NOVOS TEMPOS DA ADVOCACIA PÚBLICA
Adryelle Gomes
No instante em que todos os olhos se direcionam para a aplicação do Novo Código de Processo Civil Brasileiro, vigente desde o dia 18 de março de 2016, muitas foram as alterações, e por essa razão, a necessidade de familiarizar-se com este novo instituto tomou caráter URGENTE.
Nesse diapasão, ao que tange a militância na Advocacia Pública, segue alguns pontos importantes elencados pelas ilustres autoras Flávia Moraes Barros Fabre e Nathaly Campitelli Roque¹, que merecem o devido destaque:
Art. 182 – Incumbe à Advocacia Pública, na forma da lei, defender e promover os interesses públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por meio da representação judicial, em todos os âmbitos federativos, das pessoas jurídicas de direito público que integram a administração direta e indireta.
I Representação judicial da Fazenda Pública
Dentre as inovações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015 está a instituição de um título específico na parte geral para tratar da Advocacia Pública.
É a Advocacia Pública a instituição criada por lei do ente federado para sua assessoria e consultoria na área jurídica, incluindo entre suas funções a representação judicial. O ente federado pode instituir que sua Procuradoria seja competente para defesa das demais pessoas jurídicas da Administração (autarquias e fundações) ou estabelecer carreira própria para a defesa destas instituições públicas.
O texto em comento acompanha o regime constitucional da Advocacia-Geral da União, a Procuradoria da Fazenda Nacional e as Procuradorias dos Estados (CF, arts. 131 e 132). O CPC/2015 inova ao considerar como Advocacia Pública as Procuradorias Municipais, indo de encontro com a PEC nº 17/2012, ainda em trâmite no Congresso Nacional. (Negrito nosso)
A lei do ente federado é a competente para estabelecer as condições de ingresso, poderes e deveres do advogado público. O acesso deverá ser realizado necessariamente por concurso público de provas e títulos (CF, arts. 37, inciso II, 131 e 132).
II Dispensa do instrumento de procuração
O membro da Advocacia Pública é dispensado do instrumento de procuração caso a representação decorra diretamente de norma prevista na Constituição Federal (CPC/2015, art. 287, parágrafo único, inciso III). Sendo dispensada a procuração, não é tal documento requisito para a formação do instrumento do agravo, conforme já reconheceu o Superior Tribunal de Justiça, na vigência do CPC/1973:
“PROCESSUAL CIVIL – ALEGAÇÃO DE VÍCIOS FORMAIS – FUNDAMENTOS INSUFICIENTES PARA REFORMAR A DECISÃO AGRAVADA – INDICAÇÃO DO NOME E ENDEREÇO COMPLETO DO ADVOGADO DO AGRAVADO (ART. 524, INCISO III, DO CPC)– PRESCINDIBILIDADE – AUSÊNCIA DE JUNTADA DE CÓPIA DO INSTRUMENTO DE MANDATO CONFERIDO AO PROCURADOR DO ESTADO – DESCABIMENTO DA EXIGÊNCIA – NÃO CABIMENTO DE EXIGÊNCIA DE JUNTADA DE CERTIDÃO ATESTANDO A AUSÊNCIA – AUTENTICAÇÃO DAS PEÇAS TRASLADADAS (ART. 544, § 1º, DO CPC)–AUSÊNCIA DE EXIGÊNCIA LEGAL ESPECÍFICA – PRESUNÇÃO DE VERACIDADE – PRECEDENTES DA CORTE ESPECIAL – JULGAMENTO CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STJ – SÚMULA 83/STJ, APLICÁVEL À ALÍNEA ‘A’ DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL – AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
[…] 2. A exigência contida no inciso III do art. 524 do CPC não é absoluta, de forma que pode ser relevada se existirem nos autos outros elementos que possam identificar o nome e o endereço completo do advogado da agravada, mormente em se tratando de ente público.
Partindo-se do pressuposto de que os membros da Advocacia Pública não têm mandato, decorrendo a sua capacidade postulatória diretamente da respectiva nomeação para o cargo exercido, nos termos da lei, por via de consequência lógica, fica afastada, também para a parte ex adversa, a exigência em comento para a formação do instrumento.
Tendo em vista a ausência de exigência legal específica no sentido de exigir a declaração de autenticidade dos documentos que compõem o instrumento, não se aplica, neste caso, o disposto no art. 365 do Código de Processo Civil, relativo à força probante dos documentos juntados aos autos. Precedentes do STJ.
Agravo regimental improvido” (2ª T., AgRg no REsp nº 1065571/MA, Rel. Min. Humberto Martins, j. Em 16/12/2008, DJe de 4/2/2009).
