.[3] Com tal enfoque, a sobrepartilha não é apenas uma “nova partilha”, configurando-se, na verdade, como figura que ensejará a instauração de procedimento que contempla todas as fases do inventário sucessório, cujo desfecho dependerá da liquidação e do posicionamento jurídico dos interessados na sucessão. Tanto é assim que haverá na sobrepartilha a necessidade de designação de inventariante (que poderá ser pessoa diversa da do inventário original), consoante parágrafo único do art. 669 do CPC e parte final do art. 2.021 do CC.
Ademais, a sobrepartilha não pode ficar ilhada nos arts. 669-670 do CPC e 2.021-2.022 do CC, pois há situações outras que a autorizam e não estão alcançadas pelos citados dispositivos. Em exemplo, o art. 650 do CPC prevê que, se um dos interessados for nascituro, o quinhão que lhe caberá será reservado em poder do inventariante até o seu nascimento. Nada impede que a partilha se efetue antes da data prevista para o nascimento, de modo que o quinhão referente ao nascituro ficará reservado com o inventariante, aguardando-se que o desfecho fático. Caso o nascituro não sobreviva, mister se fará que o quinhão antes reservado seja redistribuído, dando ensejo à sobrepartilha.[4]
De outra banda, deve-se dizer que sobrepartilha não é figura exclusivamente voltada aos herdeiros, pois, em exemplo, a localização de bens não arrolados no inventário poderá beneficiar o cônjuge/companheiro sobrevivente em caso de verificação de que aqueles se submeteram ao regime de comunhão patrimonial em vida, reservando-se a meação ao supérstite. Na realidade, a sobrepartilha cria nova arrecadação, originando também nova liquidação (ato que é anterior à própria noção de “partilha”), de modo que, se o inventário primitivo teve desfecho negativo (= insolvência do espólio), a sua arrecadação terá que primeiro atender aos credores que não tiveram suas dívidas satisfeitas. Trata-se de interpretação que pode ser extraída da parte inicial do art. 647 do CPC e do art. 1.796 do CC, pois a partilha somente se justifica depois de pagas às dívidas que vinculam o espólio. Portanto, caberá a sobrepartilha em qualquer situação em que se vislumbrar a existência de bens e/ou direitos que não foram arrecadados e que, de alguma forma, estão atraídos pela sucessão,[5] sendo equivocado imaginar que apenas os herdeiros serão os seus beneficiários.
NECESSIDADE DE SISTEMATIZAÇÃO (SOBREPARTILHA PROSPECTIVA X SOBREPARTILHA RETROSPECTIVA)
Apesar de o art. 669 do CPC não seguir a ordem sequenciada dos arts. 2.021 e 2.022 do CC, não há discrepância entre as hipóteses que ensejam a sobrepartilha no texto das duas codificações, a saber:
(a) bens situados em lugar remoto da sede do juízo onde se processa o inventário (arts. 669, IV, do CPC e 2.021 do CC);
(b) bens litigiosos, assim como os de liquidação difícil ou morosa (arts. 669, III, do /CPC e 2.021 do CC);
(c) bens sonegados (arts. 669, I, do CPC e 2.022 do CC);
(d) bens da herança sejam descobertos após a partilha (arts. 669, II, do CPC e 2.022 do CC).
A ordem adotada no presente estudo segue a sequência definida no CC (bem mais didática do que a inserida no CPC), que faz a depuração em dois grandes grupos: (i) aferição da sobrepartilha no curso do inventário (art. 2.021 do CC), tendo esta, portanto, análise prospectiva; (ii) invocação da sobre partilha depois de encerrado o inventário (art. 2.022 do CC/02), fato que aloca o exame quanto à sobrepartilha com olhar retrospectivo.[6]
A SOBREPARTILHA PROSPECTIVA
Usando o art. 2.021 do CC como bússola, as principais hipóteses em que a sobrepartilha será analisada em plano prospectivo, ou seja, no âmbito de inventário ainda em curso, envolve a presença de patrimônio: (a) em situação remota do lugar do inventário (b) litigioso e/ou (c) de morosa ou difícil liquidação.
Como primeira nota acerca da sobrepartilha prospectiva, frisa-se que sua análise decorre de elemento temporal, pois nos casos listados – em regra – o deslocamento de pontuais questões para fora do processo sucessório parte da análise potencial de que estas – pela sua própria natureza – poderão retardar demasiadamente a cadência procedimental do inventário, colocando-a em xeque (diante do afastamento da determinação contida na parte final do art. 611 do CPC). Por outra perspectiva, mas ainda seguindo-se as hipóteses acima destacadas, a sobrepartilha prospectiva restará autorizada também pela incerteza quanto à arrecadação dos bens e/ou direitos, tendo em vista a situação peculiar em que se encontram.[7]–[8]
Dessa forma, o art. 2.021 do CC autoriza que a arrecadação de determinados bens e/ou direitos não seja efetuada no inventário já instaurado, a fim de que este não perca sua velocidade processual e/ou eficiência. O patrimônio não arrecadado no inventário em curso é projetado para ‘inventário suplementar’, que possui autonomia relativa em relação ao primitivo (art. 670 do CPC). Assim, não há extinção do espólio quando ocorrer a sobrepartilha prospectiva,[9] pois ainda há (potencial) patrimônio em condomínio, muito embora não tenha sido levado para o ventre o inventário original, fato que este que justifica a designação de inventariante para administração e adoção das medidas atinentes à arrecadação dos bens e/ou direitos que foram excluídos dos trilhos do inventário primitivo (art. 669, parágrafo único, do CPC e art. 2.021, parte final, do CC).
A parte final do art. 2.021 do CC pode gerar a impressão de que a sobrepartilha prospectiva somente pode ser adotada mediante consenso dos interessados, em que prevalecerá a vontade da maioria[10]. Tal interpretação não prospera, pois o art. 2.021 contempla técnica processual de organização, para que não ocorra perda de cadência no inventário sucessório (tal qual se extrai também do texto do art. 612 do CPC[11]). Assim, a sobrepartilha prospectiva poderá ser adotada não apenas por meio de ato convencional da maioria dos interessados,[12] mas também por decisão judicial, como técnica processual atrelada à organização do inventário sucessório.
A breve dinâmica traçada é indicativa de que a sobrepartilha prospectiva é assunto também afeto às primeiras declarações (art. 620). Vislumbrando a aplicação do art. 2.021 do CC, o inventariante deverá trazer o tema – se possível logo – nas primeiras declarações, pois tal postura permitirá o conhecimento e a manifestação por parte dos interessados, fato que pode dar ensejo até mesmo à deliberação conjunta destes na depuração de bens que não deverão ser arrecadados no inventário original. Mesmo nos casos em que não for possível colher a posição consensual dos interessados, as informações e a discussão quanto à questão permitirão que o juiz decida sobre o tema caso isso se torne necessário. Sem prejuízo, a sobrepartilha prospectiva poderá ser adotada no curso do inventário, fixando-se seu limite, em regra, ao se analisar e debater as últimas declarações (art. 636), oportunidade em que a medida poderá ser defendida, por exemplo, pelo inventariante.
