PRINCIPAIS ASPECTOS DO RECURSO ESPECIAL
Eduardo Arruda Alvim
Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, muitos institutos foram sensivelmente redefinidos, ensejando demasiada atenção da doutrina e da jurisprudência.
Tema que nos parece dos mais relevantes é o recurso especial, de competência do Superior Tribunal de Justiça, que é o instrumento processual adequado para que referida Corte dê a última palavra em matéria de direito infraconstitucional.
Assim como o Supremo Tribunal Federal se apresenta como a Corte competente para salvaguardar a Constituição Federal, o que tem importância inquestionável, o Superior Tribunal de Justiça exerce a mesma função em relação ao direito federal, o que tende a garantir a uniformidade e a adequação da aplicação do direito. Ambas as Cortes, portanto, são fundamentais à previsibilidade do sistema normativo e, pois, à segurança jurídica.
Nesse cenário, o recurso especial será analisado nas linhas seguintes, abordando-se aqueles que parecem ser os pontos mais relevantes da matéria, frente ao CPC/2015.
Os recursos, meios endoprocessuais de combate às decisões judiciais,[1] em razão de errores in judicando ou errores in procedendo, podem ser classificados de diversas maneiras.
Dentre as possíveis classificações dos recursos, tem-se aquela que separa tais instrumentos entre os de fundamentação livre e os de fundamentação vinculada, e também entre os ordinários e os extraordinários.
São de fundamentação livre os recursos cujas hipóteses de cabimento não são taxativamente arroladas pelo ordenamento jurídico, ou seja, não se estabelece em quais hipóteses específicas será admissível a irresignação, limitando-se a lei a dizer qual modalidade de recurso é cabível contra determinada espécie de pronunciamento judicial.
Serão de fundamentação vinculada, lado outro, os recursos cujas hipóteses de cabimento sejam taxativamente previstas pela lei, caso em que não se admite a utilização do recurso fora das hipóteses especificamente previstas.
Ademais, serão ordinários aqueles recursos que possibilitarem o reexame não só da aplicação do direito, mas também da própria verdade dos fatos, revelada pelas provas produzidas.
De outro lado, serão extraordinários os recursos de estrito direito, em que se admite a discussão apenas da correta aplicação do direito, sem possibilidade de rediscussão de fatos.
O recurso especial, aqui analisado, ao lado do recurso extraordinário, dos embargos de divergência e dos embargos de declaração, configura recurso de fundamentação vinculada, ou seja, só tem cabimento nas específicas hipóteses elencadas pelo Texto Constitucional, em seu art. 105, inciso III. Desse modo, terá cabimento o recurso especial quando a decisão recorrida (a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência, (b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal e (c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.
Refira-se, a propósito, o alerta feito por Barbosa Moreira a respeito das hipóteses de cabimento dos recursos de fundamentação vinculada, dando especial atenção ao recurso extraordinário:
“Nota-se que não é homogênea a técnica empregada pelo legislador constituinte nas várias letras do art. 102, nº III. Nas letras b e c (agora, também, na letra d), ele se ateve a uma descrição axiologicamente neutra: a realização do ‘tipo’ constitucional não implica de modo necessário que o recorrente tenha razão. Uma decisão pode perfeitamente ser correta e merecer ‘confirmação’ apesar de haver declarado a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, ou julgado válida lei ou ato do governo local contestada em face de lei federal. Quer isso dizer que nas letras b, c e d se usa técnica bem adequada à fixação de pressupostos de cabimento do recurso extraordinário, isto é, de circunstâncias cuja presença importa para que dele se conheça, mas cuja relevância não ultrapassa esse nível, deixando intacta a questão de saber se ele deve ou não ser provido. Já na letra a, muito ao contrário, a descrição do texto contém um juízo de valor: a decisão que contrarie dispositivo constitucional é decisão à evidência, incorreta, e como tal, merecedora de reforma. Aí, portanto, se ficar demonstrada a realização do ‘tipo’, o recorrente não fará jus ao mero conhecimento, senão ao provimento do recurso. Para empregar técnica semelhante à das letras b, c e d, deveria o legislador constituinte ter dito na letra a: ‘quando a decisão recorrida for impugnada sob a alegação de contrariar dispositivo desta Constituição'”.[2]
Ademais, o recurso especial apresenta-se como espécie de recurso extraordinário (lato sensu), ou seja, recurso de estrito direito. Dessa forma, seu objeto não é a pura e simples correção da má aplicação do direito ao caso concreto, corrigindo eventual injustiça. Mais do que isso, presta-se o recurso especial, tal como o extraordinário, a preservar a correta aplicação do direito, a bem, propriamente, do direito objetivo.
Refira-se, a propósito, que o STJ (tal como faz o STF) diz não ter competência para conhecer dos fatos subjacentes à lide, justamente pelo fato de o recurso especial ser de estrito direito. Assim, as Súmulas 5 e 7 do STJ não admitem, respectivamente, a rediscussão de cláusulas contratuais e a revisão de fatos e provas.
Na verdade, não são propriamente “limitações”, senão que “características” do recurso especial. Como corretamente observa Teresa Arruda Alvim, representa uma distorção de perspectiva caracterizar a impossibilidade de o Superior Tribunal de Justiça reexaminar questões de ordem puramente fática como sendo uma “limitação”. Em realidade, a impossibilidade de reapreciação de questões de ordem puramente fática em sede de recurso especial decorre da própria natureza do recurso especial, tal como esta vem delineada pelo texto constitucional.[3] Trata-se de modalidade recursal por intermédio da qual se devolve ao Superior Tribunal de Justiça o exame de ofensa à legislação federal infraconstitucional por parte do acórdão recorrido, sendo, por isso mesmo, inviável cogitar-se de rediscussão, em seu bojo, de matéria fática. Trata-se, pois, de uma característica do recurso especial, tal como este foi moldado pela Carta Maior.[4]
O recurso especial, portanto, afigura-se como recurso hábil a preservar a correta aplicação do direito federal, dando, portanto, a última palavra a respeito de tal tema.
No período anterior à Constituição Federal de 1988, o Supremo Tribunal Federal congregava a competência para dar a última palavra em matéria de direito constitucional e em matéria de direito infraconstitucional, ou seja, o recurso extraordinário destinava-se a garantir a correta aplicação da Constituição e do direito federal, como um todo. A Constituição de 1969, por exemplo, previa em seu art. 119, inciso III, alínea “a” que era cabível recurso extraordinário contra a decisão que contrariasse dispositivo da Constituição ou negasse vigência a tratado ou lei federal.
A Constituição de 1988, porém, cindiu as hipóteses de cabimento de recurso extraordinário, de modo que ao Supremo destinou-se a salvaguarda da Constituição (art. 102, inciso III) e ao Superior Tribunal de Justiça, então criado, a salvaguarda do direito federal (art. 105, inciso III), criando-se, também, o recurso especial.[5]
Dessa forma, desde a sua efetiva instalação, em 1989, o STJ passou a ter competência para julgar os recursos especiais interpostos contra os acórdãos dos Tribunais de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais.
Veja-se, a propósito, que a redação do inciso III do art. 105 é relevantemente diferente da redação do inciso III do art. 102 da Constituição Federal. Diz este dispositivo que será cabível recurso extraordinário contra decisões tomadas em única ou última instância. Já o art. 105, inciso III, faz expressa referência não só à decisão de causa (caso concreto), mas também ao órgão prolator da decisão: os TJs e TRFs.
Nessa linha, tratando-se de decisão de única ou última instância, só será cabível o recurso especial se, além disso, o órgão prolator da decisão for algum dos vinte e sete Tribunais de Justiça ou algum dos cinco Tribunais Regionais Federais.
Já o recurso extraordinário poderá ser interposto independentemente do órgão prolator da decisão, bastando que se trate de causa decidida em única ou última instância.
Isso tem especial relevância quando se considera que na sistemática dos Juizados Especiais, não há recorribilidade para os TJs ou TRFs, mas para o próprio Juizado.
A título de exemplo, tem-se o art. 41 da Lei 9.099/1995, que regula os juizados especiais cíveis e criminais, em que se prevê o cabimento de recurso, comumente dito inominado, para o próprio juizado, contra a sentença.
Os chamados colégios recursais, formados por juízes de primeiro grau, não são tribunais de segundo grau, não sendo vinculados aos Tribunais de Justiça, senão em caráter meramente administrativo. Conforme iterativa jurisprudência do STF, ademais, não cabe aos tribunais de segundo grau julgar qualquer matéria que tenha sido apreciada perante os juizados especiais.[6]
Com efeito, compete aos colégios recursais o julgamento dos recursos interpostos contra as decisões dos juizados especiais. Nesse caso, os colégios recursais serão a última instância, razão pela qual se admite a interposição de recurso extraordinário. Todavia, não se tratando de TJ ou TRF, não é cabível a interposição de recurso especial.
Nesse sentido, a propósito, coloca-se a Súmula 203 do STJ: “[n]ão cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais”.[7]
Ademais, é importante destacar que o STJ caracteriza-se como um tribunal de superposição, ou seja, ocupa posição privilegiada na estrutura do Estado, gozando de importante função uniformizadora e de preservação do direito objetivo.
Há, no mundo, dois grandes modelos de tribunais de superposição: a Cour de Cassation francesa, oriunda do período revolucionário, que se alocava fora da estrutura do Poder Judiciário e tinha função de cassação, e também a Suprema Corte dos Estados Unidos, oriundo do mesmo período histórico, em decorrência da independência americana, e que influenciou sobremaneira o STF e STJ.
O que há de mais relevante entre ambos os tribunais é a função exercida por cada um.
Enquanto a Corte de Cassação francesa, ao menos originariamente, foi concebida como Corte externa ao Judiciário que controlava a validade das decisões judiciais, limitando-se a cassá-las em caso de contrariedade à Constituição, a Suprema Corte americana tem a função de rejulgar os casos submetidos à sua apreciação.
Data a influência do direito norte-americano no direito brasileiro, tem o STJ a função não só de cassar as decisões judiciais contrárias ao direito federal, mas, além disso, a função de rejulgar os casos, aplicando o direito ao caso concreto (é, aliás, o que prevê a Súmula 456 do STF e o art. 1.034 do CPC/2015).
Aponta-se na doutrina, costumeiramente, duas funções clássicas dos recursos excepcionais: a função nomofilática e a função uniformizadora.
A primeira destina-se a preservar a correta interpretação do direito objetivo, ou seja, garante-se que a mais correta decisão prevaleça. Bem destacam Teresa Arruda Alvim e Bruno Dantas, com base nas lições de Calamandrei, que:
“A aplicação correta da lei na solução de uma lide assumiria dois vetores: o primeiro vinculado ao interesse público e o segundo associado ao interesse das partes processuais. Para as partes, portanto, a correta aplicação da lei consistiria em interesse secundário, pois a qualidade de primário era atribuída o acolhimento da pretensão deduzida.
Assim, no pensar de Calamandrei, o interesse primário das partes, em ver suas pretensões acolhidas, se converteria no veículo do interesse do Estado em controlar a aplicação do direito objetivo. “Dois problemas centrais, todavia, surgem com o desenvolvimento do pensamento jurídico”.[8]
Ao lado da função nomofilática, tem-se a função uniformizadora, que, em verdade, relaciona-se à primeira função, pois se prestigia o direito objetivo por meio da uniformização da interpretação.
De qualquer forma, é importante destacar que a referida função presta-se a garantir que o direito seja interpretado da mesma maneira a todos aqueles submetidos ao direito brasileiro.
Assim, o instrumento precípuo a ensejar o exercício das funções de Corte de superposição do STJ é, justamente, o recurso especial.
Nele, assim como no recurso extraordinário, há certa transcendência do interesse daquele que recorre, haja vista o interesse público em preservar a correta aplicação do direito.
Isso, porém, não é capaz de relegar a plano meramente coadjuvante o interesse da parte, em si, justamente porque ao STF e ao STJ não compete apenas cassar as decisões contrárias ao direito, mas também rejulgar as causas, como já se disse, resolvendo o conflito havido no mundo empírico.
Feita breve análise do recurso especial e da posição ocupada pelo STJ no Judiciário brasileiro, impõe-se analisar com maior proximidade os elementos que parecem mais relevantes a respeito do tema.
2. Admissibilidade do recurso especial e seu procedimento
Qualquer julgamento pelo Poder Judiciário apresenta dois juízos. O primeiro diz respeito à adequada provocação da atuação jurisdicional do Estado, ou seja, julga-se a presença de todos os elementos necessários à apreciação do mérito. Assim, verifica-se se estão presentes as condições da ação, os pressupostos processuais e, ainda, se inexistem outros vícios que possam impedir o conhecimento do mérito.
Já o segundo diz respeito ao julgamento do mérito, propriamente dito, momento em que o Judiciário efetivamente presta a tutela jurisdicional, substituindo a vontade das partes na resolução do conflito.
No âmbito dos recursos isso não é diferente. A lei, ao estipular requisitos de admissibilidade dos recursos, fixa, em verdade, os requisitos para que se possa provocar a atividade jurisdicional. Apenas se estiverem presentes tais requisitos é que se poderá, efetivamente, julgar o mérito do recurso, mantendo a decisão recorrida ou, se o caso, reformando-a, invalidando-a ou integrando-a.
