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O “DEVER” DE MITIGAR O DANO E O EXERCÍCIO TARDIO DO DIREITO DE AÇÃO EM CONTRATOS BANCÁRIOS EXISTENCIAIS

O “DEVER” DE MITIGAR O DANO E O EXERCÍCIO TARDIO DO DIREITO DE AÇÃO EM CONTRATOS BANCÁRIOS EXISTENCIAIS

Gustavo Obata Trevisan

SUMÁRIO: Introdução. 1 O “Dever” de Mitigar o Dano no Direito Brasileiro. 2 O Exercício Tardio do Direito de Ação nos Contratos Bancários Existenciais. Considerações Finais. Referências Bibliográficas.

                                  

Introdução  

A técnica de legislar por meio de cláusulas gerais, especialmente a consagração expressa da boa-fé objetiva em nosso ordenamento, promoveu uma releitura do conceito de obrigação no Direito brasileiro, possibilitando a percepção da complexidade intraobrigacional [1]. Essa releitura inaugura um novo paradigma para o direito obrigacional, não mais baseado exclusivamente no dogma da vontade, o que contribuiu para a adoção de uma concepção cooperativa de obrigação marcada pela imposição de regras de conduta socialmente adequadas e respeito aos interesses alheios.

A positivação da boa-fé objetiva no direito civil brasileiro tornou possível o alargamento das obrigações, trazendo à tona outros direitos e deveres encerrados no vínculo obrigacional, que visam à preservação dos interesses das partes envolvidas [2], bem como à preservação da confiança que viabiliza o contato social capaz de gerar obrigações, os quais não recebiam a devida atenção sob a égide do viés excessivamente individualista que regia as relações privadas, no âmbito do qual as atenções se voltavam apenas para os deveres principais. É com base nesta concepção de obrigação que o artigo será desenvolvido.

Diante do inadimplemento da prestação numa relação obrigacional, surge o problema de definir a extensão da responsabilidade do devedor. Com o escopo de auxiliar o equacionamento da questão, vem crescendo a utilização do instituto do dever de mitigar o prejuízo em nosso ordenamento. Postula-se que o devedor não responde pelos danos que o credor poderia ter evitado se tivesse adotado medidas razoáveis para contê-lo. Decisões judiciais acabam diminuindo os valores que seriam devidos num primeiro momento, pelo devedor, com base no inadimplemento obrigacional, em decorrência da omissão do credor na adoção de medidas que seriam tidas como razoáveis para minorar os danos.

Paralelamente a este aumento na utilização do instituto, percebe-se que não há uma delimitação clara de seus contornos, de seus fundamentos e de suas consequências. A análise da jurisprudência aponta uma falta de sistematicidade na utilização da figura. Por essa razão, é necessário que haja um esforço doutrinário para compreender a operatividade do duty to mitigate the loss e os critérios para sua adequada concreção, na medida em que sua abertura semântica exige a aplicação desta técnica, em lugar da lógica subsuntiva.

Inúmeras são as situações em que o instituto pode ser aplicado, as quais abarcam a responsabilidade contratual e a extracontratual. O estudo que ora se apresenta tem como objeto um grupo de casos específico: aquele em que o credor, diante do inadimplemento, demora a exercer sua pretensão, o que culmina no incremento substancial da dívida em virtude dos encargos moratórios. Dentro do grupo, será utilizado o contrato bancário existencial, à medida que florescem na doutrina e na jurisprudência exemplos da aplicação do instituto nesse âmbito. O raciocínio jurídico no grupo apontado demanda um maior aprofundamento.

O estudo partiu da observação de um número cada vez maior de decisões judiciais que aplicam o instituto aos contratos bancários. Constatou-se a existência de decisões diametralmente opostas que ora aplicam-no, ora o afastam. Na tentativa de contribuir para a tarefa outorgada à doutrina [3], de controle das decisões em que o julgador é chamado a preencher valorativamente o conteúdo de determinada norma aberta (norma de mitigação) [4], busca-se apresentar balizas para concreção extraídas de revisão bibliográfica sobre o tema; posteriormente analisa-se a jurisprudência atual em torno do grupo, o que demonstra a necessidade de insistir na matéria, na medida em que equívocos estão sendo repetidos; e, por fim, indica-se o caminho que se reputa adequado, para que haja uma estabilização do grupo, preservando-se as especificidades interpretativas requeridas em campos diversos, quais sejam o empresarial, o consumerista e o das relações privadas paritárias.

1 O “Dever” de Mitigar o Dano no Direito Brasileiro         

Concebido originalmente nos sistemas da common law, o dever de mitigar o prejuízo alcançou sistemas vinculados à família romano-germânica. A recepção do conceito se deu de maneira desigual e assistemática, conforme leciona Vera Fradera [5], que aponta sua utilização frequente pelo ordenamento alemão e pelo ordenamento suíço, ressaltando também a existência de sistemas que o aplicam sem usar a denominação ordinariamente adotada, como é o caso da França.