Quando se tratar de controvérsia interna, isto é, que envolva aqueles que participam do inventário, a aplicação do art. 2.021 do CC merece cuidado especial, pois há espaço para que seja efetuada a reserva de bens respectiva ao dimensionamento patrimonial da pendenga, reserva esta que deverá ser mantida até que o litígio caseiro seja resolvido (em nova plataforma – “vias ordinárias”). No ponto, o CPC trata de algumas hipóteses, a saber: (a) debate sobre inclusão de herdeiro (art. 627, III), (b) preterição de interessado (art. 628), (c) controvérsia sobre a colação (art. 641) e (d) dívidas com credores (art. 643). Nas situações listadas, o inventariante promoverá a reserva de bens, seguindo-se com os demais atos para o desfecho do inventário causa mortis. Havendo decisão final favorável ao espólio, os bens reservados perdem a sua afetação, submetendo-se à sobrepartilha.[13]
O litígio interno acaba por desenhar forma diferenciada de sobrepartilha prospectiva, pois há a arrecadação do bem (diferente das outras situações tratadas no art. 2.021 do CC), mas a entrega deste fica suspensa até que ocorra desfecho do assunto nas “vias ordinárias”. De toda sorte, com a reserva de bens (que garante o debate interno), há destrancamento do fluxo do inventário sucessório. Os bens reservados restarão em posse do inventariante, a fim de que, debelado o conflito (ainda que posteriormente ao desfecho do inventário), seja o patrimônio destinado a quem de direito. A reserva de bens é, pois, uma forma estratégica de permitir a continuidade do inventário causa mortis nas demais áreas, sendo, com todo respeito, incompreensível (já que contrário à ideia da técnica) paralisar o processo sucessório se há bem afetado e na posse do inventariante para garantir o resultado útil da controvérsia. Dessa forma, feita a garantia (reserva de bens) o inventário causa mortis deve retomar seu curso normal. Ao final, sedimentando-se a decisão sobre a controvérsia, o inventariante entregará os bens reservados ao postulante caso seu pedido seja julgado procedente, mas, em razão inversa, se não for este o resultado, o patrimônio reservado voltará ao espólio para que ocorra a sobrepartilha.[14]
A compreensão da sobrepartilha na moldagem prospectiva permite dimensionar a figura como técnica processual em prol da celeridade e organização procedimental. Com outras palavras, a sobrepartilha em tal contexto não é uma figura acidental, mas sim como técnica de caráter estratégico[15], estando vinculada à organização processual do inventário causa mortis.[16] A constatação fica mais clara quando a sobrepartilha prospectiva é contrastada as disposições cravadas em normas fundamentais, dentre as quais se destacam o art. 4º (que trabalha com a duração razoável do processo) e o art. 8º (ao determinar que as normas processuais serão aplicadas com a luz do farol da eficiência). Diante da variedade de questões que envolvem a arrecadação e liquidação da herança, decorrente do policentrismo que marca o inventário causa mortis, é fundamental que se utilize a sobrepartilha como técnica processual de organização, pois seu manejo adequado permitirá que o inventário sucessório tenha desfecho mais eficiente e célere.[17]
SOBREPARTILHA RETROSPECTIVA
O art. 669, em seus incisos I e II, comunica-se com o art. 2.022 do CC, ao prever que serão objeto de sobrepartilha: (a) os bens sonegados e (b) os bens da herança que se tiver ciência após a partilha. A depuração do citado dispositivo da lei civil nas partes destacadas se faz necessária, diante das influências que projeta na sobrepartilha. Com efeito, em relação aos bens sonegados, há diálogo com o art. 1.992 do CC, que descreve não só a conduta que caracteriza a sonegação, quanto ao âmbito dos bens que alcança (incluindo os bens sujeitos à colação) e a sanção respectiva. No que se refere aos bens da herança “descobertos após a partilha” estes devem ser entendidos como aqueles que se tenha “ciência após a partilha” (arts. 2.022 do CC).
O momento temporal indica que a sobrepartilha retrospectiva é uma solução residual, diante da evidente impossibilidade de retificação ordinária da arrecadação pelo inventariante, que se dá sempre antes da “partilha”, isto é, o desfecho final do inventário (art. 636, parte final, do CPC). Como se percebe do quadro, a sobrepartilha retrospectiva envolve a localização (descoberta) de bens e/ou de direitos que deveriam ter sido alvo de arrecadação sucessória originalmente, sendo necessário que de instaure novo processo em razão do inventário primitivo já ter findado. Assim, há quadro de desconhecimento acerca da existência de material que deveria ter sido arrecadado, situação que ocasionou omissão patrimonial na liquidação da herança, e, sequencialmente, na partilha ou adjudicação respectiva. Logo, a sobrepartilha retrospectiva é acidental, diferente do que ocorre na sobrepartilha prospectiva em que há uma (possível) projeção da sua ocorrência.
BENS COM LOCALIZAÇÃO REMOTA
Seguindo-se a sequência fixada nos artigos 2.021-2022 do CC (repita-se, mais lógica do que a constante no art. 669 do CPC), a abordagem se inicia com as hipóteses de sobrepartilha prospectiva. E, com tal bússola, a primeira situação a ser analisada traz a arrecadação de bem com localização remota em relação ao local de curso do inventário. A justificativa para tal sobrepartilha decorre da premissa de que o inventário causa mortis trabalha com o juízo universal, concentrando o trâmite do processo sucessório em apenas um local. Assim, no caso de bem localizado com aguda distância em relação ao juízo da sucessão, a arrecadação poderá ser trabalhosa, presumindo-se que esta demandará deslocamentos e tarefas que consumirão tempo precioso, colocando em risco o comando temporal da parte final do art. 611 do CPC.[18]
Por certo, o simples fato de determinado bem ter localização distante do foro do inventário, por si só, não o levará para a sobrepartilha. O que deve ficar configurado é a concreta dificuldade de inventariar bens de posicionamento distante, demonstrando-se que a inclusão destes no inventário pode ocasionar atraso na marcha processual rumo à partilha dos demais.[19] Em tempos atuais, a hipótese examinada de forma isolada perde bastante espaço, tendo em vista a agilidade nas comunicações e da fluidez cada vez maior aplicada nas operações patrimoniais (como é o caso de depósitos em dinheiro e aplicações financeiras).[20] Ademais, aplicando-se soluções previstas na legislação, com suas devidas adaptações, o juízo sucessório poderá se valer do auxílio e até da cooperação jurisdicional (arts. 67-69 do CPC).
Saliente-se que a legislação nacional não permite encaixar os bens postados em território estrangeiro como hipótese alcançada pelo inciso IV do art. 669 ou pelo caput do art. 2.022 do CC. O disposto no art. 23, II, do CPC, devidamente conjugado com regras insertas na LINDB, indica que o inventário causa mortis que tramita sobre a jurisdição brasileira somente poderá alcançar os bens cravados no território nacional. Desta forma, em relação a bens no exterior não há de que se falar em sobrepartilha, uma vez que não há jurisdição para tanto, correndo lá outro procedimento de inventariança.
BENS LITIGIOSOS
Para a análise da segunda hipótese de sobrepartilha prospectiva, é importante observar que tanto o art. 2.021 do CC, quanto o inciso III do art. 699 do CPC, são lacônicos ao fazerem alusão aos “bens litigiosos”. A carência de delimitação nas regras legais permite interpretação ampla, capaz de comportar não apenas os litígios externos, em que o espólio debaterá com terceiro acerca da titularidade ou arrecadação de determinado bem,[21] assim como em relação aos litígios internos, em que a controvérsia se instala entre participantes do inventário, estando estes em disputa que afeta a superfície da massa hereditária e/ou o dimensionamento dos quinhões.
Sem dúvida, os litígios externos terão tratamento muito mais simples no manejo da sobrepartilha, pois a premissa vulgar envolve a disputa de determinado bem entre o espólio e terceiro que não participa do inventário. Em se resolvendo o litígio favoravelmente ao espólio, o resultado da pendenga (mesmo que obtido de forma extrajudicial) será alvo de arrecadação. Assim, valendo-se de visão prospectiva da sobrepartilha, o bem que está sob disputa de titularidade não será incluso no inventário, aguardando-se a resolução da controvérsia para efetuar a sua atração ao juízo sucessório. Dessa forma, o bem será trazido ao inventário original somente se o litígio se encerrar favoravelmente ao espólio antes do desfecho do processo sucessório. Caso o inventário já tenha se encerrado, haverá espaço para sobrepartilha.[22]
A dimensão da sobrepartilha, todavia, fica um pouco alterada quando o litígio é de natureza interna, isto é, envolve controvérsia de atores que participam do inventário. Em tais casos, presentes os requisitos, será determinada a reserva de bens respectiva à controvérsia, com o objetivo de que, depois de resolvida a pendenga, o patrimônio seja entregue a quem quer de direito. Nos casos em que a disputa for julgada contra o espólio, em regra, os bens reservados serão adjudicados ou expropriados pelo interessado, ao passo que, se assim não ocorrer e por qualquer motivo a garantia seja tornada sem efeito ou diminuída, os bens reservados retomam a posição inicial de arrecadação, devendo ser partilhados de acordo com a posição jurídica dos interessados e as peculiaridades do caso.
