NORMAS FUNDAMENTAIS DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E OS PRINCÍPIOS GERAIS DA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE
Elias Marques de Medeiros Neto
André Medeiros Toledo
SUMÁRIO: 1. As normas fundamentais do novo Código de Processo Civil: 1.1. Um código constitucionalizado; 1.2. O acesso à justiça e a democratização do processo; 1.3. A solução integral do mérito e a duração razoável do processo; 1.4. A boa-fé processual e o princípio da cooperação; 1.5. A aplicação constitucional das normas processuais; 1.6. A fundamentação das decisões judiciais – 2. Princípios do processo de execução: 2.1. Princípios fundamentais da execução; 2.2. Princípios setoriais da execução: 2.2.1. Princípio da patrimonialidade; 2.2.2. Princípio da autonomia; 2.2.3. Princípio do resultado ou da especificidade; 2.2.4. Princípio da menor gravosidade para o devedor; 2.2.5. Princípio da disponibilidade; 2.2.6. Princípio do título ou da cartularidade; 2.2.7. Princípio da atipicidade dos meios executivos; 2.2.8. Princípio da lealdade; 2.2.9. Princípio do desfecho único – Conclusão – Referências.
1 AS NORMAS FUNDAMENTAIS DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
1.1. Um código constitucionalizado
O novo Código de Processo Civil, nitidamente, procurou alinhar suas normas aos postulados e princípios constitucionais, revelando uma sintonia íntima entre os preceitos do diploma processual e o modelo constitucional do processo.
É nesse sentido que há muito se sustenta a “constitucionalização do direito processual civil”, fenômeno nominado por alguns de “neoprocessualismo”, cujas premissas derivariam de outro fenômeno, o “neoconstitucionalismo”. Tal modelo normativo, nas lições de Luís Roberto Barroso, tem como pressuposto básico, além de outras características, a centralidade dos direitos fundamentais,([1]) de modo que o seu caráter ideológico é de concretização efetiva de tais direitos, reafirmando a força normativa da Constituição e a sua consequente densificação.([2]
A Constituição, pois, torna-se o ponto de partida e o ponto de chegada para qualquer interpretação e argumentação jurídica, de forma a conferir-lhe eficácia dogmática e valoração na hora de decidir os casos submetidos ao Judiciário. Nessa senda, o processo e a legislação infraconstitucional buscam seus fundamentos de legitimidade e correção na Carta Magna.
É nessa direção o magistério de Eduardo Cambi, para o qual o texto constitucional “não somente por sua posição hierárquica, mas pela quantidade e profundidade das matérias que disciplinou, está no centro do ordenamento jurídico”, de modo que não seria possível “compreender o processo, sem antes buscar seus fundamentos de validade – formal e material – na lei fundamental”.([3])
O Código de Processo Civil de 2015 rende-se a tais premissas, buscando concretizar os valores dispostos na Constituição de forma apriorística. Neste sentido, “adota-se como fio condutor, especialmente da atividade judicante, a positivação de um catálogo de direitos fundamentais, pela onipresença, na Constituição, de princípios e regras”([4]) que vão adquirir concreção infraconstitucional na nova legislação ordinária.
Nesse norte, pode-se afirmar que o modelo constitucional do processo a que o NCPC se afeiçoa é o que parte da garantia máxima de acesso à justiça (CF, art. 5º, XXXV) e se completa com as garantias, também fundamentais, do devido processo legal (art. 5º, LIV), do contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV), da vedação das provas ilícitas (art. 5º, LVI), do juiz natural (art. 5º, XXXVII e LIII), da publicidade dos atos processuais (arts. 5º, LV, e 93, IX), da fundamentação obrigatória das decisões judiciais (CF, art. 93, IX), da assistência jurídica integral e gratuita aos hipossuficientes (art. 5º, LXXIV), da duração razoável do processo e do emprego dos meios que garantam a celeridade de sua tramitação (CF, art. 5º, LXXVIII).([5])
Não obstante, o art. 1º do novo diploma processual estatui, prontamente, que “o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e os princípios fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código”.
O texto de entrada do NCPC não deixa dúvidas, quer pela posição topográfica, quer por explicitar o alicerce básico do processo, a Constituição, que ele constitui-se no dispositivo central do novo ordenamento processual civil.([6]) Consagra-se, desse modo, a supremacia substancial da Lei Fundamental, apontando-se explicitamente para a constitucionalização do processo.
A norma, relata a doutrina, apesar de ser um preceito evidente e indiscutível, revela-se de verdadeiro caráter didático e instrutivo, demonstrando, assim, que o diploma processual foi concebido e orientado a par e a partir da Constituição Federal, o que é deveras relevante, tendo em vista que este é o primeiro código de processo civil construído e promulgado sob regime democrático – já que os dois anteriores foram concebidos em períodos de regimes autoritários e ditatoriais, 1939 e 1973.([7])
No ponto, comenta a professora Teresa Arruda Alvim:
O dispositivo anuncia a linha mestra fundamental da construção do novo sistema processual civil brasileiro. Um dos objetivos que se teve ao se elaborar este novo Código foi o de situá-lo, expressa e explicitamente, num contexto normativo mais amplo, em que a Constituição Federal ocupa o principal papel. Esta contextualização tem uma função quase didática. Não é a partir deste artigo, obviamente, que o CPC deverá passar a submeter-se à Constituição Federal. Trata-se de um dispositivo que deve ser lido antes de todo e qualquer outro dispositivo que integra o Código, que deve ser compreendido a partir dos princípios constitucionais fundamentais. Está aí para ser visto, para que o intérprete não o deixe de lado, porque não teria sido “lembrado”. O artigo viabiliza de forma inequívoca a imposição que já existe: a de que o CPC seja compreendido à luz da Constituição Federal.([8])
Cassio Scarpinella Bueno, por sua vez, ao comentar o aludido enunciado normativo, informa que ele deve “ser enaltecido e bem compreendido para viabilizar uma interpretação e uma aplicação do CPC de 2015 – e, repito, de todo o direito processual civil -, mais harmônico com os valores do Estado constitucional brasileiro”.([9])
É nesse sentido também o magistério do Prof. Fredie Didier Jr., tendo em vista, primordialmente, o fato de que:
[…] as normas de direito processual civil não podem ser compreendidas sem o confronto com o texto constitucional, sobretudo no caso brasileiro, que possui um vasto sistema de normas constitucionais processuais, todas orbitando em torno do princípio do devido processo legal, também de natureza constitucional.([10])
Na mesma direção é o magistério de Humberto Theodoro Júnior, para o qual:
[…] o Direito Processual Civil brasileiro está hoje totalmente constitucionalizado no campo de seus fundamentos e de sua macroestrutura. Os poderes de acesso à justiça e os deveres de tutela jurisdicional integram as garantias fundamentais proclamadas pela Constituição de 1988. As leis processuais comuns formam um arcabouço instrumental destinado a disciplinar os aspectos procedimentais para se alcançar a tutela jurisdicional. Mas, em virtude do princípio da supremacia da Constituição, sua interpretação e manejo não podem, de modo algum, contrariar as regras e princípios traçados pela ordem constitucional. Deve-se ter sempre em mente, como ponto de partida, a observância das garantias constitucionais do moderno processo justo, na medida em que insubordinar-se contra a lei ordinária equivale a atentar contra a própria Carta Magna.([11])
Com efeito, a própria Exposição de Motivos do NCPC assentou que a Comissão responsável por sua feitura teve como um dos objetivos “estabelecer expressa e implicitamente verdadeira sintonia fina com a Constituição Federal”, de modo a ficar “evidente a harmonia da lei ordinária em relação à Constituição Federal da República”.([12])
Foi imbuído deste espírito de valorização normativa da Constituição que o novo CPC dedicou seu primeiro capítulo a apresentar um elenco com as normas fundamentais do processo civil brasileiro – arts. 1º a 12.
