RECUPERAÇÃO JUDICIAL – ÓRGÃOS – ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES E COMITÊ DE CREDORES
Daniel Carnio Costa
A recuperação judicial de empresas é uma ferramenta criada pelo sistema legal de insolvência empresarial brasileiro que tem por objetivo permitir a superação da crise da empresa através da criação de ambiente favorável à negociação equilibrada entre a devedora e seus credores, de modo que se possa encontrar uma solução de mercado para superação da crise e que possa ser aceita pela maioria dos envolvidos no processo recuperacional.
O processo é, portanto, estruturado de forma a viabilizar a representação dos principais interessados na superação da crise: devedora e credores.
Tendo em vista o bom funcionamento do processo e a garantia de atingimento de suas finalidades maiores, a lei criou órgãos de fiscalização e de deliberação no processo recuperacional.
Os órgãos de fiscalização do processo de recuperação judicial são: o comitê de credores e o Ministério Público. O órgão de deliberação é a Assembleia Geral de Credores.
Evidentemente, o juiz e o administrador judicial também têm funções fiscalizadoras da conduta das partes no processo de recuperação judicial, dentre várias outras funções decisórias e de condução do processo.
O Ministério Público, além da função fiscalizadora, também exerce sua função institucional de persecução penal, no que tange à prática de crimes falimentares.
O Comitê de Credores, por sua vez, exerce função predominantemente fiscalizadora no interesse de todos os credores sujeitos ao processo recuperacional. Entretanto, também exerce funções consultivas e de gestão.
A Assembleia Geral de Credores é o órgão de deliberação no processo recuperacional, cujas atribuições estão expressa e detalhadamente previstas em lei.
Vale destacar que todos esses órgãos existem e exercem funções não somente no processo de recuperação judicial, mas também no processo falimentar, conforme será explicado abaixo.
1. Assembleia geral de credores
A assembleia geral de credores é órgão deliberativo, formado pelos credores sujeitos ao processo concursal e de formação obrigatória na recuperação judicial, salvo no caso de micros e pequenas empresas, mas de formação facultativa na falência.
Conforme Alberto Camiña Moreira, é órgão de deliberação e expressão da vontade dos credores, considerando que o problema da crise da empresa é um problema que envolve a relação débito-crédito de modo coletivo: daí o necessário envolvimento dos interessados.
Segundo Fábio Ulhoa Coelho, a tarefa de interpretar a vontade da comunhão de interesses dos credores é exercida normalmente pelo juiz no momento em que, por exemplo, decide sobre a venda de ativos, e pelo administrador judicial, quando, por exemplo, realiza a cobrança de créditos da massa falida ou apresenta um plano alternativo de recuperação judicial. Entretanto, em algumas hipóteses a lei confere aos próprios credores a prerrogativa de expressar suas vontades. São os casos legais de convocação da Assembleia Geral de Credores.
Conforme dispõe o art. 35 da Lei 11.101/2005, a Assembleia Geral de Credores tem funções específicas e diversas na recuperação judicial e na falência.
1.1. Atribuições da assembleia geral de credores na Recuperação Judicial
Na recuperação judicial, caberá à Assembleia Geral de Credores a deliberação sobre:
(a) aprovação, rejeição ou modificação do plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor. Essa é a principal função da AGC na recuperação judicial. Haverá necessidade de convocação da AGC se, apresentado o plano de recuperação judicial pela devedora, existir objeção apresentada por qualquer credor, nos termos do que dispõe o art. 56 da Lei 11.101/2005. Inexistindo objeção, o plano se considera aprovado independentemente de deliberação dos credores em AGC. Vale destacar que não há previsão de AGC nos procedimentos especiais de recuperação de micro e pequenas empresas. Nos procedimentos de recuperação judicial de médias e grandes empresas a AGC é o seu ponto central, na medida em que o plano apresentado pela devedora, deverá ser discutido e deliberado pelos credores reunidos em Assembleia. Caso aprovado o plano, com observação do quórum legal, o juiz poderá conceder a recuperação judicial à devedora, passando-se à fase de fiscalização de seu cumprimento. Caso rejeitado o plano, convola-se a recuperação judicial em falência. Há, ainda, a possibilidade de alteração do plano, como resultado das discussões havidas em assembleia e visando a sua aprovação pelos credores. Deve-se observar, entretanto, que os credores não podem impor modificações ao plano, de modo que se a devedora não concordar com as alterações propostas, deve-se votar o plano original apresentado pela devedora, cabendo aos credores, se o caso, rejeita-lo.