O CPC em vigor contempla exemplos de litígios internos em que a mecânica acima desenhada pode ser facilmente conferida (vide arts. 627, § 3º; 628, § 2º; 641, § 2º, 643, parágrafo único), pois, ocorrendo disputas internas que não possam ser resolvidas no bojo do inventário, efetua-se a reserva dos bens no inventário e, em se seguida, será realizada a remessa da controvérsia para ambiente externo. No entanto, o CPC não é exaustivo na descrição dos conflitos internos que podem ocorrer no bojo do inventário, sendo possível que seja adotada a técnica de reserva (importando-se o modelo plasmado em situações pontuais) para outros litígios entre os personagens que participam do processo sucessório. No sentido, de modo exemplificativo, não é invulgar a formação de controvérsias sobre as seguintes situações: (a) fixação da data da separação de fato entre o falecido e o cônjuge/companheiro sobrevivente, pois o marco será utilizado para a e cessação da comunhão; (b) definição do marco de início da união estável (desprovida de escritura pública ou de ato documentado semelhante) com o companheiro sobrevivente, já que tal a aferição será usada para fixar os bens alcançados pela comunhão em vida; (c) análise da ocorrência (ou não) da sub-rogação do patrimônio pessoal do falecido e/ou do cônjuge/companheiro sobrevivente, a fim de que os bens sejam corretamente posicionados na arrecadação; (d) fixação das dívidas do falecido e/ou do cônjuge/companheiro sobrevivente como de natureza comum ou pessoal; (e) recebimento de frutos por herdeiros e pelo cônjuge sobrevivente depois da abertura da sucessão, efetuando-se a reposição patrimonial ao espólio.
Portanto, a reserva de bens, como técnica vinculada à sobrepartilha prospectiva, não se limita aos litígios externos e/ou apenas aos internos que foram expressamente catalogados no CPC, devendo ser vista como técnica geral a ser aplicada em prol da marcha processual fixada para o inventário causa mortis, a fim de que cada questão seja resolvida ao seu tempo no ambiente adequado, sem prejudicar o desfecho do inventário nas partes em que assim é possível.
BENS DE LIQUIDAÇÃO MOROSA OU DIFÍCIL
A legislação faz a indicação genérica de que os bens de liquidação morosa ou difícil se submetem à sobrepartilha prospectiva.[23]
Com efeito, liquidação morosa deve ser entendida como aquela que possui processo lento de arrecadação e quantificação valorativa do bem, fato que não justificaria tal espera, diante da projeção temporal do art. 611. Dessa forma, pode-se citar, em exemplo, que o falecido possui direito a receber parcela indenizatória cujo valor ainda não foi definido, não restando outro caminho senão a liquidação judicial.[24] Como não há certeza da dimensão do crédito e a cadência temporal para que este seja fixado é incerta, há presunção de delonga temporal, de modo que o art. 2.021 do CC permite que somente se efetue a arrecadação depois liquidação efetiva do crédito, até porque sem base de cálculo haverá dificuldade no recolhimento do ITCMD respectivo.
A legislação faz alusão também à liquidação difícil. Ao que parece, o texto legal quis firmar a ideia de liquidação complexa, no sentido de que o dimensionamento valorativo de determinados bens se submete a dados intricados e que, por isso, não permitem uma avaliação segura em curto espaço de tempo. Em ilustração, o autor da herança – em ato intervivos –, ao se desligar de empresa em que tinha participação social, teve a seu favor conferido o direito ao recebimento de percentual sobre os lucros futuros da pessoa jurídica, cujos ciclos de apuração reclamam a análise de desempenho empresarial. Trazer para dentro do inventário causa mortis a apuração de tais valores, ainda que a liquidação seja amigável, permite que a complexidade da apuração, que se projeta demorada, crie obstáculo para a imediata destinação dos bens e/ou dos créditos que já podem ser partilhados imediatamente.
BENS SONEGADOS
A análise acerca das situações que se encartam como sobrepartilha retrospectiva deve ser iniciada pela propiciada pela sonegação de bens, diante dos contornos especiais que lhe são inerentes.[25] Isso porque o art. 1.992 do CC prevê que a sonegação de bens no direito sucessório se caracteriza como conduta do herdeiro que: (1) não descreve bens da herança que estão em seu poder, (2) que possui conhecimento de bens que estão na posse de terceiros, (3) quando os omite da colação e (4) quando os deixa de efetuar a restituição respectiva. Configurada qualquer das condutas descritas no art. 1.992 e proferida decisão no sentido (art. 1.994), o herdeiro sonegador perderá todo o direito afeto ao bem. Qualquer que seja a hipótese de sonegação, caso reconhecida por decisão judicial própria, restará aplicada a pena de perda do direito sobre o bem, ou seja, de seu quinhão respectivo.
A situação peculiar acima resenhada gera sobrepartilha com fatiamento, pois a parte que o herdeiro sonegador faria jus deverá ser dividida entre os demais herdeiros proporcionalmente, seguindo-se o desenho de quinhão projetado pela vocação hereditária. No ponto, a sonegação não é tratada como hipótese de “morte civil”, situação prevista no art. 1.816 do CC, que permite que os descendentes do herdeiro excluído da sucessão possam herdar no lugar do herdeiro sonegador como se este morto fosse.[26]
Quando o herdeiro sonegador não descreve bens da herança que estão em seu poder, que estão na posse de terceiros ou não efetua a restituição destes, a pena de sonegados beneficiará a todos os herdeiros, no entanto, quando se tratar de sonegação decorrente da colação, a perda do direito aplicada ao sonegador será específica à legitima. A conclusão decorre do fato de que os bens que se sujeitam à conferência (colação) são arrecadados para parte específica da herança que está apenas na esfera patrimonial dos herdeiros necessários (arts. 1.845-1.847 e 2.002-2.003 do CC), fato que gerará o encaixe do bem sonegado em tal trecho específico da herança.
A partir do cenário tracejado, se o debate acerca da sonegação de bens (notadamente os que se submetem à colação) tiver início no curso do inventário, isto é, antes do seu desfecho, de forma diversa ao traçado no art. 2.022 do CC, estar-se-á diante de “litígio interno”, sendo passível de aplicação da sobrepartilha prospectiva. Em tal situação, não sendo o conflito resolvido internamente ao inventário, sendo necessária a dilação probatória (art. 612 do CPC), haverá a remessa para debate externo, com superfície para a formação de reserva patrimonial correspondente à pendenga, raciocínio este que pode ser extraído do art. 641, § 2º, do CPC.
BEM DESCOBERTO DEPOIS DA PARTILHA
Eventualmente pode acontecer o desconhecimento geral dos interessados acerca de determinado bem e/ou direito que deveria ter sido arrecadado na herança.
Há diferença evidente em relação à sonegação, pois, no caso tratado no item anterior, ao menos um personagem da sucessão (o herdeiro sonegador) tinha conhecimento da necessidade de arrecadação patrimonial do bem que foi deixado. Portanto, a premissa do inciso II do art. 669 do CPC é da falta de ciência geral acerca do bem e/ou direito, tanto assim que o texto legal faz alusão aos bens da herança “descobertos após a partilha”. Em exemplo, não é de todo raro que alguns bens móveis (por exemplo, joias e pedras preciosas) e documentação indicativa de titularidade de créditos e/ou bens do falecido, por vezes, fiquem escondidos em cofres, cuja descoberta ocorre em data posterior ao encerramento do inventário sucessório. Em outra ilustração, o falecido pode ter deixado bens na posse de terceiros, pessoas estas que vêm a tomar conhecimento da morte do autor da herança depois do fim do inventário, situação que faz com que a restituição seja plasmada em sobrepartilha.