Necessário mencionarmos a presença daquele em convenções internacionais, o que demonstra sua relevância e crescente utilização como padrão de conduta a ser observado no seio obrigacional. Neste sentido, tem-se a Convenção de Viena de 1980 sobre Venda Internacional de Mercadoria (CISG) [6], que traz em seu art. 77 o dever da parte que invoca a quebra do contrato de tomar as medidas razoáveis para limitar a perda, nela compreendido o prejuízo resultante da quebra, sob pena de ver excluído de suas perdas e danos o montante da perda que poderia ter sido diminuído. Os Princípios Unidroit relativos aos contratos de comércio internacional também preceituam um dever do credor de atenuar o prejuízo em seu artigo 7.4.8, evitando que seja indenizado por um prejuízo que ele poderia evitar ou limitar, sob a justificativa de que se não se pode impor a parte que já sofreu as consequências da inexecução do contrato tomar medidas que exijam dispêndio de tempo e dinheiro, também não se afigura razoável, do ponto de vista econômico, deixar aumentar um dano que medidas razoáveis permitiriam reduzir. O Código europeu de contratos reproduz o texto do artigo 7.4.8 dos Princípios Unidroit.

Como constatado, o instituto analisado vem sendo cada vez mais utilizado no cenário internacional. Nosso ordenamento não ficou imune a essa evolução. Nossos Tribunais invocam-no como fundamento decisório quando são chamados a definir a extensão da responsabilidade decorrente do inadimplemento contratual, no âmbito de uma relação obrigacional complexa.

O dever do credor de mitigar os danos decorrentes do inadimplemento não recebeu, ainda, tratamento específico pelo legislador brasileiro. Contudo, vem sendo aceito e utilizado como um desdobramento da boa-fé objetiva consagrada no art. 422 do CC [7]. Na medida em que aquele dever impõe uma restrição no direito do credor à indenização que lhe seria devida, é preciso que haja um esforço para fixação de balizas aptas a nortear a sua concretização e aplicação, no sentido de fornecer uma colaboração para que as decisões tenham um parâmetro seguro, evitando-se que estas projetem uma insegurança no seio das relações contratuais entabuladas, quanto à existência, ao dimensionamento e à extensão dos direitos, procedendo a restrições indevidas ou emprestando a cláusulas gerais sentidos que não lhe tocam. Não basta o simples invocar da boa-fé para justificar a utilização do duty to mitigate the loss [8].

É necessário que se proceda à análise do instituto, de seus contornos e consequências, para que se possa perquirir se há ou não este dever, se o credor pode ou não ter a sua indenização mitigada e, principalmente, qual o real fundamento de sua aplicação em face do ordenamento brasileiro, adequando-o a nossa sistemática.

A questão é saber quem deve arcar com os danos decorrentes do inadimplemento contratual que poderiam ter sido evitados ou minimizados pelo credor que permaneceu inerte quando poderia ter adotado medidas razoáveis para contenção dos danos e qual o fundamento desta imputação.

A doutrina [9] discute acerca da qualificação jurídica que se deve dar ao instituto, posicionando-o ora como dever, ora como ônus. A dúvida é pertinente em razão da dificuldade de subsumi-lo perfeitamente a uma das categorias, pois apresenta características que o aproximam das duas figuras.

No que tange ao dever, há dificuldade de enquadramento na medida em que a noção de dever correlaciona-se a um direito que, violado, enseja o nascimento de uma pretensão à reparação. Não é o que acontece no instituto em análise, pois, como bem pontua Daniel Dias, “não há que se falar em dever genérico ou mesmo acessório de evitar danos a si porque essa conduta por parte do lesado não é exigível[10]. Não é exigível, pois se protege o interesse do credor e apenas de maneira reflexa o interesse do devedor, tanto que as consequências (diminuição da indenização) são suportadas por aquele. Ademais, o ordenamento jurídico brasileiro não obriga o credor a defender seu crédito, tanto que permite a remissão [11] e a renúncia à herança [12], para exemplificar.

Caso se considerasse o instituto pura e simplesmente como um dever, como ressaltado por Martins-Costa [13], chegaríamos a uma situação em que a vítima do inadimplemento (credor) responderia por perdas e danos ao devedor, quando na verdade há apenas uma diminuição do montante indenizatório. Não se trata de um dever de prestação, pois não há pretensão da vítima que violada se consubstancie em inadimplemento apto a ensejar reparação.

Por outro lado, a figura não se amolda com perfeição a um ônus, pois se é certo que não há interesse à prestação, pois o exercício exigido pelo ônus relaciona-se ao interesse do próprio agente, não gerando inadimplemento, também é certo que a inércia do lesado reflete no patrimônio do devedor, o que acarretaria violação a um dever de proteção, o qual, no âmbito de uma complexidade obrigacional [14], obsta que se produzam danos na esfera das partes envolvidas (no caso, dano ao patrimônio). A inação do credor, expressão de sua liberdade individual, afetaria a esfera jurídica do devedor, o que é contrário ao dever de proteção [15].

