RESPONSABILIDADES TRIBUTÁRIAS NA AQUISIÇÃO DE ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL FALIDO
Luthianne Perin Ferreira Lunardi
Caroline Fernandes Martins
SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 Conceitos e Noções Gerais sobre Estabelecimento. 3 Possibilidades de Aquisição do Estabelecimento Falido. 4 Responsabilidades Tributárias na Aquisição de Estabelecimento Falido. 5 Considerações Finais. Referências Bibliográficas.
1 Introdução
Verifica-se, cada vez mais, a função social da empresa na sociedade, os prejuízos econômicos, tributários e sociais causados pela extinção de uma empresa em decorrência de um processo falimentar, assim como, os prejuízos causados ao Estado e, consequentemente, à coletividade, nas situações que envolvem a alienação de um estabelecimento falido para fins de fraudar o pagamento dos tributos devidos ao erário.
Pretende-se entender as questões que envolvem as responsabilizações no âmbito tributário e falimentar quando houver a alienação de um estabelecimento empresarial falido, quer seja pela alienação judicial ou, ainda, pela aquisição de forma direta, também denominada trespasse.
A questão problema do referente estudo baseia-se nas seguintes situações: a legislação brasileira possibilita que o adquirente de um estabelecimento empresarial falido seja responsabilizado por tributos que este não deu causa e em quais situações de alienação empresarial não há responsabilização dessas obrigações?
Na realização da pesquisa referente às responsabilidades tributárias da alienação de estabelecimento empresarial falido, buscou-se desenvolver o trabalho utilizando o método de abordagem dedutivo, no qual são utilizadas tanto a doutrina quanto a legislação falimentar, Lei de Falência nº 11.101/05, no que diz respeito à falência e à recuperação judicial e à legislação tributária, mais precisamente o Código Tributário Nacional, no que regula as obrigações e responsabilidades tributárias.
Desse modo, são abordados os conceitos do estabelecimento empresarial, assim como as suas formas de aquisição e as responsabilidades tributárias na aquisição de estabelecimento empresarial que sofreu processo falimentar.
Diante da pesquisa apresentada ao longo deste trabalho, pretende-se, de forma clara, analisar as formas legais e jurídicas de aquisição de um estabelecimento empresarial, afastando a sucessão tributária e possibilitando que a empresa continue exercendo sua função social e, ainda, quais as consequências caso ocorra a aquisição de um estabelecimento empresarial por meio fraudulento.
2 Conceitos e Noções Gerais sobre Estabelecimento
Inicialmente, cumpre realizar uma análise sobre o estabelecimento em si. Para tanto serão observados os conceitos e noções gerais em relação ao estabelecimento, bem como quais as definições de aviamento.
Segundo Ricardo Negrão, “o Código Civil define estabelecimento empresarial no art. 1.142: ‘todo complexo de bens organizados, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária’” (2014b, p. 27).
Também é o entendimento de Fábio Ulhoa Coelho, ao definir estabelecimento empresarial como “o complexo de bens reunidos pelo empresário para o desenvolvimento de sua atividade econômica (…)” (2014, p. 80).
Desse modo, o conjunto de bens reunidos pelo empresário é “(…) elemento indissociável à empresa. Não existe como dar início à exploração de qualquer atividade empresarial, sem a organização de um estabelecimento” (COELHO, 2015, p. 164).
Pode-se dizer, então, que o estabelecimento empresarial abrange um conjunto de bens essenciais à atividade econômica, corpóreos ou incorpóreos, reunidos pelo empresário, que tem como objetivo o desenvolvimento de algum tipo de atividade econômica com fim lucrativo. Dessa forma, cada ramo empresarial necessitará de bens corpóreos correspondentes à atividade exercida.