SOBREPARTILHA PROSPECTIVA: MANUTENÇÃO DO ESPÓLIO E DESIGNAÇÃO DE INVENTARIANTE
O parágrafo único do art. 669 do CPC determina que, nos casos de bens litigiosos, de difícil/morosa liquidação ou situados em lugar remoto da sede do juízo onde se processa o inventário, estes ficarão sob a guarda de inventariante. A referida previsão também está contida na parte final do art. 2.021 do CC, fato que demonstra a sua afinidade com a sobrepartilha prospectiva. A solução legal – ao prever a manutenção da inventariança (ainda que com previsão que permite a troca do seu protagonista) – indica que, nas hipóteses de sobrepartilha prospectiva, não ocorre a extinção total dos efeitos da saisine e da noção de condomínio aplicado à herança (arts. 1.784 e 1.791, parágrafo único, do CC).[27] O espólio, especificamente em relação aos bens e/ou direitos projetados para sobrepartilha, sobrevive e ficará latente, aguardando-se o desfecho da arrecadação, da liquidação e/ou das controvérsias que as envolvem.[28] Tal fato – manutenção do espólio – é que justifica a designação de pessoa que represente a herança e adote medidas em nome do condomínio hereditário residual (representado pelos bens e direitos que foram depurados para sobrepartilha).
Não haveria lógica na nomeação de inventariante se o espólio fosse declarado extinto por completo. A assertiva demonstra a importância de que, na decisão de desfecho do inventário (notadamente em caso de partilha), fique consignada a existência de bens e/ou direitos que poderão ser alvo de sobrepartilha, identificando-os de forma mais precisa possível. Assim, de forma ilustrada, em caso de bens litigiosos, deverá constar no bojo do inventário não só as controvérsias, mas a individualização dos bens que estas abarcam e as ações judiciais eventualmente já em curso. No que se refere aos bens sem liquidação, também deverá ser feita menção a estes, com indicativo das providências que foram adotadas. Tais informações são relevantes, pois o espólio somente se encerrará quando ocorrer a derradeira sobrepartilha ou, de outra banda, se for declarada a renúncia ou a impossibilidade jurídica da arrecadação (por exemplo, sucumbência na ação judicial em que se disputava determinado bem).[29]
A projeção das incumbências do inventariante (arts. 618-619 do CPC) são devidamente plasmadas, com os devidos ajustes, no parágrafo único do art. 669 do mesmo diploma. No particular, sem a identificação mínima daquilo que remanesce no patrimônio do espólio, restará inviável, por exemplo, que se aplique o disposto no inciso VII do art. 618, em que se pressupõe uma prestação de contas anual, conjugando-se tal dispositivo com o art. 611.[30]
No que tange à designação do inventariante, os textos do parágrafo único do art. 669 do CPC e do art. 2.021 (parte final) do CC não possuem uma redação fluída. A interpretação que parece mais adequada aponta no sentido de que aquele que exerceu a inventariança se manterá na função, com a ressalva que tal continuidade poderá ser interrompida se as partes, por maioria, decidirem efetuar sua troca. Ademais, caso seja de interesse da pessoa que exerceu a inventariança, a função poderá ser redistribuída a novo ator, não sendo permitido furtar do inventariante o direito de se afastar do encargo ao fim do inventário original. Dessa forma, a permuta da inventariança deve ser sopesada em caso de sobrepartilha prospectiva, presumindo-se que, se nada for decidido em contrário, haverá a manutenção do mesmo inventariante. Em caso de troca de ator funcional, o novo inventariante deverá prestar novo compromisso (art. 617, parágrafo único, do CPC).
A permuta na inventariança, caso efetuada mediante convenção das partes, possui semelhança com a eleição consensual para a escolha do protagonista para atuar como inventariante, razão pela qual deve ser vista como espécie de negócio jurídico processual[31]. Para que ocorra o referido processo eletivo, a expressão “maioria dos herdeiros” que consta no parágrafo único do art. 669 do CPC (e na parte final do art. 2.021 CC) não foi posta na legislação de forma segura, pois os textos legais não esclarecem como a votação deve ser contabilizada. Deverá se usar maioria simples ou maioria absoluta? E ainda, a maioria será apurada por critério quantitativo (= fixado pelo número de votantes) ou por modelagem qualitativa (= determinada pelo peso dos votos)?[32]
A importação das regras de condomínio (arts. 1.791, parágrafo único, e 1.321, do CC), embora tenha alguma utilidade, não resolve a questão de forma plena. Com efeito, ainda que o art. 1.323 do CC aponte para a ideia de que as deliberações sobre nomeação de administrador se resolverão por “maioria simples”, o art. 1.325 – que está na subseção que trata da administração do condomínio – prevê que a “maioria será calculada pelo valor dos quinhões”, dispondo seu § 1º que as deliberações serão “tomadas por maioria absoluta”. O contexto sugere que, para deliberação acerca da troca do inventariante, permutando-se de personagem especificamente para sobrepartilha, deverá ser respeitada a vontade da maioria absoluta levando-se em conta os quinhões fixados na partilha (isto é, maioria qualitativa). Ocorre que os quinhões podem ter natureza heterogênea e alcançar figura que não é tida como herdeiro, mas que possui interesse direto na sobrepartilha. Exemplo claro está no cônjuge sobrevivente que tinha com o falecido vínculo pelo regime da comunhão universal, de modo que, em regra, metade da arrecadação da sobrepartilha lhe será dirigida.[33] Assim, os quinhões nem sempre terão a mesma natureza, situação que poderá reclamar a análise judicial.[34]
O que se percebe, em razão do movediço e complexo quadro supra, é que o juiz poderá ser chamado na designação e, de forma próxima ao que ocorre no art. 617, ter à sua mão a caneta para a resolução da controvérsia. Para tanto, a decisão – ainda que leve em conta o rol de referência (art. 617) – deverá definir como inventariante aquele que terá melhores condições para exercer o cargo em relação à sobrepartilha.
SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL
Atendidos os requisitos do art. 610, §1º, do CPC, não há nenhum óbice para que sobrepartilha seja feita extrajudicialmente, ainda que o inventário, que já teve o desfecho encerrado, tenha transitado na via judicial.[35] Eventual dúvida foi no sentido foi afastada pelo texto art. 25 da Resolução n. 35/2007 do CNJ que dispõe: “É admissível a sobrepartilha por escritura pública, ainda que referente a inventário e partilha judiciais já findos, mesmo que o herdeiro, hoje maior e capaz, fosse menor ou incapaz ao tempo do óbito ou do processo judicial.” Não há também óbice contrário, ou seja, de sobrepartilha pela via judicial em caso de pretérita partilha por escritura pública.
Diante das noções de sobrepartilha prospectiva, deve-se admitir a escritura pública com partilha parcial, quando não seja possível ou viável partilhar todos os bens deixados pelo autor da herança, adaptando-se a regra do art. 2.021 ao inventário extrajudicial. Por ser vedada a sonegação de bens no rol inventariado, deve-se justificar a não inclusão de determinado bem que se deixe para sobrepartilha. Com a lavratura da escritura pública de sobrepartilha, o tabelião deverá agir conforme a natureza da partilha inicial para que se proceda à anotação nesta: (i) se judicial, fazer a devida comunicação ao juízo; ou (ii) se extrajudicial, comunicar ao cartório.
AS BALIZAS E A DINÂMICA PROCEDIMENTAL DA SOBREPARTILHA
Embora o parágrafo único do art. 670 disponha que a sobrepartilha “correrá nos autos” processo sucessório anterior, trata-se de nova relação jurídica. Com efeito, a sobrepartilha não pode ser vista apenas como ato de desfecho do processo sucessório anterior, pois, na realidade, a figura se notabiliza como ‘inventário causa mortis suplementar’, submetendo-se, com os devidos ajustes necessários, ao mesmo gabarito legal.[36]
Como as regras aplicáveis ao inventário causa mortis são lançadas à sobrepartilha, ainda que com adaptações, admite-se que esta adote qualquer dos modelos de procedimentos previstos em lei. Logo, a sobrepartilha não está amalgamada pelo procedimento padrão do inventário sucessório, sendo, pois, perfeitamente possível que esta se desenvolva pelo rito do arrolamento sumário, bastando que sejam preenchidos os requisitos fixados no art. 659 do CPC. Igualmente, deve-se admitir a sobrepartilha pelo procedimento do arrolamento comum (art. 664 do CPC), caso o patrimônio a ser sobrepartilhado seja igual ou inferior a 1.000 (mil salários-mínimos). Se preenchidos os requisitos do art. 610, § 1º, do CPC, admite-se, ainda, a sobrepartilha extrajudicial, pouco importando se partilha original foi ultimada na via judicial.[37]
O parágrafo único do art. 670 aponta pela necessidade de desarquivamento dos autos do inventário original, tendo em vista que a sobrepartilha tem os trilhos assentados nos mesmos autos,[38] ainda que com a autonomia acima demarcada.