Tais preceitos, consoante Didier,([13]) compõem o chamado “Diploma Processual Fundamental”, composto por princípios e regras, que densificam os direitos e garantias fundamentais contidos na Constituição para o processo civil.
Não se descura, entretanto, que tais princípios já vinham sendo aplicados. A novidade, na verdade, é que agora se encontram expressamente positivados no novo CPC. Tais contornos do modelo constitucional do processo esculpido na Lei 13.105/2015 têm por fim a formação e o desenvolvimento de um processo justo, que se revela por intermédio de uma tutela jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva.([14])
Nesse sentido, sobreleva-se – dentre outros – o art. 8º, estatuindo que o juiz, ao aplicar o ordenamento jurídico, “atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência”. Quanto à primeira parte do preceito, novidade inexiste; afinal, o art. 5º da LINDB já trazia a previsão de interpretação teleológica da lei. Todavia, merece atenção o fato de que pela primeira vez um diploma processual traz em seu bojo a previsão de que a dignidade da pessoa humana deverá ser resguardada e promovida.
Está-se diante, inevitavelmente, de preceito de forte cunho constitucional, derivando sua fundamentação do art. 1º, inc. III, da Constituição Federal que assevera, dentre os fundamentos da República Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa humana. Desse modo, vislumbra-se com tranquilidade que o novo Código de Processo Civil concebeu o superprincípio constitucional como vetor hermenêutico da maior monta, de modo que o intérprete do novel estatuto processual, ao analisar os pormenores jurídicos do caso submetido a sua apreciação, deverá resguardar e promover a dignidade da pessoa humana.
A propósito, inclusive, o princípio da razoabilidade e seu consectário princípio da proporcionalidade, que já figuram como princípios norteadores da Administração Pública no art. 37 da CF, agora aparecem como princípios processuais explícitos no art. 8º do novo CPC, imantando toda a atividade jurisdicional.
Merece destaque, dentre outros exemplos de aplicação direta do princípio da razoabilidade pelo legislador, a inversão do ônus da prova independentemente da existência de hipossuficiência, previsto no art. 373, § 1º, do novo Código de Processo Civil. A previsão, sintetiza o mestre Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, “alinha-se à intenção de concretizar os cânones constitucionais, notadamente no que tange ao estabelecimento de uma condição paritária entre os dois polos do processo”.([15])
Entretanto, a verticalização infraconstitucional dos mandamentos da Constituição Federal de 1988 não se restringem à pura e simples enumeração principiológica; o neonato CPC traz em seu bojo diversas normas verdadeiramente fundantes de um processo efetivo e justo. É isso que se extrai dos artigos 3º a 11 da Lei 13.105/2015. Por didática, adentrar-se-á nos seus pormenores nos próximos itens, vez que se compreende que qualquer estudo de instituto específico do processo deve, antes e necessariamente, perpassar pelos fundamentos sobre os quais se assenta a nova dogmática processual.
1.2. O acesso à justiça e a democratização do processo
A Exposição de Motivos do novo diploma processual deixa claro quais foram os objetivos principais para se transformar e melhorar a prestação jurisdicional: o fortalecimento do contraditório, a maior exigência em termos de fundamentação das decisões, instrumentos voltados para economia processual, preservação da isonomia, da segurança jurídica e da duração razoável do processo e o maior grau de gestão participativa e democrática, indicam alguns dos propósitos que permearam a feitura do novo CPC.
Tais intuitos revelam a opção do legislador pelo devido processo legal que, conforme levantado anteriormente, atendem aos conclames da dignidade da pessoa humana. Dessa forma, pode-se afirmar que todas as cláusulas principiológicas e valorativas contidas no novo Código, atendem, numa primeira observação, aos pressupostos constitucionais do processo justo, adequado e efetivo.([16])
Nessa senda, podem-se apontar os arts. 3º a 11 – o chamado “Diploma Processual Fundamental” – que estabelecem as primeiras linhas que irão reger o novo Código, daí a identificação dentro do conjunto nominado “normas fundamentais do processo civil”.
No art. 3º, inicialmente, tem-se o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional ou, conforme ensina Leonardo Carneiro da Cunha, “princípio do livre acesso à justiça”.([17]) Do dispositivo, extrai-se que o acesso à justiça deve ser garantido, a fim de que qualquer cidadão consiga postular seus direitos em juízo, sem qualquer limitação desproporcional. Nesse sentido, não basta o acesso. É importante, ademais, que se viabilize uma solução eficiente, com a implementação de “uma dogmática processual voltada para um processo de resultados concretos”.([18]) Aqui, evidentemente, tem-se princípio inaugural de efetividade da dignidade humana, afinal, não se tem como cogitar de um processo devido, adequado e justo, se não tem condições razoáveis de se postular em juízo e de se ter acesso à justiça.
Comentando o dispositivo, precisas são as linhas do professor Paulo Cezar Pinheiro Carneiro:
[…] o acesso à justiça não pode ser entendido exclusivamente pelo direito de participar, de obter uma resposta. É preciso que o Estado assegure meios para que ele se concretize em toda a sua plenitude. Assim, deve estruturar o Poder Judiciário de forma adequada, com juízes suficientes, conciliadores, serventuários diversos, cartórios devidamente equipados etc. São prestações positivas que o Estado deve oferecer para garantir o efetivo acesso à justiça. Quanto melhor forem as ações estatais para aparelhar a máquina judiciária, mais rápido e efetivo será o acesso.
Em suma, o acesso somente será pleno quando a informação dos direitos for adequada, estiver garantida a participação de quem quer que seja no devido processo legal e que assegure à parte, que tem o melhor direito, a receber o mais rápido possível o bem da vida a que faz jus.([19])
Nos parágrafos primeiro e segundo, especificamente, o novo código incentiva a composição do litígio por iniciativa das partes, por intermédio de formas alternativas à prestação jurisdicional, tais como a conciliação e a arbitragem, revelando uma nova tendência do direito processual brasileiro.
No § 2º do mesmo artigo, tem-se o princípio da solução consensual dos conflitos, ao dispor que “O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos”. Daí a ideia de existência de um princípio de estímulo da solução por autocomposição. Imbuído deste espírito de cooperativismo processual, o novo CPC congrega um ambiente democrático, cujos pressupostos apontam para construção de soluções adequadas, com mínimo de lesão à dignidade das partes que postulam em juízo. Esse, nos parece, é o mote identificador do neonato código: a cooperação processual e a solução consensual das demandas.
Nesse contexto, “passa a ser uma obrigação, e uma prioridade do Estado no exercício da função jurisdicional, sempre que possível, empregar todos os meios necessários para o alcance das finalidades salientadas”.([20]) Afora isso, o legislador achou por bem orientar os principais atores do processo (juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público) a estimularem a solução consensual por meio da conciliação e da mediação.
A despeito da conciliação, precisamente, o novo estatuto processual procura “infundir a cultura da pacificação entre os protagonistas do processo”.([21]) Tem-se, por exemplo, o art. 165, que prevê a criação de centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pelas audiências de conciliação e mediação; o art. 166, estabelecendo os princípios que informam a conciliação e a mediação; o art. 319, inc. VII, que faculta ao autor expor na inicial o desejo de participar ou não de audiência conciliatória e o art. 694, que recomenda, nas controvérsias familiares, a solução consensual, possibilitando, inclusive, a resolução extrajudicial.