“O que compõe o estabelecimento empresarial? Dependendo da criatividade e necessidade do empresário ou da sociedade empresária, o estabelecimento constará dos bens que seu titular escolher. Para exercer a atividade no ramo de restaurante, por exemplo, os bens corpóreos singulares utilizados pelo empresário serão similares aos escolhidos por empresário concorrente, mas distintos no que se refere à qualidade e ao desenho e programação visual e artística. A organização os distingue e é fruto de concepção do titular que os ordenou de maneira própria.” (NEGRÃO, 2014b, p. 128)
Como descrito por Ricardo Negrão, a reunião dos bens que compreende o estabelecimento passarão a ter uma destinação única, qual seja o desenvolvimento da atividade econômica. Portanto, ainda que constituído de bens incorpóreos, o estabelecimento empresarial não deixa de ser um bem corpóreo que possui relações jurídicas próprias. Logo, são as palavras do autor:
“O conceito merece alguns desdobramentos. A palavra ‘bens’ compreende coisas corpóreas e incorpóreas que reunidas pelo empresário ou pela sociedade empresária passam a ter uma destinação unitária – o exercício da empresa. Constitui-se, pois, o estabelecimento uma universalidade de fato e, como tal, pode ser objeto de relações jurídicas próprias, distintas das relativas a cada um dos bens singulares que o integram. A doutrina concebe o estabelecimento empresarial como bem incorpóreo, embora integrado por coisas corpóreas. Este entendimento permite compreender a extensão das operações a que se sujeita, envolvendo negócios translativos ou constitutivos. O estabelecimento pode ser objeto de usufruto, cessão, arrendamento, etc.” (2014b, p. 128)
Ademais, apesar de o estabelecimento ser considerado o conjunto de bens com fim de desenvolver atividade econômica, não é necessário que ele seja centralizado, isto é, “(…) o empresário pode manter filiais, sucursais ou agências, depósitos em prédios isolados, unidades de sua organização administrativas lotadas em locais próprios, etc.” (COELHO, 2014, p. 82). Entretanto, independente dessa descentralização, cada parte incorpora o estabelecimento empresarial.
Ou seja, a sociedade empresária terá obrigatoriamente um estabelecimento sede, entretanto, poderá possuir outros estabelecimentos que a incorporam, sem possuir qualquer distinção jurídica, quais sejam filiais, sucursais ou agências. Logo, é a lição de Fábio Ulhoa Coelho (2015, p. 166):
“A sociedade empresária pode ser titular de mais de um estabelecimento. Nesse caso, aquele que ela considerar mais importante será a sede, e o outro ou outros as filiais ou sucursais (para as instituições financeiras, usa-se a expressão agência, para mencionar os diversos estabelecimentos). Em relação a cada um dos seus estabelecimentos a sociedade empresária exerce os mesmos direitos, sendo irrelevante a distinção entre sede e filiais, para o direito comercial.”
Da mesma forma, Ricardo Negrão (2014b, p. 128) afirma que “as expressões sucursal, filial e agência não possuem distinção jurídica e, embora sejam mencionadas de forma diversificada em outros dispositivos do Código Civil (arts. 969, 1.000, 1.136 e 1.172), referem-se a uma só realidade: o estabelecimento subordinado a um principal“.
Ainda, cabe ressaltar que todo estabelecimento possui um aviamento, que, segundo Ricardo Negrão (2014b, p. 130), pode ser definido como o “(…) atributo do estabelecimento empresarial, resultado do conjunto de vários fatores de ordem material ou imaterial que lhe conferem capacidade ou aptidão de gerar lucros” .
Dessa forma, o aviamento é inerente ao estabelecimento empresarial, é uma qualidade essencial que garante a lucratividade do mesmo. E em decorrência de não possuir autonomia, não pode ser objeto de alienação ou garantia. Logo, é o entendimento de Ricardo Negrão (2014b, p. 131), ao mencionar Oscar Barreto Filho:
“Para Oscar Barreto Filho (1988, p. 171), ‘o aviamento existe no estabelecimento, como a beleza, a saúde ou a honradez existem na pessoa humana, a velocidade do automóvel, a fertilidade do solo, constituindo qualidades incindíveis dos entes a que se referem. O aviamento não existe como elemento separado do estabelecimento e, portanto, não pode constituir em si e por si objeto autônomo de direitos, suscetível de ser alienado, ou dado em garantia’.”
Mesmo que o aviamento seja resultante da atividade empresarial nele exercida pelo titular da empresa, o mesmo é inerente ao estabelecimento empresarial de tal forma que, nos casos em que houver trespasse do estabelecimento, “(…) o sobrevalor que foi outorgado o acompanha e se expressa economicamente, independentemente da permanência de seu titular. É por esta razão que entendemos aviamento como atributo do estabelecimento e não da empresa” (NEGRÃO, 2014b, p. 131).