As soluções apresentadas pela doutrina para o correto enquadramento jurídico do instituto, tendo em vista o sistema do Direito brasileiro, seria admitir a categoria do encargo de direito material (Obliegenheit do Direito alemão) [16] ou expressar a particularidade de o instituto estar a meio caminho entre as categorias do ônus e do dever [17]. Ambas as soluções demonstram que, se não há propriamente um dever do credor de evitar prejuízos, também existe um dever de proteção extraído da complexidade obrigacional e da boa-fé objetiva, que o impedem de reclamar indenização pelos prejuízos não evitados, consubstanciando-se em padrão de comportamento de forte apelo ético. A figura do encargo de direito material é apta a abranger e tutelar a situação que se visa evitar.

Trata-se de instituto que pode ser introduzido no Direito brasileiro, como de fato vem sendo, para auxiliar na questão do equacionamento justo da indenização. O fato de possuir elementos que o aproximam de um dever de proteção permite entendê-lo como um padrão comportamental que se aproxima das exigências da boa-fé objetiva, mas não se confunde nem se esgota nela. Por esse razão, a aplicação do instituto reclama prudência. Para tanto, é necessário nos atermos aos seus pressupostos e limites.

Para que se possa cogitar a aplicação do instituto, é necessário que haja o descumprimento da obrigação principal de um contrato; que esse descumprimento cause um dano que possa ser imputável à parte inadimplente; e que haja possibilidade de o credor lesado tomar providências razoáveis para conter o aumento do dano, agindo com diligência. A principal dificuldade, como ressalta Zanetti [18], consiste em “identificar critérios que permitam aferir se o credor se desincumbiu daquilo que dele se podia legitimamente esperar“.

O limite apontado nos diplomas que o preveem e na doutrina está num conceito jurídico indeterminado: a razoabilidade. Esta deve ser buscada no caso concreto e não estabelecida a priori. A afirmação é tão precisa quanto incompleta [19], pois não consegue delinear qual a atitude exigida pelo credor. Em casos assim, o estabelecimento de critérios [20] que demonstrem o que o lesado não está obrigado a fazer (conveniência de realizar) [21] pode ser de grande valia, nesse sentido alguns exemplos extraídos da casuística do common law: não está obrigado a: i) arriscar demasiadamente seu dinheiro; ii) proceder a uma cirurgia excessivamente arriscada; iii) tomar o risco de um litígio incerto contra terceiro; iv) prejudicar sua reputação comercial; v) destruir ou sacrificar seus próprios bens ou direitos; vi) prejudicar terceiro inocente; e vii) padecer por sua incapacidade financeira em adotar as medidas necessárias à eliminação ou à mitigação do dano.

Tais critérios podem ajudar o intérprete brasileiro a construir o sentido, a extensão e os limites do instituto, por meio da observação da natureza e objeto do contrato, das circunstâncias do caso e dos usos e práticas do comércio ou ramo de atividade no âmbito do qual o contrato foi entabulado. Busca-se sancionar a inércia do credor em adotar atitudes razoáveis que evitem o aumento do dano decorrente do inadimplemento contratual, o que não implica que o credor deva adotar quaisquer medidas, a despeito das circunstâncias em que se encontre, sob pena de lesá-lo duas vezes: pelo inadimplemento e pela obrigação despida de razoabilidade de conter os seus efeitos.

Além da atenção à razoabilidade, a fixação de balizas ao instituto requer a consideração de que, em virtude de sua tessitura aberta, o duty to mitigate the loss amolda-se à estrutura de uma cláusula geral. Trabalhar com essa técnica legislativa exige a percepção de que há uma diferença entre texto e norma. Supera-se a lógica de mera subsunção. Floresce a concreção. O intérprete produzirá a norma não apenas a partir de elementos que se encontram no mundo do dever-ser, mas também a partir de elementos colhidos da realidade, do mundo do ser, no qual buscará as especificidades do caso concreto e os valores imperantes em determinado momento histórico.

Nesse exercício de concreção e construção de significados, é necessário que se valore o resultado da decisão, para que se extraiam os efeitos que serão obtidos e se encontrem os caminhos mais adequados para a solução do problema [22]. O método alemão do “grupo de casos” auxilia o intérprete na concreção, na medida em que propõe a comparação do caso a ser decidido com casos que integram um grupo de casos que já foram julgados sob a égide de determinada norma, permitindo construir parâmetros interpretativos. O intérprete apenas deve se acautelar para não trocar o texto normativo pelas conclusões extraídas dos grupos, sob pena de tornar a concreção uma mera subsunção, o que não é o propósito das cláusulas gerais, que têm o propósito de promover um reenvio ao caso concreto.

Quanto ao nosso ordenamento jurídico, os grupos de casos que tocam à aplicação do dever de mitigar o prejuízo vêm sendo construídos paulatinamente. Aceitar que a omissão do credor pode dar lugar a uma diminuição na indenização devida em decorrência do inadimplemento, em razão da ingerência causal que a conduta teve sobre o resultado danoso, levanta a questão dos critérios que devem ser utilizados e, sem dúvida, trata-se de questão tormentosa, mas que não tem o condão de afastar sua aplicação, a exemplo do que ocorre com os lucros cessantes e a indenização por perda de uma chance, cujos contornos também são difíceis de precisar. A doutrina e a jurisprudência devem trabalhar juntas para aperfeiçoar a aplicação do instituto, precisando a diligência razoável que deve ser adotada.