Outrossim, o art. 334, caput, do novo Código, prevê, como regra, a realização prévia de audiência de conciliação ou de mediação, a partir da qual, se for o caso, começa a fluir o prazo para a contestação (art. 335, I). Existe, inclusive, previsão de multa de até 2{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} (dois por cento) da vantagem econômica pretendida pelo não comparecimento injustificado de qualquer das partes, além de ser considerado ato atentatório à dignidade da justiça (art. 334, § 8º).
Clareando o intuito do NCPC, os mestres Marinoni, Mitidiero e Arenhart lecionam:
O novo Código tem como compromisso promover a solução consensual do litígio, sendo uma das suas marcas a viabilização de significativa abertura para a autonomia privada das partes – o que se manifesta não só no estímulo a que o resultado do processo seja fruto de um consenso das partes (art. 3º, §§ 2º e 3º, CPC), mas também na possibilidade de estruturação contratual de determinados aspectos do processo (negócios processuais, art. 190, CPC, e calendário processual, art. 191, CPC). O juiz dirigirá o processo com a incumbência de promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais (art. 139, V, CPC).([22])
Parece indiscutível, pois, que à luz da dignidade da pessoa humana, um novo horizonte menos beligerante se aproxima do processo civil, pautando-se, inclusive, pela gestão participativa e democrática do processo, com a cooperação das partes e a valorização destas em relação aos atos do processo.
Nesse sentido, Nelson Rosenvald diz que a eficácia positiva da dignidade da pessoa humana relaciona-se de forma íntima com o modelo colaboracionista do Estado Democrático, “sendo uma de suas vertentes a materialização da autodeterminação e liberdade de escolha, notadamente vivificada no art. 190 do CPC/15”.([23]) A norma, diz o mestre civilista:
[…] conforma os negócios processuais realizados entre as partes plenamente capazes […] para fins de mudança de procedimento em direitos que admitam a autocomposição, respeitados os limites do ordenamento quanto à validade desses acordos (v.g. não podem ter por objeto poderes do juiz, renúncia ao núcleo essencial de direitos fundamentais, bem como acordos irrevogáveis ou que envolvam a integralidade do direito).([24])
É no mesmo sentido que Marinoni, Mitidiero e Arenhart se pronunciam, a saber:
[…] a dignidade da pessoa humana conecta-se com o direito à liberdade e à autonomia privada, o que explica a necessidade de respeito, dentro dos limites constitucionais e legais, aos negócios processuais realizados entre as partes (art. 190, CPC) e constitui estímulo à realização de calendários processuais entre o juiz e as partes como instrumento para eficiente gestão do tempo no processo civil (art. 191, CPC).([25])
Com efeito, a opção adotada pelo legislador de 2015 parece bastante óbvia: a solução consensual dos litígios é, de longe, a melhor forma de pacificação social, seja porque assegura uma rápida solução do imbróglio, seja porque onera demasiadamente menos as partes, contribuindo, assim, para uma tutela satisfativa para ambas as partes.
1.3. A solução integral do mérito e a duração razoável do processo
Seguindo a análise das normas fundamentais do novo Código, o art. 4º, a seu passo, impera que “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.([26]) Numa primeira análise, pode-se dizer que o comando declara a razoável duração do processo. Significa dizer que um processo “somente pode ser qualificado de devido, justo ou équo, se ostentar uma razoável duração”.([27])
Dito de outro modo, a solução da causa deve ser obtida em tempo razoável, aí incluída a atividade necessária à satisfação efetiva do direito. Entretanto, não se está defendendo que um processo seja demasiado célere. Um processo que respeita as garantias fundamentais, já nos atenta o prof. Alexandre Freitas Câmara, é, necessariamente, um processo que demora algum tempo. Destarte, “um processo rápido e que não produz resultados constitucionalmente adequados não é eficiente”,([28]) o que pode acarretar mácula no devido processo legal e, por consequência, na dignidade das partes que litigam em juízo.
Tal direito – à tutela tempestiva – implica também num direito à economia processual, vez que o aproveitamento dos atos processuais já praticados – sem decretações de nulidade e repetições desnecessárias – promove um processo com consumo equilibrado e eficiente do tempo. É nesse sentido que os mestres Marinoni, Mitidiero e Arenhart informam que a “economia processual entra no núcleo duro do direito à tutela jurisdicional tempestiva”.([29])
Verticalizando, em nível infraconstitucional, o comando estabelecido no art. 5º, LXXVIII da CF, introduzido pela EC 45/2004, o novo Código processual traz uma série de modificações que, em última medida, buscam conferir mais eficiência e celeridade ao processo. Sobre o tema, Paulo Cezar Pinheiro Carneiro reúne – resumidamente – as principais mudanças:
[…] a defesa foi toda concentrada numa única peça, eliminadas aquelas realizadas através de exceções (art. 336); a conciliação e a mediação, como examinado anteriormente, passaram a ter um tratamento digno e prioritário (arts. 165 a 175 e art. 334); a previsão de realização de uma série de atos processuais através de meios eletrônicos (arts. 170; 171; 183, § 1º; 194; 205, § 3º; 228, § 2º; 232; 235, § 1º; 246, V; 263; 270; 334, § 7º; 513, § 2º, III; 837; 854; 854, §§ 6º e 9º; 876, § 1º, III; 879, II; 880, § 3º; 892; 915, § 4º; 979; 1.019, III; 1.038, § 1º); o capítulo sobre a cooperação entre juízes praticamente eliminou o formalismo das cartas precatórias (arts. 67 a 69); o novo instituto da tutela da evidência, pautado em prova documental inequívoca a que o réu não oponha contraprova adequada, permite o imediato julgamento do processo, independentemente da urgência (art. 311); a inserção de dispositivos pontuando a força da jurisprudência e, portanto, a necessidade de observância dos precedentes, com vias a solidificar e privilegiar as decisões dos tribunais superiores (arts. 926 e 927); a criação do incidente de resolução de demandas repetitivas, capaz de eliminar a repetição de processos com a mesma questão de direito em curto espaço de tempo (arts. 976 a 987); o recurso de agravo de instrumento ficou restrito a um determinado número de hipóteses (art. 1.015), com a eliminação da preclusão das questões decididas no curso do processo, que deverão ser impugnadas por ocasião da apelação (arts. 1.009, § 1º); o cumprimento de sentença e o processo de execução foram agraciados com importantes preceitos para conferir maior efetividade ao processo. (v.g., a regulamentação da penhora online – art. 854; limitação da impenhorabilidade de depósitos em contas bancárias, correspondentes a salários em geral, pensões, pecúlios e outros, até o valor de cinquenta salários mínimos – art. 833, § 2º; a possibilidade da decisão judicial ser levada a protesto – art. 517, entre outras).([30])
Para que os efeitos do novo código sejam notáveis, no que diz respeito, especificamente, a minimizar a duração dos processos, “é imprescindível a boa vontade e o espírito cooperativo de todos os ‘personagens’ que lidam no foro: juízes, advogados, promotores e as próprias partes”.([31])
O mesmo art. 4º, fazendo-se uma leitura criteriosa, nos revela também o princípio da primazia do julgamento de mérito. Ou seja, as regras processuais devem balizar-se preferencial e prioritariamente pelo primado da análise ou do julgamento de mérito. Nesse sentido, “o processo é um método de resolução do caso concreto, e não um mecanismo destinado a impedir que o caso concreto seja solucionado”.([32]) O juiz, a fim de conferir eficácia ao mandamento legal, sempre que possível, deve superar os vícios, estimulando e permitindo sua correção, a fim de que possa efetivamente se dedicar sobre o mérito e solucionar o conflito entre as partes.([33])
Nesse contexto, evidentemente, o Poder Judiciário há de estar atento a tais mudanças, de modo a compatibilizar a teoria processual com a prática judicante efetiva. A despeito, inclusive, o Professor Elias Marques de Medeiros Neto leciona que:
Para a obtenção da efetiva prestação da tutela jurisdicional – aqui entendida como a tutela pautada pelos princípios da eficiência, da duração razoável do processo, da celeridade, do devido processo legal e inspirada nos sólidos fundamentos do pleno acesso à justiça -, dois grandes desafios devem ser enfrentados.