(b) a constituição do comitê de credores, a escolha de seus membros e sua substituição. O comitê de credores, cujas funções serão estudadas oportunamente, é formado a partir da vontade dos credores que, reunidos em AGC, decidem pela sua formação e composição. Trata-se de órgão de rara constituição no processo de recuperação judicial, tendo em vista que seus membros estão sujeitos à responsabilidades e não possuem remuneração.
(c) o pedido de desistência do devedor, nos termos do § 4º do art. 52 da Lei 11.101/2005. O devedor poderá pedir a desistência da ação de recuperação judicial. Se o pedido de desistência foi feito antes da decisão judicial que defere o processamento do pedido, poderá o juiz homologa-lo independentemente da vontade dos credores. Entretanto, se o processo já teve início, com a decisão de processamento do pedido, a desistência deixa de ser ato unilateral da devedora. Caberá à AGC decidir sobre o pedido de desistência da ação. Caso o pedido não seja homologado, o processo de recuperação deve seguir seus termos com a apresentação e votação do plano de recuperação judicial.
(d) o nome do gestor judicial, quando do afastamento do devedor. Normalmente, o devedor continua na gestão de seus negócios, ou seja, não existirá, como regra, a interferência do Poder Judiciário na gestão da empresa em recuperação judicial. Entretanto, estando presentes as hipóteses previstas no art. 64 da Lei 11.101/2005 (prática de atos ilícitos e prejudiciais aos credores), o gestor poderá ser substituído por decisão judicial. E caberá aos credores, em AGC, deliberar sobre quem será nomeado gestor judicial da empresa.
(e) qualquer outra matéria que possa afetar os interesses dos credores. Além das hipóteses elencadas expressamente em lei, poderá o juiz convocar a AGC para deliberação de qualquer outra matéria que seja de interesse dos credores na recuperação judicial. Nesse sentido, poderá haver deliberação da AGC sobre a necessidade de venda de uma UPI e/ou análise de propostas oferecidas pelos interessados na aquisição da UPI. Há também a possibilidade dos credores deliberaram pela suspensão da AGC e continuação dos trabalhos para data futura, em razão da necessidade de maior negociação. Também é possível que os credores deliberem em AGC sobre a modificação de um plano já previamente aprovado em AGC anterior. A jurisprudência dos Tribunais vem aceitando o aditamento do plano com aprovação da AGC.
Por fim, vale mencionar que o Congresso Nacional vetou dispositivo que concedia à AGC o poder de votar a substituição do administrador judicial e a indicação do nome do seu substituto. Isso porque, pretendeu-se deixar ao exclusivo critério do juiz a escolha do administrador judicial, reforçando o poder do juiz na condução do processo recuperacional.
1.2. Atribuições da assembleia geral de credores na falência
No processo de falência ou de liquidação, a AGC também tem funções específicas e distintas daquelas exercitadas durante o processo de recuperação judicial de empresas, conforme dispõe o art. 35 da Lei 11.101/2005.
Nesse sentido, na falência a Assembleia Geral de Credores terá a atribuição de deliberar sobre os seguintes temas:
(a) a constituição do Comitê de Credores, a escolha de seus membros e a sua substituição. Assim como no processo de recuperação judicial, também será possível a constituição do Comitê de Credores na falência, onde exercerá suas funções deliberativas e fiscalizatórias. Na prática, sua constituição não se mostra muito frequente, visto que se trata de uma fiscalização adicional ao processo, além daquela que já é feita pelo administrador judicial nomeado pelo juiz. Ademais, os membros do Comitê de Credores não possuem remuneração e estão sujeitos a responsabilidades.
