RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Prosseguimento das execuções fiscais. Novas regras quanto aos débitos tributários
Rénan Kfuri Lopes
1. Prosseguimento das execuções fiscais.
Com base nas inovações da nova Lei de Falências [Lei 14.112/2020], a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu desafetar um processo que seria julgado sob o rito dos recursos repetitivos para firmar tese sobre a possibilidade de, em sede de execução fiscal, praticar atos constritivos contra empresas em recuperação judicial.
A matéria foi afetada como Tema 987 em 2018, com determinação de suspensão da tramitação de todos os casos que tenham a mesma discussão. Com a desafetação, a Fazenda Nacional recebe sinal verde da corte para dar seguimento às ações de cobrança contra empresas em recuperação judicial que devem tributos, estimado em 170 bilhões de reais.
A nova legislação estabelece que as execuções fiscais não são suspensas pelo simples fato de haver o deferimento da recuperação judicial. Assim, é possível a adoção de atos de constrição patrimonial em face da empresa em recuperação judicial.
A norma ainda delega ao juízo da recuperação o poder de determinar a substituição dos atos de constrição que recaiam sobre bens de capitais essenciais à manutenção da atividade empresarial até o encerramento da recuperação judicial. Mas diz que isso deverá ocorrer “mediante a cooperação jurisdicional” com o juízo da execução.
Por isso, entendeu o ministro Mauro Campbell, não se mostra adequado o pronunciamento da 1ª Seção, já que o recurso especial foi interposto nos autos de execução fiscal sem o prévio pronunciamento do juízo da recuperação judicial: “Constatado que não há tal pronunciamento, impõe-se a devolução dos autos ao juízo da execução fiscal para que adote as providências cabíveis. Isso deve ocorrer inclusive em relação aos feitos que hoje encontram-se sobrestados em razão da afetação do Tema 987”, disse o relator. Com isso, propôs o cancelamento do tema [Resp 1.694.261].
2. Novas regras quanto aos débitos tributários
A Lei 14.112/2020 vigente desde 23.01.21 reformulou a Lei de Recuperação Judicial e Falência [Lei 11.101/2005], sobremaneira em relação aos débitos tributários das empresas recuperandas; criou novos instrumentos para resolução do passivo fiscal.
O parcelamento de todos os débitos existentes e os débitos existentes, ainda que não vencidos até a data do pedido de recuperação judicial, de natureza tributária ou não tributária, que podem ou não estar inscritos em dívida ativa com a Fazenda Nacional em até 120 prestações mensais, alteração insculpida no art.10-A da Lei 10.522/2002 [o prazo anterior era de 84 meses].
Agora é possível a liquidação de até 30{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} da dívida consolidada no parcelamento com a utilização de créditos decorrentes do prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido [CSLL], ou com outros créditos próprios relativos a tributos administrados pela Receita Federal. Contudo, nessa hipótese, o saldo remanescente da dívida só poderá ser parcelado em no máximo 84 parcelas [art.10-A, inciso VI da Lei 10.522/2002].
Para imprimir o parcelamento será celebrado um termo de compromisso dentro das premissas elencadas no §2º-A do artigo 10-A Lei 10.522/2002, a saber:
a) O fornecimento à Receita Federal e à Procuradora-Geral da Fazenda Nacional de todas as informações bancárias, inclusive aplicações, e eventual comprometimento de recebíveis e demais ativos futuros;
b) A obrigação de amortizar o saldo devedor do parcelamento, com percentual do produto de cada alienação de bens e direitos integrantes do ativo não circulante realizado durante o período de vigência do plano de recuperação judicial, observado o limite máximo de 30{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} do produto da alienação;
c) Manter a regularidade fiscal e o pagamento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço [FGTS];
d) O oferecimento de garantia idônea e suficiente, aceita pela Fazenda Nacional em juízo, ficando consignado que essa garantia não poderá ser incluída no plano de recuperação judicial, sendo permitida sua execução, inclusive por meio de expropriação, em caso de descumprimento do parcelamento.
E o art.10-B da Lei 10.522/2002 passou a autorizar o parcelamento de tributos retidos na fonte [“apropriação”] e também do Imposto Sobre Operações Financeiras [IOF] já existentes, podendo ser parcelados os débitos inscritos ou não em dívida ativa em 24 parcelas mensais [não havia previsão deste parcelamento].
A transação de créditos inscritos [inclusive os créditos das autarquias e fundações públicas federais–art.10-C da Lei 10.522/2002] é possível na recuperação judicial que teve deferido seu processamento, com o parcelamento em 120 prestações mensais, permitindo estender por mais 12 meses, quando comprovado que o devedor em recuperação judicial desenvolve projetos sociais [§1º do artigo 10-C da Lei 10.522/2002]. Todavia, importante avivar, que a proposta de transação será submetida ao poder discricionário da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional [PGFN], vez que haverão de obedecer algumas regras da matéria e da própria Administração Pública, v.g., motivação, interesse público, isonomia, capacidade contributiva, transparência, moralidade, livre concorrência, preservação da atividade empresarial, a razoável duração do processo e a eficiência [inciso III do art. 10-C].
Vale acrescentar que o art. 6º-B da Lei 11.101 permite que o prejuízo fiscal possa ser integralmente [não mais apenas 30{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6}] utilizado para o pagamento sobre o ganho de capital resultante da alienação judicial de bens e direitos da empresa em recuperação judicial.
Esses são os recentes e importantes passos da legislação tributária aplicada aos processos de recuperação judicial.