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PRECLUSÃO ELÁSTICA NO NOVO CPC

Zulmar Duarte Oliveira Junior

Há algum tempo, recebi o gentil e imerecido convite do Professor Bruno Dantas, membro da Comissão de Juristas que elaborou o anteprojeto do novo CPC[1], para escrever um artigo sobre a proposta submetida ao Congresso Na­cional.

Escrevi então sobre a preclusão no novo CPC, que adjetivei como elástica – preclusão elástica[2] -, em artigo que recentemente foi publicado na Revista de Informação Legislativa do Senado, numa edição especial sobre o novo CPC[3], que contou com a participação de diversos e eméritos professores de processo civil.

Ainda, voltei a trabalhar com o tema na VIII Semana Jurídica Acadêmica de Cuiabá, campus UNIC/Sinop[4], por reputar um dos aspectos sensíveis do projeto de novo CPC, cujos reflexos se farão sentir na prática acaso venha a ser aprovada a proposta.

Sem pretender infrutífero exercício tautológico, remetendo ao citado artigo para melhor compreensão do raciocínio, vale a pena mais um olhar sobre a questão antes de sua preclusão.

Penso que o novo CPC adotou um sistema elástico de preclusão, eis que, em determinadas hipóteses, protraiu (elasteceu) sua ocorrência até a fase recursal.

Pois bem, o novo CPC manteve a disciplina da obrigatoriedade de suscitação dos descompassos, ressalvando as matérias de ordem pública, na primeira oportunidade, como se afere da cabeça do seu art. 253:

Art. 253. A nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão.

Contudo, ao repetir a redação do art. 473 do velho CPC, o novo CPC adicionou uma ressalva, diferença redacional que, por assim dizer, faz toda a diferença.

Colhe-se do art. 494 do novo CPC:

Art. 494. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão, observado o disposto no parágrafo único do art. 963.

Aliás, colmatando o sistema preclusivo, estatui o art. 963 do novo CPC:

Art. 963. Da sentença cabe apelação.

Parágrafo único. As questões resolvidas na fase cognitiva, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de instrumento, não ficam cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em preliminar de apelação, eventualmente interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões.

Dessa urdidura normativa, conclui-se que, decidida determinada questão pelo Magistrado de primeiro grau, não sendo viável sua imediata submissão ao Tribunal pela via do agravo de instrumento[5], a mesmíssima questão fica em estado letárgico, podendo ser reproduzida e rediscutida na fase recursal.

Efetivamente, a preclusão dessa questão somente ocorrerá se não constar do recurso de apelação ou das contrarrazões recursais. A questão decidida fica, por hipóstase, em estado letárgico até o não agir futuro da parte, ou seja, pela não reedição do ponto no segundo grau de jurisdição.

Por isso, a preclusão no novo CPC opera de duas maneiras, imediatamente para aquelas matérias não suscitadas em momento oportuno (art. 253) e elasticamente para as suscitadas e não passíveis de figurarem no agravo de instrumento (arts. 494 e 963).

Em sendo assim, o novo CPC adotou uma preclusão elástica no concernente às questões decididas no curso do arco procedimental e não suscetíveis do imediato ataque pelo recurso de agravo, as quais devem ser suscitadas na fase de apelação, sob pena, aí sim, de autêntica preclusão temporal.

Preclusão elástica porque, observando adequadamente o fenômeno jurídico, não se produz exclusivamente – nem é inteiramente confinada – no segundo grau de jurisdição. Principia com a decisão interlocutória, mas elastece, estica, seu desdobramento até o segundo grau, quando então se realiza.

A decisão exarada, enquanto ato processual, produz imediatamente todos os seus efeitos, mas a consumição da possibilidade de sua alteração somente ocorrerá em segundo grau, com sua efetiva modificação (provimento do recurso) ou pela preclusão.

Sem sombra de dúvida, essa alteração acarretará (in)consequências, entre elas, sobre a preclusão pro iudicato, nos pedidos de reconsideração e sobre o próprio centro de gravidade do processo, como fiz ver no artigo publicado e já indicado, inclusive sugerindo proposta de alteração da matéria.

[1] Designaremos o projeto de novo Código de Processo Civil, tramitando atualmente na Câmara de Deputados tombado pelo nº 80466/2010 (Disponível em: <http://www.câmara.gov.br/proposicoes Web/fichadetramitacao?id Proposicao=490267>. Acesso em: 26 out. 2011), com a expressão “novo CPC”, sendo que, em contrapartida, o atual Código de Processo Civil – Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 -, pelo rótulo “velho CPC”.

[2] Infelizmente a expressão não é minha, mas de Calamandrei. Se bem que utilizada para outra dimensão do instituto, isto é, para a flexibilização da preclusão das ditas deduções de mérito, na forma dos arts. 183 e 184 do Código de Processo Civil italiano de 1940.

[3] Disponível em: <http://www.senado.gov.br/publicacoes/Livraria/asp/publicacao.asp?COD_PUBLICACAO=1328&COD_CLASSIFICACAO=17>. Acesso em: 26 out. 2011.

[4] Disponível em: <http://www.unic.br/site/index.php?pg=informando&id=15031>. Acesso em: 26 out. 2011.

[5] O novo CPC, em seu art. 9.699, repristinou a disciplina do art. 8.422 do Código de Processo Civil de 1939, estabelecendo taxativamente as hipóteses de manejo do agravo de instrumento.

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