A SENTENÇA DECLARATÓRIA DE FALÊNCIA E SEUS EFEITOS
Luis Baptista, Advogado
1 SENTENÇA DECLARATÓRIA DE FALÊNCIA
Essa abordagem é, talvez, do principal divisor de águas entre a falência e a continuidade de uma empresa. É a sentença declaratória de falência.
Antes de qualquer coisa, é importante salientar que apesar da nomenclatura adotada pelo legislador, a sentença declaratória têm também caráter constitutivo. Corrobora com este pensamento, Fábio Ulhoa Coelho, ao afirmar que este entendimento tem sido predominante na doutrina e complementa:
Com a sua edição pelo juiz, opera-se a dissolução da sociedade empresária falida, ficando seus bens, atos e negócios jurídicos, contratos e credores submetidos a um regime jurídico específico, o falimentar, diverso do regime geral do direito das obrigações. É a sentença declaratória da falência que introduz a falida e seus credores nesse outro regime. Ela não se limita, portanto, a declarar fatos ou relações preexistentes, mas modifica a disciplina jurídica destes, daí o seu caráter constitutivo.[1]
Desta forma, chega-se ao ponto em que, uma declarada a falência por meio da sentença, esta começará a gerar efeitos, sendo estes detalhadamente analisados a seguir, principalmente os relacionados aos sócios.
2 EFEITOS DA FALÊNCIA
Tratando-se dos efeitos decorrentes da decretação de falência, evidencia-se, logo de início, a extinção da pessoa jurídica da sociedade empresária, ou seja, a decretação de falência implica na dissolução da sociedade empresária.
Nos dizeres de Fábio Ulhoa Coelho:
Trata-se de ato judicial que instaura uma forma específica de liquidação do patrimônio social, para que a realização do ativo e a satisfação do passivo sejam feitas não por um liquidante escolhido pelos sócios ou nomeado pelo juiz da ação de dissolução, mas sim pelo próprio Poder Judiciário, por meio do juízo falimentar, com a colaboração do administrador judicial.[2]
Importante salientar que a decretação de falência desfaz todo e qualquer tipo de vínculo entre sócios e acionistas e inicia o processo judicial de extinção da personalidade jurídica da empresa.
Desta maneira, inabilita-se empresarialmente não só o devedor, empresário ou sociedade empresária, mas também os sócios ilimitadamente responsáveis. É o que dispõe o artigo 81 da lei 11.101/05:
Art. 81. A decisão que decreta a falência da sociedade com sócios ilimitadamente responsáveis também acarreta a falência destes, que ficam sujeitos aos mesmos efeitos jurídicos produzidos em relação à sociedade falida e, por isso, deverão ser citados para apresentar contestação, se assim o desejarem.
1º O disposto no caput deste artigo aplica-se ao sócio que tenha se retirado voluntariamente ou que tenha sido excluído da sociedade, há menos de 2 (dois) anos, quanto às dívidas existentes na data do arquivamento da alteração do contrato, no caso de não terem sido solvidas até a data da decretação da falência.
2º As sociedades falidas serão representadas na falência por seus administradores ou liquidantes, os quais terão os mesmos direitos e, sob as mesmas penas, ficarão sujeitos às obrigações que cabem ao falido.[3]
Neste sentido, elucida Manoel Justino:
Este artigo vem elucidar as dúvidas que surgiram a partir do ininteligível art. 5º da lei anterior, que dizia que tais sócios não eram atingidos pela falência, porém sujeitavam-se aos efeitos jurídicos da declaração de falência. Aqui optou o legislador, de forma clara e definitiva, por afirmar que o sócio com responsabilidade ilimitada (pessoa física) também é falido, sem embargo do entendimento de que quem fale é a sociedade empresária e não a pessoa física do sócio.[4]
Destaca-se ainda que, o requerente deve observar se existem sócios ilimitadamente responsáveis, pois a citação destes passa a ser obrigatória. Caso o procedimento não seja seguido adequadamente, todos os atos processuais estarão sob pena de nulidade se praticados sem a valida citação dos mesmos.
Dito isso, a lei de falência disciplina uma série de restrições impostas ao falido, conforme pode ser depreendido da análise dos seguintes artigos:
Art. 102. O falido fica inabilitado para exercer qualquer atividade empresarial a partir da decretação da falência e até a sentença que extingue suas obrigações, respeitado o disposto no § 1o do art. 181 desta Lei.