(b) a adoção de outras modalidades de realização do ativo, na forma do art. 145 da Lei 11.101/2005. Em regra, na falência deverão ser empregados os meios típicos de venda de ativos, que são aqueles previstos no art. 142 da Lei 11.101/2005, ou seja, leilão, propostas ou pregão. Entretanto, considerando as especificidades do caso concreto, é possível a adoção de qualquer outra forma de venda, desde que aprovada em AGC pelos credores por maioria qualificada de 2/3 dos créditos presentes à AGC, nos termos do que dispõe o art. 46 da Lei 1.101/2005. De toda forma, ainda que a forma de venda alternativa não seja aprovada pela AGC, caberá ao juiz decidir sobre esse tema, levando em consideração os pareceres do administrador judicial e do comitê de credores, se houver. A própria lei cita, como forma alternativa de alienação do ativo, a constituição de sociedades de credores ou de empregados da devedora, com ou sem participação de terceiros e/ou dos atuais sócios. Além disso, na prática se afigura comum a possibilidade de venda direta de ativos peculiares, que interessam especificamente a um agente do mercado. Nesses casos, deverá haver a concordância dos credores reunidos em AGC.
(c) qualquer outra matéria de interesse dos credores na falência. Da mesma forma que ocorre nas recuperações judiciais, conforme já visto, também na falência os credores poderão deliberar em AGC qualquer outra matéria que seja de seu interesse. Cita-se como exemplos frequentes desse tipo de deliberação em casos de falência, a conveniência de alienação de ativos por valores muito inferiores ao da avaliação, a doação de ativos e a deliberação sobre proposta de pagamento parcial com encerramento da falência.
Por fim, destaca-se que também em relação à falência, foi vetado dispositivo que concedida à AGC o poder de votar a substituição do administrador judicial e a indicação de seu substituto. Dessa forma, o legislador pretendeu deixar essa questão ao critério exclusivo do juiz, reforçando seus poderes de condução do processo.
1.3. Convocação da assembleia geral de credores
O art. 36 da Lei 11.101/2005 regula, em detalhes, como deverá ser feita a convocação da AGC.
Conforme Ana Cristina Baptista Campi e Fabrício Passos Magro, “para que a assembleia geral de credores seja convocada, é necessário que sejam atendidos alguns requisitos previstos na Lei 11.101/2005 sem os quais não haverá possibilidade de se convocar o conclave, convocação esta que sempre será efetuada pelo juiz-presidente do processo”.
A assembleia geral de credores deverá ser convocada pelo juiz por edital publicado no órgão oficial e em jornais de grande circulação nas localidades da sede e filiais, com antecedência mínima de 15 dias.
O juiz pode convocar a AGC nas hipóteses legais ou sempre que entender que a convocação dos credores possa lhes ser útil.
Além do juiz, também os credores que representem mais de 25{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} dos créditos em uma determinada classe podem convocar a realização da AGC.
A publicação do edital na imprensa oficial e em jornais de grande circulação nos locais onde estão a sede e as filiais da devedora tem por objetivo garantir que todos os interessados tenham efetiva ciência da realização da AGC e possam, dessa forma, comparecer e participar das deliberações. Para reforçar essa comunicação, cópias do aviso de convocação também devem ser afixados na sede e nas filiais da devedora.
Considerando a finalidade dessa norma, a jurisprudência tem determinado que a convocação da AGC também seja publicada no site de internet da empresa devedora e/ou do administrador judicial nomeado para o caso.
Quanto maior for a divulgação do conclave, maior será a participação dos credores na AGC.
A antecedência mínima deve ser observada como garantia de que os credores não sejam surpreendidos com a convocação às vésperas do ato, o que acabaria por impossibilitar a sua participação efetiva na AGC.
Os editais devem conter:
I – local, data e hora da assembleia em 1ª (primeira) e em 2ª (segunda) convocação, não podendo esta ser realizada menos de 5 (cinco) dias depois da 1a (primeira);
II – a ordem do dia; e
III – local onde os credores poderão, se for o caso, obter cópia do plano de recuperação judicial a ser submetido à deliberação da assembleia.
Tratando-se de recuperação judicial, é a própria devedora quem deve arcar com as despesas de convocação e realização da AGC. Tratando-se de falência, é a própria massa falida quem deve arcar com essas despesas. Entretanto, em qualquer caso, se a AGC for convocada pelos credores, são eles que deverão arcar com os custos de convocação e realização da AGC.
