RETIFICAÇÃO DO REGISTRO IMOBILIÁRIO
Ana Paula Domingues Garcia
Olá Prezados (a) leitores!
Você conhece o procedimento de retificação do registro imobiliário?
É quando o oficial titular do Cartório de Registro de Imóveis competente, utilizando da sua prerrogativa e juízo de valor, verificará se realmente ocorreu um equívoco e, caso assim seja, alterará a descrição do imóvel na matrícula imobiliária.
O sistema jurídico de registros públicos baseia-se na presunção relativa do registro, que emana do art. 1247 do Código Civil e decorre, também, dos arts. 405 e 427 do Código de Processo civil e da própria Lei de Registro Públicos (arts. 212 a 216).
Portanto, depende da coincidência entre o registro e a realidade, que nem sempre ocorre.
Havendo divergência, mister se faz a retificação do competente registro:
Art. 1247. Se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retifique ou anule.
Sob a ótica dos empreendimentos imobiliários, há necessidade de perfeita e técnica correspondência entre o teor do registro e a situação fática do imóvel e, neste sentido, no Estado de São Paulo o item 206 do Provimento CG 02/05, segundo o qual será sempre indispensável a correspondência da descrição e da área do imóvel a ser incorporado com as que constarem da transcrição ou da matrícula respectiva, exigindo-se, caso contrário, prévia retificação.
A Lei de Registros Públicos estabelece a retificação do registro de imóveis nos arts. 212 a 216, interessando, também, os arts. 248, 250, 251, 253, 255, 256, 257 e 259.
Nem sempre a retificação será, apenas, de área, nome mais conhecido da ação.
Os casos mais comuns são:
– Retificação intramuros: destinando, apenas, a adequar o registro à realidade, como, por exemplo, a retificação de área, divisas e descrição, na qual se pleiteará que a descrição, medidas e confrontações sejam adequadas à realidade fática.
– Abertura de rua pelo Poder Público, alterando a metragem e confrontações constantes do registro. Em alguns casos, a retificação pode ser suprida através de documento expedido pela prefeitura, com todos os elementos necessários à averbação da rua (Lei 6.015/1973, art. 246).
Retificação de especificação de condomínio, mediante requerimento de averbação onde conste a ata da assembleia em que comparecerem todos os condôminos que aprovaram, à unanimidade, a alteração.
Em um julgado no nosso Superior Tribunal de Justiça o Ministro relator fundamentou: “A área do imóvel somente poderá ser corrigida se houver descompasso em relação àquela que constar no registro. A retificação de área não diz respeito à pretensão de incorporação de nova área de modo que sejam ultrapassados os limites do imóvel originário. Não pode servir o procedimento de retificação constante na Lei de registros Públicos como forma de aquisição ou aumento de propriedade imobiliária, pois destinado apenas à correção dos assentos existentes no registro de imóveis, considerando-se a situação fática do bem.
No caso analisado, a área pretendida correspondia a um acréscimo de 34,80% quando o TJ de origem, analisando a questão fática, decidiu que o limite tolerado é de 20% da área titulada, sendo inviável a incorporação de área por retificação na forma pretendida, porquanto o procedimento de retificação do registro não é meio adequado para reconhecimento da propriedade.”
Por outro lado, o mesmo Ministro, já decidiu que “o procedimento de retificação, previsto no art. 213 da Lei n. 6015/1973, para compatibilizar o registro de imóvel às suas reais dimensões, ainda que implique em acréscimo de área, é plenamente adequado se ausente qualquer oposição por parte de terceiros interessados” (REsp 716.489/MT, rel. João Otávio de Noronha, DJe 28/04/2008).
Em suma, o entendimento acima espelha a tendência do STJ de não admitir a incorporação significativa de área que, no caso concreto, desborda da simples adequação da matrícula à realidade fática.
Nesta medida, não substitui a ação de usucapião nas hipóteses legais.
Quem detém legitimidade ativa: prejudicado, detentor do direito atingido pelo assento equivocado, prejudicado pela irregularidade do registro (Código Civil, art. 1247 e Lei 6.015/1973, arts. 212 e 213), mesmo que não tenha direito real, v.g., simples compromisso de compra e venda.
