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ORGANIZAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DAS FUNDAÇÕES

 Natan Rodrigues

 

 

Conceito e Criação da Fundação

As fundações, segundo Carlos Roberto Gonçalves consistem em um acervo de bens, que recebe personalidade jurídica para realização de fins determinados, de interesse público de modo permanente e estável. Dessa forma, pode considerar este ente como uma instituição caracterizada como pessoa jurídica onde define suas operações através de seu estatuto.

Outro ponto importante para seu conceito é que a fundação pode ser constituída por indivíduos, empresas ou pelo poder público onde não há fins lucrativos advindos de suas atividades, elas atuam em benefício da sociedade. Para fins de assistência social, cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico, educação, saúde, segurança alimentar e nutricional, defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável, pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas, modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos, promoção da ética, cidadania, democracia e dos direitos humanos, atividades religiosas, como traz o artigo 62 parágrafo único do Código Civil.

O procedimento para constituição de uma fundação decorre de quatro fases, sendo a primeiro o ato de dotação ou de instituição, onde faz-se a reserva ou destinação de bens livres determinando para que fim servirá a fundação. O segundo ponto é com relação a elaboração do Estatuto, pois, todas as fundações serão regidas por este instrumento que se elabora segundo regras legais, esse Estatuto pode ser direta ou fiduciária, isso com base nos artigos 62 e 65 do Código Civil. O terceiro passo é a aprovação do Estatuto, onde, ele será encaminhado ao Ministério Público Estadual da região para a aprovação, verificando também os dispositivos legais para tal feito. O Ministério Público terá 30 dias para aprovar e indicar necessárias modificações. O último passo a ser feito é o registro da Fundação realizado no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, e só assim a Fundação terá existência legal.

 

Finalidades da Fundação

A fundação deve ter finalidade lícita, sob pena de não ser aprovado o seu estatuto, nem poder ser registrada no cartório de registro civil das pessoas jurídicas. Do mesmo modo, tornando-se ilícitos os seus fins, devendo assim ser extinta.

O Código Civil de 2002 estabelecia, no parágrafo único do artigo 62, que a fundação somente poderia ser constituída para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência, trazendo este rol apenas de forma exemplificativa, uma vez que, ela poderia prestar a outras finalidades desde que afastado o caráter lucrativo.

Todavia, a Lei 13.151/15 regulamentou a questão, alterando a letra do Código Civil e ampliando os fins nobres das fundações, nos termos do seu artigo 62:

Art. 62 – A fundação somente poderá constituir-se para fins de:

I – assistência social;

II – cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico;

III – educação;

IV – saúde;

V – segurança alimentar e nutricional;

VI – defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável;

VII – pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas, modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos;

VIII – promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos humanos;

IX – atividades religiosas.

 

Procedimento de instituição da Fundação

Para que seja instituída a fundação, há duas hipóteses: por ato inter vivos, através de escritura pública, com interveniência do Ministério Público, ou causa mortis, vide testamento, sendo também imprescindível a presença do Ministério Público, nos autos de inventário.

O primeiro passo para essa criação é a produção do estatuto, que tem a função de estabelecer as relações entre órgãos da fundação, e as consequências para os beneficiários, tendo esta força de observância obrigatória, ou seja, traz cláusulas normativas que criam regras de obediência dentro da entidade, vinculando a todos, quaisquer que sejam os fatos supervenientes ou circunstanciais à sua execução.

Assim, o processo de criação do contrato, ainda que unilateral, produz regramento de eficácia que conduz à criação da fundação privada, bem como à especificação do modo de administração e respectivo regulamento.

É o estatuto o instrumento contratual de regramento interno, advindo de negócio jurídico unilateral, competindo ao instituidor ou às pessoas encarregadas por ele, o encargo de redigir essa norma, em obediência às linhas estruturais fixadas no negócio jurídico instituidor, podendo ser redigida a mesma pelo Ministério Público, quando não o feito pelo instituidor.