Portanto, se o aviamento resulta dos diversos bens, tanto materiais como imateriais, que atribuem capacidade para o estabelecimento gerar lucros, cada qual, terá um aviamento proporcional com a sua capacidade lucrativa, podendo ser maior ou menor. “Diz-se que o aviamento é pessoal ou subjetivo quando a capacidade de gerar lucros resulta substancialmente de qualidades do titular da empresa. E será real ou objetivo se decorrente da qualidade do estabelecimento empresarial” (NEGRÃO, 2014b, p. 130).
Portanto, mesmo que o aviamento decorra de atividade empregada pelo titular da empresa, entende-se que o aviamento é um “atributo do estabelecimento e não da empresa” (NEGRÃO, 2014b, p. 131), em decorrência de este estar incorporado ao estabelecimento empresarial.
Entretanto, conforme o entendimento de Fábio Ulhoa Coelho (2015, p. 169), “(…) o aviamento é um atributo da empresa, e não um bem de propriedade do empresário“.
“O estabelecimento empresarial é a reunião dos bens necessários ao desenvolvimento da atividade econômica. Quando o empresário reúne bens de variada natureza, como as mercadorias, máquinas, instalações, tecnologia, prédios, etc., em função do exercício de uma atividade, ele agrega a esse conjunto de bens uma organização racional que importará em aumento do seu valor enquanto continuarem reunidos. Alguns autores usam a expressão ‘aviamento’ para se referir a esse valor acrescido.” (COELHO, 2014, p. 80)
“Quando se negocia o estabelecimento empresarial, a definição do preço a ser pago pelo adquirente se baseia fundamentalmente no aviamento, isto é, nas perspectivas de lucratividade que a empresa explorada no local pode gerar. Isto não significa que se trate de elemento integrante do complexo de bens a ser transacionado. Significa unicamente que a articulação desses bens, na exploração de uma atividade econômica, agregou-lhes um valor que o mercado reconheceu. Aviamento é, a rigor, sinônimo de fundo de empresa, ou seja, designam ambas expressões o sobrevalor, agregado aos bens do estabelecimento empresarial em razão da sua racional organização pelo empresário.” (COELHO, 2015, p. 169)
Conclui-se deste tópico que o estabelecimento empresarial é o conjunto de bens, corpóreos ou incorpóreos, reunidos pelo empresário, essenciais à atividade econômica, desde que tenham como objetivo o desenvolvimento de algum tipo de atividade econômica com fim lucrativo. Sendo assim, o estabelecimento é indissociável à empresa.
Porém, apesar de o estabelecimento ser inerente à empresa, não é necessário que ele seja centralizado, tendo em vista que a sociedade empresária terá obrigatoriamente um estabelecimento sede, mas poderá possuir outros estabelecimentos que a incorporam, sem possuir qualquer distinção jurídica, quais sejam filiais, sucursais ou agências. Ou seja, independentemente dessa descentralização, cada parte incorpora o estabelecimento empresarial.
Por fim, todo estabelecimento possui um aviamento, resultante dos diversos bens, tanto corpóreos quanto incorpóreos, que atribuem capacidade para o estabelecimento gerar lucros. Desse modo, cada estabelecimento terá um aviamento proporcional a sua capacidade lucrativa, podendo ser maior ou menor. No próximo tópico serão analisadas as formas de aquisição do estabelecimento falido.
3 Possibilidades de Aquisição do Estabelecimento Falido
Neste item serão estudados os meios de aquisição do estabelecimento falido, podendo ser por meio de trespasse ou através de aquisição judicial, sob as formas de leilão, proposta fechada e pregão.
Segundo Fábio Ulhoa Coelho, o estabelecimento empresarial pode ser objeto de alienação pelo empresário. “(…) O contrato de compra e venda de estabelecimento denomina-se trespasse, e é muitas vezes proposto, no meio empresarial, por meio das expressões ‘passa-se o ponto’” (2015, p. 184).
Cabe ressaltar que “(…) o trespasse não se confunde com a cessão de quotas sociais de sociedade limitada ou a alienação de controle de sociedade anônima” (COELHO, 2015, p. 184).
