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O DESTINATÁRIO DAS PROVAS NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O DESTINATÁRIO DAS PROVAS NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Oscar Valente Cardoso

A FASE PROBATÓRIA

Após o fim da fase de saneamento (que mais propriamente, pode ocorrer durante toda a tramitação do processo), tem início a fase de instrução (ou probatória) do procedimento comum.

A fase instrutória como a sua própria denominação já indica, destinada especialmente à produção de provas, logo, é neste momento do processo que as partes devem demonstrar que os fatos ocorreram de acordo com o alegado por elas na petição inicial e na contestação.

A apresentação de provas é necessária desde a petição inicial, mas há uma etapa processual destinada à produção probatória, a partir da decisão de saneamento e a organização do processo (que, em regra, contém determinações relativas à instrução processual).

A fase instrutória começa a partir da estabilização do saneamento processual (após a decisão de saneamento e organização e as eventuais manifestações das partes) e pode terminar com uma audiência de instrução e julgamento, a apresentação de memoriais pelas partes ou a manifestação de autor e réu sobre a última prova produzida.

Portanto, não se trata de uma fase obrigatória no processo. Haverá fase instrutória apenas quando não for possível o julgamento antecipado do mérito. Aliás, trata-se da única etapa não obrigatória do procedimento comum. As fases de postulação, saneamento e decisão sempre existirão (ainda que a decisão seja proferida no saneamento), enquanto a instrução só ocorrerá quando for necessária a dilação probatória, com a produção de outras provas, além daquelas já apresentadas na fase postulatória (e, eventualmente, na saneatória).

Ademais, esta etapa afeta diretamente a fase decisória: o julgador deve, em primeiro lugar na fundamentação da sentença, reconstruir os fatos ocorridos, o que se faz por meio do exame e valoração das provas, a partir dos quais incidirão as consequências jurídicas.

Essa atividade de reconstrução processual dos fatos por meio das provas, com o objetivo de resolver os pedidos das partes e determinar qual a norma aplicável e de que forma ela incidirá, é realizada por meio da fundamentação. E essa escolha por determinadas provas em detrimento de outras é um assunto que não se mantém estável na história do Direito Processual e ainda não foi resolvido de forma satisfatória: todos os modelos conhecidos são sujeitos a crítica e se limitam a conferir segurança apenas sobre a previsibilidade do padrão de valoração de provas que incidirá no processo. Contudo, não há um modelo imune a falhas ou insuficiências, tampouco se pode afirmar que aquele escolhido pelo legislador será utilizado de modo adequado, por ele, pelo Judiciário ou por qualquer outro legitimado.

No Brasil, as normas sobre os meios de prova cabíveis variaram no tempo. Nesse sentido, o CPC/39 admitia somente as provas típicas: “Art. 208. São admissíveis em juízo todas as espécies de prova reconhecidas nas leis civis e comerciais”. Por sua vez, o CPC/73 passou a aceitar também as provas atípicas: “Art. 332. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa”.

O CPC/2015 mantém a possibilidade de produção e provas típicas e atípicas, com fundamente em um critério moral de ampliação das provas permitidas por lei: “Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz”.

Tendo em vista que a prova é um meio para demonstrar no processo que os fatos ocorreram conforme alegados pela parte, o direito à sua produção também é um pressuposto necessário ao exercício do direito de ação e do acesso ao Judiciário.

O DESTINATÁRIO DAS PROVAS: JUIZ OU PROCESSO?

O destinatário da prova é assunto ainda polêmico no Direito Processual: trata-se do juiz ou do processo? A fixação do destinatário da prova (e, até mesmo, da existência de um destinatário) constitui matéria que influencia a amplitude do direito à prova (e até mesmo a sua existência).

O CPC busca, em parte, resolver essa discussão, ao positivar de forma expressa o princípio da aquisição da prova no art. 371: “O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento”.

Isso significa que a prova gerará efeitos no processo independentemente de quem a tiver produzido (parte, terceiro, auxiliar da Justiça, o próprio juiz, entre outros). Em outras palavras, a prova não possui um titular ou um proprietário, porque pertence ao processo, logo, pode ser utilizada por qualquer um dos sujeitos processuais para demonstrar a ocorrência dos fatos alegados.

Da aquisição da prova decorre o princípio da comunhão da prova, que permite ao juiz valorar a prova independentemente de quem a tiver apresentado. A análise da prova é una e pode ser utilizada tanto para beneficiar quanto para prejudicar a parte que a inseriu no processo.

Em consequência, por exemplo, as provas produzidas pela parte autora pode ser utilizadas para um julgamento de improcedência de seu pedido, da mesma forma que o julgador pode utilizar as provas juntadas pelo réu para fundamentar uma decisão de procedência do pedido inicial. Não há titularidade sobre a prova (princípio da aquisição), tampouco limitação para a sua valoração (princípio da comunhão) de acordo com quem a produziu.

Ressalva-se que para a valoração existe relevância na identificação de quem produziu a prova. Por exemplo, a prova testemunhal apresentada por uma das partes tende a confirmar as suas alegações, razão pela qual não pode ser considerada isoladamente para embasar a valoração.

Portanto, a atenção principal não deve se voltar para controvérsias acerca do titular e do destinatário da prova (não apenas o processo e o juiz, mas também as partes e outros sujeitos processuais), mas sim sobre o valor de cada prova para a demonstração – ou não – dos fatos a que se destinam. Na valoração, o órgão julgador não modificará suas conclusões se considerar que o destinatário da prova é ele próprio ou o processo, tampouco deixará de levar em conta determinada prova sob o fundamento de ter sido produzida por um terceiro.