OS SUJEITOS DO PROCESSO NO NOVO CPC
Luiz Fernando Valladão Nogueira
A lide[1] se caracteriza como é sabido, pela resistência a uma pretensão manifestada por alguém que quer obter o que entende ser-lhe devido. Isso importa dizer que, em virtude da não obtenção do bem de vida almejado, exatamente pela oposição manifestada por aquele que poderia consentir, o prejudicado irá a juízo. Em outras palavras, o insucesso da via consensual o levará a requerer a intervenção do Estado-Juiz.
Pois bem, uma vez instaurada a relação processual válida, fatalmente, como regra geral, o juízo decidirá sobre a lide específica, definindo se o bem de vida deve ser concedido, ou não, ao demandante.
Ora, a paz social, objetivo maior do Judiciário, recomenda que os conflitos sejam solucionados, e em definitivo. Para que tal objetivo seja alcançado, o interessado deverá, pelo princípio dispositivo, instar o Judiciário por meio da petição inicial. De outro lado, o juízo haverá de, até mesmo em decorrência do princípio do impulso oficial, conduzir o conflito a uma solução, desatando o mérito da lide.
O ideal é que todo processo alcance uma solução de mérito (princípio da primazia do mérito), pela qual o juiz deliberará sobre o caso concreto e contribuirá para a construção da paz social. Por falar nisso, o Código Processual de 2015 apregoa que “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa” (art. 4º). Como consequência, as decisões que extinguem o processo sem resolução de mérito (arts. 4º, 6º, 317 e 488 NCPC) devem ser encaradas como exceções, e só devem ser proferidas quando for impossível a correção do defeito que impede a válida formação da relação processual.
Com efeito, considerando que o pronunciamento judicial que deixa de resolver o mérito não impede, a rigor, a repetição da ação (art. 486 NCPC)[2], pode-se dizer que decisão deste naipe, longe de pacificar e contribuir para a construção da paz social, é verdadeira causa de instigação à perpetuação da lide.
Não seria abusado dizer, pois, que o juízo deve ter verdadeira obsessão pela prolação de sentença de mérito, único meio pelo qual, decididamente, estará trazendo uma pacificação.
Aliás, como já assinalado alhures, o novo Código Processual, em boa hora, inovou e estimulou essa procura pelo mérito.
De fato, por exemplo, o juiz, doravante, assim como já fazia com relação às nulidades (art. 249 § 2º CPC/73 e art. 282 § 2º NCPC), deverá decidir o mérito de imediato, caso possa fazê-lo em prol daquele que seria beneficiado com a extinção do processo sem resolução de mérito (art. 488 NCPC)[3]. Ou seja, o magistrado ignora o vício processual e, se possível, avança para o mérito, resolvendo a lide de uma vez por todas.
Na mesma toada, o novo Código impôs ao juiz, antes de encerrar o processo sem resolução de mérito, que oportunize à parte a correção do vício, caso isto seja possível (art. 317 NCPC)[4]. O mesmo critério é adotado quando do juízo de admissibilidade recursal (par. único art. 932 NCPC)[5], ou seja, o órgão julgador deve, prioritária e obcecadamente, conhecer e examinar o mérito recursal.
E é importante dizer que esta pacificação interessa às partes, ao Estado e à sociedade!
Sim, às partes, porque a decisão de mérito, de um jeito ou de outro, estará resolvendo o conflito. E, ao resolver o conflito, trará um norte a ser seguido pelos que então litigavam, até porque – diz o Código de Processo Civil – a decisão de mérito, depois de passada em julgado, tem “força de lei” (art. 503 NCPC).
Ora, numa ação possessória, por exemplo, a definição por decisão de mérito acerca de quem ficará com a posse do bem permite com que as partes se posicionem dali em diante. Aquele que sucumbir se verá na obrigação de respeitar a posse do outro, e poderá, doravante, reposicionar-se sobre seus projetos, inclusive investindo em outra localidade, etc.
A decisão de mérito, no exemplo apresentado, trará além do dado objetivo de regramento do conflito, uma sensação subjetiva de segurança e paz social, pois os litigantes não se verão mais estimulados a disputar sobre a posse do bem e deverão se comportar em posição de respeito ao que foi deliberado.