Apesar da semelhança, tendo em vista que os dois institutos tratam da transferência da empresa, no primeiro o estabelecimento deixa de incorporar o estabelecimento do alienante e passa a ser integralmente do adquirente.
Já a cessão de quotas sociais de sociedade limitada ou a alienação de controle de sociedade anônima tem como objetivo a alienação da participação societária, e consequentemente a alteração da composição de sócios, fazendo com que o estabelecimento continue pertencendo à sociedade empresária. Dessa forma é o entendimento de Fábio Ulhoa Coelho (2015, p. 183), ao mencionar que:
“(…) São institutos jurídicos bastante distintos, embora com efeitos econômicas idênticos, na medida em que são meios de transferência da empresa. No trespasse, o estabelecimento empresarial deixa de integrar o patrimônio de um empresário (o alienante) e passa para o de outro (o adquirente). O objeto da venda é o complexo de bens corpóreos e incorpóreos envolvidos com a exploração de uma atividade empresarial. Já na cessão de quotas sociais de sociedade limitada ou na alienação de controle de sociedade anônima, o estabelecimento não muda de titular. Tanto antes como após a transação, ele pertencia e continua a pertencer à sociedade empresária. Essa, contudo tem sua composição de sócios alterada. Na cessão de quotas ou alienação de controle, o objeto da venda é a participação societária (…).”
De acordo com Ricardo Negrão (2014b, p. 129), “a doutrina consagrou a expressão trespasse para indicar a cessão ou alienação do estabelecimento empresarial“. Dessa forma, a aquisição de estabelecimento empresarial pode ocorrer de forma direta.
Cabe ressaltar que, “distintamente do que ocorre na alienação das coisas singulares, o trespasse de estabelecimento empresarial é de certas exigências legais que dão validade e segurança aos contraentes” (NEGRÃO, 2014b, p. 129).
Além da aquisição de estabelecimento por trespasse, ela também pode ocorrer judicialmente, sob três formas: leilão, propostas fechadas e pregão. A primeira é realizada em hasta pública, isto é, venda judicial, e “ocorre quando os bens do falido são vendidos pelo maior lanço, isto é, pelo maior preço, por intermédio do leiloeiro” (ALMEIDA, 2013, p. 286), devendo ser anunciado antecipadamente.
Por fim, segundo o entendimento de Almeida (2013, p. 287), o pregão se caracteriza por ser uma “(…) forma híbrida do leilão e da melhor proposta, envolvendo, por conseguinte, o recebimento de propostas fechadas e o oferecimento de lance“. Ou seja, essa forma de aquisição tem como escopo fazer uma análise das propostas de menor valor.
Em resumo, a aquisição do estabelecimento empresarial pode ocorrer de forma direta, quando ocorrer a alienação pelo empresário, também denominado trespasse. Nesse caso, o estabelecimento deixa de incorporar o estabelecimento do alienante e passa a ser integralmente do adquirente.
Além do trespasse, a aquisição do estabelecimento pode ocorrer de forma judicial, sob as formas de leilão, proposta fechada e pregão. O leilão é realizado em hasta pública, por intermédio de um leiloeiro, e a arrematação judicial do estabelecimento será para o maior lance dado.
Logo, a aquisição por proposta fechada ocorre em juízo e pressupõe que o interessado em adquirir o estabelecimento se apresente no cartório da Vara que decorre a falência “em envelope fechado e lacrado, a ser aberto pelo juiz, no dia, hora e local designado” (ALMEIDA, 2013, p. 287).