O primeiro, de natureza institucional, implica a importância de o Estado se aparelhar de forma apta a gerir eficazmente as resoluções de conflitos; de nada adianta uma legislação processual ultramoderna se o Estado, por intermédio dos seus órgãos – entre os quais o Poder Judiciário -, não está apto a dirimir de forma efetiva as lides.
[…]
O segundo desafio passa pela necessidade de a legislação processual conferir os mecanismos necessários para que o titular do direito material possa receber uma resposta adequada, oportuna, tempestiva e eficaz do Poder Judiciário, uma legislação processual adaptada às especificidades dos diferentes casos concretos que são levados diariamente ao conhecimento do Poder Judiciário, e que realmente possibilite ao demandante obter as garantias necessárias para a concreta realização do seu direito.
Os dois desafios devem e precisam ser enfrentados, sendo ambos fundamentais para a obtenção da almejada efetividade do processo.([34])
Nessa direção, portanto, o novo Código, tão somente, não resolverá o problema da ineficiência e morosidade do processo. É necessário, e não poderia ser diferente, que todos os protagonistas processuais e, sobretudo, o Estado Judiciário, tenham vontade de modernizar a aplicação das normas processuais.
1.4. A boa-fé processual e o princípio da cooperação
Seguindo os preceitos iniciais do Novo CPC e suas normas fundamentais, tem-se ainda o princípio da boa-fé objetiva amarrado no art. 5º, in verbis: “Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé”.
A boa-fé, não se descuida, já era prevista no Código revogado como um dos deveres das partes e de seus procuradores. No novo Código, entretanto, a boa-fé é erigida à categoria de norma fundamental do Processo Civil, tendo efeito irradiante em relação às demais normas do ordenamento processual.([35]) Nelson Rosenvald, inclusive, compreende que o fundamento constitucional da boa-fé objetiva decorre da proteção à dignidade da pessoa humana, conferida pelo art. 1º, III, da CF.([36])
Com efeito, a boa-fé objetiva é elemento que deve ser levado em conta “necessariamente na interpretação dos atos jurídicos em geral e inclusive – nem poderia ser diferente – dos atos processuais”.([37]) Nessa direção, o CPC de 2015 faz uso desta vertente da dignidade humana em dois momentos. O primeiro está no § 2º do art. 322 sobre a interpretação do pedido formulado pelo autor quando ingressa em juízo: “A interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé”. Doutro lado, o § 3º do art. 489, na oportunidade da interpretação das decisões judiciais, é expresso no sentido de que “a decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé”.
Destarte, a cláusula geral do art. 5º do novo diploma processual é, nos dizeres de Fredie Didier Jr:
[…] a fonte normativa da proibição do exercício inadmissível de posições jurídicas processuais, que podem ser reunidas sob a rubrica do “abuso do direito” processual (desrespeito à boa-fé objetiva). Além disso, o princípio da boa-fé processual torna ilícitas as condutas processuais animadas pela má-fé (sem boa-fé subjetiva). Ou seja, a boa-fé objetiva processual implica, entre outros efeitos, o dever de o sujeito processual não atuar imbuído de má-fé, considerada como fato que compõe o suporte fático de alguns ilícitos processuais.([38])
Sendo assim não existem dúvidas de que a incidência da boa-fé impõe aos agentes do Poder Judiciário, e também às partes envolvidas na celeuma jurisdicional, um dever de agir segundo os comportamentos socialmente assentados na tradição da lisura, coerência e lealdade. A boa-fé objetiva, portanto, acaba por funcionar como vetor da dignidade humana nas relações entre todos os sujeitos processuais. Esse diretriz, ensina o professor Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, tem uma razão muito simples: “se o processo é composto de pessoas, é evidente que quanto mais adequado for o comportamento destas, maior será a probabilidade daquele alcançar a sua finalidade”.([39])
Nesse sentido, a boa-fé processual não seria um conceito vago, de interpretação ampla e subjetiva. Antes, ela tem duas funções principais: a de estabelecer comportamentos probos e éticos aos diversos atores do processo e de restringir ou proibir a prática de atos considerados abusivos.
O novo Código de Processo Civil ainda prescreve no art. 6º que “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”. O cooperativismo processual deriva, consoante o magistério de Leonardo Carneiro da Cunha, da sobredita boa-fé objetiva. O art. 6º, pois, é um corolário do art. 5º.([40])
Tal preceito ainda congrega os valores do contraditório e do devido processo legal, uma vez que às partes é conferida oportunidade de participarem no convencimento do juiz. Instaurando-se, pois, um novo modelo de processo pautado no princípio da cooperação. Tal modelo cooperativo:
[…] afasta-se da ideia liberal do processo, que tem um juiz passivo, responsável por arbitrar uma “luta” ou “guerra” entre as partes. O modelo cooperativo também se afasta da ideia de um processo autoritário, em que o juiz tem uma postura solipsista, com amplos poderes.([41])
É nessa direção que se pode afirmar que, em sua perspectiva mais ampla, o contraditório é a garantia de participação das partes no processo, aí incluída a possibilidade de influir – legitimamente – no convencimento do juiz, o que reforça a estrutura marcadamente dialética e democrática do novo processo e a convicção de que, quanto mais diálogo houver, melhor será o resultado da tutela jurisdicional pleiteada.
A respeito, Paulo Cezar Pinheiro Carneiro sintetiza:
O regime democrático exige a participação em cooperação de todos aqueles que possam ser afetados pelo exercício de determinado poder do Estado, que só assim poderá ser considerado como legítimo. Nos processos jurisdicionais, a cooperação é verificada com a participação das partes e terceiros que devem construir, juntamente com o juiz, a decisão.
A cooperação ocorre através da prática dos atos processuais, que no contexto das partes realiza-se com o exercício dos direitos de ação, de defesa e de manifestação em geral; e na seara da magistratura se efetiva através das ordens e decisões lato sensu. Ademais, a cooperação, como dever imposto aos sujeitos do processo, pressupõe uma harmoniosa sintonia nesta prática de atos processuais, os quais devem ser realizados sempre sob o signo da boa-fé, inclusive, aqueles praticados por terceiros estranhos ao conflito, que também devem cooperar com a atividade jurisdicional.