Caso o credor adote o comportamento diligente, dentro de parâmetros de razoabilidade, terá direito a reaver os custos da diligência. Caso contrário, sofrerá uma redução da indenização que lhe é devida no montante em que poderia ter evitado ou minimizado [23].

O artigo que ora se apresenta exige um recorte metodológico. Abordar todos os grupos de caso já construídos, bem como sugerir a criação de novos, extrapolaria os limites estabelecidos. Em razão disso, trataremos da aplicação do instituto naqueles casos em que o credor demora a exercer seu direito em face do devedor inadimplente, acarretando um aumento substancial da dívida em virtude de incidência de juros de mora e multa moratória, mais especificamente na questão dos contratos bancários existenciais.

2 O Exercício Tardio do Direito de Ação nos Contratos Bancários Existenciais     

O grupo de casos que abrange o exercício tardio do direito de crédito vem sendo construído para lidar com aquelas situações em que o devedor não cumpre sua prestação e o credor não exerce sua pretensão em determinado lapso temporal antes de se consumar a prescrição, o que acarreta um aumento do débito pela incidência dos encargos moratórios. Os Tribunais vêm utilizando o duty to mitigate the loss, pautando-se na lógica da evitabilidade do dano, para sancionar os credores que não ajuízam a ação imediatamente, restringindo o crédito que lhes é devido no que toca aos valores acrescidos durante a inércia.

O cotejo entre a jurisprudência produzida e os parâmetros que foram delineados no capítulo anterior revela uma aplicação errônea da regra de mitigação. O dever de mitigar o prejuízo não deve ser aplicado para os casos em que o fundamento da restrição reside, de forma exclusiva, no atraso do ajuizamento da ação.

No âmbito da razoabilidade, é o devedor que se encontra em melhores condições de minorar o dano [24], por meio do pagamento. O ajuizamento da ação não garante que o prejuízo será mitigado, pois o devedor pode adotar condutas processuais com o escopo de protelar o desfecho da situação, abusando do direito de defesa, por exemplo, o que aumentaria ainda mais o montante da dívida. Exigir o cumprimento, como ensina Cristian Saab [25], apenas demonstra que é o devedor que está em melhores condições de minorar o dano.

A aplicação, neste grupo de casos, também encontra óbice no instituto da prescrição. Dentro do prazo prescricional a vítima tem liberdade para ajuizar a ação. A segurança e a previsibilidade conferidas pela consagração legal de um prazo não podem ceder diante de um juízo subjetivo feito no caso concreto. Vários fatores pesam na administração do prazo. A existência de inúmeros casos e a influência que diferentes juízos de concreção projetam na comunidade acarretam uma insegurança grande e um enfraquecimento do vínculo obrigacional [26], na medida em que retiram a possibilidade de avaliação apriorística da correção ou incorreção da conduta, abrindo espaço para arbitrariedades [27].

Há aqueles, a exemplo de Daniel Dias [28], que sustentam ser desnecessário o encargo de evitar o dano nesse grupo de casos, apontando que a solução deve ser buscada no art. 405 do Código Civil, o qual estabelece que os juros de mora devem ser contados desde a citação inicial. Adotando-se essa interpretação, o credor só teria direito aos juros de mora a partir da citação, o que reduziria o incremento da dívida no tempo, inferior à prescrição, em que não ajuizou a ação. Busca-se tornar a regra do art. 405 uma regra geral. Contudo, não é essa a linha de orientação seguida em nosso ordenamento, na medida em que, em se tratando de obrigações líquidas e com prazo determinado, a mora é automática (ex re), conforme disposto no art. 397 do Código Civil. O devedor sabe o dia em que deve cumprir a obrigação e o seu valor, não sendo necessário que o credor o advirta.

Apesar das críticas formuladas, cresce a utilização do duty to mitigate the loss no âmbito de contratos bancários existenciais [29] em que a demora da instituição financeira acarreta um aumento substancial da dívida. Tal fato se deve à repercussão da menção feita ao caso francês Bailleux contra Jarrettye [30] no artigo já mencionado de Vera Fradera, que, de certa forma, introduziu a discussão no cenário jurídico brasileiro e à recepção sem reserva da lição de doutrinadores que defendem a utilização do instituto nos contratos bancários [31].