Além dos requisitos de admissibilidade genéricos dos recursos, quis a Constituinte eleger outros requisitos específicos ao recurso especial. Disso, pois, tratar-se-á em seguida.
Convém advertir, por oportuno, que a distinção entre esses juízos é de todo importante, pois identificar se a decisão limitou-se a dizer que não houve a adequada provocação da tutela jurisdicional, isto é, não foi exercido o direito de ação, sob a perspectiva processual, de maneira correta, ou o instrumento adequado para tanto (processo) não apresentou pressupostos de existência ou validade, significa concluir que não se formou a coisa julgada material (art. 502 do CPC/2015), admitindo a propositura da ação (art. 486 do CPC/2015), desde que, sendo o caso, seja sanado o vício (art. 486, § 1º, do CPC/2015).
No âmbito dos recursos, a diferença é também relevante. Assim, verificar se a decisão do órgão ad quem julgou o mérito ou limitou-se a inadmitir o recurso significa aferir se houve ou não substituição da decisão recorrida por aquela que julga o recurso.
É que o art. 1.008 do CPC/2015 prevê que a decisão do órgão ad quem que julgar o mérito do recurso substituirá a decisão recorrida, ainda que haja a manutenção da decisão recorrida, e desde que o provimento do recurso não importe na anulação do decisum com reenvio ao juízo a quo para prolação de nova decisão.
Verificada a ocorrência da substituição, poder-se-á aferir, por exemplo, a competência para julgamento de eventual ação rescisória que venha a ser proposta, afinal a Corte é competente para desconstituir a coisa julgada recaída sobre suas próprias decisões. Desse modo, se determinado recurso especial, interposto contra acórdão que julgou o mérito de determinada demanda, não é conhecido, competente para julgar eventual ação rescisória que venha a ser proposta será o próprio tribunal a quo, prolator do acórdão recorrido pela via do recurso especial.
Observe-se, apenas, que nos recursos excepcionais há um ponto de extrema importância, relativa à substituição da decisão recorrida por aquela que julga o recurso. Como se disse em linhas anteriores, a Constituição Federal não se utiliza de expressões axiologicamente neutras[9] para tratar das hipóteses de cabimento dos recursos especial e extraordinário, o que acaba por gerar certa dificuldade na identificação do conteúdo da decisão (se a decisão é de inadmissibilidade, propriamente, ou se é de mérito).
Não é incomum, então, que se inadmita recurso especial e extraordinário sob o fundamento de inexistência de violação ao direito federal ou à Constituição, respectivamente.
Frente a isso, o STF consolidou o entendimento de que a competência para julgamento da ação rescisória será daquela Corte quando, mesmo não tendo conhecido do recurso, houver sido apreciada a questão federal controvertida (a Súmula é anterior à CF/1988, razão pela qual se fala em “questão federal”, haja vista inexistir, à época, recurso especial e também o próprio STJ), entendimento que foi adotado também pelo STJ.[10] É do que trata a Súmula 249 da jurisprudência do STF: “[é] competente o Supremo Tribunal Federal para a ação rescisória, quando, embora não tendo conhecido do recurso extraordinário, ou havendo negado provimento ao agravo, tiver apreciado a questão federal controvertida”.[11]
Dessa forma, embora a decisão de inadmissibilidade de recurso especial não substitua, de regra, a decisão recorrida, tendo sido apreciada a questão federal em discussão, caberá ao STJ o julgamento de eventual ação rescisória que venha a ser proposta após o trânsito em julgado. Isso se justifica porque, conquanto rotulada a decisão como sendo de inadmissão do recurso, disso não se tratará.
Em síntese, o que a Súmula 249 do STF diz, em verdade, é que a aferição da substitutividade da decisão das Cortes Superiores, em relação às decisões recorridas, deve levar em consideração o seu conteúdo, e não apenas o rótulo que lhe é atribuído.
2.1. Requisitos de admissibilidade do Recurso Especial
2.1.1. Requisitos genéricos de admissibilidade
Como se disse anteriormente, os requisitos de admissibilidade dos recursos são elementos sem os quais não se pode reconhecer corretamente provocada a jurisdição.
Em razão disso, aponta a doutrina certa proximidade entre partes desses requisitos[12] e as condições de ação, algo com o que concordamos. A propósito, destaca Barbosa Moreira:
“Assim como a instauração do processo tem por fim levar o pedido à apreciação do órgão judicial, a interposição do recurso visa a suscitar, do mesmo ou de outro órgão, novo pronunciamento. Aqui, como ali, existe algo a cujo respeito se espera uma decisão. A analogia é patente, e não a turva a circunstância de que, no primeiro caso, a provocação se fundamenta em fato exterior e anterior ao processo, ao passo que no segundo ela tem origem já processual, encontrando sua ratio essendi no próprio ato recorrido”.[13]
Veja-se que o art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal assegura o livre acesso à Justiça, que segundo Arruda Alvim configura o mais genérico direito de ação. A despeito disso, é no plano legal que se estabelecem as condições para que seja exercida essa pretensão perante o Judiciário, cuja prestação é, justamente, a jurisdicional. Fala-se, então, no direito de ação no plano processual.[14]
Com efeito, é possível que se exerça o direito de ação sob a perspectiva constitucional, mas, a despeito disso, não haja seu exercício no plano processual, em razão de faltar legitimidade ad causam ou interesse processual à parte.[15]
Os recursos são, em tudo e por tudo, manifestação do direito de ação, que não se exerce apenas no momento do ajuizamento da ação. Ele, a bem da verdade, subsiste em todos os momentos do processo.
Tratando-se de manifestação do direito de ação, ele se submete também a condições para o seu exercício (requisitos de admissibilidade), que se relacionam, como dito acima, às condições da ação.
Dessa forma, tal como as condições da ação, os requisitos de admissibilidade recursal devem ser, necessariamente, analisados antes de se adentrar ao mérito, tratando-se de questão preliminar.
Costuma-se dividir os requisitos de admissibilidade dos recursos em intrínsecos e extrínsecos. Aqueles dizem respeito aos elementos internos à própria decisão recorrida (cabimento, legitimidade e interesse recursal), ao passo que estes dizem respeito a elementos externos à decisão (tempestividade, regularidade formal, inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer e preparo).[16]
Assim, na perspectiva dos requisitos intrínsecos, o cabimento diz respeito à previsão do recurso como meio impugnativo adequado para determinada situação (dependente da espécie de pronunciamento judicial). No caso do recurso especial, seu cabimento restringe-se às hipóteses previstas no art. 105, III, da Constituição (não se podendo esquecer das ponderações feitas por Barbosa Moreira a respeito da forma como se deve ler o dispositivo), quando a decisão impugnada for acórdão de única ou última instância proferido por TRF ou TJ.
Tem-se ainda a legitimidade recursal como requisito de admissibilidade do recurso. A teor do que dispõe o art. 996 do CPC, terá legitimidade a parte, o terceiro prejudicado e o Ministério Público, seja quando atua como parte, seja quando atua como fiscal da ordem jurídica.
Parte é quem pede a tutela jurisdicional e contra quem a tutela é pedida. Terceiro interessado, ademais, é aquele que, mesmo não sendo parte no processo, acaba por ter sua esfera de direitos atingida pela decisão recorrida.
Nesse caso, somente poderá falar-se em legitimidade do terceiro (aquele que não participa do processo, quer por nunca ter sido integrado à demanda, quer por ter sido excluído) se ele for atingido juridicamente pela decisão, pois o atingimento apenas fático não autoriza a interposição de recurso.
Será terceiro interessado, pois, aquele que poderia ter sido assistente simples, litisconsorcial ou litisconsorte necessário.[17]
Note-se que o dispositivo acima mencionado (art. 996 do CPC/2015) faz referência à parte vencida e ao terceiro interessado. Isso revela, sabidamente, outro requisito de admissibilidade dos recursos, que é o interesse recursal, ou seja, não basta que o recorrente seja parte no processo, mas que, além disso, tenha sofrido prejuízo pela decisão proferida no processo, pois do contrário não haveria interesse processual na sua insurgência (o recurso não lhe traria qualquer benefício prático maior).
Isso não significa, é evidente, que a parte deva ser impedida de recorrer apenas em razão de não ter sucumbido formalmente. É preciso que se analise a sucumbência sob a ótica material, afinal o recurso deve buscar uma vantagem prática maior ao recorrente, se comparada àquela proporcionada pela decisão recorrida.
Basta que se pense na hipótese de ter havido cumulação eventual de pedidos (art. 326 do CPC/2015). Havendo a procedência apenas do pedido subsidiário, não haverá sucumbência, sob a perspectiva formal, mas certamente o desacolhimento do pedido principal importa em sucumbência material da parte, razão pela qual o autor, ainda assim, poderá interpor recurso.
Faltará interesse recursal, ademais, quando o recorrente deixar de impugnar todos os fundamentos da decisão recorrida. Significa isso dizer que se a decisão recorrida contiver mais de um fundamento, todos eles deverão ser impugnados, sob pena de não se reconhecer presente o interesse recursal. Esse é, aliás, o entendimento expresso na Súmula 283 do STF (“É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles”), aplicável também ao recurso especial; e, é essa mesma ratio essendi que permeia a Súmula 126, do STJ: “[é] inadmissível recurso especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário”. Nessa hipótese, o recurso interposto seria inútil, ante a manutenção da higidez de decisão recorrida pela falta de recurso impugnando algum dos fundamentos. É importante referir, apenas, que este entendimento tem aplicação apenas em relação aos fundamentos suficientes da decisão recorrida, isto é, refere-se apenas àqueles que são capazes de sozinhos, manter a higidez da decisão recorrida.
Adentrando aos requisitos extrínsecos de admissibilidade do recurso, tem-se, primeiramente, a tempestividade.
Como se sabe, o ordenamento brasileiro alberga sistema processual preclusivo, ou seja, a lei estabelece diversas faculdades processuais, mas exige que elas sejam exercidas em certo prazo, sob pena de preclusão. Isso decorre, é certo, da necessidade de que o processo atinja o seu fim, que é, em última análise, a satisfação do interesse da parte. Assim, as faculdades processuais não podem ser exercidas no processo a qualquer tempo e em relação aos recursos isso não é diferente.
Nessa toada, o art. 1.003, § 5º, do CPC/2015 uniformizou os prazos recursais, excetuando apenas os embargos de declaração, oponíveis em 5 dias, enquanto que os demais devem ser interpostos em 15 dias. Tais prazos, ademais, contam-se apenas em dias úteis (cf. art. 219 do CPC/2015).
Desse modo, havendo a intimação da decisão pelo órgão oficial, ou por vista da parte em cartório, inicia-se o prazo de 15 dias úteis para interposição de recurso especial. Vencido o prazo, mesmo a decisão eivada de claro error in judicando ou error in procedendo não poderá mais ser alterada, ao menos dentro da mesma relação processual, pois terá a parte perdido o direito de praticar o ato (interposição de recurso). Tem-se, então, a preclusão temporal.
Importa dizer, de outro lado, que se o recurso for interposto antes da intimação da decisão, não se haverá de cogitar de extemporaneidade da manifestação, haja vista o que dispõe o art. 218, § 4º, do CPC/2015, que considera tempestivo o ato praticado antes de seu termo inicial.
Na mesma linha, também não há necessidade de ratificação de recurso especial interposto antes da decisão de embargos de declaração interpostos pela parte contrária. Sob o regime legal passado, o STJ havia editado a Súmula 418 de sua jurisprudência, assim redigida: “[é] inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação”.[18]
Porém, o art. 1.024, § 5º, do CPC/2015 prevê que se os embargos de declaração não forem acolhidos ou, ainda que o sendo, não alterarem o conteúdo da decisão, o recurso interposto antes da publicação da decisão dos embargos não necessitará de ratificação.
O que fez o CPC/2015 foi dar normatização diametralmente oposta à orientação prevalente no STJ até então.
Diante da assimetria entre a referida Súmula e a lei processual, a Corte Especial do STJ acabou por cancelar o referido enunciado, editando, ato contínuo, a Súmula 579: “[n]ão é necessário ratificar o recurso especial interposto na pendência do julgamento dos embargos de declaração, quando inalterado o resultado anterior”.
Tem-se, ainda, a regularidade formal como requisito de admissibilidade. Para cada modalidade recursal, a lei estabelece requisitos próprios, como é o caso, v.g., dos arts. 1.016 e 1.017 do CPC/2015, relativos ao agravo de instrumento.
Em relação ao recurso especial, pode-se destacar a regularidade formal no que toca aos próprios fundamentos do recurso. Não raras vezes, os recursos especiais interpostos em razão da existência de divergência jurisprudencial (art. 105, inciso III, alínea “c” da Constituição) são inadmitidos por falta de demonstração do dissenso, que deve ser realizada na forma do art. 1.029, § 1º, e art. 255, §§ 1º e 2º, do Regimento Interno do STJ, identificando-se os trechos que revelam a similitude fática entre os casos paradigma e paragonado.