Aliás, os participantes do processo não poderiam ter comportamento diverso, na medida em que a finalidade da jurisdição é a realização da justiça rápida e eficaz. Para o alcance desse mister, é fundamental que exista um vínculo de cooperação entre todos aqueles que participam da atividade jurisdicional, sem o qual dificilmente as suas finalidades poderiam ser alcançadas.([42])
Nesse passo, pois, a figura do juiz torna-se importantíssima, vez que esse modelo o qualifica como um dos participantes do processo, igualmente gravado pela necessidade de observar o contraditório ao longo de todo o procedimento e, nessa linha, esse juiz estaria “obrigado ao debate, ao diálogo judiciário”, estando gravado, em certa medida, por “deveres de esclarecimento, prevenção, consulta e auxílio para com os litigantes”.([43])
Assim, no processo guiado pela colaboração, as partes e o juiz ficam em plano de igualdade, com intenso diálogo sobre os rumos do processo em verdadeiro passo de modelo cooperativo.
O juiz do processo dito cooperativo deve ser, nos aclara Daniel Mitidiero:
[…] um juiz isonômico na condução do processo e assimétrico no quando da decisão das questões processuais e materiais da causa. Desempenha duplo papel, pois ocupa dupla posição; paritário no diálogo, assimétrico na decisão. Visa-se alcançar, com isso, um ponto de equilíbrio.([44])
É de se ressaltar, portanto, que o princípio da cooperação impõe e “orienta o magistrado a tomar uma decisão de agente-colaborador do processo, de participante ativo do contraditório e não mais de um mero fiscal de regras”.([45]) O princípio da cooperação parte, com razão, da necessidade do juiz de adotar uma postura de diálogo com as partes e os demais sujeitos do processo.([46]) Nesse sentido é o magistério de Paulo Cezar Pinheiro Carneiro:
O princípio da cooperação não se limita aos participantes tradicionais do processo: autor e réu. Deve o juiz, sempre que necessário, especialmente nos processos cujo resultado possa alcançar um grande número de pessoas, permitir a intervenção de pessoas, órgãos ou de entidades com interesse, ainda que indireto, na controvérsia. Assim, promover a realização de audiências públicas (art. 927, § 2º; art. 983, § 1º; art. 1.038, II; v.g.), e até mesmo permitir o ingresso de outros personagens que possam colaborar para a realização da justiça, caso do amicus curiae (arts. 138 e 1.038, I), são corolários lógicos de uma das formas de cooperação do juiz com o deslinde da causa. Quanto maior for a participação e, portanto, os elementos de informação, maior será a legitimidade democrática da decisão.([47])
Ainda conforme Fredie Didier Jr., o princípio da colaboração gera os seguintes deveres para o magistrado: (I) dever de esclarecimento; (II) dever de consultar; (III) dever de prevenir.
Pelo dever de esclarecimento, o juiz deve se esclarecer junto às partes quanto às dúvidas que tenha sobre as suas alegações, pedidos ou posições em juízo. O dever de consultar está ligado ao direito ao contraditório, devendo o juiz consultar as partes sobre as questões de fato ou de direito, antes de decidir a lide. O dever de prevenção, por sua vez, “vale genericamente para todas as situações em que o êxito da ação possa ser frustrado pelo uso inadequado do processo”.([48])
Afora tais deveres, evidentemente, o que se disse acima se aplica em tudo à decisão judicial, vez que ela somente alcançará legitimidade democrática, com a almejada rapidez e justiça, se a cooperação for elemento constante e indissociável de todo o iter processual.
Ademais, o novo CPC em, seu art. 7º, congrega e densifica o devido processo legal nos seguintes termos: “É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório”.
O dispositivo revela duas diretrizes. A primeira esposada na consagração do princípio da igualdade no processo, assegurando às partes paridade de tratamento.([49]) A segunda, impõe um dever ao juiz, qual seja, zelar pelo efetivo contraditório, reequilibrando as eventuais desigualdades existentes no processo. O princípio do contraditório, tal qual disciplinado no novo CPC, revela uma dupla garantia: a de participação com influência no resultado decisório e a vedação de não surpresa.
Na primeira acepção, tem-se que “o resultado do processo deve ser fruto de intenso debate e da efetiva participação dos interessados, não podendo ser produzido de forma solitária pelo juiz”.([50]) Nesse sentido, qualquer fundamento de decisão precisa ser submetido ao crivo do contraditório, assegurando-se oportunidade para que as partes se manifestem especificamente sobre qualquer fundamento decisório. Não é por outro motivo que, nos termos do art. 10, “o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.
Comentando o art. 10, Paulo Cezar Pinheiro Carneiro expõe:
A inovação do dispositivo em exame se põe justamente na obrigação de oportunizar às partes que se manifestem previamente à decisão judicial, seja para aquelas questões conhecíveis de ofício, seja para aqueles fundamentos extraídos das provas constantes dos autos e que as partes não debateram.([51])
No novo Código, especificamente, com o objetivo de assegurar a igualdade material entre os litigantes e, por conseguinte, a paridade das partes, existe uma regra geral que confere ao juiz a possibilidade de flexibilizar o procedimento, adequando-o às necessidades do conflito, de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito (art. 139, VI). Nesta linha, pode o magistrado dilatar prazos, inverter a ordem processual de produção de provas, além de promover outras medidas necessárias ao alcance do efetivo contraditório.
Vê-se, portanto, que o modelo de processo cooperativo, coparticipativo e isonômico moldou o Código de Processo Civil, de modo que o devido processo legal lastreia-se, sobretudo, com respeito a um contraditório prévio, efetivo e dinâmico. Não é por outra razão, conforme ensina Alexandre Freitas Câmara,([52]) que o art. 9º expressamente dispõe que “não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida”. Trata-se de verdadeira garantia processual que norteia o resguardo e a promoção da dignidade da pessoa humana no trato do processo.
Aliás, vale dizer que o contraditório contemporâneo encontra-se escorado em duas linhas principais, conforme nos ensina Paulo Cezar Pinheiro Carneiro: “a vedação às decisões-surpresa – corolário do direito de participação – e o direito de influenciar a decisão judicial, a qual tem no dever judicial de motivar a decisão o seu escudo protetor”.([53])
No tocante à igualdade, esta também estende seus efeitos no momento da prolação da decisão judicial. Isso porque o novo Código de Processo Civil procurou prestigiar a jurisprudência consolidada dos tribunais (arts. 926 a 928, que trata das disposições gerais sobre a ordem dos processos nos Tribunais), visando a alcançar a maior igualdade possível nos resultados de processos que tratam da mesma questão de fato e de direito. No ponto, Paulo Cezar Pinheiro Carneiro ensina que:
Este enfoque isonômico também tem como objetivo afirmar a segurança jurídica, não somente no sentido de que basta garantir aos sujeitos a paridade de armas, mas também que os resultados dos processos símiles, com a jurisprudência já consolidada, sejam idênticos, a fim de resguardar a previsibilidade e a constância das decisões no espectro de um ordenamento uniforme.
O duplo aspecto da isonomia, na perspectiva do resultado do processo e da segurança jurídica, somadas às demais vicissitudes da igualdade […], informam a preocupação do legislador com a unidade da jurisdição (lei e jurisprudência) na perspectiva das garantias fundamentais do processo.
A constante modificação da jurisprudência, sem motivos efetivos que a sustentem, é fator de violação direta à segurança jurídica, pois impede a adoção de comportamentos padronizados por parte dos jurisdicionados. O mesmo se diga em relação à isonomia, afinal decisões conflitantes ferem a igualdade das partes no espectro do resultado do processo. E pensando nestas questões, o legislador do novo Código estabeleceu previsões determinando a vinculação dos magistrados às decisões pretéritas.([54])
Todos esses preceitos normativos, induvidosamente, revelam a constitucionalização efetiva do direito processual civil, com o respeito na legislação infraconstitucional aos princípios da isonomia, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Todos esses indissociáveis do princípio da dignidade da pessoa humana.