Parágrafo único. Findo o período de inabilitação, o falido poderá requerer ao juiz da falência que proceda à respectiva anotação em seu registro.
Art. 103. Desde a decretação da falência ou do sequestro, o devedor perde o direito de administrar os seus bens ou deles dispor.
Parágrafo único. O falido poderá, contudo, fiscalizar a administração da falência, requerer as providências necessárias para a conservação de seus direitos ou dos bens arrecadados e intervir nos processos em que a massa falida seja parte ou interessada, requerendo o que for de direito e interpondo os recursos cabíveis.[5]
Resta evidenciado que, ante a decretação de falência, de imediato, surgem duas restrições de direito ao falido, quais sejam a inabilitação para o exercício de qualquer atividade empresarial, e a perda do direito de administrar seus bens. Salienta-se que este último direito pode ser perdido antes mesmo da decretação de falência, caso haja determinação judicial do sequestro dos seus bens.
Trajano de Miranda Valverde pondera que, independentemente da inabilitação empresarial, não pode o falido ser privado dos seus direitos da vida civil:
A incapacidade jurídica do falido não tem significação nenhuma em nosso direito. Não é lícito, com efeito, ver nas restrições, quer no curso do processo de falência, quer depois do seu encerramento, derivantes umas da lei que governa o novo estado jurídico, e enquanto ele perdura, decorrentes outras de leis reguladores do exercício de certas funções, diminuição da capacidade jurídica do falido, mas, quando muito, uma incompatibilidade entre o estado de e idoneidade, que tanto pode ser moral, como técnica.[6]
Importante destacar que, ao ter sua falência declarada, o falido perde a capacidade de administrar os seus bens. Consequentemente, qualquer ato de administração praticado posteriormente a decretação de falência é passível de nulidade. Por esta razão, é que deve o juiz ao decretar sua insolvência, fixar o seu termo legal.
Contudo, não perde o falido, o direito de fiscalizar a administração da falência, requerer providências ou intervir em processos em que a massa falida seja parte. É o que dispõe o parágrafo único, do artigo 103, da Lei de Falências, já citado anteriormente.
Ainda tratando-se da administração dos bens, ou melhor, da sua indisponibilidade, José da Silva Pacheco pontua:
1º) que eles:
A) não maculam a capacidade jurídica do devedor, que permanece íntegra;
B) não interditam o devedor;
C) não retiram a propriedade ou a posse dos bens do devedor;
2º) que eles:
A) apenas inabilitam o devedor temporariamente até a extinção de suas obrigações;
B) retiram-lhe a administração dos bens, que passa ao administrador judicial;
C) impedem-no de dispor dos seus bens, que são arrecadados para a realização do ativo, a fim de atender o passivo;
3º) asseguram que o falido:
A) fiscalize a administração dos seus bens;
B) requeira as providências necessárias à conservação de seus direitos e de seus bens;
C) intervenha nos processos em que a massa falida seja parte, requerendo as medidas pertinentes e interpondo os recursos cabíveis.[7]
2.1. Dos deveres do falido
Além da extinção da pessoa jurídica, da inabilitação empresarial e da impossibilidade de administrar bens, o falido encontra um rol de deveres a serem seguidos decorrente da decretação de sua falência. Estes deveres, conforme pode ser constatado, estão elencados no artigo 104 da nova lei de falências:
Art. 104. A decretação da falência impõe ao falido os seguintes deveres:
I – assinar nos autos, desde que intimado da decisão, termo de comparecimento, com a indicação do nome, nacionalidade, estado civil, endereço completo do domicílio, devendo ainda declarar, para constar do dito termo:
a) as causas determinantes da sua falência, quando requerida pelos credores;
b) tratando-se de sociedade, os nomes e endereços de todos os sócios, acionistas controladores, diretores ou administradores, apresentando o contrato ou estatuto social e a prova do respectivo registro, bem como suas alterações;
c) o nome do contador encarregado da escrituração dos livros obrigatórios;
d) os mandatos que porventura tenha outorgado, indicando seu objeto, nome e endereço do mandatário;
e) seus bens imóveis e os móveis que não se encontram no estabelecimento;
f) se faz parte de outras sociedades, exibindo respectivo contrato;
g) suas contas bancárias, aplicações, títulos em cobrança e processos em andamento em que for autor ou réu;
II – depositar em cartório, no ato de assinatura do termo de comparecimento, os seus livros obrigatórios, a fim de serem entregues ao administrador judicial, depois de encerrados por termos assinados pelo juiz;
III – não se ausentar do lugar onde se processa a falência sem motivo justo e comunicação expressa ao juiz, e sem deixar procurador bastante, sob as penas cominadas na lei;
IV – comparecer a todos os atos da falência, podendo ser representado por procurador, quando não for indispensável sua presença;
V – entregar, sem demora, todos os bens, livros, papéis e documentos ao administrador judicial, indicando-lhe, para serem arrecadados, os bens que porventura tenha em poder de terceiros;
VI – prestar as informações reclamadas pelo juiz, administrador judicial, credor ou Ministério Público sobre circunstâncias e fatos que interessem à falência;
VII – auxiliar o administrador judicial com zelo e presteza;
VIII – examinar as habilitações de crédito apresentadas;
IX – assistir ao levantamento, à verificação do balanço e ao exame dos livros;
X – manifestar-se sempre que for determinado pelo juiz;
XI – apresentar, no prazo fixado pelo juiz, a relação de seus credores;
XII – examinar e dar parecer sobre as contas do administrador judicial.
