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PROTEÇÃO LOCATÍCIA PARA OS ESTABELECIMENTOS RELIGIOSOS, DE SAÚDE E ENSINO

PROTEÇÃO LOCATÍCIA PARA OS ESTABELECIMENTOS RELIGIOSOS, DE SAÚDE E ENSINO

Bernardo José Drumond Gonçalves

 

Em tempos de aquecimento do mercado imobiliário, inclusive, no que diz respeito à intensa procura por locações comerciais, algumas peculiaridades jurídicas devem ser conhecidas pelos envolvidos, seja na qualidade de locadores, seja como locatários

Em tempos de aquecimento do mercado imobiliário, inclusive, no que diz respeito à intensa procura por locações comerciais, algumas peculiaridades jurídicas devem ser conhecidas pelos envolvidos, seja na qualidade de locadores, seja na qualidade de locatários.

Além do direito à renovação do contrato, previsto no artigo 51, da Lei do Inquilinato, algumas modalidades de locatários gozam de outras prerrogativas legais.

Preceitua o artigo 53 da Lei 8.245/1991 que:

Nas locações de imóveis utilizados por hospitais, unidades sanitárias oficiais, asilos, estabelecimentos de saúde e de ensino autorizados e fiscalizados pelo Poder Público, bem como por entidades religiosas devidamente registradas, o contrato somente poderá ser rescindido:

I – nas hipóteses do artigo 9º;

II – se o proprietário, promissário comprador ou promissário cessionário, em caráter irrevogável e imitido na posse, com título registrado, que haja quitado o preço da promessa ou que, não o tendo feito, seja autorizado pelo proprietário, pedir o imóvel para demolição, edificação, licenciada ou reforma que venha a resultar em aumento mínimo de cinquenta por cento da área útil.

Ou seja, os contratos de locação dos estabelecimentos cuja atividade desempenhada for destinada a saúde, ensino ou de cunho religioso têm garantia legal que impede sua rescisão, afastando-se, com isso a conhecida “denúncia vazia”.

Nesse particular, ao contrário da ação renovatória, que depende de uma iniciativa do locatário sujeita a prazo decadencial, a previsão do artigo 53, da Lei do Inquilinato, confere àqueles locatários especificados o impedimento do rompimento imotivado do contrato.

Confirmando a aplicação da lei, o posicionamento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO. ESTABELECIMENTO DE ENSINO AUTORIZADO E FISCALIZADO PELO PODER PÚBLICO. CARACTERIZAÇÃO. ART. 53, CAPUT, DA LEI 8.245/91. APLICABILIDADE. PRECEDENTES. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO-COMPROVADO. SÚMULA 83/STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. 1. É firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a locação de imóvel não-residencial, para localização e funcionamento de estabelecimento de ensino, ainda que o contrato tenha sido celebrado com prazo determinado, somente será passível de rescisão nas hipóteses previstas no art. 53, §§ 1º e 2º, da Lei 8.245/91. 2. Hipótese em que o Tribunal de origem, com base no conjunto probatório, entendeu que a atividade exercida pela recorrida preenche os requisitos elencados no art. 53, caput, da Lei do Inquilinato, bem como que não restaria demonstrada a existência de acordo entre as partes para desocupação do imóvel objeto da locação, nos termos do art. 9º, I, da mesma Lei. 3. Destarte, inferir os fundamentos esposados pela Turma Julgadora, quanto à natureza da atividade exercida pela recorrida no imóvel, assim como a não-existência de acordo entre as partes para rescisão da locação, demandaria o revolvimento de matéria fático-probatória, inviável em sede especial, por atrair o óbice da Súmula 7/STJ. 4. Dissídio jurisprudencial não-comprovado. Súmula 83/STJ. 5. Recurso especial não conhecido. (STJ REsp 545.196/DF Min. Rel. Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma DJ 29.5.2006)

Ademais, mesmo que o locador venha demandar judicialmente o despejo dessas excepcionais modalidades de estabelecimento, o artigo 63, §3º, da Lei nº 8.245/91, assegura que o prazo para desocupação será de “um ano, exceto no caso em que entre a citação e a sentença de primeira instância houver decorrido mais de um ano, hipótese em que o prazo será de seis meses”.