A tônica comum, entre os requisitos formais das diversas várias modalidades recursais admissíveis no direito brasileiro, é a de que o recurso deverá ser interposto com as razões que levam ao inconformismo (v.g., art. 1.010, III, do CPC/15 relativamente à apelação; art. 1.016, inciso III do CPC/15 na hipótese de agravo de instrumento; art. 1.021, § 1º, do CPC/15, no caso do agravo interno; e art. 1.029, III, do CPC/15, relativamente aos recursos especial e extraordinário), expressão da consagração, em nosso sistema jurídico-positivo, do princípio da dialeticidade.[19]
Ademais, a peça de interposição do recurso deve ser assinada por advogado devidamente constituído nos autos do processo. Ainda ao tempo do CPC/1973, o STJ consolidou o entendimento de que o art. 13 do Código agora revogado não seria aplicável à instância especial, estampado na Súmula 115 do STJ: “[n]a instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos”.
Tal entendimento, todavia, não se sustenta agora, quando em vigor o CPC/2015, pois seu art. 76, § 2º, admite expressamente a correção de vícios relativos à regularidade de representação e capacidade processual no STJ (e no STF).
Mais do que isso, o art. 1.029, § 3º, admite a correção de vícios formais no STJ e no STF, desde que o recurso seja tempestivo e que o vício não seja grave. Sobre isso também trata o art. 932, parágrafo único, do CPC/2015, que atribui ao relator o dever de oportunizar a correção de vícios antes de inadmitir o recurso.
Temos para nós, pois, que os vícios formais que admitem correção, mesmo após a interposição do recurso, são aqueles que não dizem respeito ao conteúdo do recurso, propriamente. Estes, cremos, devem estar presentes desde o momento da interposição do recurso. A título de exemplo, basta pensar que o recurso que não atende ao princípio da dialeticidade não pode ser corrigido, ante a preclusão consumativa, pois os fundamentos do recurso são de sua essência. Lado outro, falto de assinatura em peça de interposição de recurso ou falta de procuração nos autos, apenas para citar exemplos, configuram, a nosso ver, vícios formais que admitem correção na instância especial.
Também na perspectiva dos requisitos extrínsecos de admissibilidade recursal, é necessário que inexista fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer.
Entre os fatos extintivos, tem-se a renúncia ao recurso ou a aquiescência à decisão. Como fatos impeditivos, por outro lado, surgem a desistência do recurso, o reconhecimento jurídico do pedido e a renúncia ao direito sobre que se funda a ação.
Extingue-se o direito de recorrer, também, quando não é realizado o depósito prévio da multa imposta em sede de julgamento de agravo interno (art. 1.021, §§ 4º e 5º), que extingue o direito de recorrer.
Por fim, tem-se no preparo o último requisito genérico de admissibilidade dos recursos. No preparo, estão incluídas não só à custa judicial, taxa judiciária paga ao Estado em razão da prestação da tutela jurisdicional, mas também o porte de remessa e retorno dos autos, tarifa “cuja apuração do valor devido é feita de conformidade com o peso dos autos a serem remetidos e revertem para o prestador desse serviço”.[20]–[21]
Na forma do art. 1.007 do CPC/2015, o preparo deve ser comprovado no ato da interposição do recurso, ficando isentos do seu recolhimento o Ministério Público, a Fazenda Pública, as autarquias e todos os outros que gozam de tal isenção, como é o caso do beneficiário da gratuidade judiciária (art. 98, §1º do CPC/2015).
Anteriormente ao CPC/2015, a jurisprudência era bastante rígida em relação recolhimento e comprovação do preparo recursal.[22] Sendo ele essencial à admissibilidade do recurso, a interposição da insurgência sem a devida comprovação do pagamento acarretava, desde logo, a inadmissão do recurso, salvo quando se demonstrasse a impossibilidade de recolhimento tempestivo (caso as instituições bancárias achassem-se em greve, por exemplo, admitia-se o recolhimento do preparo após a interposição do recurso). Na mesma linha, admitindo o recolhimento posterior dopreparo, a Súmula 484 do STJ: “[a]dmite-se que o preparo seja efetuado no primeiro dia útil subsequente, quando a interposição do recurso ocorrer após o encerramento do expediente bancário”.
O CPC/2015, todavia, alterou substancialmente essa regra, pois passou a admitir o recolhimento posterior do preparo, sem que isso prejudique, em um primeiro momento, o conhecimento do recurso. É importante frisar que o preparo não deixou de ser requisito extrínseco de admissibilidade dos recursos. O que houve, apenas, foi a “relativização” da regra da preclusão para esse caso específico, pois mesmo sendo interposto o recurso sem comprovação do recolhimento do preparo, poderá ele ser conhecido, desde que, no prazo de 5 dias, haja a sua complementação (art. 1.007, § 2º) ou o seu recolhimento em dobro (art. 1.007, § 4º).
Em síntese, a regra geral continua a ser a de que o recolhimento do preparo deverá ser comprovado no ato da interposição do recurso, mas, tratando-se de vício sanável, será concedido prazo para correção do vício. Findo o prazo sem o recolhimento do valor integral ou do valor em dobro, caso nada tenha sido recolhido anteriormente, ter-se-á por inadmissível o recurso interposto, o que se aplica, por certo, ao recurso especial.
2.1.2. Requisitos específicos de admissibilidade
Além dos requisitos genéricos de admissibilidade recursal, os recursos excepcionais ostentam ainda seus requisitos próprios.
São comuns ao recurso especial e ao recurso extraordinário a necessidade de esgotamento das vias ordinárias e o prequestionamento da matéria. O recurso extraordinário, porém, apresenta um terceiro requisito: a repercussão geral, tratada no art. 102, § 3º, da Constituição e no art. 1.035 do CPC/2015.
Os requisitos específicos dos recursos excepcionais, considerando-se aqueles que são comuns às duas modalidades acima referidas (RE e REsp), defluem do Texto Constitucional (arts. 102, III, e 105, III).
Com isso, pode-se dizer que o recurso especial deve ser interposto apenas contra a última decisão dos tribunais locais, de modo que sendo possível a interposição de outro recurso antes do REsp, deve ele ser interposto, sob pena de não se ter exaurido a instância ordinária. Bem por isso é que Rofolfo de Camargo Mancuso já alertou, de há muito, para a impossibilidade de interposição dos recursos excepcionais per saltum.[23] A propósito, esse entendimento já restou consolidado no âmbito do STF, conforme se extrai da Súmula 281 de sua jurisprudência: “[é] inadmissível o recurso extraordinário, quando couber, na Justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada”. É, afinal, o que diz claramente o caput do art. 105 da Constituição Federal, ao aludir a “causas decididas, em única ou última instância”.
Consigne-se, ademais, que é exigível, ao que nos parece, que se proceda à ampliação do julgamento perante os tribunais, na forma do art. 942 do CPC/2015. Muito embora trate o referido dispositivo de técnica de julgamento, e não de recurso, a sua aplicação ao caso concreto é de rigor, a fim de que se possa, posteriormente, fazer uso das vias recursais excepcionais.
Desse modo, se determinado recurso de apelação é provido por maioria de votos, necessariamente, como cremos, há de ocorrer a ampliação do julgamento, convocando-se mais desembargadores para tomar assento na discussão. Só então, após o voto de todos os julgadores, é que se poderá interpor recurso especial.
Na mesma linha, se determinado acórdão for omisso, deixando de apreciar um dos fundamentos da apelação, a oposição de embargos de declaração é imprescindível, a fim de viabilizar a posterior via recursal ao STJ (e ao STF) [24]–[25]
Além da necessidade de serem esgotadas as instâncias ordinárias, a Constituição exige também o prequestionamento da matéria a ser levada ao STJ.
É que o art. 105, III, da Constituição Federal prevê que será admitido o recurso especial que tratar de causas decididas.
O bem da verdade, o prequestionamento relaciona-se diretamente ao cabimento do recurso especial (e extraordinário, na forma do art. 102, inciso III da Constituição), ou seja, a Carta Constitucional, ao estabelecer as hipóteses de cabimento do recurso especial, fê-lo de modo a incluir o prequestionamento. Porém, dada à importância do tema, deve-se dar tratamento específico ao ponto.
Ademais, é importante asseverar que muito embora não se possa desconsiderar que a expressão “prequestionamento” permite variadas interpretações, adotamos no presente trabalho o entendimento de que prequestionamento é a existência de decisão do tribunal local acerca de determinada questão federal.
É preciso, portanto, que a questão levada ao STJ tenha sido decidida pelo tribunal local.
Há de se referir que a regra geral é que as questões sobre as quais o tribunal deve se pronunciar são aquelas levantadas pelas partes, afinal vige no processo civil o princípio dispositivo. Todavia, há questões que podem, por disposição legal, ser conhecidas de ofício, seja porque são matérias de ordem pública (condições da ação, v.g.), quer porque o legislador, a despeito de estar diante de questão eminentemente privada, entendeu por bem dar tratamento especial (prescrição, v.g.).[26]
Independentemente da origem da questão, o que importa ao recurso especial é ter sido ela decidida.
A propósito, deve-se dizer que se o TJ ou TRF não se pronunciou sobre questão que deveria ter apreciado, seja porque se tratava de questão cognoscível de ofício, seja porque houve provocação da parte, serão cabíveis embargos de declaração por omissão do julgado (art. 1.022, inciso II do CPC/2015). Isso, como já se disse linhas acima, a propósito do esgotamento das vias ordinárias, é imprescindível, a fim de ensejar a decisão a respeito da questão. Refira-se, inclusive, a Súmula 356 do STF, segundo a qual “[o] ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento”.
Assim, haver-se-á por prequestionada a matéria decidida, seja porque a parte assim o requereu, seja porque o tribunal utilizou-se do poder atribuído pela lei para conhecer de certas questões que, dada a previsão legal, não encontram óbice nos arts. 141 e 492 do CPC/2015, que são expressão do princípio da congruência.[27]
À luz da jurisprudência do CPC/1973, o STJ admitia o prequestionamento implícito, caracterizado pelo julgamento da questão federal controvertida, a despeito de não dizê-lo expressamente o TJ ou TRF. Diverso, contudo, era o tratamento dado ao prequestionamento ficto, caracterizado pela presunção de que houve decisão em razão da provocação da parte, ainda que a questão não tenha sido apreciada pelo tribunal local.[28]
Não se exigia, ainda, o chamado “prequestionamento numérico”, isto é, a necessidade de que a questão houvesse sido decidida com expressa menção ao dispositivo legal debatido. A propósito, Egas Moniz de Aragão, com a autoridade que lhe é peculiar, já sentenciou que “(…) se alguma questão fora julgada, mesmo que não seja mencionada a regra de lei a que está sujeita, é óbvio que se trata de matéria “questionada” e isso é o quanto basta [para que se repute presente o requisito do prequestionamento]”.[29]
Em relação ao prequestionamento, deve-se destacar a importante mudança promovida pelo CPC/2015, conforme já se adiantou linhas acima. Como dito, o art. 1.025 considera incluídos no acórdão todos os elementos levantados pelas partes, quando a decisão do tribunal for omissão, obscura, contraditória ou contiver erro material, mesmo que a Corte local não tenha reconhecido o vício.
Isso se dá porque repetidas vezes eram opostos embargos de declaração em razão, por exemplo, da omissão do acórdão. A despeito disso, os embargos não eram acolhidos, faltando decisão a respeito da questão.
Em virtude disso, era preciso interpor recurso especial por violação ao art. 535 do CPC/1973 (que tratava dos embargos de declaração), a fim de obter a anulação do acórdão, com remessa dos autos ao tribunal a quo para prolação de nova decisão, dado o error in procedendo. A propósito, diz a Súmula 211 do STJ ser “inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo”. Referida súmula trata, evidentemente, do recurso especial cujo objeto é a própria questão não apreciada pelo tribunal a quo, exigindo, portanto, recurso especial versando a nulidade do acórdão por violação à lei federal (CPC).
Com o art. 1.025 do CPC/2015, não se faz mais necessária a interposição de recurso especial com vistas à anulação da decisão, pois a lei passou a considerar incluída no acórdão local os elementos oportunamente levantados pelas partes que, todavia, não foram apreciados expressamente pela Corte.
Importa referir, porém, que a questão há de ter sido aventada em tempo e modo adequados, ou seja, os corriqueiramente chamados “embargos prequestionadores” não podem inovar no processo, isto é, introduzir elemento novo, a fim de viabilizar o acesso à via especial.
Em verdade, só são admissíveis tais embargos de declaração se, efetivamente, houver omissão, contradição, obscuridade ou erro material na decisão, que necessitem ser sanados a fim de permitir a interposição de recurso especial, isto é, a fim de ver prequestionada a matéria.
No mais das vezes, a falta de prequestionamento decorrerá da omissão do julgado na sua apreciação. Nesse caso, prestar-se-ão os embargos declaratórios a forçar o tribunal local a se manifestar sobre questão federal já suscitada, sobre a qual se tenha omitido, com vistas ao cabimento do recurso especial. Presta-se a suprir “omissão” do julgado local (art. 1.022, II, do CPC/15), e, evidentemente, omissão não haverá se o tema não foi levantado pelo interessado, não ensejando manifestação a seu respeito por parte do acórdão local.