Parágrafo único. Faltando ao cumprimento de quaisquer dos deveres que esta Lei lhe impõe, após intimado pelo juiz a fazê-lo, responderá o falido por crime de desobediência.[8]
Salienta-se que, o juiz poderá também entender necessário, o comparecimento dos sócios não administradores para dar declarações, pratica esta que vem sendo adotada desde a lei de falências anterior.
Apesar do representante deter todas as informações requisitadas pelo mencionado dispositivo, muitas vezes, podem os sócios serem responsabilizados por seus atos, até mesmo porque têm eles a função de fiscalizar a sociedade e seus administradores. É o que pode ser depreendido a partir da análise dos artigos 1.020 e 1.021 do Código Civil, que seguem adiante:
Art. 1.020. Os administradores são obrigados a prestar aos sócios contas justificadas de sua administração, e apresentar-lhes o inventário anualmente, bem como o balanço patrimonial e o de resultado econômico.
Art. 1.021. Salvo estipulação que determine época própria, o sócio pode, a qualquer tempo, examinar os livros e documentos, e o estado da caixa e da carteira da sociedade.[9]
Manoel Justino, neste contexto, explana com maestria o assunto discutido:
“[…] ao prestar essas declarações da letra e, deve obrigatoriamente informar quais são os bens imóveis e móveis, tanto de propriedade da pessoa jurídica falida, quanto de sua propriedade pessoal, como pessoa física. Não é de boa técnica limitar-se à colheita de informações sobre os bens da sociedade empresária, devendo ser declarados os bens de ambos (sociedade e pessoa física: administradores e sócios). Mais ainda é recomendável este tipo de esclarecimento, para que se possa eventualmente verificar o crescimento desmesurado do patrimônio pessoal em comparação à queda do patrimônio social, principalmente ante a aplicação cada vez mais comum da doutrina da desconsideração da personalidade jurídica no sentido de se evitarem fraudes contra os credores da falência.”[10]
Importante destacar que ante o não cumprimento de qualquer das obrigações mencionadas no artigo 104 da LF, estará o falido praticando crime de desobediência. Por isso, até mesmo com a finalidade de evitar medidas protelatórias, o juiz tem a faculdade de determinar que o falido permaneça à disposição do juízo, devendo adquirir expressa autorização do juiz, caso deseje se ausentar do lugar de onde se processa a falência.
2.2. Dos efeitos da sentença quanto ao sócio
Isso exposto, se faz necessária a análise em relação aos efeitos da sentença declaratória de falência em relação aos sócios de uma sociedade empresarial. De imediato, ressalta-se que estes efeitos devam recair apenas sobre a pessoa jurídica e não sobre os membros.
De qualquer forma, para esta análise, há de se levar em conta a função exercida pelos sócios e o tipo societário da empresa.
De maneira análoga aos empresários individuais que são afastados da administração de seus bens, ficam os sócios impedidos de deliberar sobre assuntos relacionados ao gerenciamento da empresa, bem como do patrimônio pertencente à sociedade.