Interessa a pacificação, por meio de decisão de mérito, também ao Estado, pois a solução de um conflito pelo Poder Judiciário significará o verdadeiro funcionamento da regra constitucional de divisão dos Poderes (art. 2º CF – “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário“). Sim, na medida em que o Legislativo estabelece regras abstratas de comportamento, impõe-se ao Judiciário aplicá-las ao caso concreto, sendo que eventual omissão deste poderá causar instabilidade social, exatamente em virtude dos desdobramentos que um permanente estado de beligerância entre as partes pode ocasionar. Ao Estado não interessa a manutenção de instabilidades sociais, em maior ou menor extensão, pois atraem inseguranças jurídicas e conflitos de toda ordem, além de afugentar a instalação de investimentos e riquezas no país.
Em assim sendo, no exemplo aqui trabalhado, é importante ao Estado que a posse seja definida, ou seja, se ficará com o autor ou com o réu, para que se instaure o equilíbrio.
Também interessa à sociedade o atingimento de uma decisão de mérito, porquanto todos precisam que o regramento sobre aquela situação concreta (lide) seja definido. De fato, as pessoas precisam saber como se comportarão em face das partes e do bem de vida disputado, o que só será possível com a definição pelo Judiciário.
A partir do exemplo da ação possessória, pode-se dizer que terceiros precisam saber com quem negociarão o arrendamento ou a compra e venda do imóvel em disputa; os empregados de autor e réu precisam de uma definição, para que possam conjecturar com o tempo em que continuarão laborando; o próprio Poder Público, sob a ótica tributária, quer saber sobre quem fará acontecer o lançamento tributário, etc.
O norte é a paz social, por meio da definição de mérito pelo Estado-Juiz, isto se as partes não alcançarem-na por meio da autocomposição. É que os conflitos podem ser pacificados antes mesmo da decisão de mérito pelo Poder Judiciário, através de uma autocomposição, a qual, inclusive, tem o condão de gerar aceitação pelas partes quanto ao resultado, eis que este é fruto do acertamento implementado por elas próprias.
Exatamente por isso que o novo Código diz que “o Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos” (art. 3º § 2º). E mais: “A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial” (art. 3º § 3º).
Doravante, aquele que, ao interpretar determinada norma jurídica, assim o fizer com abstração da prioridade dada à efetiva solução da lide, descumpre eixo central – de origem legal e principiológica -, contido no novo Código Processual. Acaba, em última análise, por ignorar a garantia constitucional que “assegura a razoável duração do processo” (art. 5º inc. LXXVIII CF).
Os sujeitos do processo. O novo Código de Processo Civil. Pontuações legais e comportamentais.
Se for verdade ser a paz social o objetivo a alcançar-se, não menos certo que o processo é o instrumento para tanto. E do processo participam atores, denominados pelo diploma processual como sujeitos.
O Código de Processo Civil, ao tratar da forma dos atos processuais, refere-se aos praticados pelas partes (arts. 200 a 202 NCPC), pelo juiz (arts. 203 a 205 NCPC), pelo escrivão ou chefe de secretaria (arts. 206 a 211 NCPC). Demais disso, o Código trata como “sujeitos do processo” as partes, os advogados, os terceiros que intervêm no processo, o juiz e os auxiliares da justiça, o Ministério Público, a advocacia e a Defensoria Públicas (arts. 70 a 187 NCPC).
O magistrado, como representante do Estado-Juiz no equacionamento da lide, é quem dirige o processo. Espera-se, no exercício dessa condução, que ele venha a “assegurar às partes igualdade de tratamento” (art. 139 I NCPC), devendo, para tanto, ser imparcial. Essa imparcialidade traz, implicitamente, a ideia de que o magistrado possui atributos que lhe permitam “cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício” (art. 35 I lei complementar 35/79). A quebra da imparcialidade pode gerar suspeição ou impedimento do Juiz (arts. 144 a 148 NCPC), arguições que, uma vez apresentadas, pretendem afastar o magistrado parcial da condução do processo.
O promotor de Justiça, como integrante do Ministério Público, sabe que deve estar atento “à defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (art. 1º da lei complementar 8625/93)[6]. Se o norte de sua atuação não é proteger interesses particulares disponíveis, deve, mesmo quando autor de ação, ser imparcial na sua conduta[7]. Irá, em certas situações, requerer como parte, mas sem interesse próprio ou em defesa de direitos de terceiros disponíveis[8]. Também aí a imparcialidade, se quebrada, ensejará a arguição de suspeição ou impedimento, na forma do art. 148 I NCPC.