Também de maneira correta, previu o art. 941, § 3º, do CPC/2015 que o voto vencido deve ser sempre declarado, ou seja, o julgador, ainda que vencido, deve dar as suas razões. Isso é importante para fins de prequestionamento, pois o dispositivo considera tal tratamento, ainda que não tenha recebido coro do órgão colegiado, como prequestionamento da matéria. Cremos, pois, que não mais subsiste razão à Súmula 320 do STJ, assim redigida: “[a] questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requisito do prequestionamento”.
Questão que nos parece de todo relevante, ao se tratar do prequestionamento, diz respeito ao prequestionamento das matérias cognoscíveis de ofício.
Previa o art. 267, § 3º, do CPC/1973 que as matérias tratadas nos incisos IV (condições da ação), V (pressupostos processuais negativos – perempção, litispendência e coisa julgada) e VI (pressupostos de existência e validade do processo) poderiam ser conhecidas de ofício a qualquer tempo, antes da prolação da sentença definitiva.
O art. 485, § 3º, do CPC/2015, por sua vez, prevê que nessas hipóteses (incluiu-se a intransmissibilidade da causa – inciso IX) será possível o conhecimento de ofício em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não ocorrer o trânsito em julgado.
Tal mudança reforça discussão já existente ao tempo do CPC/1973, respeitante à possibilidade de o STJ conhecer, ex officio, de questões, independentemente de prequestionamento.[30]
A despeito da posição prevalente no STJ, mormente nos últimos anos, de não admitir o chamado efeito translativo[31] do recurso especial, há setores da doutrina que entendem pela necessidade de aplicação de tal efeito também pelo STF e STJ.
É o que diz Paulo Lucon, para quem “um filtro como esse, consistente na impossibilidade de se conhecer matéria de ofício suscitada nos graus especial e extraordinário, revela-se despido de previsão no ordenamento jurídico”.[32]
Em sentido diverso, admitindo a necessidade de prequestionamento também das questões de ordem pública, pensa Nelson Luiz Pinto.[33] Também sobre o tema, diz Nelson Nery Jr. que no primeiro juízo dos recursos excepcionais não incide o efeito translativo, presente apenas no juízo de revisão.[34]
Diz este autor que há nos recursos excepcionais duplo juízo de mérito. Segundo afirma, a Constituição Federal estabelece as hipóteses de cabimento dos recursos extraordinário e especial, o que se exige para que haja a cassação da decisão recorrida. Ou seja, o primeiro juízo realizado é o de cassação da decisão, típica das Cortes Superiores. No Brasil, porém, as Cortes de vértice não se limitam ao juízo de cassação, realizando, propriamente, o rejulgamento da causa. Tanto é assim que a Súmula 456 do STF dispõe que “[o] Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à espécie”, previsão que consta, também, do art. 1.034 do CPC/2015.
Com base nisso é que Nelson Nery Jr. sustenta não existir efeito translativo no juízo de cassação do recurso especial (e extraordinário), pois sua feição é marcadamente constitucional, exigindo-se o prequestionamento da matéria.
Ressalta o autor, todavia, que uma vez conhecido o provido o recurso, cassando-se o acórdão recorrido, “os tribunais superiores passam a ter competência plena para julgar a causa aplicando o direito à espécie”.[35]
Em certa medida, Teresa Arruda Alvim e Bruno Dantas adotam o mesmo entendimento:
“Assim, o recurso pode ser admitido porque se teria constatado existir determinada ilegalidade quanto à solução que se tenha dado ao mérito da decisão impugnada, e uma vez admitido o recurso e anulada a decisão (ou seja, na fase de rejulgamento), verificar-se-ia e decretar-se-ia a falta de uma das condições da ação. O que não pode ocorrer seria o tribunal detectar esse vício ‘para’ admitir o recurso (como fundamento para admitir o recurso se não tivesse sido expressamente elencado como tal e devidamente prequestionado).”.[36]
A despeito das variadas posições a respeito do tema, ao menos um ponto há em comum entre aquelas de maior relevância: exige-se, para a incidência do efeito translativo perante o STJ, que o recurso especial tenha sido conhecido, o que se justifica porque apenas quando o recurso é admissível é que reconhece-se ter sido adequadamente provocada a atuação jurisdicional da Corte.
A diferença entre os entendimentos, pois, residirá na necessidade de cassação da decisão para, só então, conhecer-se de matéria ex officio ou se bastará o conhecimento para abrir, ato contínuo, a possibilidade de conhecimento de matérias de ofício.
Portanto, o recurso especial, além dos requisitos genéricos de admissibilidade, deve ser interposto somente após o esgotamento das vias ordinárias, além de ser imprescindível o prequestionamento, ainda que ficto na forma do art. 1.025 do CPC/2015, em virtude da exigência Constituição contida no art. 105, III, da Carta.
2.2. Hipóteses de cabimento do recurso especial
Tratou-se anteriormente dos requisitos de admissibilidade do recurso especial, dentre os quais se enquadra o cabimento (requisito intrínseco).
A esse requisito dar-se-á maior atenção neste tópico, principalmente por sua feição constitucional e originar inquestionáveis dúvidas.
As alíneas do inciso III do art. 105 da Constituição Federal preveem o cabimento de recurso especial quando a decisão recorrida (a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência, (b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal e (c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.
Tratemos, pois, de cada uma das hipóteses.
2.2.1. Violação ao direito federal
Na alínea “a” do inciso III do art. 105 da Constituição prevê-se o cabimento de recurso especial quando a decisão recorrida contrariar tratado ou lei federal ou negar-lhe vigência. Trata-se, de modo geral, da violação ao direito federal.
É importante ressaltar, desde logo, que os “tratados” a que se refere a Constituição são aqueles que passam a integrar o ordenamento jurídico brasileiro como normas infraconstitucionais. Exclui-se da competência do STJ, portanto, os tratados que versem direitos humanos e que tenham sido aprovados com quórum qualificado, na forma do art. 5º, § 3º, da Constituição.[37]
Mais do que isso, a expressão “lei federal”, além de abarcar os tratados internacionais acima referidos (a norma, pois, contém redundância, como já assinalou Arruda Alvim[38]), abarca também as leis complementares, ordinárias, delegadas, medidas provisórias, decretos e regulamentos.[39] Descabe recurso especial, de outro lado, quando a violação disser respeito a portarias, avisos, regimentos internos de tribunais ou mesmo das Casas Legislativas.
A Carta Constitucional se utiliza das expressões “contrariar” e “negar vigência”, sendo que esta, a bem da verdade, acha-se incluída no conceito daquela.
Independentemente disso, é certo que “contrariar” tratado ou lei federal significa aplicar a norma de maneira incorreta. Negar vigência, de outra banda, é simplesmente deixar de aplica-la.
Já se disse anteriormente que a Constituição não se utilizou, na alínea “a” do art. 105, III, de expressões unívocas. Daí porque a mais adequada interpretação da referida alínea é aquela que conduz à conclusão de que terá cabimento o recurso especial quando houver alegação de violação à lei federal, não se exigindo, para fins de cabimento do recurso, que haja efetiva violação à lei.[40]
Vale referir, ainda, que em certos casos a verificação do objeto da ofensa é tarefa deveras complexa. Isso porque em muitos casos a lei federal reproduz o conteúdo normativo de preceitos constitucionais, e noutros casos acaba até mesmo por reproduzir a própria letra da Constituição.
Há entendimento do STJ no sentido de que descabe recurso especial se a norma infraconstitucional limitar-se à reprodução do Texto Constitucional, caso em que será cabível recurso extraordinário.[41]–[42] No corpo do acórdão referido (STJ – RT 698/198), fez-se referência ao parecer do Ministério Público Federal, e quem se disse que “não há falar em negativa de vigência de dispositivo legal quando o preceito questionado não passa de mera reprodução de norma constitucional, que o absorve totalmente”.[43] Esta última, em princípio, a opinião que nos servimos de acompanhar.
De outro lado, há entendimento do STF no sentido de que descabe recurso extraordinário, quando a alegada ofensa ao texto constitucional demandar prévia verificação de agressão à lei federal, caso em que a ofensa à Constituição será apenas indireta. Nesse sentido, o STF já decidiu que a constatação de “aspectos meramente legais pertinentes à noção de direito adquirido” constitui ofensa indireta à Constituição e, portanto, não autoriza a interposição de recurso extraordinário.[44] Por tais razões, a propósito, é que o STF editou a Súmula 636, assim redigida: “[n]ão cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida”.
Destaque-se, por oportuno, que o CPC/2015 solucionou, em certa medida, os problemas enfrentados pela delimitação das ofensas à Constituição e à legislação infraconstitucional. É que os arts. 1.032 e 1.033 do Código determinam que se cabível fosse o recurso extraordinário e a parte interpôs recurso especial, e se o cabível fosse o especial e o interposto o extraordinário, devem as Cortes Superiores aplicar a fungibilidade entre ambos. Disso tratar-se-á novamente em linhas posteriores.
Há de se ressaltar, ademais, que de há muito o STJ deixou de aplicar o entendimento consolidado na Súmula 400 do STF, assim redigida: “[d]ecisão que deu razoável interpretação à lei ainda que não seja a melhor, não autoriza recurso extraordinário pela letra a do art. 101, III, da CF”.
Referida súmula, de início, causava inadequada confusão entre admissibilidade e mérito do recurso (extraordinário, à época de sua edição), pois dizia não ser cabível recurso extraordinário quando o fundamento da decisão recorrida fosse razoável, matéria que é inquestionavelmente meritória.
Mais do que isso, a súmula impedia a uniformização da aplicação do direito.
Não se nega que o direito admite variadas interpretações, todas possíveis, ao menos em abstrato. Contudo, deve-se ter presente, também, que a aplicação de múltiplos resultados decorrentes da atividade interpretativa acaba por violar o princípio da isonomia, pois um mesmo texto normativo não deve causar diferentes consequências no mundo empírico, quando se tratarem de situações semelhantes.
Assim, se o STJ tem a função de uniformizar o direito federal (o que fica claro também pela alínea “c” do inciso III do art. 105 da Constituição), incorreto seria obstar o acesso à Corte pelo simples fato de se ter dado, nas instâncias ordinárias, “interpretação razoável”.
Portanto, tratando-se de matéria infraconstitucional, conforme dito acima, a violação à norma jurídica permitirá a interposição de recurso especial. É de se ressaltar, por oportuno, que a efetiva ocorrência da violação constitui questão de mérito, que como tal deve ser tratada. Basta, portanto, a afirmação de violação ao direito federal, para que possa ser conhecido o recurso especial.
2.2.2. Legalidade de ato de governo local
É cabível recurso especial, também, quando o acórdão recorrido houver julgado válido ato de governo local, quando confrontado com lei federal. É do que trata o art. 105, inciso III, alínea “b”, da Constituição.
Diferentemente da previsão contida na alínea “a” do dispositivo constitucional, a hipótese de cabimento aqui prevista não deixa dúvidas de que se está diante de requisito de admissibilidade do recurso.
Portanto, se houver sido considerado válido o ato de governo local, desde logo será cabível o recurso especial.
É importante referir, ademais, que o ato de governo local não pode ser lei, pois a divergência entre leis autoriza a interposição de recurso extraordinário, conforme se extrai da alínea “d” do inciso III do art. 102 da Constituição, alterado pela Emenda Constitucional 45/2005, afinal a divisão de competências legislativas é, em última análise, matéria constitucional.
Ainda que tenha a Constituinte tipificada tal hipótese recursal em tipo diverso, fato é que a alínea “b” contém nada mais que hipótese de alegação de violação à lei federal, pois se se pretende reformar decisão que julgou válido o ato de governo local contestado em face de lei federal, é porque se pretende demonstrar, noutras palavras, que o ato de governo local violou a lei federal.
2.2.3. Divergência jurisprudencial
A terceira hipótese de cabimento de recurso especial diz respeito à existência de divergência jurisprudencial e também configura desdobramento da alínea “a” do permissivo constitucional.
Ao interpor recurso especial por divergência jurisprudencial, pretende o recorrente, em verdade, que prevaleça a interpretação dada à lei pelo acórdão paradigma, porque aquela está correta e a do acórdão recorrido, errada. Portanto, em linha de princípio, podemos afirmar que se tem cabimento o recurso especial pela alínea “c” do inciso III do art. 105 do Texto Constitucional é porque a hipótese também comporta recurso especial pela alínea “a” do inc. III do mesmo art. 105.[45]
Para que o recorrente se utilize do presente permissivo constitucional, é preciso que haja acórdão tratando de situação fática semelhante e que tenha dado interpretação diversa ao direito.
Note-se que não se admite a interposição do recurso especial para solucionar a divergência entre acórdãos de um mesmo tribunal, pois a uniformização da jurisprudência cabe ao próprio tribunal, que deve promovê-la de acordo com o que dispuser o seu regimento interno.
Nada impede, ademais, que seja interposto recurso especial com fundamento na alínea “c”, quando o acórdão recorrido houver sido proferido por TJ e o acórdão paradigma se origine de TRF, e vice-versa. Ou seja, basta que se trate de tribunais distintos, cujas decisões possam ser apreciadas pelo STJ, sendo desnecessário que a competência de um e de outro seja a mesma.