Há diferenças procedimentais em relação à forma com que a sobrepartilha ocorrerá, diferenças estas que se darão a partir do modelo prospectivo ou retrospectivo. Ora, em se tratando de sobrepartilha prospectiva, não há a extinção do espólio, razão pela qual a figura do inventariante ainda se faz presente (art. 669, parágrafo único, do CPC). O pormenor é relevante, pois a situação pode alargar a legitimação para abertura do procedimento fixado no art. 670 do CPC. Com efeito, em regra, a legitimidade para requerer a sobrepartilha está voltada aos atores que constam no rol do art. 616 da codificação processual,[39] isto é, aqueles que poderiam instaurar o inventário primitivo. Ocorre que não se deve negar a legitimação do inventariante designado para sobrepartilha, pois tal restrição é contrária ao exercício do encargo especialíssimo. Assim, aquele que for designado previamente como inventariante para a sobrepartilha terá legitimação para a respectiva instauração, mesmo que não se encontre dentro das figuras do rol de legitimados do inventário original.[40]
Diante do cenário acima posto, tem-se que, em caso de sobrepartilha prospectiva, não será necessária a designação de inventariante, situação diversa quando a sobrepartilha tiver caráter retrospectivo, pois na última hipótese, o espólio restará extinto e não terá nenhum a pessoa ocupando a inventariança.[41] Portanto, a postulação inicial que envolve a sobrepartilha deverá apontar à existência de inventariante, identificando-o em caso positivo. Em não remanescendo mais nenhuma pessoa na função ou deixando as partes de apresentar um nome de consenso para o encargo, caberá ao juiz efetuar a nomeação, designação esta que observará o rol de referência (art. 617 do CPC) para a escolha daquele com os melhores predicados para o exercício funcional e tarefas atinentes à sobrepartilha.
A petição inicial deverá estar moldada ao procedimento adotado[42], devendo ser requerida a citação dos interessados, a fim de que estes integrem a relação jurídica (art. 238 do CPC), facultando-lhes a apresentação de manifestação sobre o pedido e acerca das declarações e conteúdos vinculados à sobrepartilha.[43]–[44] O inventariante deverá apresentar peça com moldagem semelhante às primeiras declarações (art. 620 do CPC), de modo que permita a perfeita identificação do patrimônio e dos beneficiários, pois, em alguns casos, os bens e /ou direitos trazidos em sede de sobrepartilha adentrarão na esfera jurídica apenas de determinadas pessoas, situação clara quando se trata de bem sonegado e vinculado à colação (já que este interessa aos herdeiros necessários).
Em se tratando de sobrepartilha judicial, a competência é a do mesmo foro em que tramitou o inventário e partilha. Todavia, a partir das próprias variações permitidas no parágrafo único do art. 48 do CPC, não se pode descartar que a sobrepartilha seja apresentada em juízo diverso do processo original, desde que a opção esteja no cartel legal e a escolha esteja devidamente justificada. Exemplo no sentido pode ser tirado em relação aos bens situados em local remoto (art. 669, IV, do CPC), pois a manutenção do juízo onde se processou o inventário original restabelecerá a mesma dificuldade que anteriormente culminou na sobrepartilha prospectiva. Logo, considerando que as bandejas do art. 48 do CPC permitem a fixação de foro sucessório a partir da localização de bens da herança, o deslocamento da competência para a sobrepartilha pode ser medida eficiente para o seu desfecho mais célere.
Diferente do que ocorre em relação ao inventário causa mortis, não há prazo para a instauração do procedimento de sobrepartilha, devendo tal fato ocorrer quando os bens e/ou direitos se encontrem aptos a serem levados à efetiva arrecadação sucessória. No entanto, depois de sua instauração, aplicar-se-á o prazo do art. 611 do CPC à sobrepartilha, ou seja, os interessados terão 12 (doze) meses para finalizar o inventário suplementar. O detalhe demonstra a importância de se iniciar a sobrepartilha com os bens e/ou direitos em condições de arrecadação e distribuição, não sendo necessários os unir junto a outros ainda não aptos para tanto, pois, como bem destacado na parte final do art. 2.021 do CC, será possível que se apresentem quantas sobrepartilhas forem necessárias.
Não obstante se tratar de procedimento autônomo, a sobrepartilha possui natureza suplementar do inventário sucessório original. Há, pois, um aspecto de continuidade em que o inventário primitivo será mantido como referencial, já que nele foram adotadas decisões relevantes acerca da sucessão, como a definição das posições jurídicas de cada um dos interessados e o desenho quantitativo dos quinhões. No sentido, a data de instauração do inventário original é aproveitada pela sobrepartilha, não se podendo falar em mora por pagamento tardio do ITCMD.[45] Seria um despropósito considerar a aplicação de mora fiscal pelo não pagamento do ITCMD acerca de bens que não foram efetivamente transferidos aos interessados em decorrência de fatos alheios a estes. No ponto, o ITCMD somente poderá ser exigido, a teor do art. 654 do CPC, quando os bens estão aptos à partilha e/ou adjudicação.
Apresentadas as “primeiras declarações” vinculadas à sobrepartilha, não poderão ser renovados os debates já sedimentados no inventário anterior, tais como a posição jurídica dos interessados na herança. Haverá limitação nas manifestações dos interessados, cujo mote – dado aos próprios trilhos da sobrepartilha – se cingirá à nova arrecadação efetuada, assim como os bens e/ou direitos que dela fazem parte. Proceder-se-á a avaliação, abrindo-se nova fase de liquidação que permitirá que eventual credor se valha do patrimônio trazido para reclamar o pagamento de dívida ainda aberta (arts. 642-643 do CPC). Somente depois de ultrapassadas tais etapas, o procedimento restará pronto para decisão.[46]
Na hipótese de, no curso da sobrepartilha, surgir ponto controverso que reclame a produção de prova que não a documentada (ou as exceções legais), o conflito não poderá ser resolvido internamente, impondo-se a remessa externa da controvérsia (art. 612 do CPC).[47]
SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL EM CASO DE INVENTÁRIO JUDICIAL E VICE-VERSA
Como já antecipado no item 11, a sobrepartilha por escritura pública pode ser feita mesmo que o inventário anterior tenha tido tramite judicial (tema tratado no art. 25 da Resolução n. 35/2007 do CNJ). Também se admite sobrepartilha judicial na hipótese de pretérito inventário extrajudicial, pois a opção primitiva não vincula a sobrepartilha.
“PRESCRIÇÃO” E A SOBREPARTILHA
A apresentação da postulação de sobrepartilha em si não se submete a qualquer prazo extintivo do direito ou da pretensão, até porque a prescrição ou decadência são incompatíveis com a própria natureza do inventário causa mortis enquanto processo de arrecadação e liquidação da herança.[48] Assim, o decurso do tempo como vetor de estabilização de relações jurídicas não merece ser analisado na íntima perspectiva do procedimento de sobrepartilha sucessória, mas, de modo diverso, com outro enfoque, a partir das hipóteses que a ensejam, ou seja, o seu impacto diretamente nas situações descritas nos incisos do art. 669 do CPC. A anotação é relevante, pois a doutrina e a jurisprudência[49] costumam fazer apontamento genérico que – se mal interpretado – pode causar a impressão de que o tema é analisado sob o enfoque da sobrepartilha.
Em ilustração ao acima dito, para a análise da prescrição acerca da arrecadação dos bens sonegados (art. 669, I, do CPC) o foco não está no prazo em si para apresentar o pedido de sobrepartilha, mas de postulação para a condenação do herdeiro sonegador (art. 1.992 do CC)[50]. Dessa forma, é incorreto, no exemplo, se falar em “prescrição” com olhos voltados à própria sobrepartilha, fixando-se prazo específico (e geral) para que esta seja apresentada. A prescrição envolverá, em verdade, o fundamento que pode ensejar a sobrepartilha, sendo certo que – com tal visão – há variantes íntimas a cada uma das hipóteses que a autorizam.