“Durante o prazo para apresentação das propostas, os interessados devem entregá-las em cartório, mediante recibo, em envelopes lacrados, que serão abertos pelo juiz somente no dia hora e local designado no edital. O escrivão lavrará o auto respectivo, que será assinado pelo juiz, pelo administrador judicial, pelo Ministério Público e pelo comitê, se houver. Abertas as propostas e conferidos os preços, que devem ser maiores que os da avaliação, vencerá aquele proponente que ofereceu maior valor. Assinado o auto de alienação por proposta, será juntado aos autos da falência com as respectivas propostas.” (ARAÚJO, 2009, p. 291)
Já a aquisição de estabelecimento por proposta fechada ocorre em juízo, e pressupõe que o interessado em adquirir o estabelecimento se apresente no cartório da Vara que decorre a falência, com a sua proposta de compra em um envelope fechado, que será aberto apenas pelo juiz, vencendo aquele que oferecer maior valor pela aquisição do estabelecimento. Ao contrário da aquisição proposta fechada, o pregão é realizado em uma sessão pública onde será analisada a proposta fechada e o lance com menor valor. No próximo tópico serão estudadas as responsabilidades tributárias decorrentes da aquisição de um estabelecimento falido.
4 Responsabilidades Tributárias na Aquisição de Estabelecimento Falido
Nesse item, serão analisadas as responsabilidades tributárias decorrentes da aquisição de um estabelecimento empresarial falido, qual seja pela forma direta, também denominado trespasse, ou ainda quando suceder por meio de alienação judicial.
De acordo com o art. 133 do Código Tributário Nacional c/c o art. 1.146 do Código Civil brasileiro, nos casos de aquisição de estabelecimento empresarial, o adquirente poderá ser responsabilizado de forma integral ou subsidiária. Ocorre que o adquirente de estabelecimento que continuar explorando a mesma atividade empresarial, responderá de forma integral pelos créditos tributários anteriores à aquisição, quando o alienante cessar a exploração das atividades empresariais desenvolvidas.
Conforme o entendimento de Luciano Amaro (2014, p. 350), o adquirente responderá pelas obrigações tributárias, de forma integral, quando, após a aquisição do estabelecimento, o alienante deixar de explorar qualquer atividade empresarial. Nesse caso, o adquirente responderá sozinho pelos tributos devidos, mesmo que tenham sido gerados anteriormente à aquisição. “O adquirente (sociedade ou firma individual) responde, pois, pelos tributos relativos ao estabelecimento adquirido, se o alienante cessar a exploração da atividade que vinha executando e não passar a explorar outra atividade. Nessa hipótese, afirma o Código que a responsabilidade do adquirente é integral. O que, na verdade, o Código quis dizer é que, nesse caso, o adquirente responde sozinho, ou seja, não há obrigação do alienante“.
Também é o entendimento de Fábio Ulhoa Coelho (2015, p. 188), ao afirmar que, no caso de o alienante não continuar explorando qualquer tipo de atividade no estabelecimento empresarial, “(…) a responsabilidade do adquirente é direta, e pode o Fisco cobrar dele todas as dívidas tributárias do alienante, originadas da atividade desenvolvida no local do estabelecimento“.
Entretanto, se o alienante, no prazo de seis meses após a alienação, continuar desenvolvendo qualquer tipo de atividade empresarial, a responsabilidade do adquirente será subsidiária, e, dessa forma, o alienante será o principal responsável pelos créditos tributários. Logo, é o entendimento de Luciano Amaro (2014, p. 350):
“Mas se o alienante prossegue a exploração da atividade que desenvolvia no estabelecimento alienado, ou passa a explorar outra, dentro de seis meses contados da data da alienação, a responsabilidade do adquirente é meramente subsidiária, permanecendo, pois, como principal obrigado o alienante.”
Assim, no caso de o alienante continuar a exploração de qualquer tipo de atividade empresarial, no prazo de seis meses a partir da alienação, independentemente de ser no mesmo estabelecimento, “(…) o adquirente responde de forma subsidiária, quer dizer, apenas no caso de falência ou insolvência do alienante” (COELHO, 2015, p. 188).
Em outras palavras, só irá resultar sucessão tributária quando o adquirente continuar explorando atividade que o alienante já exercia no estabelecimento anteriormente à alienação. Caso o adquirente explore outra atividade empresarial, o mesmo não terá qualquer tipo de responsabilidade pelas dívidas tributárias. Dessa forma, é o entendimento do autor:
“Registra-se que a sucessão tributária somente se caracteriza, em qualquer caso, se o adquirente continuar explorando, no local, idêntica atividade econômica do alienante. Se alterar o ramo de atividade do estabelecimento, não responde mais pelas dívidas fiscais do alienante, nem direta, nem subsidiariamente.” (COELHO, 2015, p. 189)
Para Hugo de Brito Machado (2013, p. 160), o art. 133 enseja a questão de saber se o alienante continua vinculado à obrigação tributária. A regra legal diz apenas que o adquirente responde “integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade“.