1.4. Instalação e funcionamento da assembleia geral de credores
O art. 37 da Lei 11.101/2005 regula a instalação e o funcionamento da AGC.
A AGC será presidida pelo Administrador Judicial, que designará um dos credores presentes para ser o secretário. Deve-se reforçar que não é o juiz quem preside a AGC, seja porque a lei determinar que o ato seja presidido pelo administrador judicial, seja porque isso seria de todo inconveniente, já que caberá ao juiz julgar eventuais impugnações de fatos ocorridos durante a AGC.
Nas AGC em que o objeto de deliberação seja o afastamento do administrador judicial, ou em outras em que haja incompatibilidade deste, a assembleia será presidida pelo credor presente que seja titular do maior crédito.
A AGC é sempre convocada para ser realizada em 1ª e 2ª convocação. Haverá efetiva instalação da assembleia em 1ª convocação quando comparecerem ao ato os credores titulares de mais da metade dos créditos de cada uma das classes de credores. Não sendo atingido esse quórum, a assembleia será instalada em 2ª convocação com a presença de qualquer número de credores.
Os credores deverão assinar a lista de presença até o momento da instalação da AGC, sob pena de não poderem participar do ato. Vale dizer, somente participará da AGC o credor que tiver assinado a lista antes da instalação do ato.
É possível que, caso não seja instalada a AGC em 1ª convocação por falta de quórum, os credores presentes aproveitem a ocasião para fazerem uma reunião informal a fim de debater assuntos de seus interesses, registrando em ata suas conclusões ou pretensões. A isso se dá o nome de Reunião de Credores. Tal documento, que não está previsto em lei, mas vem sendo aceito pela jurisprudência dos Tribunais, poderá auxiliar a composição dos interesses dos credores. Entretanto, a reunião de credores (e a respectiva ata) não tem força de AGC.
1.5. O exercício do direito de voto do credor na assembleia geral de credores
O credor poderá vota em AGC pessoalmente ou por mandatário.
Tratando-se de credor pessoa física e que pretenda votar pessoalmente, deverá estar munido dos seus documentos pessoais, como RG e CPF. Admite-se qualquer outro documento que comprove inequivocamente a identidade do credor que pretende exercer o direito de voto, como passaporte, certidão de casamento, certidão de nascimento etc.
Tratando-se de credor pessoa jurídica, deverá apresentar no ato da AGC seus atos constitutivos e outros documentos que comprovem que possui poderes de representação da pessoa jurídica (diretor ou administrador da empresa).
Mas também é possível, como já afirmado, que o credor exercite o direito de voto em AGC por meio de mandatário ou procurador. Nesse caso, o procurador/mandatário do credor deverá cientificar o administrador judicial com 24 horas de antecedência em relação ao início da AGC em 1ª convocação. A cientificação deverá ser acompanhada da procuração ou da indicação das folhas dos autos em que se encontra a procuração. Essas providências são necessárias para que o administrador judicial tenha a possibilidade de verificar a regularidade da representação dos credores, zelando pelo correto exercício do direito de voto em AGC.
Considerando a finalidade da norma, existem decisões judiciais que relativizam a antecedência legal e aceitam a apresentação da procuração em prazo menor, autorizando a participação do credor por seu mandatário na AGC, desde que não haja dúvida quanto à regularidade da representação.
No caso de haver suspensão da AGC por decisão dos credores e redesignação para continuação em data futura, discute-se dois pontos: se o credor não presente no início da AGC original poderia participar da AGC em continuação; e se o procurador do credor deveria entregar a procuração com 24 horas de antecedência em relação à 1a convocação ou poderia apresenta-la depois, por ocasião da AGC em continuação.
Na prática, considerando que o objetivo da recuperação judicial é garantir a maior participação possível dos credores, deve-se autorizar a participação de credores retardatários, desde que tal participação não cause tumulto processual.
Isso porque, a participação de credor retardatário poderá, conforme o caso, desequilibrar as negociações já feitas entre a devedora e os credores tempestivos, causando tumulto processual e prejudicando os objetivos do processo de recuperação judicial que também tem como princípio da criação de ambiente adequado à negociação equilibrada entre devedora e credores.