O advogado representa a parte em juízo (art. 103 NCPC)[9], devendo, para tanto, estar inscrito regularmente na Ordem dos Advogados do Brasil. Por representar aquele que está em conflito, o advogado, no processo judicial, “contribui, na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador” (art. 2º § 2º lei 8906/94). Então, ele é parcial! Essa parcialidade faz com que o advogado leve suas argumentações fáticas e jurídicas ao processo, sendo que encontrarão resistência em outras apresentadas pelo colega adversário, tudo isso para que o Juiz, a partir do choque de proposições, possa fazer escolhas e equacionar a lide. Não é por serem parciais que os advogados estão isentos de formular pretensões com fundamentação lógica e de cumprir as decisões e não embaraçá-las (art. 77 e incisos NCPC[10]). Eles respondem pelos abusos, não perante os Juízes que conduzem os processos em que atuam (§ 6º art. 77 NCPC[11]), mas sim no âmbito da OAB e/ou corregedorias, estas últimas para infrações praticadas por advogados públicos.
As partes é que vão a juízo, representadas pelos advogados, defender seus interesses. São, obviamente, parciais. Mas se sujeitam aos deveres de lealdade e cooperação, sob pena, nos casos de manifestação desses abusos, de responderem com multas e mesmo sanções penais, ex vi dos arts. 77 e 80 NCPC.
Ao que se veem, os sujeitos de um processo judicial têm características próprias, estando cada um deles atento às finalidades de sua atuação no litígio submetido ao Poder Judiciário.
Dessa forma, o advogado será ético, mas parcial, assim levando ao processo versões fáticas e proposições jurídicas que interessarem ao cliente; o promotor de Justiça vigiará os interesses que justificaram sua intervenção no processo, como é o caso de conflitos que envolvam menores ou incapazes; o juiz observará a imparcialidade, devendo analisar de forma equidistante todas as versões para proferir a decisão; as partes – aquelas que manifestam seus pleitos à Justiça – depositam todas as suas esperanças no processo, até porque foram incapazes de resolver amigavelmente o conflito.
Porém, não é surpresa para ninguém a existência de advogados que estimulam os conflitos. Da mesma forma, há casos em que os Promotores de Justiça ignoram suas responsabilidades e deixam de defender o interesse público, apegando-se a objetivos menos nobres. Existem juízes que, por simpatia com a parte ou com o advogado, proferem decisões ou conduzem o processo de maneira parcial. E há partes que, além de incapazes de resolver extrajudicialmente a querela, vão a juízo apenas por espírito de vingança ou provocação. Tais situações são exceções, mas existem.
À vista disso, o novo Código de Processo Civil (lei 13.105/15), ao menos no plano teórico e abstrato, contribui para o aperfeiçoamento ético dos sujeitos no processo judicial. A começar pela adoção expressa de princípios como o da boa-fé processual[12], do que impõe isonomia entre as partes[13] e o de cooperação entre os sujeitos do processo[14], dentre outros tantos.
Perpassando os limites principiológicos, o novo Código tratou de exigir que o juiz se aproxime das partes e dos advogados para que apure e esclareça, sem armadilhas, quais fatos serão trazidos ao campo probatório e, da mesma forma, quais fundamentos jurídicos serão reputados como relevantes para a decisão. Tudo claro e sem surpresas, até mesmo porque o Código exige que as decisões sejam efetivamente fundamentadas, sem a aplicação de manifestações padronizadas e que sirvam para qualquer caso[15]. Com efeito, ao tratar do saneamento do processo, diz o novo Código, em seu artigo 357 § 3º, que, “se a causa apresentar complexidade em matéria de fato ou de direito, deverá o juiz designar audiência para que o saneamento seja feito em cooperação com as partes, oportunidade em que o juiz, se for o caso, convidará as partes a integrar ou esclarecer suas alegações“.