É possível, por exemplo, que uma decisão do TJ apresente divergência de interpretação em relação a acórdão do TRF. Tratando-se de situação fática semelhante, nada há que impeça a utilização do acórdão desta Corte para julgar se a decisão daquela Corte está correta.
Sobre isso, ademais, andou bem o CPC/2015 em reconhecer a possibilidade de ampla utilização da rede mundial de computadores como forma de obtenção das decisões paradigmas. Assim, prevê o art. 1.029, § 1º, que tais acórdãos poderão ser retirados de repositório oficial e também da Internet, o que se justifica apenas para garantir a veracidade do acórdão.
Caberá ao recorrente, portanto, demonstrar analiticamente a divergência jurisprudencial, comparando os acórdãos, caso em que será admissível o recurso especial.
2.3. Interposição do recurso especial
Vistos os requisitos de admissibilidade do recurso especial, é de se destacar o procedimento a ser adotado quando da sua interposição.
Uma vez interposto o recurso, que conterá a exposição do fato e do direito, a demonstração do seu cabimento e as razões para anulação ou reforma da decisão (cf. art. 1.029, caput, do CPC/2015), será a parte contrária intimada para apresentar contrarrazões (art. 1.030, caput, do CPC/2015).
Em seguida, o recurso será submetido ao primeiro juízo de admissibilidade recursal.
O art. 1.030 do CPC/2015, tal como aprovado em março de 2015, havia extinguido o sistema anteriormente vigente, em que o juízo de admissibilidade era realizado, primeiramente, no tribunal a quo. Se positivo, o recurso era remetido ao STJ, onde novamente seria apreciada a admissibilidade (não havia vinculação ao juízo realizado pelo órgão a quo). Se negativo, caberia agravo em recurso especial, que remeteria a admissibilidade do recurso especial para o conhecimento do STJ.
A mudança foi justificada pelo fato de que a inadmissão do recurso especial no tribunal de origem gerava novo recurso (agravo), o que seria contraproducente.
Contudo, ainda no período da vacatio legis do CPC/2015, foi sancionada a Lei 13.256/2016, que reinseriu no sistema processual o duplo juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais.
Na prática, portanto, o juízo de admissibilidade nunca deixou de ser exercido pelo tribunal a quo, tendo em vista que quando entrou em vigor o CPC/2015, a Lei 13.256/2016 já o alterou (ambas as leis entraram em vigor na mesma data – 18 de março de 2016).
Assim sendo, oportunizada a apresentação de contrarrazões, o tribunal a quo realizará o juízo de admissibilidade do recurso.
2.3.1. Admissão do recurso especial e remessa ao Superior Tribunal de Justiça
Estando presentes os requisitos de admissibilidade do recurso especial, determina o art. 1.030, V, do CPC/2015 que os autos sejam remetidos ao STJ.
É importante destacar que as alíneas do referido inciso elencam hipóteses em que, mesmo presentes os pressupostos de admissibilidade, não serão os autos remetidos ao STJ, o que deve ser interpretado a contrario sensu.
Desse modo, presentes os pressupostos de admissibilidade referidos anteriormente e não tendo havido afetação de recurso para julgamento na forma dos recursos repetitivos (art. 1.036 e seguintes do CPC/2015), tendo sido o recurso afetado para julgamento como causa-piloto ou não tendo havido retratação pelo próprio tribunal. Dessas hipóteses tratar-se-á em seguida.
No STJ, será realizado novo juízo de admissibilidade do recurso pelo próprio relator (art. 932, inciso III do CPC/2015). Sendo positivo, poderá ainda ser julgado o próprio mérito monocraticamente (art. 932, incisos IV e V do CPC/2015).
Caso o recurso seja submetido ao julgamento do colegiado, será realizado juízo de admissibilidade também pelos demais ministros que, sendo positivo, julgarão o mérito do recurso.
Vale destacar importante inovação do CPC/2015, que diz respeito à fungibilidade entre recurso especial e extraordinário.
Antes do advento do CPC/2015, sendo interposto recurso especial que versasse, segundo o STJ, questão constitucional, tal recurso era simplesmente inadmitido. O mesmo, ademais, ocorria no STF.
Como já se adiantou em linhas pretéritas, os arts. 1.032 e 1.033 do CPC/2015 alteraram substancialmente essa regra, pois expressamente prevê que se um recurso for interposto no lugar do outro, deverão as Cortes Superiores aplicar a fungibilidade entre eles, a fim de garantir a instrumentalidade das formas.
Assim, caso o recurso interposto seja o especial, entendendo o STJ que a questão versada é constitucional, caberá ao relator abrir prazo para que o recorrente demonstre a repercussão geral da matéria (requisito de admissibilidade específico do recurso extraordinário), remetendo-se os autos, em seguida, ao STF.
Da mesma forma, se o recurso interposto for o extraordinário, os autos serão remetidos ao STJ por determinação do relator, haja vista tratar-se de mera ofensa reflexa à Constituição.
2.3.2. Inadmissão do recurso especial
A inadmissão do recurso especial pode decorrer, em linhas gerais, de dois fundamentos.
É possível, primeiramente, que a inadmissão decorra da ausência dos requisitos de admissibilidade genéricos e específicos do recurso especial.
De outro lado, é possível que o recurso especial seja inadmitido por contrariar entendimento firmado em recurso especial repetitivo.
Como se observa de diversos dispositivos do CPC/2015 quis o legislador ordinário dar especial relevância ao direito jurisprudencial, chegando a dar força obrigatória a certos pronunciamentos, haja vista a previsão de cabimento de reclamação contra a inobservância (cf. art. 988, III, IV e § 5º, I e II, do CPC/2015).
Nessa toada, o inciso I do art. 1.030 prevê que será negado seguimento ao recurso especial quando já houver tese firmada em sentido diverso no regime dos recursos especiais repetitivos (alínea “b”).
Significa isso dizer que se o STJ já se debruçou sobre certa questão, não devem seguir à Corte recursos que tratem do mesmo tema. Há de se ressaltar, porém, que o sistema de “precedentes obrigatórios” só poderá ser efetivamente democrático se se oportunizar, efetivamente e ao menos, a mutabilidade das teses fixadas, pois do contrário restará enrijecido o direito.
2.3.2.1. Recurso contra a decisão que inadmite o recurso especial
Inadmitido o recurso, prevê o art. 1.030, § 2º, que serão cabíveis os recursos de agravo em recurso especial e agravo interno.
O primeiro, previsto no art. 1.042, será cabível quando a inadmissão do recurso decorrer, propriamente, da falta de pressupostos de admissibilidade recursal, cabendo o seu conhecimento ao próprio STJ.
Vale referir, inclusive, que não caberá ao tribunal local exercer qualquer espécie de juízo acerca do recurso, que mesmo flagrantemente intempestivo, por exemplo, deverá ser remetido ao STJ.
O segundo – agravo interno – será cabível quando o recurso especial for inadmitido por haver tese firmada em recurso especial repetitivo. Nesse caso, o recurso, previsto no art. 1.021, será conhecido pelo próprio tribunal a quo.
Assim, a depender do fundamento da decisão que inadmite o recurso especial, será cabível diferente modalidade recursal.
Isso gera importante questionamento, relativo à possibilidade de interposição de recurso após o julgamento do agravo interno interposto no próprio tribunal local, pois o CPC não dá qualquer resposta clara a esse respeito.
Diante disso, respeitáveis setores da doutrina acabaram por dar soluções diversas ao problema.
Para Nelson Nery Jr. e Georges Abboud, ao art. 1.030, § 1º, do CPC/15 deve ser emprestada interpretação conforme ao Texto Constitucional. Para os autores, a Constituição atribuiu ao STJ e ao STF a competência para julgar REsp e RE, respectivamente, o que inclui a decisão, em caráter definitivo, acerca da admissibilidade dos recursos excepcionais. Dessa forma, somente tais Cortes é que poderão julgar, em última instância, a admissibilidade dos recursos de sua competência.[46]
De outra banda, Teresa Arruda Alvim e Bruno Dantas, em relação ao não conhecimento de recurso extraordinário pelo tribunal de origem, são peremptórios em afirmar que ‘‘da decisão do agravo interno (art. 1.021) caberá, se preenchidos os demais pressupostos, recurso especial e recurso extraordinário”.[47]
Assim, a divergência doutrinária consiste em afirmar, de um lado, que após o julgamento do agravo interno será cabível agravo em recurso especial, na forma do art. 1.042 do CPC/2015, lido em conformidade com a Constituição, e de outro, que será cabível novo recurso especial ou extraordinário.
Há, portanto, inquestionável dúvida objetiva e atual, que, ao que nos parece, deve ser solucionado pela aplicação do princípio da fungibilidade entre agravo e recurso especial (ou extraordinário, se o caso).
2.3.3. Retratação no tribunal local
Também na linha da valorização da jurisprudência, previu o inciso II do art. 1.030 do CPC/2015 que se o recurso especial estiver em consonância com decisão do STJ tomada em julgamento de recurso especial repetitivo, serão os autos remetidos ao órgão prolator da decisão, a fim de que realize o juízo de retratação.
Apenas se o órgão prolator da decisão recusar-se a realizar a retratação é que os autos serão remetidos ao STJ, caso presentes os requisitos de admissibilidade, conforme prevê o art. 1.030, inciso V, alínea “c”.
Note-se, a propósito, que o dispositivo em questão parece excetuar a regra de que a atuação do órgão jurisdicional exaure-se com a prolação da decisão, que somente poderá ser reapreciada em caso de erro material ou quando do julgamento de embargos de declaração (art. 494 do CPC/2015).
2.3.4. Sobrestamento do recurso especial
É possível, ainda que o recurso especial seja sobrestado, por ter sido a questão submetida a julgamento sob o rito dos recursos repetitivos.
Caso o recurso especial tenha sido escolhido como representativo da controvérsia, serão os autos remetidos ao STJ, na forma do art. 1.030, inciso V, alínea “b”.
Do contrário, permanecerá o recurso no próprio tribunal local, aguardando a fixação da tese pelo STJ. Após isso, será a tese, a princípio, aplicada ao caso concreto.
Uma vez sobrestado o recurso, admite a lei que se requeira a exclusão do sobrestamento do recurso intempestivo, a fim de que seja ele inadmitido (art. 1.036, § 2º, do CPC/2015).
O mesmo requerimento pode ser formulado quando o sobrestamento for determinado de maneira incorreta, ou seja, quando houver distinção entre os casos-pilotos e o recurso especial sobrestado (art. 1.037, § 9º).
Nessa hipótese, prevê o art. 1.037, § 10, do CPC/2015 que o requerimento será formulado ao relator no tribunal local (inciso III) ou no tribunal superior (inciso IV), a depender do local em que estiver o recurso especial no momento do sobrestamento (se no tribunal local ou no STJ).
Em seguida, prevê o § 13, II, do mesmo dispositivo que o recurso cabível contra a decisão será o agravo interno.
Há, mais uma vez, incongruência entre dispositivos do CPC/2015, pois na forma do art. 1.030, § 2º, será cabível agravo interno diretamente contra a decisão que determinar o sobrestamento do recurso (inciso III do art. 1.030). Ou seja, a lei processual prevê, ao mesmo tempo, o cabimento de agravo interno contra a decisão que sobrestar o recurso e contra a decisão que resolver o pedido formulado ao relator para que volte à regular tramitação o recurso.
Aliás, no caso do agravo interno tratado pelo § 2º do art. 1.030, a decisão recorrida será a do presidente ou vice-presidente do tribunal local, ao passo que no caso do art. 1.037, § 10, a decisão recorrida será a do próprio relator.
A despeito da divergência, temos presente que seria mais adequado ao sistema processual que se admitisse, por primeiro, a formulação de pedido ao relator do processo, a fim de que volte a tramitar o processo, afinal é o relator que preparou a causa para julgamento, tendo pleno conhecimento a respeito da demanda, razão pela qual ele poderá, ao que nos parece, decidir com maior possibilidade de acerto se há ou não distinção entre o caso a ser julgado e o recurso sobrestado.
3. Recurso especial repetitivo
Antes mesmo do CPC/2015, já havia no direito brasileiro a figura do recurso especial repetitivo.
Com as mudanças promovidas pela Lei 11.672/2008, foi inserido o art. 543-C ao CPC/1973, que autorizava o julgamento de recursos especiais repetitivos por amostragem, isto é, quando houvesse multiplicidade de recursos sobre uma mesma questão, seriam selecionados recursos representativos da controvérsia, que seriam julgados pelo STJ e, em seguida, seriam as teses aplicadas aos demais recursos.
A grande mudança promovida pelo CPC/2015 diz respeito ao caráter obrigatório dessas decisões, pois como já se disse anteriormente, o atual Código deu especial força à jurisprudência.
Tal como aprovado em março de 2015, previa o CPC/2015 que contra a decisão judicial que inobservasse decisão oriunda de recurso repetitivo seria atacável não só por recurso, mas também por reclamação, ação autônoma de impugnação. Era o que se extraia do art. 988, IV, combinado com o art. 927, III e art. 928, II.