Em relação à apresentação da procuração, deve-se aceitar sua apresentação fora do prazo, em AGC redesignadas, desde que não haja dúvida quanto a regularidade da representação do credor.
Por fim, o credor trabalhista e de acidente de trabalho, além de poder ser representado por procurador específico, também poderá ser representado pelo sindicato da sua categoria profissional.
Todavia, nesse caso, o sindicato deverá apresentar relação de credores trabalhistas que serão por ele representados com 10 dias de antecedência em relação à AGC.
Caso o credor conste em mais de uma lista apresentada por sindicatos distintos, deverá comunicar ao administrador judicial com 24 horas de antecedência qual será o seu representante, sob pena de não poder ser representado por qualquer deles.
Evidentemente, caso o credor trabalhista esteja presente na AGC, pessoalmente ou por procurador específico, o sindicato não poderá representa-lo no exercício do direito de voto. Vale dizer, o sindicato somente poderá representar o credor associado que não estiver presente na AGC.
Comitê de Credores
O Comitê de Credores é órgão deliberativo, de formação facultativa, composto por representantes das classes de credores e com função predominantemente fiscalizadora, mas também consultiva (como, por exemplo, impugnação de crédito, pedido de restituição, alienação extraordinária de ativos etc.) e de gestão no caso de afastamento da administração da sociedade em recuperação judicial.
Conforme Afonso Henrique Alves Braga, “a nova lei de falências trouxe como mais uma de suas inovações, a previsão legal da possibilidade de instituição do comitê de credores com função fundamentalmente administrativa. Como se nota, sua instituição é facultativa pelos credores e, em caso de sua inexistência, caberá ao administrador judicial exercer suas funções legalmente estipuladas e, no caso de impedimento deste, suas funções serão exercidas pelo juiz. Essa preocupação do legislador quando da elaboração da nova lei de falências se deu, pois, pelas normas legais anteriormente vigentes, os credores tinham pouca ou quase nenhuma insurgência nos rumos do processo falimentar, já que a assembleia só era prevista para o caso de deliberação acerca do pagamento do ativo, como previsto nos arts. 122 e 123 do Decreto-lei 7.661/1945”.
2.1. Constituição e composição do comitê de credores
O art. 26 da Lei 11.101/2005 trata da constituição e da composição do Comitê de Credores, estabelecendo que esse órgão será constituído por deliberação de qualquer das classes de credores na assembleia-geral e terá a seguinte composição:
1 (um) representante indicado pela classe de credores trabalhistas, com 2 (dois) suplentes;
1 (um) representante indicado pela classe de credores com direitos reais de garantia ou privilégios especiais, com 2 (dois) suplentes;
III. 1 (um) representante indicado pela classe de credores quirografários e com privilégios gerais, com 2 (dois) suplentes.
1 (um) representante indicado pela classe de credores representantes de microempresas e empresas de pequeno porte, com 2 (dois) suplentes.
Caso não haja a indicação de representantes por alguma das classes, ainda assim o Comitê de Credores poderá ser constituído e funcionará com número inferior ao previsto pelo art. 26.
Os credores, que representem a maioria dos créditos de sua respectiva classe, poderão requerer ao juiz que seja feita a nomeação de representante e suplentes de classe ainda não representada no Comitê, bem como a substituição do respectivo representante ou de seus suplentes. Tal indicação independe de realização de assembleia.
O Comitê de Credores deve ter um presidente, que será indicado por seus próprios membros.
2.2. Atribuições do comitê de credores
O art. 27 da Lei 11.101/2005 trata das atribuições do Comitê de Credores na recuperação judicial e na falência.
Existem atribuições comuns na recuperação judicial e na falência. Vale dizer, tanto na falência quanto na recuperação judicial, o Comitê desempenha atividades idênticas. Entretanto, também há funções e atividades a serem desempenhadas pelo Comitê especificamente na recuperação judicial.