As relações entre os sujeitos do processo – ou seja, seres humanos comunicativos – criam amizades, simpatias e antipatias. Porém, o código traçou limites objetivos e subjetivos quando encarou tais relações em face do processo judicial. Nessa linha de raciocínio, o juiz será literalmente impedido de julgar o processo em que figure como parte o cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente de até terceiro grau, mesmo que naquele caso específico esteja representado por outro advogado do escritório. Em tempos de maior cobrança ética, é providencial a nova regra. Sim, estará impedido o juiz de funcionar no processo, em que “figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório” (Art. 144 inc. VIII NCPC).
Por sua vez, o perito a ser nomeado – será observado o critério da equitatividade pelo juiz – não precisará ter em seu currículo uma filiação ilustre, devendo apenas estar legalmente habilitado e constar no cadastro público (arts. 156 e §s e 157 §2º NCPC[16] – conferir resolução CNJ 233/2016).
Já os advogados terão que trabalhar não pela protelação do processo, mas pela conciliação – agora, com o auxílio da chamada mediação. Ou seja, os alentados preliminares trabalhadas pelos advogados não terão o condão mais de provocar o efeito de atrasar o processo ou a solução da lide. O profissional da advocacia deve preferir, até por visão prática, intensificar sua atuação técnica com foco nas alegações de mérito.
Com efeito, o legislador repugna o louvor às formalidades e às nulidades desnecessárias. Eis o porquê da adoção do chamado “princípio da primazia do mérito”, segundo o qual se deve aproveitar ao máximo os atos já praticados. Aliás, isso faz todo sentido, pois a paz social não se obtém apenas com a conciliação, mas com a definição do juízo sobre o mérito em discussão.
A eternização dos conflitos judiciais – sobretudo com os desnecessários debates sobre solenidades e formas – traz insegurança aos litigantes e àqueles que estão ao seu redor, além de acarretar perda de credibilidade do Estado-Juiz.
De outro lado, deve-se insistir com a assertiva de que o diálogo entre os sujeitos do processo é ponto forte no novo Código.
A propósito, o advogado terá que se comunicar mais com os clientes. Por exemplo, mesmo as intimações para o cumprimento de obrigações pessoais de fazer ou não fazer – sob pena de multa – ocorrerão na pessoa do profissional da advocacia. Com efeito, o art. 513 § 2º NCPC trata, de forma genérica, acerca do cumprimento de sentença, tendo consignado que, a priori, a comunicação ao devedor será por intimação, pelo Diário da Justiça, na pessoa do seu advogado constituído nos autos (inc. I). A partir daí, se não cumprida a obrigação, já incidirá a multa eventualmente fixada pelo juiz (art. 537 § 4º NCPC). Aquela disposição legal genérica (intimação destinada ao advogado) aplica-se ao cumprimento de obrigação de fazer e não fazer, eis que não foi erigida qualquer exceção nos artigos específicos (arts. 536 e 537 NCPC). O resultado prático disso, além de celeridade e efetividade processuais, é a superação da súmula 410 STJ[17] e a exigência de efetiva e documentada comunicação entre advogado e cliente.
Aliás, o advogado será responsável por comunicar às testemunhas de seu cliente sobre a necessidade de comparecimento à audiência. Sim, a regra geral, doravante, é a de que “cabe ao advogado da parte informar ou intimar a testemunha por ele arrolada do dia, da hora e do local da audiência designada, dispensando-se a intimação do juízo” (art. 455 NCPC).
Tudo está a revelar que o legislador quer um processo mais dinâmico e que se mova pelo paradigma da confiança, mesmo que haja um latente conflito entre os litigantes. Os sujeitos do processo deverão mostrar-se confiáveis, a fim de que os atos processuais transmitam segurança.
Não por outra razão, que o art. 6º do novo Código Processual, quase poeticamente, estabeleceu que “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”. Mais adiante, de forma mais pragmática, o legislador adverte que o juiz, o advogado público, o promotor de Justiça e o defensor público responderão civilmente quando, no exercício de suas funções, agirem com dolo ou fraude (arts. 143, 181, 184 e 187 NCPC).
Demais disso, o art. 235[18] estabelece a imposição de sanções administrativas ao juiz que extrapolar os prazos, sendo que, se a inércia for mantida, os autos do processo serão remetidos ao seu substituto legal para que, em última análise, os jurisdicionados não fiquem com os prejuízos. Em outras palavras, o magistrado deve estar com o seu serviço em dia, até para que não sobrecarregue, injustamente, o seu colega (“o substituto legal”).