Todavia, antes da entrada em vigor da Lei 13.105/2015, sobreveio a Lei 13.256/2016, que modificou a redação do art. 988, IV, do CPC/2015, excluindo a admissibilidade da reclamação, de imediato, quando houvesse violação a tese firmada em recurso repetitivo, mantendo-a, porém, no § 5º, II, do art. 988. Ou seja, a mudança decorrente da Lei 13.256/2016 relaciona-se apenas ao momento a partir do qual será admissível a reclamação (somente após o esgotamento das vias ordinárias).
A questão é de todo importante porque segundo afirmam Teresa Arruda Alvim e Bruno Dantas, são fortes os precedentes quando a sua inobservância acarreta o imediato ataque pela via da reclamação,[48] caso em que se enquadram os recursos especiais repetitivos.
Assim, ainda que tenha havido mudança no tocante ao cabimento de reclamação por inobservância de tese fixada no julgamento de recursos repetitivos, fato é que sua obrigatoriedade persiste.
Diga-se, a propósito, que a questão da obrigatoriedade de certas decisões judiciais tem levantado acirrado debate na doutrina atual, sobretudo pelo fato de que o sistema vigente foi introduzido por meio de lei ordinária.
Por essa razão é que Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery sustentam ser inconstitucional o sistema de “precedente” introduzido pelo CPC/2015, pois apenas as Súmulas Vinculantes encontram previsão constitucional (art. 103-A). Assim afirmam os autores:
“Somente no caso da súmula vinculante, o STF tem competência constitucional para estabelecer preceitos de caráter geral. Como se trata de situação excepcional – Poder Judiciário a exercer função típica do Poder Legislativo – a autorização deve estar expressa no texto constitucional e, ademais, se interpreta restritivamente, como todo preceito de exceção.[49]–[50]
Em sentido diverso, afirma Luiz Guilherme Marinoni que o Judiciário não pode tratar desigualmente os jurisdicionados, razão pela qual o respeito aos precedentes é de rigor.[51] Não por outra razão é que Teresa Arruda Alvim e Bruno Dantas sustentam que compete ao Judiciário, como um todo, “interpretar a lei com independência, livre de pressões externas”, e não a cada juiz, isoladamente.[52]
Tais autores, pois, vê na inobservância dos precedentes, também, violação à Constituição, que concebe como direito fundamental a isonomia, em que se inclui, certamente, o tratamento dado pelo Poder Judiciário. Eloquente a seguinte passagem da obra:
“Porque a criação essa obrigatoriedade forte para esses precedentes seria “mais” inconstitucional do que o flagrante desrespeito ao princípio da isonomia? Não será o princípio da isonomia, aquele segundo o qual todos são iguais perante a lei (= rectius, direito), inaceitavelmente desrespeitado, praticamente ignorado, com essas “idas e vindas” da jurisprudência?”[53]
Referida brevemente a importante discussão travada no âmbito da doutrina, impende analisar, agora, os pontos de maior destaque no âmbito dos recursos especiais repetitivos.
3.1. Procedimento do recurso especial repetitivo
Constatando-se a existência de multiplicidade de recursos especial sobre uma mesma questão de direito, será possível a afetação de dois ou mais recursos para julgamento, como causas-piloto.
Uma vez julgados os recursos, fixar-se-á a tese que será aplicada a todos os demais casos cujos processos encontrem-se sobrestados por força da afetação.
De início, convém dizer que os casos que apresentam uma mesma questão de direito não são, necessariamente idênticos. É possível que variados casos concretos, cujos fatos subjacentes sejam absolutamente distintos, devam receber um mesmo tratamento, pois a incidência da norma há de ser igual.
Basta pensar que se a controvérsia jurídica disser respeito à aplicação de norma processual, pouco importa a similitude dos fatos subjacentes à lide, pois o que interessará é a verificação da incidência ou não incidência da regra processual.
O que importa, portanto, é que a questão submetida a múltiplos recursos especiais se refira à aplicação de uma mesma norma jurídica.
Na forma do art. 1.036, § 1º, do CPC/2015, caberá aos Presidentes ou Vice-presidentes dos TJs e TRFs a seleção de dois ou mais recursos especiais admissíveis (art. 1.036, § 6º, primeira parte), que serão remetidos ao STJ para julgamento como causa-piloto. É preciso destacar que tais recursos deverão ser representativos da controvérsia, isto é, deverão conter suficiente delimitação dos fundamentos relacionados à questão, conforme exige o § 6º do art. 1.037.[54] Isso, ao que nos parece, visa garantir a boa formação da tese que, como se disse, será aplicada aos demais casos.
No mesmo momento, deve-se suspender o curso dos demais processos em que se discuta a mesma questão jurídica.
Havendo a suspensão, poderá ser formulado, como já se tratou anteriormente, pedido de exclusão do sobrestamento, quer porque o recurso interposto é intempestivo (art. 1.036, § 2º), quer porque a inclusão no rol de demandas sobrestadas foi incorreta (art. 1.037, §§ 9º e 10).
Já no STJ, poderá o relator designado selecionar outros recursos, não estando, em absoluto, vinculado à decisão dos tribunais locais, no que toca à afetação dos especiais para julgamento pelo procedimento dos repetitivos. É disso que tratam os §§ 4º e 5º do art. 1.036. É possível, inclusive, que o relator, no STJ, entenda por não ser caso de julgamento na forma dos recursos repetitivos (art. 1.037, § 1º).
Também perante a Corte, será proferida decisão admitindo o processamento dos recursos na forma do art. 1.036, ou seja, pela via dos recursos repetitivos. Nessa oportunidade, dever-se-á, ainda, suspender todos os processos, individuais ou coletivos, que tratem da mesma questão em todo o território nacional (art. 1.037, II), ampliando a suspensão decorrente da afetação promovida pelos TJs ou TRFs, no âmbito de sua competência (art. 1.036, § 1º). É possível, ademais, que sejam remetidos ao STJ mais recursos representativos da controvérsia (art. 1.037, III).
Uma vez afetados os recursos especiais, não mais se admitirá, perante os tribunais locais, a instauração de incidente de resolução de demandas repetitivas, conforme prevê o art. 976, § 4º, do CPC/2015.
Além disso, prevê o art. 998 do CPC/2015 que aquele que tiver seu recurso afetado como representativo da controvérsia poderá desistir do recurso, mas isso não afetará o julgamento do repetitivo. Como bem apontam Nelson Nery Jr. e Rosa Nery, o CPC não indica a saída que deve ser adotada nesse caso, pois a desistência do recurso é direito da parte, que não se submete a vontade da parte contrária ou mesmo do julgador. Dizem os autores que:
“O CPC 998 par. ún. reforça que a questão não pode deixar de ser apreciada em razão da desistência do recurso. Mas não indica se o STF ou o STJ deveria escolher um novo recurso que servirá de paradigma, ou se deveria simplesmente proceder ao julgamento da questão objeto do incidente de forma independente. Na verdade deve ser escolhido outro caso para servir de paradigma, pois aquele em que houve a desistência do recurso, pelo fato de impor-se fim ao procedimento recursal (com o consequente não conhecimento do recurso e extinção do processo ou trânsito em julgado da decisão recorrida), o recurso não mais existirá. O que o texto comentado indica é a sobrevivência da competência do STF e do STJ, mesmo quando tenha havido a desistência do recurso utilizado como paradigma, com a tomada de outro recurso que cumpra a função que o extinto cumprira”.[55]
A fim de proporcionar decisão democraticamente legítima, o que é imprescindível, tendo em vista a sua eficácia erga omnes, quis o legislador permitir a ampliação do debate, o que se faz pela admissão de amici curiae nos recursos afetados, bem como pela solicitação de informações aos tribunais locais e a realização de audiências públicas, conforme trata o art. 1.038 do CPC/2015.
É importante ressaltar, ainda, que se exige que o STJ dê publicidade às afetações, a fim de permitir que todos saibam que determinada questão será julgada de acordo com o procedimento dos recursos repetitivos. Tal publicidade, ademais, é feita também pelo CNJ, de acordo com a sua Resolução 235/2016.[56]
3.2. Julgamento dos recursos especiais repetitivos
Julgados os recursos afetados, será a tese aplicada a todos os demais casos suspensos, bem como aos casos futuros, na forma dos arts. 1.039 e 1.040 do CPC/2015.
Refira-se, a propósito, que o art. 1.040, IV, do CPC/2015 (da mesma forma como faz no art. 985, § 2º), exige que se os recursos julgados tratarem de serviço público concedido, permitido ou autorizado, os órgãos fiscalizadores deverão ser intimados da decisão, a fim de fiscalizar a obediência da tese.
Tais dispositivos (art. 985, § 2º, e art. 1.040, IV) podem gerar dúvidas quanto à sua constitucionalidade, pois aparentam criar hipótese diversa daquela prevista na Constituição Federal de eficácia vinculante das decisões judiciais (vinculação da Administração Pública). Todavia, sustenta Sofia Temer, tratando do art. 985, § 2º, do CPC/2015, que o efeito da decisão proferida em IRDR, em relação à Administração Pública, é apenas persuasiva, aplicando-se à Administração apenas quando for parte em processo judicial, já que a vinculação é ao Poder Judiciário.[57]
Os dispositivos, ademais, são vistos com bons olhos por Cássio Scarpinella Bueno, para quem:
“Trata-se de importante dispositivo que encontra seu par no § 2º do art. 985, a propósito do incidente de resolução de demandas repetitivas, e que impõe a comunicação do resultado do julgamento do repetitivo ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação da tese adotada quando o recurso envolver questão relativa à prestação de serviço concedido, permitido ou autorizado”.[58]
Saliente-se, por fim, que o Estado do Rio de Janeiro ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5.492/DF, rel. Min. Dias Toffoli) perante o STF, questionando, entre outros dispositivos, os arts. 985, § 2º, e 1.040, IV, do CPC/2015, sob o fundamento de que eles criam vinculação inconstitucional da Administração Pública.
Somadas as questões relativas à vinculatividade das decisões judiciais independentemente de alteração constitucional, referida em tópico anterior (introdução ao tópico 3) e as decorrentes da alegada vinculação da Administração Pública à jurisprudência dos tribunais locais e superiores, verifica-se a existência de grandes e importantes discussões no seio da doutrina, e que certamente serão objeto de análise pelo Judiciário.
4. Súmulas do STJ superadas pelo CPC/2015
Vistos aqueles que parecem ser os principais aspectos relativos ao recurso especial no CPC/2015, convêm que sejam destacadas as Súmulas do STJ, relativas aos recursos especiais, que perderam eficácia com o novo Código.
A Súmula 115 do STJ previa que “na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos”, enunciado ao qual já se referiu anteriormente. Como dito, o art. 76, § 2º, do CPC/2015 faz expressa referência à possibilidade de correção de vício relativo à capacidade processual e à representação da parte no STF e no STJ. Além disso, os arts. 932 parágrafos únicos, e 1.029, § 3º, dizem ser obrigatório que se oportunize a correção de vícios sanáveis, antes de ser inadmitido o recurso.
Ademais, a Súmula 187 do STJ dizia que “é deserto o recurso interposto para o Superior Tribunal de Justiça, quando o recorrente não recolhe, na origem, a importância das despesas de remessa e retorno dos autos. Como também se tratou alhures, o CPC/2015 autoriza que o preparo, que contempla não só a taxa judiciária, mas também as despesas decorrentes da remessa e retorno dos autos, seja recolhido no prazo de 5 dias da interposição do recurso, na forma de complementação ou de pagamento em dobro, conforme prevê o art. 1.007, §§ 2º e 4º.
Igualmente, disse-se anteriormente que a Súmula 211 do STJ não admitia recurso especial quando a questão federal não houvesse sido enfrentada pelo TJ ou TRF, a despeito da oposição de embargos de declaração: “[i]nadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal a quo”. Agora, prevê o art. 1.025 do CPC/2015 que nessa hipótese (omissão, contradição, obscuridade ou erro material da decisão recorrida) considerar-se-á prequestionada a matéria.
Também, prevê a Súmula 216 do STJ que “[a] tempestividade de recurso interposto no Superior Tribunal de Justiça é aferida pelo registro no protocolo da secretaria e não pela data da entrega na agência do correio”. Em sentido contrário, porém, prevê o art. 1.003, § 4º, do CPC/2015 que a data da postagem do recurso será a data da interposição do recurso.
Ainda, a Súmula 320 do STJ não considera prequestionada a matéria quando a questão houver sido abordada em voto vencido: “[a] questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requisito do prequestionamento”. Em sentido diverso, como já se expôs, o art. 941, § 3º, do CPC/2015 determina que o voto vencido seja sempre declarado e que isso será considerado como prequestionamento da questão federal.
Como exposto anteriormente, a Súmula 418 do STJ também perdeu efeito frente ao CPC/2015, tanto é que veio a ser cancelada pela Corte Especial, que editou a Súmula 579. Dizia a Súmula 418 que “[é] inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação”. Todavia, expressamente diz o art. 1.024, § 5º, que não será necessária a ratificação de recurso interposto antes do julgamento dos embargos de declaração, quando não houver alteração da decisão recorrida. Adequada, portanto, a redação da Súmula 579 do STJ: “[n]ão é necessário ratificar o recurso especial interposto na pendência do julgamento dos embargos de declaração, quando inalterado o resultado anterior”.