São atribuições comuns do comitê de credores, tanto na recuperação judicial, como na falência:
(a) fiscalizar as atividades e examinar as contas do administrador judicial;
(b) zelar pelo bom andamento do processo e pelo cumprimento da lei;
(c) comunicar ao juiz, caso detecte violação dos direitos ou prejuízo aos interesses dos credores;
(d) apurar e emitir parecer sobre quaisquer reclamações dos interessados;
(e) requerer ao juiz a convocação da assembleia-geral de credores; e
(f) manifestar-se nas hipóteses previstas nesta Lei.
Na falência, deve-se destacar que o Comitê de Credores deverá opinar sobre fixação de honorários dos advogados contratados pelo administrador judicial para representar a massa falida (art. 22, III, n); acordos sobre direitos e obrigações da massa falida e concessões de abatimento de dívidas (art. 22, §3º); forma de alienação de bens da massa falida (art. 142); locação ou celebração de contrato com o objetivo de produzir renda para a massa (art. 114); cumprimento de contratos que reduzem ou evitem a majoração do passivo da massa (arts. 117 e 118) e modalidade de alienação de ativos diversa das modalidades previstas no art. 142 (art. 144).
Na recuperação judicial, além das funções comuns, o Comitê de Credores também exercerá as seguintes atribuições específicas:
(a) fiscalizar a administração das atividades do devedor, apresentando, a cada 30 (trinta) dias, relatório de sua situação;
(b) fiscalizar a execução do plano de recuperação judicial; e
(c) submeter à autorização do juiz, quando ocorrer o afastamento do devedor nas hipóteses previstas nesta Lei, a alienação de bens do ativo permanente, a constituição de ônus reais e outras garantias, bem como atos de endividamento necessários à continuação da atividade empresarial durante o período que antecede a aprovação do plano de recuperação judicial.
A fim de que o Comitê possa exercer a sua atribuição de fiscalização, a Lei 11.101/2005 impõe à devedora, que permanece na condução dos negócios, o dever de prestar as informações solicitadas pelos membros do Comitê de Credores, sob pena de afastamento da gestão, conforme se observa no art. 64, V, da Lei 11.101/2005.
Na recuperação judicial, o Comitê de Credores ainda terá atribuição consultiva sobre a alienação ou oneração de bens do ativo permanente do devedor, exceto em relação aos bens previamente relacionados no plano de recuperação judicial, nos termos do que dispõe o art. 66 da Lei 11.101/2005.
Discute-se na doutrina se o Comitê de Credores teria ou não competência para elaboração de plano alternativo de recuperação judicial.
Segundo Fábio Ulhoa Coelho, “a lei não a menciona especificamente, mas deve-se admiti-la em qualquer caso. Sempre que o Comitê tiver um plano de recuperação diferente do apresentado pelo devedor, pode e deve tomar a iniciativa de submetê-lo à Assembleia Geral de Credores. Convém que indique as diferenças entre seu plano e o do requerente da recuperação judicial, bem como as vantagens que nele enxerga”.
Por outro lado, Marlon Tomazette sustenta que “tal competência não existe, na medida em que não há previsão legal nesse sentido. O projeto abarcava tal competência, que acabou não sendo incorporada ao texto definitivo da lei. Ademais, a competência para elaboração do plano de recuperação judicial é atribuída exclusivamente ao próprio devedor, permitindo-se aos credores apenas a proposição de alterações”.
Penso que seja mesmo ilegal que o Comitê de Credores tenha o poder de submeter plano de recuperação judicial alternativo à assembleia-geral de credores. Embora o Comitê de Credores, assim como qualquer outro credor tenha a possibilidade de apresentar sugestões de alteração do plano (ou mesmo um plano alternativo), tal sugestão ou plano alternativo somente será submetido à votação pela assembleia-geral de credores se houver a concordância da devedora.
Na hipótese de não existir o Comitê de Credores, caberá ao administrador judicial ou, na incompatibilidade deste, ao juiz exercer suas atribuições, conforme dispõe o art. 28 da Lei 11.101/2005.
2.3. Remuneração dos membros do comitê de credores
Nos termos expostos pelo art. 29 da Lei 11.101/2005, os membros do Comitê não terão sua remuneração custeada pelo devedor ou pela massa falida, mas as despesas realizadas para a realização de ato previsto nesta Lei, se devidamente comprovadas e com a autorização do juiz, serão ressarcidas atendendo às disponibilidades de caixa.