RECURSO
Deve-se admitir manejo de agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias proferidas no curso da sobrepartilha (art. 1.015, parágrafo único, do CPC), conclusão intuitiva diante da natureza jurídica de tais dicções judiciais.[51] Não se deve admitir, contudo, agravo de instrumento contra a decisão que apenas recebe a postulação inicial envolvendo a sobrepartilha (seja para determinar o desarquivamento dos autos para tal finalidade, seja para convocar interessados para se manifestar sobre o pedido).[52] Isso porque se refere a ato judicial (ainda que com conteúdo decisório) sem estabilidade e que permite a devida impugnação junto ao próprio juiz.[53]
A sentença que julgar a sobrepartilha, dando por encerrado o procedimento, poderá ser atacada por apelação.
SOBREPARTILHA X RETIFICAÇÃO (ART. 656) E RESCISÃO DE PARTILHA (ART. 658)
Em regra, a sobrepartilha será representada por outra “partilha” (= outro desfecho, complementar, provocado por novo inventário suplementar). Assim, não há identidade da figura prevista nos arts. 669-670 do CPC com a previsão contida no art. 656 da codificação processual, em que se assentou a possibilidade de retificação da partilha, mesmo após o trânsito em julgado da decisão que a homologou ou sobre ela decidiu. Em suma, a base do art. 656 contempla o saneamento da partilha e não uma “partilha” provocada por inventário suplementar. Demais disso, considerando que a sobrepartilha preserva o(s) inventário(s) pretérito(s), tendo, pois, essência complementar, não é possível confundir o instituto com a rescisão da partilha, tema do art. 657. Sem rebuços, a rescisão da partilha tem o fito de rompê-la, isto, é “desconstituí-la” nos casos previstos nos incisos do art. 658, ou seja, sua mecânica não está ligada a ato de suplementação característico da sobrepartilha.[54]
SOBREPARTILHA X ALVARÁ
É possível que, depois de encerrado o inventário, surja situação em que o espólio é chamado para cumprir obrigações que vinculavam o falecido, mas que não eram de conhecimento dos herdeiros. Por exemplo, depois de finalizado o inventário causa mortis, os herdeiros podem ser chamados para assinar escritura pública de venda de imóvel, decorrente de pretérita promessa de compra e venda quitada e com preço recebido integralmente pelo autor da herança antes do seu óbito. A ilustração não se afina com sobrepartilha, pois o procedimento comentado envolve arrecadação de bens e não o cumprimento de obrigações do espólio com terceiros.
Diante do encerramento do inventário, não ficando mais nenhuma pessoa postada como inventariante, a solução que se apresenta mais adequada é o pedido de alvará judicial, a fim de que seja credenciada pessoa para que, em nome do espólio, faça as vezes de representante residual.[55] Na exemplificação posta, o pedido de alvará buscará a designação judicial de pessoa para assinar a escritura definitiva de compra e venda, sendo que, se todos os interessados forem capazes, semelhante representação poderá ser obtida pela via extrajudicial por meio de escritura pública.
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[1] O estudo está vinculado ao grupo de pesquisa “Núcleo de Estudos em Processo e Tratamento de Conflitos” – NEAPI, vinculado à Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), cadastrado no Diretório Nacional de Grupos de Pesquisa do CNPq no endereço <http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/7007047907532311#identificacao>. O grupo é membro fundador da “ProcNet – Rede Internacional de Pesquisa sobre Justiça Civil e Processo Contemporâneo” (<http://laprocon.ufes.br/rede-de-pesquisa>).
[2] Embora os artigos 669-670 do CPC e 2.021-2.022 do CC só façam alusão a “bens”, em aparente sentido fechado, nada impede que o patrimônio objeto de sobrepartilha tenha natureza mais fluida, incluindo-se, portanto, outros direitos que não são propriamente bens, como é o caso dos direitos decorrentes da à apuração de determinados lucros de operação societária e/ou de participações no sentido.
[3] Com tal norte, é possível que situação semelhante à sobrepartilha ocorra em hipótese de herdeiro universal, sendo que, em tal caso, não será propriamente partilha, mas adjudicação (sobreadjudicação, caso queira se aproveitar a da nomenclatura utilizada no artigo em comento).
[4] No sentido: ARAÚJO, Luciano Vianna. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 2 (arts. 539-925). Coordenação de Cassio Scarpinella Bueno. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 257.
[5] Semelhante: ALVIM, Arruda; ASSIS, Araken de; ALVIM, Eduardo Arruda. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2012, p. 1.518. Na jurisprudência: STJ, 3ª Turma, AgRg no REsp 1.151.143/RJ, j. 04/09/2012, DJ 10/09/2012.
[6] Sobre a sistematização utilizada (sobrepartilha prospectiva e sobrepartilha retrospectiva), confira-se: MAZZEI, Rodrigo. Comentários ao Código de Processo Civil: volume XII (arts. 610 a 673). Coordenação de José Roberto Ferreira Gouvêa, Luis Guilherme Bondioli e José Francisco Naves da Fonseca. São Paulo: Saraiva, no prelo.
[7] José Fernando Simão se refere aos bens alcançados pelo art. 2.021 do CC como os “problemáticos” e que “não devem impedir a partilha dos demais bens, pois a celeridade interessa aos herdeiros e reduz o risco de litígios” (Código Civil Comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 1.552). Direto no assunto, Silvio Venosa aduz que: “Muito útil, pois, essa possibilidade legal que permite que não se retarde a partilha dos bens incontroversos e de fácil divisão” (Código Civil Interpretado. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 1.723). Parecendo concordar, confira-se: TEPEDINO, Gustavo; NEVARES, Ana Luiza Maia; MEIRELES, Rose Melo Vencelau. Fundamentos do direito civil: Direito das sucessões. v. VII. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 274.
[8] Quando se projeta bem de arrecadação incerta à sobrepartilha, busca-se evitar que o mesmo seja atribuído desde logo ao quinhão de um (ou alguns) herdeiro(s), que pode(m) depois vir a perdê-lo no processo que o tem por objeto material, o que poderia abrir discussão sobre a necessidade de, em atenção ao princípio da igualdade da partilha, exigir dos demais herdeiros a indenização em virtude da evicção (art. 2.024 do CC). De toda sorte, ainda que com dificuldades da avaliação (pela falta de elementos exatos para seu dimensionamento em muitas vezes), não se pode descartar que tais bens possam ser alocados no quinhão de um ou mais herdeiros, desde que estes assumam expressamente o risco por tal opção. Próximo: PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil. XIV (arts. 982-1.045). Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 302; e LUCCA, Rodrigo Ramina. Breves comentários ao novo código de processo civil. Coordenação de Teresa Arruda Alvim Wambier et al. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 1.744. Assim procedendo, para que os efeitos do art. 2.024 do CC não se voltem contra os demais interessados, é fundamental que se lance convenção acerca da modulação da evicção, hipótese permitida pelo art. 448 da lei civil que prevê que as partes podem, “por cláusula expressa, reforçar, diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção”. No mesmo sentido: CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Inventário e partilha judicial e extrajudicial. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 231-232.
[9] No sentido: STJ, 4ª Turma, REsp 977.365/BA, j. 26/02/2008, DJ 10/03/2008.
[10] Parece ser esta a posição de Euclides de Oliveira (Código Civil Comentado. v. XX. São Paulo: Atlas, 2004, p. 227). Note-se que a redação do parágrafo único do art. 669 esclarece que a decisão por maioria se refere à designação do inventariante, não estando atrelada à adoção (ou não) da sobrepartilha.
[11] Sobre as aproximações da sobrepartilha prospectiva com a técnica prevista no art. 612 do CPC, confira-se: MAZZEI, Rodrigo. Comentários ao Código de Processo Civil: volume XII (arts. 610 a 673). Coordenação de José Roberto Ferreira Gouvêa, Luis Guilherme Bondioli e José Francisco Naves da Fonseca. São Paulo: Saraiva, no prelo.