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[1] Com a acuidade que lhe é peculiar, diz Barbosa Moreira que recurso é “o remédio voluntário idôneo a ensejar, dentro do mesmo processo, a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou integração de decisão judicial que se impugna” (MOREIRA, Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 233).
[2] MOREIRA, Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 585.
[3] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Questão de fato, conceito vago e discricionariedade. Aspectos polêmicos e atuais do recurso especial e extraordinário, p. 448.
[4] Refira-se, todavia, a relevante posição divergente de Nelson Nery Jr., para quem, no juízo de revisão do recurso especial, cabe ao STJ rejulgar a causa como se se tratasse de tribunal de apelação, inclusive podendo reexaminar livremente as provas dos autos, pois segundo diz, a restrição às matérias de direito diz respeito apenas ao juízo de cassação da decisão (NERY JR., Nelson. Teoria geral dos recursos, p. 466).
[5] Em cuidadosa análise histórica da criação do Superior Tribunal de Justiça, relata Rodolfo de Camargo Mancuso que a ideia de ser criado um Tribunal Superior destinado às matérias infraconstitucionais remonta ao ano de 1965, quando formou-se mesa-redonda integrada por juristas de escol, como Seabra Fagundes, Caio Mário da Silva Pereira e Miguel Reale, apenas para citar exemplos. Destacando as conclusões atingidas pelos notáveis, destaca Mancuso que isso “permite que se extraia alguns pontos que constituíram a ideia-mãe na criação do STJ: a) um Tribunal Superior, na linha da Justiça comum, de última instância a nível de direito federal não-constitucional; b) é lícito inferir que se desejava evitar qualquer capitis diminutio em relação ao STF, que seria mantido como a Corte Constitucional: mas é difícil afirmar que esse desiderato tenha sido mantido na atual Constituição, porque na verdade, como observa Theotônio Negrão, a Carta ‘dividiu o recurso extraordinário da CF em dois: o do art. 102, III, que manteve o nome e que é interposto par ao STF; e o do art. 105, III, denominado ‘recurso especial’ e interposto par ao STJ’; sendo assim, parece-nos que agora, o ‘Tribunal da Federação’ são dois: um, o STF, soberano em matéria constitucional; outro, o STJ, soberano no direito federal stricto sensu.” (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial, pp. 46-47).
[6] Sobre isso, confira-se, exemplificativamente, a seguinte ementa: “CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA PARA O EXAME DE MANDADO DE SEGURANÇA UTILIZADO COMO SUBSTITUTIVO RECURSAL CONTRA DECISÃO DE JUIZ FEDERAL NO EXERCÍCIO DE JURISDIÇÃO DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. TURMA RECURSAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. I – As Turmas Recursais são órgãos recursais ordinários de última instância relativamente às decisões dos Juizados Especiais, de forma que os juízes dos Juizados Especiais estão a elas vinculados no que concerne ao reexame de seus julgados. II – Competente a Turma Recursal para processar e julgar recursos contra decisões de primeiro grau, também o é para processar e julgar o mandado de segurança substitutivo de recurso. III – Primazia da simplificação do processo judicial e do princípio da razoável duração do processo. IV – Recurso extraordinário desprovido.” (STF, RE 586.789/PR, Tribunal Pleno, rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 16.11.2011).
[7] Refira-se, por oportuno, que a despeito da citada Súmula 203 do STJ, decidiu o STF, no julgamento do ED no RE 571.572 que: 3. No âmbito federal, a Lei 10.259/2001 criou a Turma de Uniformização da Jurisprudência, que pode ser acionada quando a decisão da turma recursal contrariar a jurisprudência do STJ. É possível, ainda, a provocação dessa Corte Superior após o julgamento da matéria pela citada Turma de Uniformização. 4. Inexistência de órgão uniformizador no âmbito dos juizados estaduais, circunstância que inviabiliza a aplicação da jurisprudência do STJ. Risco de manutenção de decisões divergentes quanto à interpretação da legislação federal, gerando insegurança jurídica e uma prestação jurisdicional incompleta, em decorrência da inexistência de outro meio eficaz para resolvê-la. 5. Embargos declaratórios acolhidos apenas para declarar o cabimento, em caráter excepcional, da reclamação prevista no art. 105, I, f, da Constituição Federal, para fazer prevalecer, até a criação da turma de uniformização dos juizados especiais estaduais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça na interpretação da legislação infraconstitucional” (STF. Tribunal Pleno. ED no RE 571.572/BA. Rel. Min. Ellen Gracie, j. em 26.8.2009). Diante disso, o STJ veio a editar a Resolução 12/2009, que passou a admitir o ajuizamento de reclamação, perante a Corte, quando as turmas recursais dos juizados especiais dos Estados divergissem da jurisprudência do STJ firmada em recursos especiais repetitivos. Porém, com o advento do CPC/2015, sobreveio a Resolução 03/2016, também do STJ, que atribui às Câmaras ou Seções Especializadas dos Tribunais de Justiça a competência para julgar as reclamações decorrentes da inobservância da jurisprudência do STJ.
[8] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso especial, recurso extraordinário e a nova função dos Tribunais Superiores no direito brasileiro, p. 309.
[9] É a expressão utilizada por Barbosa Moreira (MOREIRA, Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 585).
[10] Este é o entendimento do STJ de há muito sedimentado: “AR – ADMINISTRATIVO – PROCESSUAL CIVIL – MILITAR TEMPORÁRIO – CABO DA AERONÁUTICA – ESTABILIDADE – INEXISTÊNCIA – AÇÃO RESCISÓRIA – RESCISÃO DE ACÓRDÃO A QUO RATIFICADO POR DECISÃO SINGULAR, DE MÉRITO, PROFERIDA EM AGRAVO DE INSTRUMENTO DENEGATÓRIO DE SUBIDA DE RECURSO ESPECIAL – COMPETÊNCIA DO STJ – APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 249-STF – LIMITES DA RESCISÃO. 1 – O Superior Tribunal de Justiça é competente para julgar ação rescisória contra acórdão de Tribunal originário, quando o Ministro Relator do agravo de instrumento ao desprovê-lo adentra no mérito da questão federal controvertida. Aplicação analógica da Súmula 249-STF. Precedentes (AR nºs 438-RJ e 627-RJ e EIAR nº 354-BA). Desta forma, a rescisão fica circunscrita aos limites da decisão hostilizada, não podendo o autor fomentar pedido que extrapole o contexto fático-jurídico preexistente. 2 – O militar temporário não se confunde com o de carreira, sendo defeso ao primeiro reivindicar estabilidade com base no art. 50, II, ‘a’ da Lei nº 6.880/80, quando restar comprovado nos autos, que o autor não possui mais de 10 (dez) anos de efetivo serviço prestado. ‘O ato de reengajamento de praça é discricionário da Administração (Lei 6.880/80, art. 121, e Decreto 92.577/86, arts. 43, 44 e 88), não se podendo por isso reconhecer violação ao direito do militar que, às vésperas de completar o decêndio para a estabilidade, é licenciado ex officio, em virtude do término da última prorrogação de tempo de serviço.’. 3 – Refoge à competência do Poder Judiciário igualar situações que o próprio legislador distinguiu. Inviável a isonomia requerida, principalmente, pelo conhecimento prévio por parte do servidor, da peculiaridade do serviço castrense e da situação delimitada no tempo. Precedentes (REsp. nºs 116.499-PE, 150.934-CE, 198.389-RJ, 203.274-RS e 45.932-RJ) 4 – Pedido julgado improcedente. (STJ, AR 702/DF, 3ª Seção, rel. Min. Gilson Dipp, j. 24.5.2000).
[11] Sobre a discussão, relevante é a seguinte decisão do STF, da lavra do Min. Sepúlveda Pertence: “A propósito da discussão, há importante decisão do STF, da lavra do então Ministro Sepúlveda Pertence, dando conta da importante distinção entre admissibilidade e mérito no recurso extraordinário. Veja-se a ementa: “I. Recurso extraordinário: letra a: possibilidade de confirmação da decisão recorrida por fundamento constitucional diverso daquele em que se alicerçou o acórdão recorrido e em cuja inaplicabilidade ao caso se baseia o recurso extraordinário: manutenção, lastreada na garantia da irredutibilidade de vencimentos, da conclusão do acórdão recorrido, não obstante fundamentado este na violação do direito adquirido. II. Recurso extraordinário: letra a: alteração da tradicional orientação jurisprudencial do STF, segundo a qual só se conhece do RE, a, se for para dar-lhe provimento: distinção necessária entre o juízo de admissibilidade do RE, a – para o qual é suficiente que o recorrente alegue adequadamente a contrariedade pelo acórdão recorrido de dispositivos da Constituição nele prequestionados – e o juízo de mérito, que envolve a verificação da compatibilidade ou não entre a decisão recorrida e a Constituição, ainda que sob prisma diverso daquele em que se hajam baseado o Tribunal a quo e o recurso extraordinário. III. Irredutibilidade de vencimentos: garantia constitucional que é modalidade qualificada da proteção ao direito adquirido, na medida em que a sua incidência pressupõe a licitude da aquisição do direito a determinada remuneração. IV. Irredutibilidade de vencimentos: violação por lei cuja aplicação implicaria reduzir vencimentos já reajustados conforme a legislação anterior incidente na data a partir da qual se prescreveu a aplicabilidade retroativa da lei nova” (STF, RE 298.694/SP, Tribunal Pleno, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 06.08.2003).
[12] Tratar-se-á mais à frente dos requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade. Por ora, vale referir que as condições da ação se aproximam, ao que nos parece, dos requisitos intrínsecos de admissibilidade recursal.
[13] MOREIRA, Barbosa. O juízo de admissibilidade dos recursos cíveis, p. 30.
[14] ALVIM, Arruda. Tratado de direito processual civil, p. 373.
[15] Diz Arruda Alvim, com acuidade, que “as condições da ação são categorias lógico-jurídicas existentes na doutrina e na lei que, se preenchidas, possibilitam que alguém chegue à decisão de mérito – ainda que desfavorável. São condições de possibilidade da prestação jurisdicional. (ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, p. 156).
[16] Para Barbosa Moreira, a classificação dos requisitos de admissibilidade em intrínsecos e extrínsecos leva em consideração, respectivamente, o poder de recorrer e o modo de se exercer esse poder (modo de recorrer). Para o autor “os requisitos de admissibilidade dos recursos podem classificar-se em dois grupos: requisitos intrínsecos (concernentes à própria existência do poder de recorrer) e requisitos extrínsecos (relativos ao modo de exercê-lo). Alinham-se no primeiro grupo: o cabimento, a legitimação para recorrer, o interesse em recorrer e a inexistência de fato impeditivo (v.g. o previsto no art. 881, caput, in fine [do CPC/1973, correspondente, parcialmente, ao art. 77, §7º do CPC/2015]) ou extintivo (v.g., os contemplados nos arts. 502 e 503 [do CPC/1973, correspondentes aos arts. 999 e 1.000 do CPC/2015]) do poder de recorrer. O segundo grupo compreende: a tempestividade, a regularidade formal e o preparo. Esses requisitos são genéricos, embora possa a lei dispensar algum deles, em tal ou qual hipótese (…)” (MOREIRA, Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 263). Contudo, parece-nos acertada a posição de Nelson Nery Jr., segundo quem os requisitos intrínsecos e extrínsecos devem levar em consideração a decisão recorrida tal como prolatada (NERY JR., Nelson. Teoria geral dos recursos, p. 266).
[17] Para Nelson Nery Júnior, somente aquele que poderia ter intervindo no processo como assistente simples ou litisconsorcial é que tem legitimidade para recorrer como terceiro prejudicado (NERY JR., Nelson. Teoria geral dos recursos, p. 297).
[18] Como a oposição dos embargos de declaração interrompe o prazo para interposição de outros recursos (especial e extraordinário, por exemplo), entendia-se que o recurso interposto nesse momento (quando interrompido o prazo) era extemporâneo. Mais do que isso, a decisão do TJ ou TRF só estaria completa após o julgamento dos embargos, razão pela qual seria, em tese, apenas a partir desse momento que se poderia recorrer ao STJ. Seria imprescindível, pois, a ratificação do recurso posteriormente à intimação da decisão dos embargos de declaração.
[19] NERY JR., Nelson. Teoria geral dos recursos, p. 353.
[20] FORNACIARI JR., Clito. A reforma processual civil (artigo por artigo), p. 94.
[21] Registre-se que o porte de remessa e retorno dos autos é devido apenas em se tratando de autos físicos. Tratando-se de processo cujos autos são digitais, tal tarifa não é devida, a teor do que dispõe o art. 1.007, § 3º, do CPC/2015.
[22] Nesse sentido: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. COMPROVANTE DO PAGAMENTO DO PREPARO E DAS CUSTAS PROCESSUAIS. AUSÊNCIA. COMPROVANTE DE AGENDAMENTO. INADMISSIBILIDADE. IMPROVIMENTO. 1.- ‘Nos termos do art. 511 do CPC, o preparo do recurso deve ser comprovado no ato de sua interposição, não se admitindo a mera juntada do comprovante de agendamento, que faz a ressalva de que não houve a quitação da transação.’ (AgRg no AG 1.363.339/MT, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 29/3/2012). Precedentes. 2.- Agravo regimental improvido” (STJ, AgRg no REsp 1.401.263/TO, 3ª Turma, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 24.09.2013).