Legitimidade passiva: Retificação não contenciosa: não há réu. A citação ou intimação de confrontantes não os transforma em réus e não torna obrigatório o comparecimento. Com a alteração da Lei de Registro Público pela Lei 10.931, de 02/08/2004, não se faz mais mister a citação do alienante.
Retificação contenciosa: legitimado para a ação competente, como por exemplo, ação demarcatória, ação de usucapião, ação reivindicatória etc. Não havendo uma ação específica com fundamento no art. 212 da Lei 6.015/1973, interporá uma ação de conhecimento, pelo procedimento comum.
Valor da causa: estimativa do autor, jamais o valor do imóvel, que não representa a vantagem patrimonial requerida.
Jurisdição
Retificação como processo de jurisdição voluntária
Nesta espécie, o fato aponta para a omissão da inscrição do usufruto na compra e venda; correção da área e dividas do imóvel intramuros, pelo seu titular (fato constante do registro) ou aquisição por acessão natural, como, por exemplo, abandono do álveo, aluvião, avulsão e formação de ilhas.
Retificação como processo de jurisdição contenciosa
A jurisdição contenciosa ocorre na retificação que acarreta modificação do direito de terceiros, como, por exemplo, o cancelamento do registro de escritura de venda e compra por nulidade do título ou, ainda, havendo impugnação fundamentada no processo de jurisdição voluntária.
Muitas vezes, havendo impugnação fundamentada ao pedido de retificação do registro, as partes são remetidas às vias ordinárias.
Por exemplo: alegando o impugnante, em sede de retificação não contenciosa, que não há divisa no pedido de retificação de divisas, o juiz trancará o processo não contencioso de retificação e remeterá as partes à via ordinária que nesse caso, tratar-se-á da ação demarcatória e não retificação.
Outro exemplo é a retificação não contenciosa em que haja impugnação no sentido de se alegar que a área a ser acrescida é de propriedade do impugnante.
Nesse caso, as partes serão remetidas para a ação reivindicatória, por exemplo, com exceção de usucapião (Lei 9.699/1981). A própria usucapião pode ser a via ordinária adequada nesse caso.
Quanto à competência a retificação pode ser extrajudicial ou judicial.
A extrajudicial sempre não contenciosa, quando não há potencialidade de danos a terceiros, v.g., fusão de matrículas (arts. 234 e 235 da Lei 6015/73) ou nos casos de retificação direta.
Também será extrajudicial a retificação nos termos dos arts. 212 e 213 da Lei de Registros públicos, com a alteração empreendida pela Lei 10.931, de 02/08/2004.
Art. 213. O oficial retificará o registro ou a averbação:
(…)
II – a requerimento do interessado, no caso de inserção ou alteração de medida perimetral de que resulte, ou não, alteração de área, instruído com planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado, com prova de anotação de responsabilidade técnica no competente Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura – CREA, bem assim pelos confrontantes.
Dessa forma, haverá a necessidade de seguir os passos abaixo:
Contratar engenheiro agrimensor: deve-se contratar um profissional habilitado para proceder à verificação in loco e realizar a medição do seu imóvel, conforme efetivamente está lá no físico;
Planta e memorial descritivo: após o levantamento da área feita pelo engenheiro, deverá ser apresentada a planta e memorial descritivo assinados pelo engenheiro responsável, por todos os proprietários e confrontantes do imóvel objeto da presente retificação. Há necessidade de coleta de assinatura dos vizinhos, para que o oficial registrador tenha segurança que a nova medição do imóvel não esteja invadindo área de terceiros.
Dessa forma, possuindo a anuência dos demais lindeiros, não haverá prejuízo quanto a isso.
Caso algum dos confrontantes se recuse a assinar os documentos, haverá a possibilidade de solicitar ao Registro de Imóveis que expeçam uma notificação para o endereço dessa pessoa, a qual terá o prazo de 15 (quinze) dias para se manifestar, considerando a ausência de manifestação como concordância com o que foi mencionado no procedimento.
Se porventura não seja possível localizar essa pessoa no endereço indicado, pode-se também realizar a notificação por Edital, com o mesmo prazo de manifestação mencionado acima, devendo ser publicado duas vezes no jornal de maior circulação.
Porém, devo alertar que no caso de impugnação realizada pelo confrontante ao seu procedimento de retificação de registro, será oportunizado o prazo de 5 dias para você e engenheiro manifestarem-se e solucionarem a questão de forma amigável. Contudo, não sendo possível o acordo o oficial, remeterá os documentos ao Juiz competente, que decidirá a questão levantada.