Todavia, há algumas hipóteses que a própria lei dispõe que excepcionam essa regra geral.

A primeira delas é a deliberação das partes (“por mútuo acordo”), prevista no artigo 9º, I, da Lei do Inquilinato. Nesse sentido, se as partes contratantes estipulam um prazo determinado para findar a relação contratual, nada impedirá, portanto, sua rescisão.

Outra possibilidade de encerramento do vínculo contratual firmado é a “prática de infração legal ou contratual”, bem como a “falta de pagamento do aluguel e demais encargos” (art. 9º, II e III). Exemplo dessas transgressões contratuais é o descumprimento de alguma imposição, como a contratação de seguro contra incêndio, sublocação sem consentimento, inadimplência do aluguel ou de outras obrigações, como IPTU e taxas condominiais.

Já o locador, nessas hipóteses, pode pleitear a rescisão caso venha demandar o imóvel locado para demolição, edificação ou reforma “que venha resultar em aumento mínimo de cinquenta por cento da área útil”.

Logo, é extremamente restrita a possibilidade de o locador impedir o prosseguimento do curso do contrato de locação utilizado pelos estabelecimentos de saúde, ensino ou religiosos.

A atual lei (8.245/91), com redação dada pela lei nº 9.256/96, ampliou o alcance da legislação anterior (6.239/75), que se limitava aos hospitais, unidades sanitárias oficiais, estabelecimentos de saúde e ensino. Além dos asilos, os estabelecimentos religiosos registrados também foram contemplados. Há, ainda, a necessidade de que os estabelecimentos de saúde e ensino sejam “autorizados e fiscalizados pelo Poder Público”.

Segundo SÍLVIO DE SALVO VENOSA, “A presente disposição tem um evidente sentido social, protegendo a permanência desses estabelecimentos que desempenham importante papel de assistência e educação”[1].

Nesse contexto, questiona-se o porquê do legislador não ter também acrescido as instituições filantrópicas/sem fins lucrativos no texto legal.

No entanto, ressalva o citado doutrinador que o conceito dos estabelecimentos eleitos pelo legislador é restrito, não se incluindo “cursos livres de informática, de arte, de atividade profissionalizante, […] cursinhos preparatórios e auto escolas (JTACSP 576/161)”.

Simples clínicas médicas, onde ocorre mera realização de exames e consultas, segundo a Jurisprudência atual, não podem ser consideradas como estabelecimento hospitalar para efeito da aplicação legal em comento.

Com efeito, os estabelecimentos destinados a tratamento de saúde, principalmente, os que prestem serviços com convênio ao SUS – Sistema Único de Saúde, não podem ser afastados dessa garantia legal, por estarem incluídos no objetivo social do legislador, ao complementarem o exercício da saúde pública nacional, em estado notoriamente precário.

Da mesma forma, os estabelecimentos destinados ao ensino fundamental e médio.

Ressalte-se, por fim, que, para conseguir a rescisão, o locador deverá desincumbir de cabal comprovação do “aumento mínimo de cinquenta por cento da área útil” do imóvel, sob pena de prevalecer o impedimento legal.

Quanto ao locatário, deverá adotar as devidas providências para manter o estabelecimento devidamente registrado, autorizado e fiscalizado pelo Poder Público, conforme o caso, evitando-se a perda da garantia legal que lhe é conferida.

Portanto, as condições para se firmar e manter um contrato de locação de imóvel não residencial celebrado com os estabelecimentos que a Lei atribui tratamento privilegiado deverão ser sempre bem tratadas previamente pelas partes, evitando-se prejuízos futuros.