Nessa elaboração, deve-se observar estritamente as determinações do instituidor definidas no negócio de instituição em conformidade com o Código Civil Brasileiro, o Código de Processo Civil e a Lei de Registros Publicos. Consoante a legislação em vigor, o órgão encarregado de velar pelas fundações é o Ministério Público que, em regra, dá a última palavra sobre a possibilidade ou não de se instituir uma fundação.

Aqueles a quem o instituidor cometer a aplicação do patrimônio, nos termos do artigo 65 do Código Civil, em tendo ciência do encargo, formularão logo o estatuto da fundação projetada, submetendo-o, em seguida, à aprovação da autoridade competente, com recurso ao juiz. Não sendo este estatuto elaborado no prazo definido, ou, não havendo prazo, far-se-á o Ministério Público no prazo de cento e oitenta dias.

No ato de instituição, serão observados os requisitos determinados na legislação aplicável, sendo:

A) Patrimônio composto de bens livres no momento da constituição ou da lavratura do testamento;

B) Ato constitutivo da fundação, em regra por escritura pública, se vivo o instituidor, ou ainda, por testamento onde se doa o patrimônio necessário para futura constituiçãoda entidade, por quem de direito;

C) Declaração da finalidade precípua e especifica da fundação;

D) O estatuto ou seu esboço (dispensável em casos de testamento) que conterá:

Denominação, sigla, fins e sede;

Patrimônio e forma de geri-lo;

Modelo de administração, sendo necessária a instituição de um Conselho Curador como autoridade máxima no comando da entidade fundacional;

Rito de eleição dos membros da direção;

Nomeação do representante legal da entidade (geralmente o Diretor Presidente) perante os órgãos públicos, inclusive Poder Judiciário;

Rito para reforma estatutária ou mesmo extinção da entidade fundacional e a consequente destinação de seu patrimônio (para entidades congêneres);

Disposições transitórias.

Após a produção do estatuto, o interessado, por via de petição, encaminhará ao Ministério Público Estadual da sede da instituição, que examinará a regularidade e a viabilidade econômica desta fundação. Se aprovado, este será encaminhado ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas para a sua personalização; se denegado, o Ministério Público determinará as modificações a serem feitas; e, se houver irregularidades insanáveis, este estatuto será reprovado, sem a possibilidade de se modifica-lo sem a análise judicial.

Se o interessado não concordar com as definições do Ministério Público, seja por negar a aprovação do estatuto, seja por não concordar com as modificações por ele propostas, ou ainda por discordar do estatuto elaborado pelo mesmo, quem decidirá sobre estes casos é o juiz, nos termos do Art. 764, I e II do Código de Processo Civil, através da petição de suprimento, devendo esta ser devidamente motivada nos termos do artigo supracitado.

A partir dessa petição, o juiz poderá, nos moldes do Art. 764, § 2º do Código de Processo Civil, antes de suprir a aprovação, definir as modificações necessárias ao estatuto, a fim de adaptá-lo ao objetivo do instituidor, e ainda deferir ou indeferir o mesmo.

O julgamento da ação de suprimento da autorização do Ministério Público é sentença, e dela cabe apelação, no caso da parte não aceitar a decisão, nos termos do artigo 1009 e seguintes do Código de Processo Civil.

Por fim, o Código Civil, em seus artigos destinados a regrar as fundações, traz uma especificidade em seu artigo 63, que acontece quando o valor estipulado para a fundação é insuficiente, os bens a ela destinados serão, se de outro modo não dispuser o instituidor, incorporados em outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante.

 

Alteração Estatutária

Como já sabido a criação de uma fundação se desdobra em várias fases, entre elas, a elaboração do seu estatuto, e neste plano, surge a necessidade da modificação estatutária que é de suma importância para adequar o ente social a uma nova realidade.

Se até mesmo a Constituição Federal é passível de modificação, não há por que um simples estatuto ser inalterável, estando essa possibilidade de alteração está prevista no artigo 67 do Código Civil:

Art. 67. Para que se possa alterar o estatuto da fundação é mister que a reforma:

I – seja deliberada por dois terços dos competentes para gerir e representar a fundação;

II – não contrarie ou desvirtue o fim desta;

III – seja aprovada pelo órgão do Ministério Público, e, caso este a denegue, poderá o juiz supri-la, a requerimento do interessado.