No sistema brasileiro, não cabe à devedora em recuperação judicial ou à massa falida custear a remuneração dos membros do Comitê de Credores. Isso porque, as funções exercidas pelo comitê podem ser exercidas pelo próprio administrador judicial, que já é remunerado pela devedora em recuperação judicial ou pela massa falida. O Comitê de Credores é órgão de formação facultativa e que se destina a realizar uma fiscalização adicional sobre o trabalho do administrador judicial e sobre a conduta da recuperanda. Assim sendo, não cabe à devedora em recuperação ou à massa falida pagar duas vezes pelo exercício das mesmas atribuições. Nesse sentido, cabem aos credores, interessados nessa fiscalização adicional, realizar o pagamento da remuneração dos integrantes do Comitê de Credores.
A Assembleia-Geral de Credores poderá deliberar sobre a remuneração dos membros do Comitê de Credores. Entretanto, tal deliberação deverá especificar o valor e quem deverá arcar com o pagamento, ficando vedado atribuir ao devedor ou à massa falida a responsabilidade por esse pagamento.
Conforme Fábio Ulhoa Coelho:
“se, por outro lado, a Assembleia dos Credores aprovar alguma remuneração aos membros do Comitê, ela deve votar o valor e quem deverá arcar com o pagamento. Quanto a esse último aspecto, proíbe a lei que a remuneração dos membros do Comitê seja paga pelo devedor em recuperação judicial ou pela massa falida. Quer dizer, os credores devem se cotizar para levantar recursos necessários ao pagamento que a Assembleia aprovou. Mesmo o credor que votou vencido é obrigado a entrar com a sua parte, a menos que o valor aprovado pela maioria não seja razoável tendo em vista a importância do passivo ou o trabalho dos membros do Comitê”.
É importante destacar que também as despesas que o Comitê de Credores tiver para exercer suas atribuições deverão ser arcadas pelos credores. Assim, por exemplo, se o Comitê pretende contratar um contador para analisar documentos financeiros-contábeis da empresa em recuperação, tal despesa não poderá ser carreada à devedora.
Nesse sentido, assim já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo:
“RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Insurgência contra decisão que indeferiu pedido formulado pelo Comitê de Credores de contratação de contador para analisar os documentos financeiros-contábeis apresentados pela recuperanda – Valor que deve ser suportado pelos próprios credores, uma vez que a elaboração do relatório previsto no art. 27, II, a, da Lei 11.101/2005, constitui atribuição própria do comitê de credores, não havendo razão para que a sociedade empresária em recuperação suporte tal encargo – Inteligência do art. 29 da Lei 11.101/2005 – Decisão mantida – Recurso Improvido”. (TJSP, Agravo de Instrumento 2156337-61.2015.8.26.0000, rel. Des. Caio Marcelo Mendes de Oliveira)
2.4. Impedimentos
Conforme dispõe o art. 30, da Lei 11.101/2005, não poderá integrar o Comitê ou exercer as funções de administrador judicial quem, nos últimos 5 (cinco) anos, no exercício do cargo de administrador judicial ou de membro do Comitê em falência ou recuperação judicial anterior, foi destituído, deixou de prestar contas dentro dos prazos legais ou teve a prestação de contas desaprovadas.
A destituição do membro do Comitê de Credores é medida punitiva para o integrante desidioso ou que tenha exercido suas atribuições de forma ilegal. Diga-se o mesmo em relação ao membro que deixa de prestar contas ou, pior, tem suas contas rejeitadas. Por isso, aquele que tenha sofrido essa punição fica impedido de integrar Comitê de Credores pelo prazo de 5 (cinco) anos.
Tendo em vista que o Comitê de Credores deve exercer atividade de fiscalização no interesse dos próprios credores, a Lei também veda que seja membro aquele que tiver relação de parentesco ou afinidade até o 3º (terceiro) grau com o devedor, seus administradores, controladores ou representantes legais ou deles for amigo, inimigo ou dependente.