Neste cenário, Gladston Mamede pontua:
(…) os sócios são diretamente afetados pela decretação da falência, a principiar pelo fato de serem afastados do poder de, em reunião ou assembleia, deliberarem sobre o futuro da atividade empresarial e do patrimônio titularizado pela sociedade falida. Todos esses assuntos, com a constituição do estado falimentar, passam a submeter-se diretamente ao juízo falimentar, contando com a atuação, a serviço dele, do administrador judicial. Mais do que isso, a falência implica uma cristalização da situação societária, sem que sejam possíveis ingressos de novos sócios, retirada de sócios até então existentes.[11]
E assim, buscando evitar a prática de crimes falimentares e garantir a responsabilização dos falidos, a legislação prevê que estes perderão os direitos sobre os bens sujeitos a arrecadação, devendo ainda, estes ser entregues ao administrador judicial, bem como ficar inviabilizados de retirar valores referente às cotas ou ações. É o que dispõe o artigo 116 da lei 11.101/05:
Art. 116. A decretação da falência suspende:
I – o exercício do direito de retenção sobre os bens sujeitos à arrecadação, os quais deverão ser entregues ao administrador judicial;
II – o exercício do direito de retirada ou de recebimento do valor de suas quotas ou ações, por parte dos sócios da sociedade falida.[12]
2.3. Sócio com responsabilidade ilimitada
Ainda quanto à responsabilização do sócio, pode-se afirmar que o sócio com responsabilidade ilimitada encontra-se na posição menos favorável dentre os demais. Até por isso, essa modalidade de sociedade é quase inexistente.
O artigo 190 da LF preceitua que sempre que houver referência ao falido ou ao devedor, aplicar-se-á também ao sócio ilimitadamente responsável, todos os efeitos decorrentes desta lei:
Art. 190. Todas as vezes que esta Lei se referir a devedor ou falido, compreender-se-á que a disposição também se aplica aos sócios ilimitadamente responsáveis.[13]
Tal dispositivo justifica-se a partir do pressuposto de que, uma vez falida a empresa, também em crise ou insolvente, estarão os sócios ilimitadamente responsáveis da mesma.
Nesse contexto, Amador Paes de Almeida ensina:
[…] é necessário destacar que os direitos e obrigações a que se refere o dispositivo são exclusivamente os estabelecidos pela Lei de Falências. Quer dizer, sempre que a lei prevê um ato processual a ser praticado pelo devedor, quem dele deve desincumbir-se ou estão legitimados a praticar são os representantes legais da sociedade falida, seus administradores ou liquidantes. […] não decorre do dispositivo em questão nenhuma responsabilidade objetiva dos administradores e liquidantes pelo passivo da sociedade falida. A responsabilidade dos administradores e liquidantes está exaustivamente delineada pelas leis societárias.[14]
Vale ressaltar que os sócios ilimitadamente responsáveis respondem de maneira diversa em relação àqueles que detêm responsabilidade limitada. Isso porquê responderão de acordo com as disposições legais que regulamentam o tipo societário do qual participa a empresa.
O artigo 82 da LF, , assim preceitua:
“Art. 82. A responsabilidade pessoal dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e dos administradores da sociedade falida, estabelecida nas respectivas leis, será apurada no próprio juízo da falência, independentemente da realização do ativo e da prova da sua insuficiência para cobrir o passivo, observado o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil”[15]
Ante a análise deste artigo, resta claro que a responsabilização dos sócios encontram-se definidas em legislação específica, e não na falimentar. Lá estarão indicadas as hipóteses específicas em que cada sócio poderá ser responsabilizado de acordo com o seu tipo societário.
Rubens Requião, se posiciona acerca do assunto, da seguinte forma:
[…] o sócio de responsabilidade ilimitada é solidário com os demais companheiros dessa categoria, respondendo igualmente pelas obrigações sociais. Essa responsabilidade, não mais se discute, é subsidiária, no sentido de que somente se efetiva quando faltarem bens suficientes para a sociedade cumprir integralmente suas obrigações.[16]
Complementa Gladston Mamede, no seguinte sentido:
“Todos os sócios da sociedade empresária em nome coletivo, bem como os sócios comanditários da sociedade empresária em comandita simples e os sócios diretores da sociedade em comandita por ações, portanto, estão obrigados a saldar as obrigações sociais se a sociedade não o faz, sendo que o credor da sociedade, insatisfeito em seu crédito, pode dirigir a execução individual contra eles: um, alguns ou todos, certo que são devedores solidários entre si; a subsidiariedade afirma-se apenas em relação à sociedade. Se o credor, todavia, opta pelo pedido de falência, desde que preenchidos os requisitos para tanto, a subsidiariedade da obrigação dos sócios constitui-se de imediato: se a sociedade não faz o depósito elisivo, os sócios (um, alguns ou todos) deverão fazê-lo. Se não o fazem, confessam-se insolventes como a própria sociedade e, destarte, sujeitar-se-ão à falência conjunta com a pessoa jurídica”[17]
Destaca-se contudo, a importância do artigo 1.024 do Código Civil, no qual fica estabelecido que apenas poderão ser executados os bens particulares dos sócios, em decorrência de dívidas pertencentes à empresa, depois de terem sido executados os bens sociais:
Art. 1.024. Os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais.[18]
2.4. Da responsabilidade do sócio
Uma vez analisado o sócio ilimitadamente responsável, viabiliza-se analisar com maior profundidade as circunstâncias em que os sócios com responsabilidade limitada podem ter seus bens atingidos em consequência dos atos e obrigações de uma empresa.