A observação da jurisprudência recente demonstra que ainda não se construíram parâmetros seguros para o manejo do instituto no grupo em análise, em virtude da dificuldade encontrada na utilização de conceitos com abertura semântica. Vacila-se entre o reconhecimento do dever de ajuizar a ação em prazo curto e a consequente diminuição da indenização devida e o não reconhecimento do dever, em virtude da prescrição ou da melhor oportunidade do devedor evitar o aumento do dano. Relaciona-se a seguir o resumo de decisões que representam a controvérsia [32]:

  1. a) Consumidor deixou de utilizar cartão de crédito oferecido pela instituição bancária em agosto de 2009 e a ação de cobrança foi ajuizada em abril de 2013. No período a dívida teve um aumento exponencial. O TJSP acolheu o recurso do devedor, valendo-se do duty to mitigate the loss, sob a justificativa de que o banco “deveria agir para mitigar as perdas de seu contratante (o enfoque não é a perda da instituição, mas de seu cliente), e não silenciar para majorar seus lucros“. Limitou a cobrança aos seis meses posteriores à última utilização do cartão [33].
  1. b) Relator do acórdão assentou que o instituto poderá ser aplicado nas relações de consumo em que a instituição financeira negligencia e deixa de tomar providências que poderiam mitigar as perdas. Nestes casos, o devedor pode pedir a redução das perdas e danos, em proporção igual ao montante da perda que poderia ter sido diminuída com determinada ação. No caso em análise, negou a aplicação, pois reputou que o banco adotou condutas para minorar o seu dano, oferecendo parcelamento da dívida [34].
  1. c) Consumidora opôs embargos à execução alegando que a instituição bancária demorou um ano para distribuir ação de execução, a contar do vencimento antecipado da dívida, o que gerou acúmulo de encargos, como se a dívida fosse investimento. Tribunal negou a pretensão sob o fundamento de que foi observado o prazo prescricional. Negou a aplicação do duty to mitigate the loss, pois entendeu que a consumidora que deveria minorar seu dano, procurando o banco para saldar a dívida [35].
  1. d) Consumidora opôs embargos à execução, sob a alegação de que o inadimplemento de contrato de financiamento em 21.09.2011 gerou o vencimento antecipado de todas as demais e que a execução só foi proposta pelo banco em 24.06.2015. Pleiteia que seja reduzido o crédito “em proporção igual ao montante da perda que poderia ter sido diminuída” e que a correção monetária seja aplicada a partir do ajuizamento da ação e os juros, a partir da citação. Tribunal afastou a aplicação do “dever de mitigar o prejuízo“, alicerçado na doutrina de Vera Fradera, sob a alegação de que a embargante não demonstrou a relação de causalidade entre a conduta do banco e seu prejuízo [36].

A imprecisão e o uso desmedido e atécnico do instituto levam a soluções diametralmente opostas. Algumas se constituem numa tentativa de conferir rótulo diverso a um julgamento por equidade que visa proteger o consumidor. É certo que a hipossuficiência, o problema do superendividamento, a vulnerabilidade do consumidor e as abusivas taxas de juros praticadas pelas instituições bancárias merecem atenção. Porém, a boa-fé objetiva não outorga autorização para que se aplique a norma de mitigação sem qualquer limite, pressuposto ou avaliação dos resultados.

No âmbito do direito do consumidor, a boa-fé objetiva, além das funções de cânone hermenêutico-integrativo, criação de deveres anexos e limitação do exercício de direitos subjetivo, é chamada a exercer uma função corretora do desequilíbrio contratual. Tal funcionalidade advém da conexão com a política das relações de consumo, seus princípios e objetivos, que buscam tutelar a assimetria existente entre os contratantes [37]. A chave de leitura é diferente daquela utilizada nas relações paritárias e nas relações empresariais.

Essa observação leva à constatação de que deve haver um cuidado na formação de pré-compreensões acerca de um instituto e de sua funcionalidade, pois o resultado transitará em outros ramos. As soluções que buscam tutelar o consumidor no caso em questão devem ser construídas sem o recurso ao dever de mitigar o prejuízo. Os dispositivos existentes no CDC são suficientes para construir decisões que lidem com o problema do superendividamento nos contratos bancários existenciais.

A norma de mitigação não se presta a solucionar o problema do exercício tardio do direito de ação e o aumento da dívida nos contratos bancários existenciais pelas razões já expostas. A boa-fé objetiva, em sua função protetiva, pode auxiliar na construção de soluções que tutelem o consumidor vulnerável em face da abusividade praticada pelas instituições bancárias. Porém, tal construção prescinde do uso do duty to mitigate the loss. A utilização deste como mero reforço argumentativo, desacompanhado dos critérios dogmáticos apresentados, contribui para esvaziá-lo de um conteúdo próprio, confundindo-o com outros institutos e tolhendo sua funcionalidade enquanto critério de análise da extensão da responsabilidade. A ausência de limites, na quase totalidade das vezes, importa em arbítrio.

A observação é válida quando se constata que as soluções traçadas ajudam a construir o grupo de casos referente ao exercício tardio de direitos, no âmbito do qual serão buscados parâmetros para decisão de um caso concreto, sendo evidente a influência sobre o intérprete e a tendência à reiteração de decisões [38]. Chamado a exercer funções que tecnicamente não são suas, construídas no ambiente consumerista, a norma de mitigação, quando transportada para o direito civil (relações paritárias) [39], trará mais danos do que benefícios, enfraquecendo os vínculos obrigacionais, aumentando os custos de transação, dificultando as negociações e o fluxo de bens (que a norma visa otimizar), pois obrigará os contratantes a desenhar soluções para fazer frente a um cenário de insegurança e imprevisibilidade.