A priorização da rapidez, da isonomia nas decisões, da efetividade e da cooperação entre as partes, sem se afastar das garantias processuais constitucionais, demonstram um Código, pelo menos dogmaticamente, comprometido com resultados jurisdicionais justos.
1.5. A aplicação constitucional das normas processuais
O NCPC criou artigo específico sobre a aplicação das normas processuais. Isso porque a norma insculpida no art. 8º do CPC/2015 revela-se como verdadeiro guia hermenêutico do magistrado no momento de aplicação das regras processuais. Sem correspondência no Código revogado, o sobredito artigo possui a seguinte redação: “Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência”.
Como sustentado anteriormente, a norma em comento não traz nenhuma novidade significativa no tocante à interpretação das normas e os princípios que a regem. Todavia, uma característica importante do dispositivo em comento é exatamente o fato de que a interpretação do “ordenamento jurídico” compreende as normas processuais. Ou seja: não é só na aplicação do direito material que o magistrado deve observar os fins sociais, as exigências do bem comum e outros cânones interpretativos. Na interpretação das normas processuais, o guia insculpido no art. 8º também deve ser seguido à risca.
Merece destaque, especialmente, o princípio da dignidade da pessoa humana. Sob o enfoque processual, a dignidade assume dois significados principais: primeiro, reconhece às partes um direito de atuação efetiva, paritária e respeitosa; o segundo se refere à própria prestação jurisdicional, a qual deve ser justa, eficaz e ter uma duração razoável.
Noutro norte, os postulados da razoabilidade e da proporcionalidade também servem como normas de ponderação na aplicação concreta das normas procedimentais. Não são raras as vezes que o magistrado deve decidir entre duas opções processuais possíveis. A razoabilidade, precisamente, serve como importante norte para decidir-se justa e efetivamente.
1.6. A fundamentação das decisões judiciais
O art. 11 do NCPC encerra uma das mais antigas e importantes garantias processuais: a motivação das decisões judiciais. Na missão de aplicar o ordenamento jurídico, o magistrado deve observar as regras do procedimento. Dentre estas, destaca-se o dever de fundamentar as suas decisões.
Este dever é uma decorrência natural do acesso à justiça e do devido processo legal, garantias expressamente asseguradas pela Constituição (art. 5º, XXXV e LIV e art. 93, IX). Duas, diz a doutrina, são as razões para a necessidade de motivação: primeiro porque serve de garantia para as partes diante do “convencimento” do magistrado; segundo porque permite um controle adequado da prestação jurisdicional.
Tal regra, evidentemente, acarreta para as partes o direito de obter do Estado-juiz uma decisão motivada que analise todos os pontos e argumentos apresentados. É nessa linha que o inciso IV do § 1º do art. 489 estabelece que a decisão judicial não é considerada fundamentada se ela não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador.
A motivação, portanto, compreende a análise de todos os fatos apresentados em juízo, bem como na apreciação dos fundamentos jurídicos que lhe dão suporte. Atento a essas imposições, o novo Código de Processo Civil, além de considerar a motivação das decisões como norma fundamental, procurou orientar a sua aplicação por meio de regras próprias (art. 489, § 1º, I a VI, §§ 2º e 3º), sem as quais a decisão não será considerada válida (art. 489, § 1º).
Nesse passo, uma decisão não será considerada válida se o juiz se limitar a indicar ou a reproduzir parte de ato normativo, sem correlacioná-lo com a questão decidida (art. 489, § 1º, I). Da mesma forma, a decisão será inválida se o magistrado, ao motivar, fizer afirmações sem conteúdo.
É de se ver que no novo Código não basta ao juiz motivar a decisão judicial expondo as razões de seu convencimento. É preciso mais. Deverá o magistrado expor por qual razão não acatou os argumentos trazidos pelas partes, concretizando, em última análise, a completude da decisão judicial e o caráter cooperativo e participativo que o novo Código quis conferir ao processo.
2 PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE EXECUÇÃO
2.1. Princípios fundamentais da execução
Afora todo o plexo de normas processuais fundamentais estabelecidas na Constituição Federal de 1988 e densificadas no texto do novo diploma processual, a doutrina há muito indica a coexistência de princípios processuais executivos específicos. Por evidente, todos os elementos normativos existentes no texto constitucional irradiam sua eficácia para a execução. Desse modo, o devido processo legal, a ampla defesa, o contraditório, a isonomia, a duração razoável do processo, a publicidade das decisões jurisdicionais, a motivação das decisões e a dignidade da pessoa humana são princípios indissociáveis ao processo de execução.
Assim, neste tópico apenas serão indicados aspectos particulares e precisos sobre estes princípios aplicados ao processo de execução.
O primeiro deles, o devido processo legal, está tratado na CF/88, em seu artigo 5º, inciso LIV. De seu fundamento extrai-se que a prática de atos executórios depende da observância do devido procedimento legal executivo. Ou seja: para que o devedor possa perder eventualmente seus bens, é absolutamente importante que seja seguida a legalidade, evitando-se, enfim, que a expropriação caminhe em harmonia com o abuso ou a ilegalidade. Por certo, além de fortalecer a segurança do e no procedimento executivo, o princípio do devido processo legal também deve ser comungado com os princípios do contraditório, da ampla defesa e da isonomia. Assim, para que o devido processo legal seja respeitado e o procedimento seja tido como adequado, faz-se absolutamente necessário que este procedimento assegure o contraditório, a ampla defesa a isonomia no tratamento ao exequente e ao executado.
Nessa perspectiva, o princípio do contraditório “se compreende na necessidade de garantia de participação do credor e do devedor no processo de execução”.([55]) É bem verdade que a participação do devedor, em certa medida, limitar-se-á a fiscalizar os atos executórios ou defender-se na execução.([56]) Doutro lado, para o credor caberá indicar bens para serem penhorados, participar do procedimento de avaliação, bem como requerer eventuais adjudicações ou alienações judiciais.
Comentando a irradiação do princípio do contraditório na execução, Marcelo Abelha([57]) ensina:
[…] parece não existirem dúvidas de que há, sim, o contraditório no processo de execução ou na atividade executiva, simplesmente porque nestas há “participação”, e, se esta existe, então estará presente o contraditório. As partes e também o juiz participam e devem cooperar entre si na obtenção do resultado executivo, e, se isso acontece, certamente é porque deverá estar presente o contraditório.
Na mesma direção, reconhecendo a existência do contraditório no processo executivo, manifesta-se Alexandre Freitas Câmara:([58])
É inegável a presença de contraditório no processo executivo (ou na fase executiva de um processo misto). Basta pensar, por exemplo, na execução por quantia certa contra devedor solvente, em que o bem penhorado é levado à avaliação judicial. Elaborado o laudo, deve-se comunicar as partes de seu teor (informação necessária), para que possam, querendo, impugná-lo pelo meio próprio (reação possível). Outro exemplo que pode ser aduzido é o da necessidade de citação do executado na execução por quantia certa contra devedor solvente fundada em título extrajudicial para, em três dias, pagar a dívida. Com isso, estar-se-á levando ao executado o conhecimento da demanda executiva ajuizada em face dele (informação necessária), além de se permitir que o executado atue no processo, pagando ou assumindo o risco de suportar a atividade executiva (reação possível).