Resolvendo-se a questão pendente, ou não havendo nenhuma impugnação, o procedimento seguirá na análise e conferência da documentação pelo Registro de Imóveis.
Apresentação da Anotação de Responsabilidade Técnica – ART : esse é um documento a ser emitido pelo engenheiro, que serve para informar a execução dos serviços ao órgão competente;
Apresentação do requerimento: o requerimento deverá ser assinado pelos interessados/proprietários do imóvel e seus respectivos cônjuges, bem como mencionar quais são os devidos requerimentos a que imóvel se refere e constar as declarações necessárias;
Documentos de qualificação das partes: o Registro poderá requerer documentos de qualificação dos proprietários, de modo a adequar e complementar a qualificação contida na matrícula do imóvel, pois assim como a descrição do perímetro pode estar precária, a qualificação das partes também poderá apresentar equívocos ou ausência de informações.6. Documentos de qualificação do imóvel: será necessário apresentar também a documentação relativa ao imóvel, tratando-se de imóvel rural, deverá ser apresentado o Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR), que é expedido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), a Certidão Negativa de Débitos Relativos aos Tributos Federais e à Dívida Ativa da União de Imóvel Rural (ITR), expedida pela Receita Federal do Brasil e o Cadastro de Imóvel Rural (CAR).
Continuando, sobre se seu imóvel possui área diferente da que consta na matrícula imobiliária, e se tratar de imóvel urbano, deverá ser apresentado um documento a ser expedido pela prefeitura do Município competente, onde conste a informação do cadastro e inscrição imobiliária do imóvel na respectiva prefeitura.
Na posse de toda essa documentação atualizada, o oficial de registro de imóveis procederá à conferência para verificar se os documentos estão de acordo com o que a legislação determina, não havendo nenhum óbice, procederá à averbação da retificação na matrícula imobiliária e abrirá nova matrícula com a atual descrição, que constou em todo o procedimento.
Contudo, caso a documentação esteja incompleta, o projeto elaborado pelo engenheiro divergente, ou eventualmente seja necessário retificar algum documento apresentado, o registro de imóveis poderá elaborar uma nota de exigência, onde irá mencionar o que necessita e informará qual a fundamentação legal para tal requerimento.
Por isso, é importante ter um advogado (a) de confiança, que analisará previamente essa documentação e apresentará no registro de imóveis o documento mais completo possível, evitando reiteradas notas de exigência que tem como finalidade a adequação ao que a lei impõe.
Apesar de ter mencionado os principais documentos necessários para efetivar a retificação do registro, o oficial de registro de imóveis poderá sempre requerer novos documentos a fim de auxiliar no seu livre convencimento.
Importante ressaltar que o procedimento tratado visa corrigir imperfeições no registro, não sendo meio hábil de aquisição de propriedade.
Judicial:
Nos termos da Lei de Registros Públicos, com as alterações da Lei 10.931, de 02 de agosto de 2004, a retificação não contenciosa somente será judicial se a parte interessada assim requerer – tratando-se assim de faculdade ou na espécie contenciosa se houver impugnação sem que o impugnante e o interessado na retificação celebrem acordo.
Se houver impugnação fundamentada e o Oficial de Registro de Imóveis remeter o requerimento ao juiz competente ou se o interessado optar desde o início, a retificação será judicial.
Quanto à origem do erro, a retificação pode ser:
a) Direta
Decorre de erro na transcrição do título, v.g., o vendedor constava no título como casado e, no registro, consta como solteiro.
Nesse caso a retificação independe de qualquer ação, podendo ser efetuada administrativamente (extrajudicialmente), mediante simples pedido efetuado ao registrador ou até de ofício, ou seja, pelo próprio registrador, independentemente de requerimento das partes.
b) Do título
V.g., o adquirente fora qualificado como solteiro na escritura, quando, na realidade, é casado.
Nesse caso, a retificação do registro, que foi maculado pelo título, em regra, depende da retificação do título, salvo alguns erros materiais evidentes, como um numero do documento, que admite a retificação direta.
A retificação do título, uma escritura, por exemplo, só pode ser efetuada mediante outra escritura.
Não há como retificar judicialmente uma escritura.
