PODERES, DEVERES E RESPONSABILIDADES DO JUIZ A LUZ DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Marisa Aparecida Rocha Onuma
Rodrigo Soncini De Oliveira Guena
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DO OFICIO DE JUIZ. 2 CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 3 ASPECTOS RELEVANTES A NECESSIDADE DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 3. 1 COMPARAÇÃO DOS DISPOSITIVOS DO CPC/1973 COM O CPC/2015 ATINENTE AOS PODERES, DEVERES E RESPONSABILDIADE DO JUÍZ. CONCLUSÃO. REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem por finalidade abordar questões do Novo CPC/2015 e, ao analisa-lo, pretendemos discorrer sobre os poderes e limites da atividade do Juiz no processo, bem como os princípios que estão envoltos a sua atividade jurisdicional. É importante frisar que com o advento do Novo CPC, o legislador trouxe para atividade do magistrado uma atuação colaborativa no processo com o fim de diminuir os conflitos sociais e instaurar a paz tão almejada. Essa Temática é uma premissa fundamental para a mudança que se espera, pois, o magistrado é o gestor do processo, mas deve ser visto muito mais como um agente colaborador para efetiva prestação jurisdicional.
1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DO OFICIO DE JUIZ
Por tratar-se de assunto com íntima relação com o tema aqui analisado, faz-se necessário realizar uma breve explanação sobre o cenário histórico bem como as peculiaridades do surgimento da figura do Juiz. A figura institucionalizada do magistrado tem forte relação com o surgimento das civilizações: Uma vez que litígios surgem naturalmente, vislumbrando esse aspecto, a ideia de um terceiro, tido como neutro, é essencial para construir uma visão livre de parcialidade. Nesse passo, os senadores em Roma, exerciam exclusivamente a função de julgar certas questões, exercendo a função de magistrado na Grécia e Roma antiga.
A imagem do magistrado foi sendo construída aos poucos, e inicialmente, o juiz era percebido como um representante do divino. Assim, sua decisão simbolizava a postura de um ser superior que via os casos de maneira neutra. Entretanto, esse conceito evoluiu concomitantemente com a sociedade, de modo que o pensamento iluminista e o legado da Revolução Francesa contribuíram para uma mudança de paradigma: pois ao colocar o cidadão no centro, o juiz, que era parte da classe privilegiada (o Segundo Estado na Revolução Francesa), passa a ser um cidadão eleito por sua capacidade e aptidão para julgar casos imparcialmente.
Desse modo, a propagação do conceito com o passar dos anos, mostra um ponto inicial de necessidade de um terceiro neutro, para enfim, representar o cidadão e os seus direitos tutelados. Esse processo foi fundamental para entendermos o juiz atualmente, como um cidadão dotado de habilidades selecionadas por meio de requisitos e critérios e não mais um ser místico ou privilegiado.
2 CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
O Código de processo civil está em estrita consonância com a Constituição Federal, pois a sua nuance é objetivar de forma tempestiva e célere a garantia dos direitos fundamentais, privilegiando o direito material em detrimento de sua forma, todavia, assegura a aplicação dos princípios constitucionais de maneira justa.
Do texto da lei, verificamos que o legislador teve uma certa preocupação em dar novos rumos ao NCPC, pois foi de forma direta e positiva à carta magna, garantindo as partes no processo uma amplitude maior dos direitos e garantias fundamentais.
No que se refere a constitucionalização o NCPC traz expressamente em seu artigo primeiro, a seguinte afirmação, in verbis:
Artigo 1 – O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.
Ainda sobre o dispositivo 1° do NCPC, está notório que houve uma preocupação do legislador, em trazer a luz a síntese de que o processo civil, além de ser um meio de concretização de direitos fundamentais elencados na Constituição Federal, podemos afirmar que o mesmo deverá ser interpretado em consonância com os moldes previsto na Constituição, prevalecendo o totalitarismo constitucional que rege o processo.
Nesse passo, o totalitarismo constitucional não deve ser interpretado de maneira negativa, visto que a constituição é precipuamente a lei maior e todo o ordenamento jurídico gira em torno da constituição.
Contudo, podemos afirmar que o novo CPC, não aponta mais para um isolamento, um protagonismo processual, mas sim para uma cooperação que tem por primazia a boa-fé, fazendo com que não sejam violados os princípios da demanda e imparcialidade do Juiz.
3 ASPECTOS RELEVANTES A NECESSIDADE DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL
O magistrado não pode se eximir em sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade na lei. Ao julgar a lide, o mesmo tem que aplicar as normas legais. Assim, existindo ausência de lei ou de regra preestabelecida, o magistrado irá recorrer à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.
Essa temática é permissiva para o tema em comento, o juiz é inerte, todavia, uma vez a jurisdição sendo provocada, a atuação jurisdicional é inexorável. Assim, é dever do Estado dar seguimento a função de compor o litígio, aplicando o direito ao caso concreto.