Enfim, os sujeitos do processo serão cobrados, para que suas atuações tenham em mira o rápido atingimento do mérito pelo Judiciário.
O enfoque dado pelo novo Código de Ética da OAB.
No tocante à advocacia – principal razão da produção do presente trabalho coletivo -, cabe inserir, no contexto normativo aqui já estudado, o novo Código de Ética da OAB.
Aqui foi dito ser o diálogo, assim como a busca pela paz social, pontos relevantes do processo.
Quanto à paz social, reafirme-se que o novo Código Processual impõe ao advogado desapego às querelas meramente formais e que podem procrastinar a solução do litígio. Isso porque – repita-se – enquanto não houver decisão de mérito, persistirá o conflito e distanciar-se-á a paz. E – volta-se a dizer – todos os sujeitos do processo deverão estar comprometidos com a paz social.
Demais disso, o advogado deve ser independente da estratégia processual, sempre, um pacificador. Por isso mesmo o Código de Ética em apreço dispõe que o advogado deve “estimular, a qualquer tempo, a conciliação e a mediação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios” (art. 2º par. único inc. VI).
Esse espírito conciliatório exige do profissional da advocacia um exercício permanente de separação da sua atuação em face dos problemas vividos pelo cliente.
A solução consensual de determinado conflito é motivo de aplausos ao advogado, pois, se alcançada efetivamente, significará verdadeiro êxito do profissional. Em situações tais, ele terá ajudado na obtenção da referida solução, e esta consensualidade permitirá, de forma rápida e menos traumática para o próprio cliente, a implementação da paz. Mas o advogado só terá atuação positiva na busca do consenso, caso consiga, valendo-se daquela separação aqui afirmada, mostrar ao cliente que o término do conflito supera mágoas e alguns prejuízos. É preciso nesse mister que o advogado seja – sem perder o vínculo da fidúcia com o cliente – efetivamente equilibrado e sensato.
O diálogo, notadamente com o cliente, é, agora, uma exigência, até de índole prática e ética. Sim, com tantas responsabilidades trazidas pelo novo Código Processual – algumas delas exemplificadas alhures – passa a ser, quando nada precavido, o advogado que se comunica, cada vez mais, com o cliente.
Ora, a responsabilização, inclusive a título indenizatório, passa a ser um risco do advogado que, por exemplo, esquece-se de avisar às testemunhas sobre a audiência ou de comunicar ao cliente que ele deve cumprir uma obrigação imposta pelo juiz, sob pena de multa diária. E a precaução avança no sentido de que é conveniente que o advogado faça tudo por escrito, tomando ciência do cliente sobre suas comunicações. Assim, ele evitará situações indesejadas em que, a despeito de ter se comunicado verbalmente, depara-se com cliente de má-fé, o qual se vale de falta de prova documental acerca da comunicação para obter vantagem indevida.
Aliás, se o advogado percebe ser o cliente não merecedor de confiança, o melhor a fazer é seguir o roteiro abaixo, disciplinado pelo art. 10 do Código de Ética:
Art. 10. As relações entre advogado e cliente baseiam-se na confiança recíproca. Sentindo o advogado que essa confiança lhe falta, é recomendável que externe ao cliente sua impressão e, não se dissipando as dúvidas existentes, promova, em seguida, o substabelecimento do mandato ou a ele renuncie.
A modernidade e a rapidez trazida pelas comunicações virtuais são extremamente positivas. Porém, ninguém mais experiente que o advogado para saber que os registros acerca do que foi feito e combinado, no curso da relação profissional, são garantidores e podem vaciná-lo contra a maledicência humana.
Novos regramentos exigem novos hábitos. Conclusão.
Ao final de uma leitura de tantas regras e princípios, fica a impressão de que ingressamos em novos e valiosos tempos. Entretanto, a pergunta que fica é: teremos mesmo justiça célere, ética, isenta e de qualidade?
Penso que, se quisermos – todos nós, os sujeitos do processo – alcançar esse referencial, o caminho estará na mudança de mentalidade. Se os impulsos e sanções previstos no Código não se alinharem a uma mudança de valores, o resultado positivo será meramente ilusório.
