RKL Escritório de Advocacia

QUAIS SÃO AS CONSEQUÊNCIAS DE TER UM SÓCIO CORRUPTO?

QUAIS SÃO AS CONSEQUÊNCIAS DE TER UM SÓCIO CORRUPTO?

Walfrido Jorge Warde Júnior

 

Se os réus forem Heresiarcas, ou Dogmatistas, e se constar terem disseminado erros, e feito sequazes deles, se os não confessarem, e as pessoas que com eles contaminaram, ou se confessarem, ocultando algumas das ditas pessoas, serão postos a tormento proporcionado à qualidade da Prova e dos Indícios, que contra eles houver, pelo muito que importa arrancar de entre os Fiéis tão venenosos e pestíferas raízes.”

Regimento do Santo Ofício da Inquisição dos Reinos de Portugal

Dos Tormentos, item 4, p. 55

O dicionário Aurélio explica: corrupção é um substantivo feminino, que significa decomposição, putrefação, devassidão, depravação, perversão, suborno e peita.

Aquilo que se submete à corrupção se desnatura, perde as suas propriedades originais e, portanto, inutiliza-se para os fins a que se propõe.

Não é coisa boa.

Mas quais são as consequências, diante de tamanha ignomínia, de ter um sócio corrupto?

Uma avaliação dos riscos dessa associação (com o sócio corrupto), para os consócios e para a sociedade, pressupõe a análise de três variáveis essenciais: 1. A natureza das relações societárias em questão; 2. A conduta do sócio delinquente; 3. A participação da sociedade e dos demais sócios nos atos de delinquência.

Sim, em primeiro lugar, o que se quer saber é a influência do sócio malfeitor sobre a sociedade e, portanto, em que grau essa influência sujeita a sociedade e os demais sócios. São três as possibilidades: 1. O sócio corrupto pode ser controlador; 2. Pode exercer uma influência significativa (que se presume pela titularidade de 20% ou mais do capital votante); ou 3. Pode deter participação minoritária, mais um menos qualificada, inferior ao que permite presumir uma influência significativa.

Quanto maior a influência do sócio corrupto, maior o risco de imputação de responsabilidade à sociedade, com reflexos negativos para os demais sócios.

A incidência do art. 12, III, da Lei de Improbidade (Lei n.º 8.429/1992), por exemplo, impede a sociedade sob controle do sócio ímprobo de contratar com o Poder Público. Em um regime de produção capitalista como o nosso, contratar com o Estado é tudo o que fazem algumas empresas. A pena, nesse caso, contamina a sociedade com um vírus mortal, que pode levá-la à destruição e, com isso, ao perdimento de quase todo, senão todo, o valor das participações societárias de sua emissão.

Mas o papel desempenhado pela sociedade na ordem das coisas fora da ordem, também importa.

O art. 2º da Lei de Combate à Corrupção (Lei n.º 12.846/2013) atribui responsabilidade objetiva à sociedade, toda a vez que se aproveitar de atos lesivos à administração pública nacional ou estrangeira. Isso significa que a sociedade responde, com o seu patrimônio, pela indenização e pela multa devidas ao Estado, em reparação do dano que a beneficiou.

É claro, nesse caso, que o benefício ilícito é consequência de um manejo ilegal da sociedade, pelo sócio corrupto, o que pressupõe poder de controle ou influência significativa.

O sócio minoritário se sujeitou a esse bruto fato (o poder e a influência que determinaram o ilícito), mas, ainda que nada soubesse e que não tenha compactuado com o ocorrido, vai pagar o pato, mesmo que indiretamente. A imputação de responsabilidade à sociedade certamente diminuirá a sua lucratividade, o seu valor de mercado e o valor das participações societárias de sua emissão.

Não será de admirar que, insolventes a sociedade e o seu controlador, em vista dos desdobramentos da revelação dos atos de corrupção, aos sócios minoritários seja imputada responsabilidade por dívidas da sociedade, sobretudo as de natureza trabalhista e aquelas decorrentes de relações de consumo.

A participação da sociedade (seja porque praticou o ato, seja porque dele se aproveitou) também é, como se viu, fundamental para o destino dos sócios inocentes.

Mas é necessário que os inocentes sejam inocentes.

Os arts. 328, 332 e 333 do Código Penal Brasileiro disciplinam e punem a usurpação de função pública, o tráfico de influência e a corrupção ativa. Todos esses crimes, que gravitam no entornam da ideia de corrupção, são praticados pelo particular contra a administração.

Os inocentes, se concorrerem para a sua prática, não serão inocentes, inexoravelmente.

Provada a associação dos sócios minoritários com o controlador delinquente, com a sociedade e com os seus administradores, para articular uma organização criminosa nos termos do §1º, art. 1º da Lei n.º 12.850/2013, estarão todos submetidos, então, ao mais revolucionário instrumento legislativo dedicado ao combate à corrupção.

A chamada Lei da Delação Premiada – largamente usada na Operação Lava-Jato – prove às autoridades poderosos instrumentos de obtenção de prova. Para além da quebra dos sigilos fiscal, bancário, telefônico e telemático, a verdade poderá ser descoberta por meio da infiltração de agentes, da implantação de escutas ambientais e da colaboração premiada, em meio ao fim da equidistância entre o magistrado e as partes do processo penal. Hoje, o juiz que condena é o mesmo que instrui processo (ou seja, que coleta e organiza a prova) com o acusador (o Ministério Público).

A caracterização do conluio entre sócios, não lhes reserva, portanto, apenas pobreza, mas também cadeia.

O exercício do controle para os fins da corrupção deve ser confrontado pelos demais sócios. Essa é a sua única salvação. Ainda que o confronto não os redima completamente, evitará, ao menos, a sua absoluta ruína.

Ao sinal de delinquência, o sócio minoritário deverá se mover. À sua disposição se encontram: 1. O direito de fiscalizar, mais ou menos amplo em razão da forma societária; 2. O direito de exigir, em algumas circunstâncias, a realização de auditoria e de perícia independentes e a adoção de planos de integridade, com o fim de mitigar as sanções aplicadas à sociedade; 3. A colaboração com as autoridades; e 4. A dissolução total ou parcial da sociedade (e nesse último caso para os fins de retirada ou de exclusão do sócio delinquente), observados os requisitos postos pela lei e pela jurisprudência.

A prontidão é a regra e o laxismo a raiz de todos os males.