Considerações Finais     

Lançadas ao longo do texto, passa-se à dedução sistemática das conclusões:

1) A entrada em vigor do CC/02 operou mudanças significativas no direito obrigacional brasileiro advindas das diretrizes adotadas pelo legislador, que consagraram como princípios fundamentadores de toda a sistemática do direito privado a socialidade, a eticidade e a operabilidade. Abandonou-se o paradigma do sistema fechado, daquele dogma que identificava o direito com a lei, e fomos a um sistema aberto, assentado em cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados, que possuem uma grande abertura semântica.

2) Dentre as inovações, que formam um conjunto operacional, sobreleva em importância para o trabalho a consagração expressa da boa-fé objetiva em nosso ordenamento, que permitiu uma releitura do conceito de obrigação, possibilitando a percepção da complexidade intraobrigacional. Instaurou-se uma ordem de cooperação entre as partes, a partir da percepção de que a obrigação encerra um conjunto de direitos e deveres que não se esgotam na prestação principal.

3) O inadimplemento da obrigação passou por uma releitura. A parte inadimplente não pode ser chamada a indenizar os danos decorrentes do inadimplemento que o credor poderia evitar caso adotasse uma conduta razoavelmente diligente. Para fixar a extensão da responsabilidade, é válida a utilização do instituto do duty to mitigate the loss, originário do sistema da common law.

4) O duty to mitigate the loss apresenta características de ônus e de dever de proteção e encontra fundamentação na ética estabelecida pelo sistema obrigacional. A aplicação encontra limite no postulado da razoabilidade do comportamento exigido do credor para mitigação do dano. Adotando o comportamento razoável, o credor terá direito ao reembolso das despesas de conservação. Não adotando, a indenização deverá sofrer uma diminuição proporcional ao prejuízo que se deixou de evitar.

5) O dever de mitigar o prejuízo não se compatibiliza com o grupo de casos em que o credor não exerce imediatamente seu direito de ação, mas o faz no limite estabelecido pelo prazo prescricional. Nesse caso, o problema é disciplinado pela prescrição e pelo fato de que é o devedor que tem a melhor oportunidade de evitar o dano, pagando a dívida.

6) O superendividamento de consumidores vulneráveis é um problema que reclama atenção. O CDC traz institutos que são aptos para construção de uma interpretação que tutele o consumidor. A própria boa-fé objetiva, a partir da chave de leitura da hipossuficiência daquele, adquire uma função protetiva que pode auxiliar o intérprete na busca dos objetivos estabelecidos pela Política Nacional das Relações de Consumo. O uso da norma de mitigação no caso dos contratos bancários existenciais, quando o fundamento do incremento da dívida é apenas a demora da instituição em ajuizar a ação, além de desnecessário é inadequado.

7) É preciso cuidado quando da concreção do instituto, que possui uma grande abertura semântica. O manejo atécnico, sem balizas, contribui para o esvaziamento de sentido e perda da funcionalidade da norma de mitigação. Ademais, traz consequências sistemáticas importantes, pois a busca de fundamentação em um grupo de casos construído com reiteração de erros acarreta o enfraquecimento do vínculo obrigacional e projeta insegurança e falta de previsibilidade, dificultando o fluxo de trocas e encarecendo a contratação.

                                              

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[1] “A inovação, que permitiu tratar a relação jurídica como uma totalidade, realmente orgânica, veio do conceito do vínculo como uma ordem de cooperação, formadora de uma unidade que não se esgota na soma dos elementos que a compõem. Dentro dessa ordem de cooperação, credor e devedor não ocupam mais posições antagônicas, dialéticas e polêmicas. Transformando o status em que se encontravam, tradicionalmente, devedor e credor, abriu-se espaço ao tratamento da relação obrigacional como um todo.” (COUTO E SILVA, Clóvis V. do. A obrigação como processo. 3. reimp. Rio de Janeiro: FGV, 2006. p. 19-20)

[2] “A obrigação é um processo conducente à satisfação do interesse do credor e daí que todos os seus elementos estejam organizados para essa finalidade. Mas é inquestionável que há também nesta organização interesse do devedor que são legítimos e que carecem de protecção.” (CUNHA DE SÁ, Fernando Augusto. Direito ao cumprimento e direito a cumprir. Coimbra: Almedina, 1997. p. 80-81)

[3] MENKE, Fabiano. A interpretação das cláusulas gerais: a subsunção e a concreção dos conceitos. Revista de Direito do Consumidor, v. 50, São Paulo, RT, abr. 2004, p. 32.

[4] A expressão “norma de mitigação” é utilizada para designar a conduta razoável e diligente exigida do credor para evitar o incremento de seu prejuízo. Não há no ordenamento jurídico disposição legal expressa consagrando-a. Norma não se confunde com texto normativo, mas é o que se extrai de um enunciado normativo, após o exercício hermenêutico. É uma construção. A ordem de cooperação extraída da boa-fé objetiva e a razoabilidade na definição da extensão da responsabilidade permitem a construção da norma retromencionada.