O artigo 1.009 do código civil assim dispõe:
Art. 1.009. A distribuição de lucros ilícitos ou fictícios acarreta responsabilidade solidária dos administradores que a realizarem e dos sócios que os receberem, conhecendo ou devendo conhecer-lhes a ilegitimidade.[19]
Percebe-se pela análise deste dispositivo, novamente a preocupação em evitar fraudes ou crimes contra credores, responsabilizando, solidariamente, tanto os administradores responsáveis pela distribuição dos referidos lucros, quanto os sócios, que por sua vez, mesmo desconhecendo a origem, deveriam fiscalizá-la.
Também serão responsabilizados os sócios de quando, a partir de uma deliberação contrária ao interesse da empresa e graças a seu voto, der causa à perda de capital da empresa. É o que dispõe o parágrafo terceiro do artigo 1.010 do Código Civil, conforme pode depreender-se a seguir:
Art. 1.010 – Quando, por lei ou pelo contrato social, competir aos sócios decidir sobre os negócios da sociedade, as deliberações serão tomadas por maioria de votos, contados segundo o valor das quotas de cada um.
[…]
3º. Responde por perdas e danos o sócio que, tendo em alguma operação interesse contrário ao da sociedade, participar da deliberação que a aprove graças a seu voto.[20]
No mesmo sentido, o artigo 1.055, parágrafo 1º, também do Código Civil, dispõe que responderão solidariamente os sócios, pela exata estimação dos bens conferidos ao capital social, até o prazo de cinco anos da data de registro da sociedade:
Art. 1.055. O capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio.
1º Pela exata estimação de bens conferidos ao capital social respondem solidariamente todos os sócios, até o prazo de cinco anos da data do registro da sociedade.[21]
Nas hipóteses em que os lucros ou quantias se distribuírem com prejuízo do capital, estarão os sócios obrigados à repor estes valores retirados a qualquer título, ainda que autorizados pelo contrato. É o que dispõe o artigo 1.059 do Código Civil:
Art. 1.059. Os sócios serão obrigados à reposição dos lucros e das quantias retiradas, a qualquer título, ainda que autorizados pelo contrato, quando tais lucros ou quantia se distribuírem com prejuízo do capital.[22]
Apenas cumpre salientar que, de maneira geral, nas sociedades de responsabilidade limitada, cada sócio apenas responsabiliza-se no limite de suas cotas. Entretanto, todos os sócios respondem pela integralização do capital social de maneira solidaria. É o fundamento do artigo 1.052 do código civil:
Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.[23]
De outro modo, equivale a dizer que a responsabilidade de cada sócio limita-se ao valor de suas ações ou cotas, ressalvando que, perante terceiros, todos responderão de maneira solidaria até que o capital social esteja completamente integralizado.
2.5. Responsabilidade dos sócios quanto às obrigações tributárias
Em uma breve abordagem quanto ás obrigações tributárias, cumpre salientar que a nova lei de falências promoveu grandes mudanças de crédito no processo falimentar. Não somente em relação à preferência dos créditos trabalhistas, mas também fazendo obedecer a ordem dos créditos de garantia real e posteriormente os de natureza tributária. É o que se vislumbra pela análise do artigo 83 da lei 11.101/2005, já mencionado no início deste estudo.