Também tratam do regime processual da Fazenda Pública diversos dispositivos esparsos no CPC/2015. Destacamos os seguintes (negrito nosso):
a) art. 75, incisos I a III: tratam da representação processual da Fazenda Pública Federal, Estadual e Municipal por seus procuradores (ou prefeito, no caso do Município em que não haja procuradoria constituída)
b) art. 85, § 3º: regime de honorários próprio se condenada a Fazenda Pública
c) art. 247, inciso III: citação pessoal por oficial de justiça, enquanto não implementada a citação por meio eletrônico
d) art. 496: remessa necessária, como condição do trânsito em julgado de decisões contrárias à Fazenda Pública, nos casos ali previsto
e) art. 1.007, § 1º: dispensa de custas de recurso
f) art. 1.021, § 5º: dispensa da multa como requisito para recorrer em caso de condenação de agravo interno
g) art. 1.026, § 3º: dispensa da multa como requisito para recorrer em caso de condenação de embargos de declaração.
Art. 183 – A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público gozarão de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais, cuja contagem terá início a partir da intimação pessoal.
1º – A intimação pessoal far-se-á por carga, remessa ou meio eletrônico.
2º – Não se aplica o benefício da contagem em dobro quando a lei estabelecer, de forma expressa, prazo próprio para o ente público.
III Prazo em dobro e intimação pessoal
Como prerrogativa, concedeu-se expressamente às Advocacias Públicas a concessão de prazo em dobro para todas as manifestações. Fica derrogada, assim, a regra do prazo quadruplicado para defesa e em dobro para recorrer estabelecido no CPC/1973 (art. 188). (Negrito Nosso)
Os prazos se contam em dias úteis (CPC/2015, art. 219), observadas as causas de suspensão e de interrupção estabelecido no próprio CPC e em legislação extravagante.
Também estabeleceu que todos os entes mencionados no caput do dispositivo terão intimação pessoal. Esta regra deverá ser seguida em qualquer processo em que a Fazenda Pública seja parte e em todos os graus de jurisdição.
IV Forma da intimação pessoal
O termo inicial do prazo iniciar-se-á da carga ou remessa, em se tratando de processos cujos autos sejam físicos ou em autos eletrônicos cuja intimação eletrônica ainda não esteja disponível. Ocorrerá por meio eletrônico, caso os autos sejam digitais e a intimação eletrônica já esteja implementada.
V Intimação por meio eletrônico
No caso de intimação por meio eletrônico, devem ser observadas as regras legais estabelecidas no CPC e na Lei nº 11.419/2009. Confira-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema:
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. INTIMAÇÃO PESSOAL DO PROCURADOR FEDERAL, POR VIA ELETRÔNICA. INTERPOSIÇÃO DO RECURSO ESPECIAL, APÓS O TRINTÍDIO LEGAL, SEM OBSERVÂNCIA DO PARÁGRAFO ÚNICO, PARTE FINAL, DO ART. 3º DA LEI 11.419/2006, E DO § 6º DO ART. 5º DA MESMA LEI. INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
Nos termos do § 2º, III, b, do art. 1º da Lei 11.419/2006, para o disposto nesta Lei, considera-se assinatura eletrônica a identificação inequívoca do signatário, mediante cadastro de usuário no Poder Judiciário.
Segundo o art. 2º da Lei 11.419/2006, o envio de petições, de recursos e a prática de atos processuais em geral, por meio eletrônico, serão admitidos mediante uso de assinatura eletrônica, na forma do art. 1º desta Lei, sendo obrigatório o credenciamento prévio, no Poder Judiciário, conforme disciplinado pelos órgãos respectivos. O credenciamento no Poder Judiciário será realizado mediante procedimento no qual esteja assegurada a adequada identificação presencial do interessado. Ao credenciado será atribuído registro e meio de acesso ao sistema, de modo a preservar o sigilo, a identificação e a autenticidade de suas comunicações.
Os órgãos do Poder Judiciário poderão criar um cadastro único, para o credenciamento previsto neste dispositivo legal.
III. O art. 3º, caput, da Lei 11.419/2006 estabelece que se consideram realizados os atos processuais por meio eletrônico, no dia e hora do seu envio ao sistema do Poder Judiciário, do que deverá ser fornecido protocolo eletrônico. Já o parágrafo único desse dispositivo legal estabelece que, quando a petição eletrônica for enviada para atender prazo processual, serão consideradas tempestivas as transmitidas até as 24 (vinte e quatro) horas do seu último dia.
De acordo com o § 6º do art. 5º da Lei 11.419/2006, as intimações feitas por meio eletrônico, em portal próprio, aos que se cadastrarem na forma do art. 2º desta Lei, inclusive a Fazenda Pública, serão consideradas pessoais, para todos os efeitos legais.
Em conformidade com o § 6º do art. 5º da Lei 11.419/2006, a Segunda Turma do STJ, ao julgar o REsp 1.247.842/PR (Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 28/11/2011), deixou consignado que, havendo intimação pessoal do Procurador Federal, por via eletrônica, não há que se falar em violação ao art. 17 da Lei 10.910/2004.