[5] FRADERA, Véra Jacob de. Pode o credor ser instado a diminuir o próprio prejuízo? Revista Trimestral de Direito Civil, Rio de Janeiro, Padma, v. 19, jul./set. 2004, p. 112.

[6] No original: “A party who relies on a breach of contract must take such measures as are reasonable in the circumstances to mitigate the loss, including loss of profit, resulting from the breach. If he fails to take such measures, the party in breach may claim a reduction in the damages in the amount by which the loss should have been mitigated” (Disponível em: <http://www.cisg.law.pace.edu/cisg/text/treaty.html>. Acesso em: 17 mar. 2016).

[7] Tal fato se deve ao artigo pioneiro de Vera Fradera e ao seu acolhimento no Enunciado nº 169, editado na III Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho da Justiça Federal: “Art. 422. O princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamento do próprio prejuízo”.

[8] Conforme pontuado por Menezes Cordeiro quando da análise do desenvolvimento histórico das cláusulas gerais: “A simples referência legal, ainda que solene, a grande princípios, a não ser quando precedida ou acompanhada de um esforço doutrinário e jurisprudencial de concretização e aplicação, é insuficiente para corporizar, na prática, a orientação pretendida” (Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2011. p. 700).

[9] Por todos: MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: critérios para a sua aplicação. São Paulo: Marcial Pons, 2015. p. 554-563.

[10] DIAS, Daniel Pires Novais. O duty to mitigate the loss no direito civil brasileiro e o encargo de evitar o próprio dano. Revista de Direito Privado, n. 45, ano 12, jan./mar. 2011, p. 124.

[11] Art. 385 do Código Civil.

[12] Art. 1.806 do Código Civil.

[13] MARTINS-COSTA, Judith. Idem, p. 555.

[14] Acerca dos interesses envolvidos na relação, vale transcrever a lição de Jorge Cesa Ferreira da Silva, que, baseando-se na doutrina de Heinrich Stoll, preceitua que “por interesses envolvidos na relação entende-se não só aqueles vinculados diretamente ou indiretamente à prestação, como também os vinculados à manutenção do estado pessoal e patrimonial dos integrantes da relação, advindos do liame de confiança que toda obrigação envolve. Nestes termos, o fato jurígeno obrigacional dá ensejo, pelo menos, a uma duplicidade de espécie de deveres: os de prestação e os genéricos de conduta” (A boa-fé e a violação positiva do contrato. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 69).

[15] Os deveres de proteção pretendem proteger a contraparte dos riscos de danos na sua pessoa e patrimônio que nascem da (e por causa da) relação particular estabelecida: a sua finalidade é negativa, já que não atinem diretamente ao interesse à prestação (FRADA, Manuel Carneiro da. Contrato e deveres de proteção. Coimbra: Coimbra Editora, 1994. p. 41).

[16] Conforme a lição de Proença: “As Obliegenhein são ‘deveres’ necessários para adquirir ou conservar uma determinada vantagem jurídica, mas sem que a inobservância da conduta proposta lese outra pessoa ou faça surgir qualquer obrigação de indemnização. A ‘inobservância’ da conduta por parte do lesado e a consequente ‘violação’ dos seus interesses geram uma desvantagem, na subjacência da qual não se encontra qualquer ideia de sanção-censura”. Segundo o autor, concebido por Reimer Schmidt o conceito aproxima-se do dever jurídico, avocando uma ideia de ilicitude relativa ou enfraquecida (PROENÇA, José Carlos Brandão. A conduta do lesado como pressuposto e critério de imputação do dano extracontratual. Coimbra: Almedina, 1997. p. 504-505).

[17] Posições de Judith Martins-Costa e Daniel Pires Novais Dias, deduzidas nas obras retromencionadas.

[18] ZANETTI, Cristiano de Sousa. A mitigação do dano e a alocação da responsabilidade. Revista Brasileira de Arbitragem, CBar, Porto Alegre, v. 35, jul./ago. 2012, p. 32.

[19] “Lo razoable o irrazoable depende del caso concreto, pues, como dijimo, el reenvío a la razonabilidad opera precisamente allí donde uma respuesta a priori no parece posible. En todo caso, decir que lo razonable o no razonable depende del caso concreto, si bien es todo cierto, no resulta suficiente para delinear cabalmente la actitud esperada del acreedor.” (SAN MARTÍN N., Lilian Cecília. Del “deber” del acreedor de evitar o mitigar el daño. Tese, TorVergata, Roma, 2010. p. 350)

[20] Critérios retirados da tese de Lilian San Martin e também expostos no artigo de Cristiano Zanetti, ambos já mencionados.

[21] Conforme explicado na tese de Lilian San Martin: “Nótese que todas estas reglas son extraídas haciendo una abstracción de la causística del Common Law ingles, y no se refieren a ‘hechos’ que el perjudicado debe o no ejecutar, sino a la ‘oportunidad’ de realizarlos, por ejemplo, no se dice que el perjudicado no debe iniciar um litígio contra uma tercera persona, sino que no debe iniciar um ‘litigio incierto’” (p. 355).