Em qualquer caso, poderá o devedor, qualquer credor ou o Ministério Público requerer ao juiz a substituição dos membros do Comitê nomeados em desobediência aos preceitos da Lei 11.101/2005.
2.5. Destituição do membro do comitê de credores
Conforme dispõe o art. 31 da Lei 11.101/2005, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento fundamentado de qualquer interessado, determinar a destituição do membro do comitê de credores quando verificar ilegalidade, descumprimento de seus deveres, omissão, negligência ou prática de ato lesivo às atividades do devedor ou a terceiros.
Nesse sentido, tem-se que o pedido de destituição do membro do comitê de credores poderá ser feito pelo Ministério Público ou por qualquer interessado, inclusive a devedora. Além disso, admite-se que o juiz, mesmo de ofício, determine a destituição do membro do comitê de credores.
São causas de destituição do membro do comitê de credores a prática de ato ou omissão negligente, ilegal ou lesiva à devedora ou a terceiro.
A responsabilidade é individual, de cada membro do comitê de credores. Assim, deverá o juiz convocar o suplente do membro destituído para integrar o comitê de credores. Entretanto, caso todos os membros sejam considerados culpados, o comitê será dissolvido pelo juiz.
2.6. Responsabilidade civil dos membros do comitê de credores
Nos termos do que dispõe o art. 32 da Lei 11.101/2005, os membros do Comitê responderão pelos prejuízos causados à massa falida, ao devedor ou aos credores por dolo ou culpa, devendo o dissidente em deliberação do Comitê consignar sua discordância em ata para eximir-se da responsabilidade.
Nota-se, portanto, que se o ato praticado pelo membro do comitê de credores, que motivou a sua destituição, também causou prejuízo à devedora, à massa falida ou a terceiro, esse membro será responsável civilmente pela reparação do prejuízo.
Trata-se de responsabilidade civil aquiliana, decorrente da prática de ato ilícito por dolo ou culpa.
O membro do comitê de credores que divergir de decisão deliberada por maioria, deve consignar sua discordância para se eximir de eventual responsabilidade pelos prejuízos causados pela conduta do comitê de credores.
No caso de falência, somente a massa falida tem legitimidade para responsabilizar o membro do Comitê pelo dano, não se admitindo que credores promovam individualmente as ações de indenização contra membro do comitê.
Tratando-se de recuperação judicial, caso algum credor seja prejudicado pela atuação do comitê de credores, admite-se que atue em nome próprio e busque individualmente responsabilizar o membro do comitê, tendo em vista que inexiste o conceito de massa ou de universalidade de fato aplicável à recuperação judicial.
Conforme o art. 33 da Lei 11.101/2005, os membros do Comitê de Credores, logo que nomeados, serão intimados pessoalmente para, em 48 (quarenta e oito) horas, assinar, na sede do juízo, o termo de compromisso de bem e fielmente desempenhar o cargo e assumir todas as responsabilidades a ele inerentes.
Referências
BRAGA, Afonso Henrique Alves. Comitê de Credores. Comentários completos à lei de recuperação de empresas e falências. Daniel Carnio Costa (coord). Curitiba: Juruá, 2015. Volume 1.
CAMPI, Ana Cristina Baptista; MAGRO, Fabricio Passos. Assembleia geral de credores – convocação, instalação e funcionamento – condução dos trabalhos – aspectos práticos. Comentários completos à lei de recuperação de empresas e falências. Daniel Carnio Costa (coord). Curitiba: Juruá, 2015.
COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à lei de falências e de recuperação de empresas: direito de empresa. 11. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.
MOREIRA, Alberto Camiña. Poderes da assembleia de credores, do juiz e atividade do Ministério Público. Direito falimentar e a nova lei de falências e recuperação de empresas. Luiz Fernando Valente Paiva (coord). São Paulo: Quartier Latin, 2005.
TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial. São Paulo: Atlas, 2015.
Citação
COSTA, Daniel Carnio. Recuperação judicial – órgãos – assembleia geral de credores e comitê de credores. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Comercial. Fábio Ulhoa Coelho, Marcus Elidius Michelli de Almeida (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/213/edicao-1/recuperacao-judicial—orgaos—assembleia-geral-de-credores-e-comite-de-credores