Porém para o autor, a expressão “integralmente“, utilizada no inciso I do art. 133, não se confunde com “exclusivamente“, tendo em vista que a última dá margens a interpretações que possibilitam práticas fraudulentas. Portanto, o termo mais adequado seria “solidariamente“.
“Existem valiosas manifestações em sentido contrário. Não nos parecem, todavia, procedentes. A palavra ‘integralmente’, no inciso I do art. 133 do CTN, há de ser entendida como solidariamente, e não como exclusivamente. O elemento teológico da interpretação impõe esse entendimento, que afasta a possibilidade de práticas fraudulentas. Havendo mais de uma interpretação possível, não se há de preferir aquela que dá oportunidades para fraudes. O aperfeiçoamento do ordenamento jurídico o exige.” (AMARO, 2013, p. 60)
Portanto, o adquirente só responderá de forma solidária com o alienante quando esse deixar de praticar a atividade empresarial. E responderá de forma subsidiária se o alienante continuar explorando qualquer tipo de atividade seis meses após a alienação do estabelecimento.
“Em síntese, na hipótese do art. 133, I, o adquirente responde solidariamente com o alienante que cessou a exploração do comércio, indústria ou atividade. Já na hipótese do inciso II, o adquirente responde subsidiariamente com o alienante que prosseguiu na exploração, ou iniciou, dentro de seis meses, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou atividade.” (MACHADO, 2013, p. 161)
Da mesma forma, é o entender de Leandro Paulsen, ao mencionar que o adquirente de estabelecimento responderá integralmente pelos créditos tributários se o alienante cessar qualquer tipo de atividade empresarial. Porém, no caso do alienante continuar explorando a mesma atividade ou iniciar qualquer tipo de atividade, no prazo de seis meses a contar da alienação do estabelecimento, o adquirente responderá subsidiariamente com o alienante.
“A responsabilidade por sucessão também ocorre nos casos de aquisição de fundo de comércio ou de estabelecimento comercial, industrial ou profissional, conforme o art. 133. O adquirente que continuar a respectiva exploração responde ‘integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade’ (inciso I) ou ‘subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de 6 (seis) meses, a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo do comércio, indústria ou profissão’ (inciso III).” (PAULSEN, 2014, p. 189)
Entretanto, “na prática, na generalidade dos casos, ninguém se interessa pela aquisição dos bens da massa falida exatamente porque as dívidas tributárias desta são muito elevadas, o que torna absolutamente desvantajoso o negócio” (MACHADO, 2013, p. 161). Diante disso, o legislador adicionou dispositivos na lei que visam excluir da sucessão tributária o adquirente de estabelecimento, por meio de alienação judicial, e, assim, assegurar a função social da empresa.
Por sua vez, o § 1º do art. 133 do Código Tributário Nacional dispõe de duas possibilidades de inaplicabilidade da responsabilidade tributária. A primeira decorre da aquisição de estabelecimento alienado judicialmente. Dessa forma, o arrematante não irá responder por qualquer tipo de responsabilidade tributária anterior à alienação judicial. Logo, é o entendimento de Ricardo Negrão (2014a, p. 557):
“O Código Tributário Nacional em expressão harmônica com esse dispositivo, recepcionou nova redação ao art. 133, fazendo constar a inaplicabilidade dos efeitos da sucessão por aquisição de fundo de comércio ou estabelecimento empresarial na hipótese de alienação judicial ocorrer em processo de falência.”
Na segunda possibilidade de exclusão da sucessão tributária, o adquirente não será responsabilizado tributariamente quando se tratar de filial ou unidade produtiva isolada em processo de recuperação judicial, conforme o inciso I, § 1º, do art. 133 do CTN.
A Lei nº 11.101/05, no seu “(…) inciso II do art. 141, dispõe expressamente que o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária (…)” (ARAÚJO, 2009, p. 287).
A Lei Complementar nº 118, de 2005, inovou o Código Tributário Nacional, ao adicionar os §§ 1º, 2º e 3º, que tratam da sucessão tributária do adquirente de estabelecimento falido ou em recuperação judicial.