[22] Conforme explicado na tese de Lilian San Martin: “Nótese que todas estas reglas son extraídas haciendo una abstracción de la causística del Common Law ingles, y no se refieren a ‘hechos’ que el perjudicado debe o no ejecutar, sino a la ‘oportunidad’ de realizarlos, por ejemplo, no se dice que el perjudicado no debe iniciar um litígio contra uma tercera persona, sino que no debe iniciar um ‘litigio incierto’” (p. 355).

[23] LOPES, Cristian Saab Batista. A mitigação dos prejuízos no direito brasileiro. Tese de Doutorado. Belo Horizonte: Faculdade de Direito da UFMG, 2011. p. 187.

[24] A doutrina brasileira há algum tempo afirma que se deve levar em consideração quem teve a melhor e mais eficiente oportunidade de evitar o dano. Cf. DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. v. 2. p. 695.

[25] LOPES, Cristian Saab Batista. A mitigação dos prejuízos no direito brasileiro. Tese de Doutorado. Belo Horizonte: Faculdade de Direito da UFMG, 2011. p. 217.

[26] Há um enfraquecimento, pois a possibilidade de ver reduzidos os encargos decorrentes da mora poderá ser uma variante no cálculo utilizado pelo devedor, para cumprir ou não a obrigação no prazo ajustado.

[27] “O exercício de um direito legítimo dentro do prazo não pode sofrer restrição pela demora em seu exercício” (LOPES, Cristian Saab Batista. Idem. p. 220).

[28] DIAS, Daniel Pires Novais. Idem. p. 126-127.

[29] Toma-se a expressão contratos existenciais em oposição a contratos interempresariais, pautando-se na lição de Junqueira de Azevedo. Os primeiros estariam sujeitos a um regime maior de intervenção judicial, em razão da função social e da tutela da dignidade da pessoa humana, contratando para ter acesso a bens essenciais e não de forma profissional com escopo de lucro. Arremata o autor: “Uma entidade jurídica empresarial ineficiente pode – ou até mesmo deve – ser expulsa do mercado, ao contrário da pessoa humana que merece proteção, por não ser ‘descartável’” (AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Novos estudos e pareceres de direito privado. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 185).

[30] Locador permaneceu 11 anos sem cobrar aluguéis, e, ao invocar a cláusula resolutória, acaba sendo privado de exercer seu direito (FRADERA, 2004, p. 113).

[31] Encontra-se bastante divulgada a lição de Flávio Tartuce acerca do instituto aplicado aos contratos bancários: “Segundo a nossa interpretação, não pode a instituição financeira permanecer inerte, aguardando que, diante da alta taxa de juros prevista no instrumento contratual, a dívida atinja montante astronômicos” (TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Método, 2015. v. 3. p. 114).

[32] As decisões analisadas demonstram a atualidade do tema. Decisões clássicas foram analisadas com precisão nas obras mencionadas, das quais recomenda-se a leitura. Contudo, o problema apontado ainda persiste. Em razão disso, justifica-se a opção metodológica, ressaltando-se que a transcrição de inúmeras decisões pouco acresceria à discussão empreendida.

[33] TJSP, AC 0003834-83.2013.8.26.0445, Rel. Sergio Gomes, 37ª Câmara de Direito Privado, j. 15.03.2016, data de registro: 16.03.2016.

[34] TJMS, AC 0805053-28.2014.8.12.0001, Rel. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva, 5ª Câmara Cível, j. 16.02.2016, data de registro: 18.02.2016.

[35] TJSP, AC 1006513-08.2015.8.26.0562, Rel. Luis Carlos de Barros, 20ª Câmara de Direito Privado, j. 14.12.2015, data de registro: 18.12.2015.

[36] TJSP, AC 1013416-90.2015.8.26.0196, Rel. Roque Antonio Mesquita de Oliveira, 18ª Câmara de Direito Privado, j. 13.04.2016, data de registro: 20.04.2016.

[37] Judith Martins-Costa, lecionando sobre a boa-fé nas relações de consumo, aponta que o Código de Defesa do Consumidor “agregou-lhe ainda a função corretora do desequilíbrio contratual, daí resultando na prática a boa-fé como mandamento de otimização do equilíbrio contratual e, no plano metodológico, a superposição da boa-fé ao princípio do equilíbrio” (AZEVEDO, Antônio Junqueira de; TORRES, Heleno Taveira; CARBONE, Paolo [Coord]. Princípios do novo Código Civil brasileiro e outros temas. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 393).

[38] Tal tendência é ainda mais evidenciada quando se analisa a importância que o novo Código de Processo Civil conferiu aos precedentes.

[39] Como bem anotado por Gustavo Tepedino e Anderson Schreiber: “Em relações não caracterizadas pela vulnerabilidade de qualquer das partes, é imprescindível conceber a boa-fé na sua real extensão: como princípio que exige lealdade e honestidade, impondo deveres de colaboração que são condicionados e limitados pela função social e econômica do negócio celebrado” (TEPEDINO, Gustavo [Coord]. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 41).