Se uma parte faleceu, cumpre ao interessado pedir ao juízo do inventário que autorize o inventariante, por alvará, a comparecer para outorga da escritura de retificação.
Havendo recusa ou se a parte não for encontrada, mister se faz uma ação, mesmo com citação por edital, para que o juiz supra a declaração de vontade mediante alvará que será transcrito na escritura de rerratificação.
Modelo de ação de retificação de área
Exmo. Sr. Dr Juiz de Direito da (…)
(…) por seus procuradores (documentos 01/02), com escritório no endereço retro, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, aforar Retificação de Registro Público (área e confrontações de imóvel), o que faz com supedâneo no art. 213 e parágrafos, da Lei 6.015, de 1973, expondo e requerendo o quanto segue:
I – Fatos
A requerente adquiriu, conforme Escritura de Venda e Compra, com pacto adjeto de hipoteca, lavrada nas notas do (…), devidamente registrada junto ao Oficial de Registro de Imóveis da (…) – (…) (documentos 03/04), de (…), um imóvel situado no Distrito e Município de (…), que assim atualmente se descreve:
Um terreno, situado no Município de (…), medindo (…).
Dito imóvel fora havido pelos antecessores da requerente através de compra feita de (…) e sua mulher (…), conforme transcrição nº (…), livro (…), em (…), perante o (…) Cartório de Registro de Imóveis e Anexos (…).
Como é possível verificar, a descrição do imóvel constante do registro é antiga, imprecisa e precária, não oferecendo segurança quanto aos seus extremos e, tampouco, estabelecendo a correta especificação e descrição da área, que consta sem rumos e distâncias corretas. Aliás, nem consta a medida do imóvel no registro retificando.
Sendo assim, a requerente procedeu a levantamento topográfico, efetuado pelo técnico (…), CREA (…), com a devida anotação de responsabilidade Técnica sob o nº (…) e apurou a seguinte descrição (doc.05):
Para aproveitamento do imóvel objeto do registro retificando, mister se faz, principalmente, que conste sua medida que sequer consta do registro.
Portanto, resta absolutamente inviabilizada qualquer iniciativa de se levar a efeito um empreendimento no imóvel do requerente, tratando-se, outrossim, de retificação intra muros, que nenhum prejuízo pode causar a terceiros.
O imóvel está cadastrado no INCRA sob o nº (…), Município de (…), SP, em nome de Sítio dos Coqueiros (nome do imóvel), com a área total de (…) – fração mínima de parcelamento (…) – enquadramento empregador (…) – classificação do imóvel latifúndio, conforme Certificado de Cadastro referente ao exercício de (…) (doc.06).
II – Pedido
Desta forma, a fim de regularizar definitivamente a situação do imóvel no tocante a correta especificação e descrição da área, com metragem, demarcação, confrontação e descrição, considerando-se ademais que esses elementos são imprecisos nos assentamentos do Registro de Imóveis, é a presente para requerer se digne Vossa Excelência de determinar as providencias ora requeridas, a saber:
III – Requerimento
Requer-se:
a) a citação de todos os confrontantes e seus respectivos cônjuges (documentos 07/10), rol abaixo, pelo correio, para que se manifestem sobre o requerimento em dez dias;
b) a citação, por edital, de terceiros interessados;
c) a ciência ao oficial de Registro de Imóveis da Comarca de (…), que deverá prestar as informações requeridas pelo juízo;
d) a ciência ao D. Representante do Ministério Público, de todo o requerido;
Por derradeiro, requer a procedência do pedido de retificação, com a oportuna retificação de mandados ao Oficial de Registro de imóveis competente, a fim de serem averbadas, à margem da matrícula nº (…), livro (…), fls. (…), as medidas apuradas, as divisas, limites e confrontações do imóvel, expedindo se idêntico mandado ao INCRA, a fim de proceder aos registros necessários à regularização da área em seus assentamentos e cadastros.
IV – Provas
Requer a produção de prova documental, testemunhal, pericial, inspeção judicial e de todos os meios probantes em direito admitidos, inclusive o depoimento pessoal dos impugnantes, se porventura houver.
V – Valor da causa
Dá à causa, par os efeitos fiscais, o valor de R$ 1.000 (mil reais).
Termos em que, cumpridas as necessárias formalidades legais, deve a presente ser recebida e ao final julgada procedente, como medida de inteira Justiça.