Ora, de nada adianta a decantada primazia do mérito se aqueles que atuarão tecnicamente nos processos não se qualificarem. Já que os sujeitos do processo terão que dialogar abertamente, é preciso que tenham conteúdo. Daí já surge três medidas urgentes: diminuição do número de faculdades de Direito desqualificadas e mercantilizadas; melhora na qualidade do exame da OAB; imposição de obrigatória qualificação permanente aos que exercem cargos públicos nas carreiras jurídicas.
De nada adianta, também, a provocação legal à conciliação se os advogados não compreenderem que devem estar sempre equilibrados e em busca da paz social. A parcialidade do advogado pode sim fazê-lo aguerrido, mas nunca levá-lo a perder o foco. As manifestações processuais, conforme for o estilo adotado, podem estimular ou inviabilizar eventual e futuro acordo entre as partes. Nessa toada é de dizer-se que, por mais beligerante que seja a situação, as peças produzidas no curso do processo devem refletir o estilo parcimonioso, marca indispensável mesmo do advogado ético!
Em igual sentido, é inviável a tentativa de conciliação se juízes ou promotores lançarem manifestações agressivas nos autos em detrimento de algum dos litigantes ou de seus patronos. Aliás, a caneta das referidas autoridades pode até ser pesada, mas deve ser técnica e sempre atenta ao princípio da dignidade humana.
O avanço passa também pela mudança de postura das próprias partes. Sim, o litigante deve ir à Justiça para pedir o razoável, mas nunca o absurdo. Também não deve buscar a vitória a qualquer preço, pois o que mais se precisa no país, no momento atual, é de resultados pacificadores e definitivos, não de soluções meramente formais e que, no fundo, causem desconfianças e descréditos.
Ao reverso disso e estimulados pelas provocações do novo Código Processual, os atores dos processos judiciais devem compreender o outro, agir sempre dentro do razoável e com considerações técnicas e bem-elaboradas.
https://www.migalhas.com.br/depeso/271931/os-sujeitos-do-processo-no-novo-cpc
[1] “Lide ou litígio é um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida ou insatisfeita. Esse conflito de interesses verifica-se quando o titular da pretensão, ao tentar obter do outro sujeito da relação jurídica (o obrigado) a prestação devida, encontra resistência ou não logra êxito no seu objetivo. Tal ocorrendo, surge, para o titular da pretensão, o interesse de agir.” (MEDINA, Paulo Roberto de Gouvêa Medina. Teoria Geral do Processo. Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 2012. p. 26).
[2] Art. 486. O pronunciamento judicial que não resolve o mérito não obsta a que a parte proponha de novo a ação.
[3] Art. 488. Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485.
[4] Art. 317. Antes de proferir decisão sem resolução de mérito, o juiz deverá conceder à parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício.
[5] Art. 932 – Parágrafo único. Antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível.
[6] No mesmo sentido, o art. 176 NCPC: “O Ministério Público atuará na defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses e direitos sociais e individuais indisponíveis”.
[7] [.] admite-se a exceção, tendo em vista que o órgão do Ministério Público, atuando como parte ou como fiscal da lei, deve agir com imparcialidade. Defende, afinal, interesse que não lhe é próprio ou particular, mas de toda a sociedade, razão pela qual a vinculação de suas atitudes à correta aplicação da lei ao caso concreto é não somente desejável, como exigível. Por isso, a parte interessada pode buscar o afastamento do promotor valendo-se, para tanto, das msmas razões que a lei prevê para o magistrado (art. 258 c/c arts. 252 e 254, CPP). (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. Rio de Janeiro: Forense. 2015. Pg. 288).
[8] Interessante a reflexão doutrinária, no âmbito do processo penal: [.] ocupa, no processo penal, o Ministério Público a posição de sujeito da relação processual, ao lado do juiz e do acusado, além de ser também parte, pois defende interesse do Estado, que é a efetivação de seu direito de punir o criminoso. Embora, atualmente, não lhe seja mais possível negar o caráter de parte imparcial . não deixa de estar vinculado ao polo ativo da demanda, possuindo pretensões contrapostas, na maior parte das vezes, ao interesse da parte contrária, que é o réu, figurando no polo passivo. [.] Sua caracterização como imparcial não tem outra finalidade senão “agregar uma maior credibilidade à tese acusatória [.]” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado – São Paulo: Revista dos Tribunais – 11ª Edição – 2012 – pg. 582).