Noutro giro, o princípio da isonomia se revela, sobretudo, no tratamento igualitário dispendido ao credor e ao devedor no processo de execução. O texto constitucional e o novo diploma processual rechaçam o tratamento desigual às partes que litigam em juízo. No processo de execução, especificamente, cuja relação de simetria já é abalada pelos seus próprios pressupostos (credor no lado positivo e devedor no lado negativo da relação processual), cabe ao magistrado, com diligência, aparar e igualar as garantias processuais tanto do credor quanto do devedor.
Ainda assim, outros princípios constitucionais revelam-se especiais para o processo executivo. Enquanto o princípio da publicidade (art. 93, IX, da CF/88) informa que todas as decisões jurisdicionais devem ser precedidas de publicidade, revelando-se em verdadeira garantia processual, o princípio da fundamentação das decisões impera que todas as decisões sejam sempre fundamentadas, sob pena de nulidade. E no processo de execução, precisamente, atos que agridem o patrimônio do devedor devem ter, com muito mais razão, a devida justificativa. De igual modo, não poderá o magistrado furtar-se a praticar atos executórios requeridos pelo credor sem motivar adequadamente sua decisão.
Noutro passo, ainda salta das normas processuais constitucionais o já sobredito princípio da duração razoável do processo. No processo de execução, especialmente, a respeitabilidade à duração justa e equilibrada do processo adquire importância bastante relevante. Isso porque, se de um lado deve ser respeitado o devido processo legal (garantia, no processo de execução, de verdadeiro valor para o devedor), de outro, não é razoável que demore tanto a execução a ponto de fulminar o adimplemento da obrigação. Razoável, diz a doutrina, “é o processo que tem respeitado os procedimentos legais sem delongas advindas pelas práticas do próprio Poder Judiciário”.([59]) Assim, para que o processo de execução dure razoavelmente, é vital que o adimplemento da obrigação ocorra sem uma demora injustificada, tudo a recomendar uma sensação de eficiência e justiça para credor e devedor.
Ainda assim, exalta do texto constitucional (e agora do art. 8º do NCPC) o princípio da dignidade da pessoa humana. No processo de execução, precisamente, o devedor não poderá sofrer qualquer espécie de constrição de seus bens a ponto de ferir sua dignidade. É nesse sentido que a própria lei estipula situações nas quais determinados bens são impenhoráveis.([60]) Em arremate, a tutela jurisdicional executiva não pode nem deve gerar situações incompatíveis com o princípio da dignidade da pessoa humana.
2.2. Princípios setoriais da execução
Afora tais princípios transcendentes ao processo de execução, a doutrina costuma indicar a existência de princípios setoriais ou princípios informativos do processo executório. Isso porque, nada obstante a relevância daqueles princípios, destaca-se outra banda de fundamentos próprios da execução, que se referem, especialmente, à função jurisdicional executiva. Por essa razão, serão abordados os principais princípios setoriais da execução.
2.2.1. Princípio da patrimonialidade
O princípio da patrimonialidade impõe que a execução somente recaia sobre os bens do devedor. Nesse sentido, o art. 789 do CPC dispõe que “o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei”.([61]) Dessa premissa, conclui-se que não havendo pagamento das dívidas, não será possível ocorrer a prisão civil do devedor, exceto na hipótese de devedor de pensão alimentícia.([62]
O art. 790, colmatando o art. 789, indica ainda os bens que também são sujeitos à execução: (I) do sucessor a título singular, tratando-se de execução fundada em direito real ou obrigação reipersecutória; (II) do sócio, nos termos da lei; (III) do devedor, ainda que em poder de terceiros; (IV) do cônjuge ou companheiro, nos casos em que seus bens próprios ou de sua meação respondem pela dívida; (V) alienados ou gravados com ônus real em fraude à execução; (VI) cuja alienação ou gravação com ônus real tenha sido anulada em razão do reconhecimento, em ação autônoma, de fraude contra credores; e (VII) do responsável, nos casos de desconsideração da personalidade jurídica.
A doutrina costuma chamar o princípio da patrimonialidade de princípio da realidade, ou seja, toda execução é real e não pessoal, devendo incidir, em regra, sobre o patrimônio do executado, e não imediatamente sobre sua pessoa.
Em certa medida, a execução tem como finalidade precípua a expropriação dos bens do devedor, visando satisfazer o direito do exequente. Ao executado, portanto, caberá adimplir suas obrigações com os seus bens presentes ou futuros. Todavia, essa expropriação não pode, em regra, atingir a pessoa do devedor, sob pena de coisificação da dignidade patrimonial do devedor. É nesse sentido que os professores Didier Jr., Cunha, Braga e Oliveira ensinam que “a humanização do direito trouxe consigo este princípio, que determina que só o patrimônio, e, não, a pessoa submete-se a execução”.([63])
Nessa perspectiva, ensina Humberto Theodoro Júnior:([64])
[…] toda execução é real, quer-se com isso dizer que, no direito processual civil moderno, a atividade jurisdicional executiva incide, direta e exclusivamente, sobre o patrimônio, e não sobre a pessoa do devedor. […] Em linha de princípio, portanto, frustra-se a execução e suspende-se o processo quando o devedor não disponha de bens patrimoniais exequíveis (art. 921, III).
Em resumo, com fulcro no princípio da realidade ou patrimonialidade, a atividade executiva deve atingir apenas o patrimônio do responsável executivo, admitindo-se mediatamente, quando a lei assim o autorizar, o uso de medidas executivas indiretas para satisfazer o crédito, tudo garantindo o devido processo legal executivo e à respeitabilidade ao princípio da dignidade da pessoa humana.
2.2.2. Princípio da autonomia
O princípio da autonomia do processo de execução estabelece que o processo executivo é autônomo ao processo de conhecimento. Enquanto este tem o objetivo de buscar o acertamento do direito material deduzido em juízo, aquele objetiva adimplir a obrigação do executado. A autonomia entre cognição e execução inspirou o CPC/1973 e, em grande medida, o CPC/2015. Em razão desse princípio, ensina o mestre José Miguel Garcia Medina:
[…] positivam-se regras que exibem a concepção de que os processos de conhecimento e de execução seriam “puros”, isto é, de que não se devem se realizar atos executivos no curso do processo de conhecimento e não devem haver atos cognitivos sobre a existência da obrigação no processo de execução.
Tal diretriz revela que as atividades cognitiva (sobre a existência ou não da dívida, por exemplo) e executiva são bem diferentes, o que recomenda que se perfaçam em processos diversos. No contexto do CPC de 2015, o princípio da autonomia é revelado na execução de título extrajudicial e, também, na execução de sentença que reconhece dever de pagar quantia em dinheiro.
Na primeira espécie, a cognição limitar-se-á a examinar os requisitos do processo executivo e à validade e adequação dos atos de execução levados a cabo pelo juízo. No segundo caso, sentença que condena ao pagamento de soma em dinheiro, o exequente deverá promover a execução, cabendo no curso do procedimento a avaliação dos seus pressupostos, assim como verificação da validade e da adequação dos atos executivos.
Noutro giro, no que se refere a determinados títulos executivos judiciais, não há que se falar mais em processo de execução, mas sim de fase executiva, uma vez que a Reforma de 2005 e o novo CPC estabeleceram o processo sincrético. Assim, em se tratando de títulos executivos judiciais, existirá a denominada fase de cumprimento de sentença, não havendo mais processo independente de execução do título judicial.
É nessa perspectiva que o NCPC, em harmonia com a noção de processo sincrético, estabelece – conforme visto anteriormente – que as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral da lide, incluída a atividade satisfativa (art. 4º, CPC/2015).