[12] Próximo: CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Inventário e partilha judicial e extrajudicial. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 230; VENOSA, Silvio. Código Civil Interpretado. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 1.723; e DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018, p. 611. Não se trata, todavia, de “mero interesse dos herdeiros”, como defende: ARAÚJO, Luciano Vianna. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 2 (arts. 539-925). Coordenação de Cassio Scarpinella Bueno. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 292. Há de ficar configurada concretamente situação que justifica o fatiamento do inventário, pois a sobrepartilha prospectiva é uma técnica que quebra, de certa maneira, a unicidade sucessória.
[13] Próximo: ARAÚJO, Luciano Vianna. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 2 (arts. 539-925). Coordenação de Cassio Scarpinella Bueno. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 292.
[14] No caso de litígio sobre bem instaurado junto a terceiro (aquele que não participa do inventário) não será necessário efetuar qualquer tipo de reserva interna ao inventário. Na verdade, a partir da incerteza de que o bem fará parte do acervo da herança e/ou da presumível demora para que a controvérsia seja definida no seu ambiente próprio (provável ação judicial), o bem litigioso não deve ser arrecadado no primeiro momento, devendo ser alvo de sobrepartilha, como indicado no art. 2.021 do CC. Caso o litígio contra personagem externo seja julgado favorável ao espólio em data posterior ao desfecho do processo sucessório, aplicar-se-á o comando do art. 670 do CPC, ou seja, o bem dará ensejo a inventário suplementar (tratado na lei como sobrepartilha). Se o resultado for negativo, não haverá sobrepartilha.
[15] Como destaca Rodrigo Ramina Lucca: “Permite-se que bens conhecidos e facilmente partilhados assim o sejam rapidamente, deixando aqueles de difícil divisão para um momento posterior” (Breves comentários ao novo código de processo civil. Coordenação de Teresa Arruda Alvim Wambier et al. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 1.743).
[16] Dessa forma, os interessados na herança devem aquilatar a viabilidade de que determinadas questões que envolvem a arrecadação patrimonial e/o conflitos sejam resolvidas internamente (ou não) ao inventário causa mortis, pois a opção influenciará no seu desfecho. Considerando as possibilidades da sobrepartilha prospectiva, haveria esforço concentrado para o desfecho no ventre do inventário acerca dos temas patrimoniais nucleares e/ou de resolução mais simplificada, ao passo que questões duvidosas (tais como arrecadação de créditos de improvável ou difícil recebimento) e/ou de litígio extremamente agudo (por exemplo, debate com terceiro acerca da titularidade de determinado bem) sejam projetadas para fora do inventário causa mortis. Como a aceleração processual e o desfecho do inventário são de interesse geral, há fértil terreno para que sejam efetuadas convenções processuais envolvendo a sobrepartilha.
[17] As matrizes do just in time (JIT), no sentido de que há boa cadência temporal entre o início e o desfecho da produção, estão ligadas à organização de sequência de atos em que deve ser eliminado o tempo improdutivo. Tal visão merece ser adotada nos processos judiciais, notadamente quando estes carregam complexidades internas como ocorre no inventário causa mortis. Sobre a aplicação do JIT no plano processual, confira-se: MAZZEI, Rodrigo. Aspectos panorâmicos do ‘tempo’ na ‘realização do direito’. In: SILVA, Bruno Freire e; MAZZEI, Rodrigo (Coords). Reforma do Judiciário: análise interdisciplinar do primeiro ano de vigência. Curitiba: Juruá, 2006, p. 523-524.
[18] Nos casos de inventário extrajudicial, diante da ampla liberdade quanto à competência para sua instauração, é possível se inverter a lógica e fazer abertura do processo sucessório no local em que estão localizados os bens remotos. Assim, a dificuldade que levaria à sobrepartilha pode ser justificada para que os interessados instaurem o inventário extrajudicial fora do local que ordinariamente optariam, pois as regras de competência aplicáveis ao inventário judicial não se aplicam ao inventário extrajudicial (art. 1º da Resolução n. 35/2007 do CNJ. No tema: MAZZEI, Rodrigo. Comentários ao Código de Processo Civil: volume XII (arts. 610 a 673). Coordenação de José Roberto Ferreira Gouvêa, Luis Guilherme Bondioli e José Francisco Naves da Fonseca. São Paulo: Saraiva, no prelo.
[19] Igualmente: LUCCA, Rodrigo Ramina. Breves comentários ao novo código de processo civil. Coordenação de Teresa Arruda Alvim Wambier et al. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 1.647.
[20] No mesmo sentido: OLIVEIRA, Euclides de. Código Civil Comentado. v. XX. São Paulo: Atlas, 2004, p. 226.
[21] Por exemplo, os que estão sendo disputados em ações possessórias e reivindicatórias. No sentido: OLIVEIRA, Euclides de. Código Civil Comentado. v. XX. São Paulo: Atlas, 2004, p. 227.
[22] Se, por acidente (= contrariando as expectativas que justificaram a projeção de sobrepartilha), a controvérsia sobre o bem se resolver antes do desfecho do inventário causa mortis, bastará que se faça a retificação da arrecadação por parte do inventariante (art. 636, parte final). Assim não ocorrendo, segue-se no plano original e a resposta positiva do litígio será plasmada em sobrepartilha, que seguirá o rito do art. 670. Dessa forma, não se justifica a paralisação do inventário sucessório por conta de um litígio externo ou ainda da inclusão do bem, com pagamento de ITCMD respectivo, sem que concretamente o patrimônio fosse efetivamente transferido aos herdeiros. No sentido: PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil. XIV (arts. 982-1.045). Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 302.
[23] [23] O texto da lei não é claro, criando a possibilidade de mais de uma interpretação da expressão “bens de liquidação morosa ou difícil”. Por exemplo, Mauro Antonini defende que os bens em local remoto e os bens litigiosos são exemplos de “bens de liquidação morosa ou difícil” (Código Civil Comentado. Coordenação de Cezar Peluso. 7. ed. Barueri: Manole, 2013, p. 2.365), posição também adotada por: TOMÁS, Patrícia Mara dos Santos. Código Civil Interpretado. Organização de Costa Machado. Coordenação de Silmara Juy Chinellato (coord.). 3. ed. Barueri: Manole, 2010, p. 1.638). Parecendo concordar: GERSON, Fischmann. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 14. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 205.
[24] Correta a dicção de Euclides de Oliveira: “Não se pode prejudicar o líquido pelo ilíquido” (Código Civil Comentado. v. XX, São Paulo: Atlas, 2004, p. 227).
[25] Sobre a sonegação de bens no inventário, sobre diversas nuances, confira-se: MAZZEI, Rodrigo. Algumas notas sobre a sonegação de bens como hipótese de remoção do inventariante. In: SALLES, Priscila (Org.). HORTA, Renato; CÂMARA, Thaís Câmara (Coord.). Temas atuais em famílias e sucessões. Livro eletrônico. v. 2. Belo Horizonte: OAB/MG 2021, posição 472-495.
[26] De todo modo, há entendimento doutrinário de que a sanção é personalíssima e não poderia ser estendida aos herdeiros se o herdeiro apontado como sonegador morrer no curso da ação escorada no art. 1.992 do CC. No sentido: MAXIMILIANO, Carlos. Direito das Sucessões. v. III. 4. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1958, p. 390); GOMES, Orlando. Sucessões. 12. ed. Atualização de Mario Roberto Carvalho de Faria. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 305; e ANTONINI, Mauro. Código Civil Comentado. Coordenação de Cezar Peluso. 7. ed. Barueri: Manole, 2013, p. 2.327.
[27] Próximo: CARVALHO, Dimas Messias de. Direito das sucessões: inventário e partilha. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 520.
[28] Próximo: NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil comentado. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 1.105. No sentido: “Encerrado o inventário, mas ainda havendo bens a partilhar, não se pode concluir pela extinção da figura do espólio” (STJ, 4ª Turma, REsp 977.365/BA, j. 28/02/2008, DJ 10/03/2008). Seguindo semelhante linha: STJ, 3ª Turma, REsp 284.669/SP, j. 10/04/2001, DJ 13/08/2001; e STJ, 2ª Turma, REsp 1.172.305/PR, j. 16/03/2010, DJ 24/03/2010.