Desde que o Estado assumiu para si, em caráter de exclusividade, o poder-dever de solucionar os conflitos de interesse, o juiz foi investido do poder de julgar. É sua obrigação conduzir o processo, proferindo os despachos e decisões necessárias para o seu bom andamento, e, ao final, sentenciar. Não lhe é dado proferir o non liquet, isto é, deixar de julgar o processo, alegando que a lei é omissa, ou que os fatos não foram apurados adequadamente (GONÇALVES, 2012, p. 219).
O art. 140, do CPC estabelece um preceito a ser seguido pelo magistrado, ao proferir o julgamento. In verbis.
Art. 140°. O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico.
Parágrafo único. O juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei.
No mesmo seguimento do artigo 140, do CPC, em caso de omissão legislativa, o artigo 4º da Lei de Introdução das Normas de Direito Brasileiro assim preceitua, in verbis:
Art. 4° Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito
3.1 COMPARAÇÃO DOS DISPOSITIVOS DO CPC/1973 COM O CPC/2015 ATINENTE AOS PODERES, DEVERES E RESPONSABILDIADE DO JUÍZ
Com o advento do Novo CPC houve alguns incrementos na atuação do oficio de Juiz. Para isso, exemplificaremos um quadro comparativo para discorrermos acerca dessas mudanças, não somente pelo aumento do número de incisos que compõe o assunto, mas pelas mudanças substanciais elencadas de forma sistemática no novo código.
O CPC de 1973 de abordava questões atinentes a atuação do juiz no processo, bem como sua participação como gestor velando pelas garantias constitucionais.
CPC DE 1973
Seção I Dos Poderes, dos Deveres e da responsabilidade do Juiz
Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:
I – assegurar às partes igualdade de tratamento;
II – velar pela rápida solução do litígio;
III – prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da Justiça;
IV – tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)
Com o advento do novo CPC 2015, o legislador aumentou sobremaneira os poderes do juiz, doravante as modificações são muito mais textuais do que normativas. Vale salientar que o Artigo 125 da lei revogada continha uma quantidade pequena de incisos, apenas quatro, ademais, o que menciona o inciso VIII do Artigo. 139 estava, anteriormente, no Artigo 342 do CPC/1973. Já o que está no inciso X já constava do artigo 7° da Lei de Ação Civil Pública. Dessa forma, os outros incisos do artigo 139, (IV, VI, VII e IX), são novidades trazidas pelo legislador que merecem ser apreciadas.
CPC 2015
CAPÍTULO I
Dos Poderes, dos Deveres e da responsabilidade do Juiz
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
I – assegurar às partes igualdade de tratamento;
II – velar pela duração razoável do processo;
III – prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias;
IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;
V – promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais;
VI – dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito;
VII – exercer o poder de polícia, requisitando, quando necessário, força policial, além da segurança interna dos fóruns e tribunais;
VIII – determinar, a qualquer tempo, o comparecimento pessoal das partes, para inquiri-las sobre os fatos da causa, hipótese em que não incidirá a pena de confesso;
IX – determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais;
X – quando se deparar com diversas demandas individuais repetitivas, oficiar o Ministério Público, a Defensoria Pública e, na medida do possível, outros legitimados a que se referem o art. 5o da Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985, e o art. 82 da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, para, se for o caso, promover a propositura da ação coletiva respectiva.
Parágrafo único. A dilação de prazos prevista no inciso VI somente pode ser determinada antes de encerrado o prazo regular.
Contudo, muito mais do que novas regras e princípios trazidos nesse novo CPC, esperamos a mudança cultural e os novos incisos precisam sair do papel, como enunciamos sua importância nos primeiros comentários no programa abaixo e na qual ainda retornaremos a matéria.
CONCLUSÃO
O que se tem com o novo Código é uma legislação equilibrada, que não dá primazia nem aos juízes nem aos advogados ou a qualquer outro participante do processo. [5] Na verdade, o novo CPC é o “código do jurisdicionado”. E não poderia mesmo ser de outro modo. Afinal, um sistema processual não pode ser construído nem para juízes nem para advogados (ou promotores, ou serventuários, ou quaisquer outros profissionais que atuam no processo). No Estado Democrático de Direito, um sistema processual não pode senão ser pensado em favor dos jurisdicionados. O Estado Democrático brasileiro exige um processo civil democrático. Um processo civil que seja construído para os jurisdicionados, que somos todos nós. Através de um processo cooperativo (artigo 6º), que se desenvolve com observância de um contraditório prévio (artigo 9º) e efetivo (artigo 10), com todos os sujeitos nele atuando de boa-fé (artigo 5º), sendo tratados de forma isonômica (artigo 7º), no qual se observe a primazia do mérito (artigo 4º) e se produzam decisões verdadeiramente fundamentadas (artigo 11), ter-se-á respeitado o que consta do artigo 1º do novo CPC, e que nada mais é do que a reafirmação do que está à base do modelo constitucional de processo civil brasileiro: o devido processo constitucional.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
Cassio Scarpinella Bueno Novo Código de Processo Civil Anotado 3ª Ed. 2017
Poderes e atribuições do juiz, Eduardo Chemale Selistre Peña. São Paulo: Saraiva, 2014.
(MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Prova. 2. Ed. São Paulo: RT, 2011. P. 396).