[9] Art. 103. A parte será representada em juízo por advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil.
Parágrafo único. É lícito à parte postular em causa própria quando tiver habilitação legal.
[10] Art. 103. A parte será representada em juízo por advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil.
Parágrafo único. É lícito à parte postular em causa própria quando tiver habilitação legal.
10 Art. 77. Além de outros previstos neste Código, são deveres das partes, de seus procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo:
I – expor os fatos em juízo conforme a verdade;
II – não formular pretensão ou de apresentar defesa quando cientes de que são destituídas de fundamento;
III – não produzir provas e não praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou à defesa do direito;
IV – cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais, de natureza provisória ou final, e não criar embaraços à sua efetivação;
V – declinar, no primeiro momento que lhes couber falar nos autos, o endereço residencial ou profissional onde receberão intimações, atualizando essa informação sempre que ocorrer qualquer modificação temporária ou definitiva;
VI – não praticar inovação ilegal no estado de fato de bem ou direito litigioso.
[11] § 6º Aos advogados públicos ou privados e aos membros da Defensoria Pública e do Ministério Público não se aplica o disposto nos §§ 2º a 5º, devendo eventual responsabilidade disciplinar ser apurada pelo respectivo órgão de classe ou corregedoria, ao qual o juiz oficiará.
[12] Art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.
[13] Art. 7º É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório
[14] Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.
[15] rt. 489 § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
[16]Art. 156. O juiz será assistido por perito quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico.
1º Os peritos serão nomeados entre os profissionais legalmente habilitados e os órgãos técnicos ou científicos devidamente inscritos em cadastro mantido pelo tribunal ao qual o juiz está vinculado.
2º Para formação do cadastro, os tribunais devem realizar consulta pública, por meio de divulgação na rede mundial de computadores ou em jornais de grande circulação, além de consulta direta a universidades, a conselhos de classe, ao Ministério Público, à Defensoria Pública e à Ordem dos Advogados do Brasil, para a indicação de profissionais ou de órgãos técnicos interessados.
3º Os tribunais realizarão avaliações e reavaliações periódicas para manutenção do cadastro, considerando a formação profissional, a atualização do conhecimento e a experiência dos peritos interessados.
4º Para verificação de eventual impedimento ou motivo de suspeição, nos termos dosarts. 148 e 467, o órgão técnico ou científico nomeado para realização da perícia informará ao juiz os nomes e os dados de qualificação dos profissionais que participarão da atividade.
5º Na localidade onde não houver inscrito no cadastro disponibilizado pelo tribunal, a nomeação do perito é de livre escolha pelo juiz e deverá recair sobre profissional ou órgão técnico ou científico comprovadamente detentor do conhecimento necessário à realização da perícia.
Art. 157 § 2º – Será organizada lista de peritos na vara ou na secretaria, com disponibilização dos documentos exigidos para habilitação à consulta de interessados, para que a nomeação seja distribuída de modo equitativo, observadas a capacidade técnica e a área de conhecimento.
[17] Súmula 410/STJ: “A prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”.
[18] Art. 235. Qualquer parte, o Ministério Público ou a Defensoria Pública poderá representar ao corregedor do tribunal ou ao Conselho Nacional de Justiça contra juiz ou relator que injustificadamente exceder os prazos previstos em lei, regulamento ou regimento interno.
1º Distribuída a representação ao órgão competente e ouvido previamente o juiz, não sendo caso de arquivamento liminar, será instaurado procedimento para apuração da responsabilidade, com intimação do representado por meio eletrônico para, querendo, apresentar justificativa no prazo de 15 (quinze) dias.
2º Sem prejuízo das sanções administrativas cabíveis, em até 48 (quarenta e oito) horas após a apresentação ou não da justificativa de que trata o § 1o, se for o caso, o corregedor do tribunal ou o relator no Conselho Nacional de Justiça determinará a intimação do representado por meio eletrônico para que, em 10 (dez) dias, pratique o ato.
3º Mantida a inércia, os autos serão remetidos ao substituto legal do juiz ou do relator contra o qual se representou para decisão em 10 (dez) dias.