“No atinente às obrigações de natureza tributária houve alteração do CTN pela Lei Complementar nº 118, de 09.02.05, cujo art. 1º acrescentou ao art. 133 do CTN os §§ 1º, 2º e 3º, esses dispositivos atendem perfeitamente aos interesses da recuperação ou da falência quanto à sucessão do falido pelo adquirente da empresa.” (ARAÚJO, 2009, p. 287)
Como descrito por Hugo de Brito Machado (2013, p. 161), “no processo de falência, atribuir ao adquirente dos bens que integram a massa falida, para continuar a atividade empresarial, a responsabilidade pelos tributos devidos pelo falido é frustrar a possibilidade de preservar a empresa“.
Dessa forma, o § 1º do art. 133 do CTN estabeleceu que quando houver a aquisição de um estabelecimento empresarial por meio de alienação judicial, ou seja, por meio de leilão, pregão ou proposta fechada, o adquirente não responderá por qualquer tipo de débito fiscal anterior à aquisição do estabelecimento, sendo afastada a sucessão tributária.
De fato, esse meio de aquisição possibilita que a empresa cumpra a sua função social, uma vez que, em atividade, estará gerando riquezas, empregos e, consequentemente, tributos, que resultarão no desenvolvimento econômico e social de uma determinada região. Além disso, o valor pago pelo adquirente na alienação judicial liquidará as obrigações anteriores à alienação.
“Ao nosso pensar, essa inovação é muito positiva, uma vez que a empresa tende a continuar em atividade (gerando riquezas e mantendo empregos), enquanto o produto da alienação passa a ser fundamental no processo de reabilitação do devedor. É óbvio que o valor pago pela empresa em quebra será aproveitado para saldar as obrigações do devedor (antigo proprietário da empresa) em relação aos seus credores.” (SABBAG, 2014, p. 761)
Porém, essa regra não abrange o adquirente de estabelecimento falido que tiver como finalidade adquirir estabelecimento empresarial sob a forma judicial no intuito de fraudar a sucessão empresarial. Assim, o arrematante não poderá ter qualquer tipo de vínculo ou parentesco com a sociedade empresarial falida ou em recuperação judicial, ou com os sócios da mesma. Em Hugo de Brito Machado (2013, p. 161), vamos encontrar o seguinte esclarecimento:
“No § 2º cuidou o legislador de evitar que a referida exceção possa ser utilizada de forma fraudulenta. Estabeleceu que a exceção não se aplica – prevalecendo, portanto, a norma da cabeça do artigo – quando o adquirente for: (a) sócio da sociedade falida ou em recuperação judicial; (b) sociedade controlada pelo devedor falido ou em recuperação judicial; (c) parente, em linha reta ou colateral até o 4º grau, consanguíneo ou afim, do devedor falido ou em recuperação judicial ou de qualquer de seus sócios; e (d) identificado como agente do falido ou do devedor em recuperação judicial com o objetivo de fraudar a sucessão tributária.”
Ou seja, o arrematante não poderá ter qualquer intenção de fraudar a sucessão tributária, e ainda não poderá ser “(…) sócio da falida, de sociedade controlada pelo falido, parente (em linha reta ou colateral até o quarto grau, consanguíneo ou afim) do falido ou do sócio da sociedade falida (…)” (NEGRÃO, 2014a, p. 557).
Do mesmo modo, ao mencionar o Código Tributário Nacional, Leandro Paulsen (2014, p. 190) afirma que “não se dá tal responsabilidade quando a alienação ocorra em processo de falência ou em processo de recuperação judicial, desde que o adquirente não seja o próprio sócio, seus parentes, agente da empresa ou sociedade controlada, conforme os §§ 1º e 2º do art. 133“.
Na visão de Eduardo Sabbag (2014, p. 761), “pretende-se evitar que os institutos da recuperação tenham uso indevido, a fim de favorecer, fraudulentamente, o próprio alienante. Se isso ocorrer, esse adquirente responderá pelas dívidas, na forma prevista no art. 133 do Código Tributário Nacional“.