[29] Parecendo concordar: ALVIM, Arruda; ASSIS, Araken de; ALVIM, Eduardo Arruda. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2012, p. 1.517; CARVALHO, Dimas Messias de. Direito das sucessões: inventário e partilha. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 520.
[30] No tema, confira-se: MAZZEI, Rodrigo. Comentários ao Código de Processo Civil: volume XII(arts. 610 a 673). Coordenação de José Roberto Ferreira Gouvêa, Luis Guilherme Bondioli e José Francisco Naves da Fonseca. São Paulo: Saraiva, no prelo.
[31] Luciano Vianna Araújo entende que se o art. 669, parágrafo único, sugere a presença de negócio jurídico processual típico (Comentários ao Código de Processo Civil. v. 2 (arts. 539-925). Coordenação de Cassio Scarpinella Bueno. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 293).
[32] Sobre o tema, Gustavo Tepedino, Ana Luiza Maia Nevares e Rose Melo Vencelau Meireles defendem que: “Não esclarece o legislador se a maioria é quantitativa ou qualitativa, mas deve se entender por este último critério” (Fundamentos do direito civil. v. VII: Direito das sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 274).
[33] Não se afigura inspirada a posição de Clóvis do Couto e Silva que faz a interpretação literal do parágrafo único do art. 1.040 do CPC de 1973 (substituído pelo art. 669, ora comentado) e entende o cônjuge sobrevivente não participa da votação do inventariante (Comentários ao Código de Processo Civil. v. XI. tomo I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977, p. 416).
[34] O art. 1.325 do CC reconhece que o dimensionamento dos quinhões poderá ser dificultoso, ao prever em seus §§ 2o e 3o respectivamente: “2o Não sendo possível alcançar maioria absoluta, decidirá o juiz, a requerimento de qualquer condômino, ouvidos os outros. § 3 o Havendo dúvida quanto ao valor do quinhão, será este avaliado judicialmente”.
[35] Entre vários, confira-se: ABELHA, Marcelo. Manual de Direito Processual Civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 846; OLIVEIRA, Euclides de; AMORIM, Sebastião. Inventário e partilha: teoria e prática. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 457; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil comentado. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 1.105.
[36] Tanto assim que será necessário que se apresente petição inicial apontando os fundamentos que ensejam a sobrepartilha e as informações acerca do patrimônio (bens e/ou direitos) que merece ser inventariado, a fim de que se faça nova liquidação sucessória, com a distribuição respectiva (observando-se as posições jurídicas das partes). Bem próximo: FISCHMANN, Gerson. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 14. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 206.
[37] No sentido: ARAÚJO, Luciano Vianna. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 2 (arts. 539-925). Coordenação de Cassio Scarpinella Bueno. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 293; e GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Processo de conhecimento e cumprimento de sentença: comentários ao CPC 2015. v. 2. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 1.139.
[38] No sentido: SILVA, Ricardo Alexandre da; LAMY, Eduardo. Comentários ao Código de Processo Civil. v. IX (artigos 539-673). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 618; VENOSA, Silvio. Código Civil Interpretado. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 1.723.
[39] No sentido (entre vários): GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Processo de conhecimento e cumprimento de sentença: comentários ao CPC 2015. v. 2. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 1.139; e LUCCA, Rodrigo Ramina. Breves comentários ao novo código de processo civil. Coordenação de Teresa Arruda Alvim Wambier et al. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 1.745.
[40] Note-se, no ponto, que o rol de incumbências do art. 618 é puramente exemplificativo. No sentido: MAZZEI, Rodrigo. Comentários ao Código de Processo Civil: volume XII (arts. 610 a 673). Coordenação de José Roberto Ferreira Gouvêa, Luis Guilherme Bondioli e José Francisco Naves da Fonseca. São Paulo: Saraiva, no prelo.
[41] Por praxe, na sobrepartilha retrospectiva, costuma-se reconduzir o inventariante anterior, exceto quando demonstrado algum motivo que inviabilize a medida (por exemplo, falecimento da pessoa que anteriormente ocupou o cargo) ou que esta seja desaconselhável (em ilustração, o antigo inventariante está acometido de doença grave ou em posição de litígio com algum interessado na herança).
[42] Não se trata de simples requerimento incidental, seguindo de pedido de desarquivamento, mas de postulação afinada ao gabarito de petição inicial. No sentido: PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil. XIV (arts. 982-1.045). Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 303-304.
[43] Próximo: CARVALHO, Dimas Messias de. Direito das sucessões: inventário e partilha. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 520; PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil. XIV (arts. 982-1.045). Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 302; FISCHMANN, Gerson. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 14. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 207; BARROS, Hamilton de Moraes. Comentários ao Código de Processo Civil. v. IX (arts. 946-1.102). 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1988, p. 346-345); OLIVEIRA, Euclides de; AMORIM, Sebastião. Inventário e partilha: teoria e prática. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 280.
[44] Como se trata de nova relação processual distinta da anterior, torna-se necessária nova procuração outorgando poderes aos advogados dos interessados. Tal lógica não se aplicará se o mandato fizer menção a continuidade do trabalho do advogado para eventual sobrepartilha, espelhando o que está disposto no parágrafo único do art. 669 do CPC em relação ao inventariante. De forma diversa (entendendo ser possível aproveitar a procuração original para a sobrepartilha): ARAÚJO, Fábio Caldas de. Curso de Processo Civil. tomo III. Procedimentos Especiais. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 280.
[45] Igualmente: ARAÚJO, Luciano Vianna. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 2 (arts. 539-925). Coordenação de Cassio Scarpinella Bueno. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 292.
[46] Próximo: ARAÚJO, Luciano Vianna. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 2 (arts. 539-925). Coordenação de Cassio Scarpinella Bueno. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 293.
[47] Igualmente: CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Inventário e partilha judicial e extrajudicial. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 233.
[48] No ponto, o art. 31 da Resolução n. 35/2007 do CNJ ratifica o acima dito, pois o inventário poderá ser instaurado a qualquer tempo, aplicando-se a mesma lógica à sobrepartilha.
[49] No julgamento do AgInt no AREsp 225.534/PR, a 4ª Turma do STJ fez a seguinte alusão na ementa: “prescrição para o ajuizamento da ação de sobrepartilha” (j. 08/11/2016, DJ 16/11/2016). Na doutrina, confira-se: LUCCA, Rodrigo Ramina. Breves comentários ao novo código de processo civil. Coordenação de Teresa Arruda Alvim Wambier et al. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 1.743-1.744; GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Processo de conhecimento e cumprimento de sentença: comentários ao CPC 2015. v. 2. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 1.138; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 663; e SILVA, Ricardo Alexandre da; LAMY, Eduardo. Comentários ao Código de Processo Civil. v. IX (artigos 539-673). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 616.
[50] No exemplo, a jurisprudência tem entendido que o prazo de encerramento do inventário deve ser como marco para contagem do prazo prescricional aplicável a ação de sonegados e não da sobrepartilha, muito embora tal linha decisória nem sempre fique clara nos julgados. No sentido: STJ, 3ª Turma, REsp 1.196.946/RS, j. 18/08/2014, DJ 05/9/2014.
[51] No sentido: SILVA, Ricardo Alexandre da; LAMY, Eduardo. Comentários ao Código de Processo Civil. v. IX (artigos 539-673). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 617.
[52] Igualmente: PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil. XIV (arts. 982-1.045). Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 301.
[53] O ato decisório de instauração da sobrepartilha não se confunde com a deliberação sobre a sobrepartilha retrospectiva¸ uma vez que última se notabiliza como ato de condução do processo (calcada no art. 2.021 do CC). Há de se distinguir, portanto, sobrepartilha enquanto procedimento (inventário suplementar) e técnica de organização processual que remete determinadas questões para fora de inventário sucessório (sobrepartilha prospectiva).
[54] No sentido: STJ, 3ª Turma, REsp. 95.452/BA, j. 26/06/1996, DJ 26/08/1996.
[55] No sentido: CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Inventário e partilha judicial e extrajudicial. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 234.