[23] MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial, p. 77.
[24] Vale ressaltar, por oportuno, que a questão da oposição de embargos de declaração anteriormente à interposição de REsp recebeu especial atenção do legislador. Disso tratar-se-á mais de espaço em linhas posteriores, mas, por ora, vale referir que a oposição dos embargos é indispensável, mas o seu desprovimento, mesmo diante de omissão, contradição, obscuridade ou erro material, não conduz à “mera” anulação da decisão, pois o art. 1.025 do CPC/2015 considera presentes no acórdão todos os elementos que o embargante requereu fossem apreciados, para fins de prequestionamento.
[25] Já tivemos o ensejo de dizer que “os recursos especial e extraordinário (espécies do gênero recurso extraordinário) só terão cabimento contra acórdãos, que não sejam mais impugnáveis por recursos ordinários”. (ALVIM, Eduardo Arruda. Direito processual civil, pp. 950-951).
[26] Dizem Olavo de Oliveira Neto, Elias Marques de Medeiros Neto e Patrícia Elias Cozzolino de Oliveira, com percuciência, que: “[a]tualmente, porém, embora nosso sistema processual civil tenha escolhido o princípio dispositivo para preponderar sobre o princípio inquisitório, optou por fazê-lo de forma mitigada, permitindo ao juiz, em determinadas hipóteses, agir de ofício em prol da realização dos escopos do processo.” (OLIVEIRA NETO, Olavo de; MEDEIROS NETO, Elias Marques de; OLIVEIRA, Patrícia Elias Cozzolino de. Curso de direito processual civil, p. 119).
[27] No mesmo sentido a Súmula 282 do STF: “[é] inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada”.
[28] Assim: “[a] jurisprudência desta Corte Superior admite amplamente a ocorrência do chamado ‘prequestionamento implícito’. Trata-se daquelas situações em que o órgão julgador, não obstante não faça indicação numérica dos referidos artigos legais, aprecia a decide com amparo no seu conteúdo normativo. Precedentes. Coisa diversa é o chamado ‘prequestionamento ficto’, não admitido por este Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual se considera prequestionada a matéria que, apesar de não analisada pelo acórdão, foi objeto das razões dos embargos de declaração interpostos, ainda que eles sejam rejeitados sem qualquer exame da tese, bastando constar da petição dos referidos aclaratórios. Precedentes’ (STJ, AgRg no REsp 1.170.330/RS, 4ª Turma, rel. Min. Marco Buzzi, j. 17.12.2015).
[29] ARAGÃO, Egas Moniz. Pré-questionamento. Revista Forense, v. 328.
[30] Recentemente, parecia sólida a posição do STJ a respeito do tema: “Com relação aos embargos declaratórios da Câmara de Vereadores de Itapevi, importa salientar que sua tese principal remete à necessidade de aplicação ao recurso especial de efeito translativo para tratar da sua aventada falta de intimação para determinados atos processuais, ou seja, para permitir ao Tribunal o conhecimento ex officio de questão de ordem pública não prequestionada, o que todavia esbarra na remansosa jurisprudência desta Corte de Justiça que não admite esse efeito translativo no recurso especial” (STJ, 2ª Turma. Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. em 03.09.2013). Não se deve esquecer, todavia, de que há julgados esparsos do STJ que adotam uma linha menos rigorosa do que aquela anteriormente retratada (completa inadmissibilidade de conhecimento de matéria de ofício). Encampam orientação no sentido de que, desde que o recurso especial seja conhecido (isto é, desde que presentes os pressupostos de admissibilidade desse recurso), é possível ao STJ vir a conhecer ex officio de determinadas matérias, tal como se de um tribunal local se tratasse: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. LEGITIMIDADE DE PARTE. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. QUANDO E POSSIVEL O SEU CONHECIMENTO DE OFICIO POR ESTA CORTE. I – A QUESTÃO RELATIVA A LEGITIMIDADE DE PARTE SÓ PODE SER OBJETO DE RECURSO ESPECIAL, SE PREQUESTIONADA (SÚMULAS NUMS. 282 E 356 DO STF). SE A MATERIA NÃO FOI PREQUESTIONADA, ISSO NÃO IMPEDE O SEU CONHECIMENTO DE OFICIO POR ESTA CORTE, MAS SÓ NO CASO DE O RECURSO ESPECIAL SER CONHECIDO. II – AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO” (STJ, AgRg no AI 95.597-GO, 2ª Turma, rel. Min. Pádua Ribeiro, j. 25.04.1996).
[31] Efeito translativo é, segundo aponta Nelson Nery Jr., o efeito de que goza o recurso de trasladar ao órgão ad quem o conhecimento de matérias independentemente de provocação da parte, decorrente do princípio inquisitório. Trata-se, segundo leciona o autor, no mais das vezes, de matérias de ordem pública, mas nada impede que outras sejam examinadas a despeito de não se tratar de tal espécie de questão (NERY JR., Nelson. Teoria geral dos recursos, p. 460 e seguintes). A esse fenômeno Barbosa Moreira dá o nome de profundidade do efeito devolutivo (MOREIRA, Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 445). Teresa Arruda Alvim e Bruno Dantas, em posição de certa maneira intermediária, sustentam que o efeito translativo diz respeito, propriamente, às questões de ordem pública: “Cabe, desde logo, o registro de que, segundo o modelo que estamos traçando, o efeito translativo, do qual trataremos a seguir, diferentemente do que sustenta Nelson Nery Jr., não engloba as matérias dos §§ 1º e 2º do art. 515 do CPC de 1973, correspondentes ao art. 1.013, §§ 1º e 2º, do CPC de 2015, mas tão somente matéria de ordem pública, na acepção estrita da expressão. Para nós, é indicativo de que as matérias em questão não têm natureza de ordem pública o fato de que a sua arguição e consequente cognição depende da iniciativa das partes, a quem cabe estabelecer os limites sobre os quais vão incidir. Em outras palavras: a matéria efetivamente de ordem pública necessita tão somente do veículo hábil para transportá-la ao órgão ad quem, ao passo que as matérias que se relacionam com o vetor profundidade do efeito devolutivo subordinam-se, antes, à extensão que o recorrente haja estipulado em sua impugnação” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso especial, recurso extraordinário e a nova função dos Tribunais Superiores no direito brasileiro, pp. 390-391).
[32] LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Recurso especial: ordem pública e prequestionamento. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, edição especial 30 anos do CPC, p. 322.
[33] PINTO, Nelson Luiz. Recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça, p. 129.
[34] NERY JR., Nelson. Teoria geral dos recursos, p. 465.
[35] Idem, p. 465.
[36] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso especial, recurso extraordinário e a nova função dos Tribunais Superiores no direito brasileiro, pp. 402-403.
[37] Diga-se, a propósito, que para Flávia Piovesan, os tratados internacionais sobre direitos humanos já integravam o direito constitucional brasileiro por força do § 2º do art. 5º da Constituição. Para a autora, “no catálogo de direitos constitucionalmente protegidos, os direitos enunciados nos tratados internacionais em que o Brasil seja parte. Esse processo de inclusão implica a incorporação pelo Texto Constitucional de tais direitos” (PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional, p. 114). Continua a autora afirmando que tendo a proteção dos direitos humanos natureza materialmente constitucional, por se tratar de direito fundamental, os tratados e convenções internacionais sobre o tema necessariamente deveriam ser tidos como normas constitucionais (Idem, p. 116).
[38] ALVIM, Arruda. Novo Contencioso Cível no CPC/2015, p. 515.
[39] Ibidem.
[40] É, noutras palavras, a conclusão a que chega MOREIRA, Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 585.
[41] STJ – RT 698/198.
[42] Nesse sentido, v. Gleydson Kleber Lopes de Oliveira: “[n]a hipótese de a lei federal repetir preceito integrante da Constituição Federal – de que é exemplo a discussão sobre direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada -, considera-se a matéria como constitucional, sendo admissível o recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal e não o especial ao Superior Tribunal de Justiça (OLIVEIRA, Gleydson Kleber Lopes de. Recurso especial, p. 237).
[43] STJ, REsp 8.096, rel. Min. José de Jesus Filho, j. 13.10.92, in RT 698/198.
[44] STF, AGRAG 135.632-RS, rel. Min. Celso de Mello, j. 10.10.98, DJ 03.09.99, p.27.
[45] Com a acuidade de sempre, já dizia, de há muito, Teresa Arruda Alvim que “[à]s letras b e c temos chamado de hipóteses de cabimento. À letra a, de único fundamento.” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Controle das decisões judiciais por meio de recursos de estrito direito e de ação rescisória: recurso especial, recurso extraordinário e ação rescisória: o que é uma decisão contrária à lei?, p.172).
[46] NERY JR., Nelson; ABBOUD, Georges. Recursos para os Tribunais Superiores e a Lei 13.256/2016. Revista de processo, v. 257, p. 231.
[47] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso especial, recurso extraordinário e a nova função dos Tribunais Superiores no direito brasileiro, p. 410.
[48] Para os autores, o CPC/2015 estabeleceu três graus de obrigatoriedade: forte, relativa às decisões judiciais cuja desobediência acarreta a possibilidade de ajuizamento de reclamação; média, relativa à possibilidade de readequação da decisão pela via recursal; fraca, relativa a aspectos apenas culturais, que vinculam os próprios juízes às suas decisões. (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso especial, recurso extraordinário e a nova função dos Tribunais Superiores no direito brasileiro, pp. 278-279).
[49] NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 1837.
[50] Importante destaque já era dado por Lenio Streck e Georges Abboud, antes ainda do advento do CPC/2015: “faz-se necessário destacar que o dispositivo da sentença, ao ser utilizado em casos futuros, não configura mais a norma em si, o texto do dispositivo que consubstanciou a norma do caso concreto em que foi proferida essa sentença interpretativa passa a consistir em enunciado normativo a solucionar casos futuros, dando origem a novas normas à medida que surgirem novas sentenças resolventes de novos casos jurídicos. (…) Não apenas a súmula não traz a norma com ela, como ela, ao se constituir em uma prescrição literal, passará a poder ser interpretada e dar origem a novas normas (…)”. (STRECK, Lenio Luiz; ABBOUD, Georges. O que é isto – o precedente judicial e as súmulas vinculantes?, pp. 59-60).
[51] MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios, p. 207.
[52] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso especial, recurso extraordinário e a nova função dos Tribunais Superiores no direito brasileiro, pp. 366-372.
[53] Idem, pp. 283.
[54] A propósito, diz Bruno Dantas que “a escolha do recurso piloto deve observar parâmetros que levem em consideração toda a quantidade e variedade de perspectivas argumentativas utilizadas nos casos individuais, de modo que a seleção recaia sobre aquele recurso que venha a reunir as melhores condições de influir efetivamente no convencimento da Corte” (DANTAS, Bruno. Teoria dos recursos repetitivos, p. 117). Relevantíssima, ainda, a advertência feita por Araken de Assis: ‘‘[é] da maior delicadeza a seleção dos recursos extraordinários representativos da controvérsia, a cargo do presidente ou do vice presidente do TJ ou do TRF (ART. 1.036, § 1º), ou do relator do recurso especial no STJ. Uma má escolha, recaindo sobre acórdão fundamentado insuficientemente, impedirá a análise cabal das teses” (ASSIS, Araken de. Manual dos recursos, p. 970).
[55] NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 2022.
[56] É do que trata o art. 5º da Resolução, assim redigido:
“Art. 5º Fica criado, no âmbito do CNJ, banco nacional de dados com informações da repercussão geral, dos casos repetitivos e dos incidentes de assunção de competência do Supremo Tribunal Federal (STF), do STJ, do TST, do TSE, do STM, dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais do Trabalho e dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal.
1º O banco nacional de dados será alimentado continuamente pelos tribunais, com a padronização e as informações previstas nos Anexos I a V desta Resolução.
2º O CNJ disponibilizará as informações para toda a comunidade jurídica, separando em painéis específicos os dados relativos à repercussão geral, aos recursos repetitivos, ao incidente de resolução de demandas repetitivas e ao incidente de assunção de competência admitidos e julgados pelos tribunais.
3º A gestão das informações a que se refere o § 2º deste artigo, bem como a criação do Número Único dos Temas (NUT) de IRDR e de IAC são da competência da Comissão Permanente de Gestão Estratégica, Estatística e Orçamento do CNJ, com o apoio técnico do Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ).
4º O Número Único dos Temas de IRDR e de IAC conterá as informações previstas nos §§ 4º e 5º do art. 1º da Resolução CNJ 65/2008, seguidas de um algarismo identificador do respectivo incidente, além de um número sequencial único gerado por ordem cronológica de cadastro, que será vinculado à descrição do tema, enviada pelos Tribunais Regionais Federais, Tribunais Regionais do Trabalho e pelos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal”.
[57] TEMER, Sofia. Incidente de resolução de demandas repetitivas, pp. 220-222.
[58] BUENO, Cássio Scarpinella. Manual de direito processual civil, p. 659.