Deste modo, para a alteração se faz necessário aprovação de dois terços dos membros da administração, além disso, diante do Inciso segundo, e de acordo com Carlos Roberto Gonçalves, os fins ou objetivos da fundação não podem, todavia, ser modificados, nem mesmo pela vontade unânime de seus dirigentes. Tendo em vista que somente o instituidor pode especificá-los e sua vontade deve ser respeitada.

Salienta-se ainda a necessidade da aprovação pelo Ministério Público, que deve faze-la no prazo máximo de 45 dias, caso contrário, cabe o interessado recorrer ao juiz.

O artigo 68 do ordenamento civilista, traz ainda a disposição dos direitos da minoria vencida, ou seja, sempre quando houver votação não unânime, a minoria vencida poderá impugnar a votação no prazo de dez dias.

 

Extinção das Fundações

Ensina a doutrina de Carlos Roberto Gonçalves, que o desvirtuamento posterior do que fora registrada a fundação para utilização de fins ilícitos ou nocivos, é causa de dissolução da entidade, incumbindo aos sócios ou ao Ministério Público a iniciativa para que esta venha a se findar.

Para o Código Civil há duas hipóteses de extinção, nos termos do artigo 69 do mencionado diploma, que é quando tornar-se ilícita, nociva, impossível ou de inútil finalidade a fundação, ou ainda quando vencer o prazo de sua existência.

A primeira hipótese pode acontecer quando por exemplo a finalidade antes lícita, em virtude de mudança jurídica, torna-se ilícita, ou ainda, grave e criminoso desvio de finalidade, quanto a impossibilidade, se extrai que pode ocorrer por situação financeira imprevista, uma crise ou má administração. A inutilidade ocorre quando a finalidade, razão da instituição da fundação foi atingido, quanto ao prazo, em regra inexiste, mas o instituidor pode assim determinar.

Também a lei processual civil também traça hipóteses no artigo 765, do CPC, contudo, verifica-se que seus dizeres são praticamente os mesmos, sendo que a finalidade se iguala.

Pois bem, se verificada causa de extinção, o Ministério Público deve intervir, ou qualquer interessado, para promover a extinção da fundação, que ocorrendo, o patrimônio será incorporado a outra fundação com fim semelhante, salvo se diversa disposição contiver o ato constitutivo ou estatuto.

Em caso de inexistência de fundação com fim semelhante, os bens serão dados como vagos e serão encaminhados ao município ou distrito federal, conforme a circunscrição, e para a união em caso de ser situado em território federal, conforme artigo 1228 do CC.

No mais, cabe dizer que eventuais danos causados pelos administradores são responsabilizados pessoalmente, sendo que a ação de responsabilização pode ser proposta pelos outros administradores ou pelo Ministério Público.

Quanto aos aspectos processuais, temos que salientar que somente será extinta a fundação por sentença, sendo que o desdobrar dos autos obedecerá ao procedimento comum da jurisdição voluntária (art. 719 a 725 do CPC).

Quanto a legitimidade ativa, conforme mencionado, esta é de qualquer interessado, inclusive a minoria quanto tratar-se de um grupo de sócios e o Ministério Público (art. 765 do CPC combinado com art. 69, do CC)

Quando a iniciativa processual é pelo Ministério Público, será citado o administrador da fundação e será nomeado curador especial para a fundação, noutro vértice, se a iniciativa se dá pela fundação ou de outro interessado é imprescindível a citação do Parquet para atuar como curador legal.

Proferida sentença, esta deverá determinar a extinção e a destinação dos bens, conforme reger o estatuto e na omissão deste, como dito, segue-se o art. 69 do CC, incorporando o patrimônio a outras fundações de fim igual ou semelhante.

 

Referências

Código Civil Brasileiro, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm/>;

Código de Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015 2018/2015/lei/l13105.htm/>

SILVA, Arcênio Rodrigues. “Fundação de direito privado: Instituição, dotação e estatutos sociais” Disponível em: <http://www.ambitojurídico.com.br/site/index.phpn_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2837/

 

 

 

 

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