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PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE AGORA É EXPRESSA NO CPC

Clito Fornaciari Júnior

Um dos institutos que ultimamente sofreu maior número de modificações foi o da prescrição. Embora não se revelem uniformes as alterações, elas denotam uma tendência, não apenas no sentido de abreviar os prazos em que o direito perece, mas também no intuito de mais rapidamente extinguir os processos.

Assim, o Código Civil de 2002 reduziu vários prazos, inclusive o da regra geral, aplicável à falta de disposição específica. O prazo de 20 anos ficou reduzido a 10 (art. 205). Além disso, alimentos, aluguéis, rendas vitalícias ou temporárias e juros, entre outras pretensões, tiveram prazos reduzidos de modo significativo. Acrescentou-se, ademais, regra no sentido de prescrever a exceção no mesmo prazo da pretensão (art. 190), disposição que afastou antigo entendimento, segundo o qual, diante da prescrição, restava alegar a matéria prescrita como defesa, em eventual processo promovido em face do titular da pretensão.

Logo após, surgiu a Lei nº 11.280/06, que dispôs sobre matéria processual, mas afetou também o direito material. Assim, alterando-se o § 5º do art. 219 do Código de Processo Civil, conferiu-se à prescrição, mesmo relativa a direito patrimonial, o caráter de defesa de ordem pública, passível, pois, de reconhecimento de ofício, em qualquer fase do processo, de modo que igualmente a qualquer momento pode ser alegada pela parte. O novo preceito revogou princípio assente desde o direito romano, contemplado no art. 166 do Código Civil de 1916 e repetido no de 2003 (art. 194), vedando ao juiz conhecer da prescrição de direitos patrimoniais, se não invocada pelas partes, ficando, pois, dentro da esfera de disponibilidade do interessado. Justificava-se sua existência em nome do respeito “ao escrúpulo de consciência daquele que não quer se libertar da dívida, por não ter podido pagar em determinado tempo” (BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil comentado. 11. ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1956. p. 356. v. 1.). Com isso desapareceu essa reserva de escrúpulo, se é que ainda era sua razão de ser, de modo que queira ou não o devedor será libertado por ato do juiz do dever de pagar ao credor ainda que retardatário. Essa alteração das leis de processo e de direito civil colocou em discussão a sobrevivência da renúncia à prescrição, prevalecendo entendimento sobre sua manutenção (cf. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 475. v. 1), apesar de haver ficado mais difícil sua demonstração, notadamente quanto à renúncia tácita.

No novo Código de Processo Civil, a novidade foi conferir-se foro legal à chamada prescrição intercorrente. Disso já se falava antes da novel lei, mas a falta de previsão expressa dificultava seu reconhecimento. No atual Código, o § 4º do art. 921 e o inciso V do art. 924 literalmente referem-se à prescrição intercorrente, sem, contudo, arrolar suas exigências, embora seu pressuposto seja o mesmo da prescrição normal, tendo lugar com o transcurso do tempo previsto na lei associado à inércia no processo do titular do direito postulado.

Os dois artigos que consideram o instituto dizem respeito ao processo de execução. O art. 921 estabelece um específico termo inicial do seu curso, que se verifica quando for ultrapassado o prazo de um ano de suspensão do processo de execução em razão de não ter o devedor bens penhoráveis (inciso III e §§ 1º e 4º do art. 921). O art. 924, por sua vez, prevê a prescrição intercorrente como causa de extinção do processo de execução. Em que pese o enfoque legal estar na disciplina da execução e do cumprimento de sentença, essa não é privativa destas modalidades de processo, podendo ocorrer mesmo em fase de conhecimento de qualquer feito. Um processo que ainda não obteve sentença pode ficar paralisado por tempo superior ao suficiente para a perda do direito: por exemplo, uma ação de cobrança de aluguéis paralisada por mais de dois anos. Tanto acontecendo, justifica-se seja extinto o processo – e é com julgamento de mérito, tendo como fundamento legal o art. 487, II, do Código de Processo Civil, que considera genericamente a prescrição e a decadência.

Na execução, em sentido amplo, e na fase de conhecimento, além da superação do prazo legal, há de se ter a inércia da parte, de modo que a simples paralisação do processo não é suficiente para que se tenha a prescrição intercorrente. Sua paralisação nas mãos do juiz ou na dependência de ato da parte contrária, que não o realiza, não importa na prescrição, que somente se verifica quando a omissão e, pois, a paralisação sejam decorrentes da parte que pede o direito.

É certo que a legislação processual cuida de duas outras formas de inércia da parte: o abandono da causa por mais de 30 dias pelo autor (art. 485, III) e a negligência de ambas as partes por mais de um ano (art. 485, II). As duas hipóteses implicam extinção do processo sem julgamento de mérito e são, por isso, impeditivas da prescrição, de vez que o prazo, inclusive, é menor. São, portanto, bem mais benéficas à parte do que a prescrição. Nada impede, porém, que o juiz não extinga o processo diante dessas ocorrências e, posteriormente, suplantado o prazo prescricional, aí sim resolva extinguir e o faça com base na prescrição intercorrente, proferindo, então, decisão de mérito. Nada impede que isso ocorra, mesmo porque a extinção pela inércia do autor somente poderá ser declarada se houver pedido do réu. Ambas, de outro lado, devem ser precedidas de intimação da parte para que, no prazo de cinco dias, dê andamento ao processo. Destarte, sem o pedido, no caso da inércia do autor, não poderá haver a extinção, de modo a poder o réu ficar no aguardo de inércia mais longa, a fim de se beneficiar com a consumação da prescrição.

A lei processual, preocupada com o contraditório, exige seja também assegurada prévia manifestação da parte contra a qual a prescrição foi arguida. Seu objetivo, nesse caso, é diferente da hipótese de inércia. Aqui não se permite à intimada simplesmente dar andamento ao processo. A ela cabe demonstrar que a prescrição não se operou, pois, por exemplo, a inércia não era sua ou o prazo não se consumou, cumprindo ao juiz dizer se houve ou não prescrição. Nos casos do art. 485, a intimação é somente para fazê-lo fluir.

O princípio repetido amiúde de que a execução prescreve no mesmo prazo da ação não tem sentido diante do chamado processo sincrético, que faz com que a fase de cumprimento seja continuação da de conhecimento. Na demora em requerer o cumprimento, a prescrição a ser considerada é a intercorrente, de modo que, se não vier a ser iniciada a nova fase no prazo, perderá o direito, vez que o processo estará paralisado por tempo suficiente para que tal se concretize. É certo, porém, que o início da execução provisória é faculdade, e não obrigação, do credor, de modo que se a ela não se der início não correrá a prescrição (cf. nosso artigo nesta Tribuna do Direito, Suplemento nº 135), o que somente acontecerá na inércia quanto ao cumprimento definitivo.

Respostas de 2

  1. Com relação à prescrição de sentença sem a resolução do mérito, nos termos do art. 485, III do CPC, não há nenhuma possibilidade por parte do autor em receber o crédito? Nem mesmo promover ação monitória?

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