Importante destacar que, sendo os fatos geradores da obrigação tributária, posteriores à decretação de falência, estes serão considerados extraconcursais, devendo ser quitados com precedência sobre àqueles elencados no referido artigo de lei. Visualiza-se a definição de crédito extraconcursal no artigo 84 da LF:
Art. 84. Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na ordem a seguir, os relativos a:
I – remunerações devidas ao administrador judicial e seus auxiliares, e créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho relativos a serviços prestados após a decretação da falência;
II – quantias fornecidas à massa pelos credores;
III – despesas com arrecadação, administração, realização do ativo e distribuição do seu produto, bem como custas do processo de falência;
IV – custas judiciais relativas às ações e execuções em que a massa falida tenha sido vencida;
V – obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do art. 67 desta Lei, ou após a decretação da falência, e tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência, respeitada a ordem estabelecida no art. 83 desta Lei.[24]
Ante o exposto, conclui-se que não precedem aos créditos extraconcursais, os créditos tributários. Os extraconcursais deverão ser atendidos pelo administrador judicial antes mesmo do pagamento dos credores do falido.
Ainda cabe frisar que os créditos tributários também não sujeitam-se à habilitação, conforme se depreende da análise do artigo 187 do Código Tributário Nacional:
“Art. 187. A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento.
Parágrafo único. O concurso de preferência somente se verifica entre pessoas jurídicas de direito público, na seguinte ordem:
I – União;
II – Estados, Distrito Federal e Territórios, conjuntamente e pró rata;
III – Municípios, conjuntamente e pró rata.”[25]
Apesar de ser a sociedade empresária o sujeito passivo das obrigações tributárias, a própria lei prevê a responsabilização de terceiros.
Quanto aos sócios, estes poderão ser responsabilizados subsidiariamente, quando da liquidação da sociedade, quando não for possível a exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, nos atos em que ocorrer intervenção por parte dos mesmos, ou pelas omissões em que estes forem responsabilizados, conforme dispõe o artigo 134, inciso VII do CTN:
Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:
I – os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores;
II – os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou curatelados;
III – os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes;
IV – o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio;
V – o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário;
VI – os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício;
VII – os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.
Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em matéria de penalidades, às de caráter moratório.[26]
A título de esclarecimento, a definição de sujeito passivo de uma obrigação tributária encontra-se no artigo 121, também do CTN:
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.
Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;
II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.[27]
[1] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – Direito de Empresa. Vol. 03. 14ª ed: São Paulo: Saraiva, 2014, p. 280.
[2] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – Direito de Empresa. Vol. 03. 14ª ed: São Paulo: Saraiva, 2014, p. 295.
[3] BRASIL, Lei nº11.1011, de 09 de fevereiro de 2005.
[4] BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de Recuperação de Empresas e Falência. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. P. 193.
[5] BRASIL, Lei nº11.1011, de 09 de fevereiro de 2005
[6] VALVERDE, Trajano de Miranda. Comentários à lei de Falencias: (Decreto-Lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945). 4. Ed. Rev. E atual. / por J. A. Penalva Santos e Paulo Penalva Santos. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2000.
[7] PACHECO, José da Silva. Processo de recuperação judicial, extrajudicial e falência: em conformidade com a Lei nº 11.127/05. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 317.
[8] BRASIL, Lei nº11.1011, de 09 de fevereiro de 2005
[9] BRASIL, Lei nº10.4066, de 10 de janeiro de 2002.
[10] BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de Recuperação de Empresas e Falência. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. P. 253.
[11] MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial Brasileiro: Falência e Recuperação de Empresas. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 388.
[12] BRASIL, Lei nº11.1011, de 09 de fevereiro de 2005
[13] BRASIL, Lei nº11.1011, de 09 de fevereiro de 2005
[14] ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de Falência e Recuperação de Empresa. 23. Ed. Rev. E atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 205, 206.
[15] BRASIL, Lei nº11.1011, de 09 de fevereiro de 2005
[16] REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar. 14. Ed. Saraiva, 1995, v. 2, p.450.
[17] MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial Brasileiro: Falência e Recuperação de Empresas. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 205,206.
[18] BRASIL, Lei nº10.4066, de 10 de janeiro de 2002.
[19] BRASIL, Lei nº10.4066, de 10 de janeiro de 2002.
[20] BRASIL, Lei nº10.4066, de 10 de janeiro de 2002.
[21] BRASIL, Lei nº10.4066, de 10 de janeiro de 2002.
[22] BRASIL, Lei nº10.4066, de 10 de janeiro de 2002
[23] BRASIL, Lei nº10.4066, de 10 de janeiro de 2002.
[24] BRASIL, Lei nº11.1011, de 09 de fevereiro de 2005
[25] BRASIL, Lei nº5.1722, de 25 de outubro de 1966.
[26] BRASIL, Lei nº5.1722, de 25 de outubro de 1966.
[27] BRASIL, Lei nº5.1722, de 25 de outubro de 1966.