Também a Segunda Turma do STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.354.877/RS (Rel. Ministra ELIANA CALMON, DJe de 14/10/2013), proclamou que ‘é distinta a intimação feita por meio eletrônico em portal próprio, na forma do art. 5º da Lei 11.419/2006, daquela realizada mediante publicação em Diário Eletrônico’.
No caso, consoante certidão expedida pela Secretaria do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em 28/05/2014, houve intimação pessoal, por via eletrônica, do representante judicial do IBAMA, acerca do inteiro teor do acórdão recorrido, nos termos do art. 1º, § 2º, III, b, da Lei 11.419/2006, tendo sido concedido o prazo recursal de 30 (trinta) dias, com data inicial em 10/06/2014 e data final em 09/07/2014. Ocorre que o IBAMA interpôs o Recurso Especial somente no dia 10/07/2014, de forma intempestiva, visto que não observados o parágrafo único, parte final, do art. 3º da Lei 11.419/2006, e o § 6º do art. 5º desta mesma Lei.
VII. Agravo Regimental improvido” (2ª T., AgRg no REsp nº 1488739/RS, Rel. Min. Assusete Magalhães, j. Em 17/3/2015, DJe de 25/3/2015).
VI Comprovação da tempestividade do recurso
Para fins de comprovar a tempestividade do recurso, a prova da intimação pessoal pode ser feita por qualquer meio apto, como já reconheceu o Superior Tribunal de Justiça:
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. IRRECORRIBILIDADE DA DECISÃO QUE DETERMINA A SUBIDA DO RECURSO ESPECIAL. CABIMENTO QUANDO OCORREM VÍCIOS NOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PEÇA OBRIGATÓRIA (ART. 544, § 1º DO CPC). CERTIDÃO DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA FAZENDA NACIONAL. TEMPESTIVIDADE AFERIDA POR OUTROS MEIOS. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. A DECISÃO DE SUBIDA DO RECURSO ESPECIAL NÃO VINCULA O ÓRGÃO JULGADOR. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
[…]. 2. A parte Agravante se insurge acerca da ausência da certidão de intimação no Agravo de Instrumento, uma vez que apenas foi juntada nos autos a certidão de remessa dos autos à Fazenda Nacional, sendo assim cabível o Agravo Regimental na espécie.
Sendo a intimação da Fazenda Pública, por expressa previsão legal, pessoal mediante remessa dos autos, a qual será o termo inicial do prazo recursal, tem-se que, nos Agravos de Instrumento interpostos pelo Ente Público, o termo de abertura de vista e remessa dos autos é suficiente para a demonstração da tempestividade do recurso, podendo, assim, substituir a certidão de intimação da decisão agravada.
Ademais, observa-se que a decisão agravada foi proferida em 18.07.2008 e o Agravo de Instrumento, por sua vez, foi interposto em 08.08.2008, logo, inequívoca a tempestividade do recurso.
[…]” (1ª T., AgRg nos EDcl no AgRg no Ag nº 1136417/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. Em 16/4/2015, DJe de 30/4/2015).
VII Existência de prazo próprio
A fim de evitar dúvidas, o § 2º afasta expressamente a aplicação do dispositivo se fixado prazo próprio para a Fazenda. São exemplos: o prazo para impugnar a execução (30 dias – CPC/2015, art. 535), da defesa a ser apresentada em Mandado de Segurança (10 dias – Lei nº 12.016/2009, art. 7º, inciso I), dentre outros.
Art. 184 – O membro da Advocacia Pública será civil e regressivamente responsável quando agir com dolo ou fraude no exercício de suas funções.
VIII Responsabilidade civil do advogado público
Como agente público que é, o advogado público tem responsabilidade pessoal tanto civil (sendo esta regressiva, nos moldes anteriormente mencionados) quanto administrativa e disciplinar, sem exclusão de eventual responsabilidade criminal pelos atos praticados em razão de seu cargo.
No que toca à responsabilidade civil, tema objeto do artigo em comento, fica evidenciado que a responsabilização do advogado público será regressiva se demonstrado dolo ou fraude. Tais conceitos devem ser interpretados de acordo com a lei material, entendendo-se por dolo a intenção deliberada de causar dano a ente público ao qual representa, ao oponente ou a terceiro e, como fraude, a participação de conluio para prejudicar o ente público, o oponente ou terceiro.
Lembramos que a responsabilidade do ente federado, da autarquia ou da fundação é objetiva em relação aos atos praticados por seus agentes (CF, art. 27, § 6º), respondendo estes pelos prejuízos causados pelo advogado público independente da demonstração de culpa.
Por todo exposto, na expectativa de ter corroborado um “tantinho” no aprendizado e familiarização do Novo Processo Civil, compartilhando um pouco do que venho estudando e atualizando-me.