Desse tópico, conclui-se que o adquirente responderá pelas obrigações tributárias, de forma integral, quando, após a aquisição do estabelecimento, o alienante deixar de explorar qualquer atividade empresarial. Entretanto, se o alienante, no prazo de seis meses após a alienação, continuar desenvolvendo qualquer tipo de atividade empresarial, a responsabilidade do adquirente será subsidiária e, dessa forma, o alienante será o principal responsável pelos créditos tributários.
Todavia, o § 1º do art. 133 do CTN, estabeleceu que, quando houver a aquisição de um estabelecimento empresarial por meio de alienação judicial o adquirente não responderá por qualquer tipo de débito fiscal anterior à aquisição do estabelecimento, sendo afastada a sucessão tributária. E dessa forma, possibilitando que a empresa cumpra a sua função social, uma vez que, em atividade, estará gerando riquezas, empregos e consequentemente tributos, que trarão maior desenvolvimento para uma determinada região.
Porém, essa regra não abrange o adquirente de estabelecimento falido que tiver como finalidade adquirir estabelecimento empresarial por meio de alienação judicial com o intuito de fraudar a sucessão empresarial. Assim, o arrematante não poderá ter qualquer tipo de vínculo ou parentesco com a sociedade empresarial falida ou em recuperação judicial, ou com os sócios da mesma.
Portanto, nos casos em que a aquisição do estabelecimento ocorrer por venda direta, o adquirente será responsabilizado, solidariamente ou integralmente com o alienante, pelas dívidas tributárias anteriores à aquisição. Entretanto, se o estabelecimento empresarial for adquirido em decorrência de alienação judicial, o adquirente não responderá por créditos tributários anteriores à alienação.
5 Considerações Finais
O estudo procurou analisar as responsabilidades tributárias do adquirente de um estabelecimento falido, tendo em vista a relevância da função social da empresa e como esta interferiu nas relações de aquisição de um estabelecimento empresarial.
Buscou-se resolver os impasses relacionados às situações que a legislação brasileira possibilita a responsabilização do adquirente de um estabelecimento empresarial falido, por tributos que o mesmo não deu causa e, em quais situações de alienação empresarial não há responsabilização dessas obrigações.
Quanto às situações que a legislação permite que o adquirente de um estabelecimento empresarial falido seja responsabilizado por tributos anteriores à alienação, tem-se em vista que o estabelecimento abrange um conjunto de bens essenciais para atividade econômica, tendo como finalidade gerar lucros. Entretanto, este pode ser objeto de alienação pelo empresário, podendo ser realizado por meio de contrato de compra e venda, também denominado trespasse, sendo uma forma direta de aquisição de um estabelecimento.
Nesse caso, o adquirente responderá integralmente pelas obrigações tributárias, anteriores à aquisição, desde que o alienante deixe de explorar as atividades empresariais desenvolvidas na empresa pelo prazo de seis meses. No entanto, se o alienante não cessar a exploração dessas atividades, as obrigações tributárias serão subsidiárias, sendo que este será o principal responsável pelos créditos tributários.
Tendo em vista que, na prática não seja tão vantajoso adquirir um estabelecimento falido, principalmente porque as dívidas tributárias são exorbitantes, a Nova Lei Falimentar, juntamente com o Código Tributário Nacional inovaram no que se refere à empresa garantir o cumprimento de sua função social.
Dessa forma, quando um estabelecimento empresarial falido for arrematado de forma judicial, ou nos casos de aquisição de filial ou unidade produtiva isolada em processo de recuperação judicial, o arrematante não será responsabilizado pelos créditos tributários constituídos anteriormente à aquisição. Assim, há maiores chances de garantir a satisfação da empresa, e consequentemente, a geração de riquezas, tributos, empregos e maior desenvolvimento econômico e social.
Portanto, conforme a legislação brasileira, as responsabilidades tributárias em decorrência de alienação de estabelecimento falido podem ocorrer nos casos em que a aquisição do estabelecimento suceder por meio de trespasse, isto é, quando resultar de venda direta. Já nos casos de aquisição de estabelecimento sob a forma de alienação judicial, o adquirente não irá responder por créditos tributários anteriores à alienação, ou seja, o adquirente somente responderá por créditos posteriores a alienação do estabelecimento falido.
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