2.2.3. Princípio do resultado ou da especificidade
Por este princípio propõe-se que toda execução deve ter como meta a satisfação do interesse do credor. Ou seja: os atos executórios devem ser praticados com o propósito de se adimplir a obrigação. Nesse contexto, o Estado deve promover a tutela jurisdicional específica, ofertando ao exequente o mesmo resultado que ele teria caso não tivesse ingressado em juízo. É nessas linhas que Marcelo Abelha sustenta que “o Estado deve preocupar-se em fornecer o resultado (tutela) mais coincidente possível com o que originariamente esperava o jurisdicionado caso o adimplemento fosse espontâneo”.([65])
O novo Código, especificamente, prevê no art. 831 que “a penhora deverá recair sobre tantos bens quantos bastem para o pagamento do principal atualizado, dos juros, das custas e dos honorários advocatícios”. Pela redação do dispositivo, infere-se que a atividade jurisdicional executiva incidirá sobre o patrimônio do devedor na medida tão somente do indispensável para a realização e satisfação do direito do exequente.
A adequação, portanto, do adimplemento da obrigação em juízo corresponde, em certa medida, ao cumprimento pelo juiz do princípio da eficiência estabelecido no art. 8º do NCPC. Se por um lado, o referido princípio propicia ao exequente a tutela específica da obrigação de fazer ou não fazer, por exemplo, de outro, poderá propiciar, subsidiariamente, o resultado prático equivalente, nos termos do art. 536 do CPC: “No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente”.
2.2.4. Princípio da menor gravosidade para o devedor
A ideia de que o expropriado não seja privado dos bens sem o devido processo legal importa também na cláusula de que, em última análise, a execução deve gerar o menor sacrifício possível ao executado. O substrato axiológico do princípio em destaque comunica-se, de pronto, com os princípios da dignidade da pessoa humana e da proporcionalidade na execução. Se de um lado é certo dizer que a tutela executiva deve buscar a satisfação dos interesses do credor, noutra perspectiva não é incorreto afirmar que essa se dê pela forma menos gravosa.
Esse princípio, precisamente, está previsto no art. 805 do CPC e volta-se à proteção do executado. Nessa direção, prevê o predito dispositivo: “Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado”.
Tal preceito estabelece o que a doutrina processual convencionou chamar de “princípio da menor onerosidade para o executado”. Também conhecido como “princípio do menor sacrifício possível do executado”, sua premissa reside na ideia de que a execução civil se volta à satisfação do direito do credor e não à punição do devedor.
Neste sentido, os atos judiciais devem se restringir exclusivamente ao indispensável para alcançar o cumprimento da obrigação certificada, de modo que o juiz deve atentar-se para que a execução se faça pelo modo menos gravoso para o executado, quando, por vários meios, o credor puder promovê-la. Vê-se, de pronto, que a teleologia da norma em comento inspira-se nos princípios da justiça e da equidade.
Entretanto, a menor onerosidade não pode servir de motivo para a execução ser frustrada. Deve-se, a contrario sensu, balancear-se para que a execução seja o mais eficiente possível para o credor e com menor sacrifício possível para o devedor. A despeito, Antonio Adonias Aguiar Bastos esclarece que:
Se, de um lado, o princípio da efetividade da execução forçada é considerado como um direito fundamental à execução equilibrada sob a perspectiva do exequente, de outro lado, o princípio da menor onerosidade complementa o conceito, enquanto direito fundamental à execução equilibrada sob o prisma do executado. A execução balanceada é, portanto, aquela que propicia o pleno atendimento do direito do exequente sem sacrificar inutilmente o patrimônio do executado.([66]
No mesmo sentido é a inteligência, sempre didática, do Professor Elpídio Donizzeti, para o qual:
Esse princípio tem, contudo, que ser aplicado harmonicamente com o princípio da efetividade da execução, já que a finalidade do processo executivo é a satisfação do credor, e não o contrário.
Em outras palavras, o princípio da menor onerosidade deve atuar como uma espécie de freio ou limite à satisfação do credor, de forma a impedir que direitos patrimoniais assolem direitos de maior significância, como é o caso da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF). Há, porém, um limite também ao princípio da menor onerosidade, cuja incidência não pode servir de amparo a calotes de maus pagadores.([67])
A jurisprudência, inclusive, ainda na égide no CPC de 1973, consolidando o referido princípio, já se pronunciava no sentido de que ele:
“[…] expressa típica regra de sobre direito, cuja função é a de orientar a aplicação das demais normas do processo de execução, a fim de evitar a prática de atos executivos desnecessariamente onerosos ao executado. Embora não tenha força para, por si só, comprometer a ordem legal da nomeação e substituição dos bens à penhora estabelecida no artigo 655 do Código de Processo Civil, o princípio da menor onerosidade (art. 620 do CPC) pode, em determinadas situações específicas, ser invocado para relativizar seu rigorismo, amoldando-o às peculiaridades do caso concreto” (STJ, REsp 725.587/PR, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, 1ª Turma, jul. 13.09.2005, DJ 26.09.2005).
Vê-se, pois, que na aplicação do princípio da menor onerosidade, o magistrado deve se valer do princípio da proporcionalidade no caso concreto, de modo a evitar que ele se constitua numa espécie perigosa de escudo a impedir a satisfação da obrigação. Seu substrato, entretanto, serve como garantia de que, diante da verificação da existência de mais uma possibilidade para a satisfação do crédito, o juiz deverá escolher a menos gravosa para o devedor:
É certo que o princípio da menor onerosidade não pode ser analisado isoladamente. Ao lado dele, há outros princípios informativos do processo de execução, dentre eles, o da máxima utilidade da execução, que visa à plena satisfação do exequente. Cumpre, portanto, encontrar um equilíbrio entre essas forças, aplicando-se o princípio da proporcionalidade, com vistas a buscar uma execução equilibrada, proporcional.([68])
Não obstante, a novidade prevista no parágrafo único do art. 805 pretende evitar a arguição genérica e sem fundamento do princípio da menor onerosidade para o devedor. Assim, com o acréscimo do parágrafo em exame, o executado deverá informar que outra medida pode ser adotada pelo magistrado no lugar do ato oneroso praticado.([69]) O ônus, portanto, de indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos é do executado.
Tal preceito, inclusive, fortalece e prestigia a boa-fé entre as partes (art. 5º do CPC). Nesse sentido é o magistério de Leonardo Carneiro da Cunha:
O princípio da menor onerosidade tem por finalidade proteger a boa-fé, ao impedir o abuso do direito pelo credor que, sem qualquer vantagem, opta pelo meio executivo mais oneroso ao executado. Não se trata de princípio que sirva para resguardar a dignidade do executado, já protegida pelas regras que limitam os meios executivos, sobretudo as que preveem as impenhorabilidades. O princípio protege a lealdade processual, servindo para a construção de regras que inibam ou impeçam o comportamento abusivo do exequente.([70])
A respeito do parágrafo único do art. 805, comentam Wambier e Talamini:([71])
O disposto no art. 805 não é mais do que desdobramento do critério da proporcionalidade, que permeia todo o direito (não só o processual). Pela proporcionalidade, sempre que houver a necessidade de sacrifício de um direito em prol de outro, esta oneração há de cingir-se aos limites do estritamente necessário.
É nessa perspectiva que o professor Humberto Theodoro Júnior leciona que o princípio da menor onerosidade da execução para o devedor também pode ser chamado de princípio da economia da execução, ou seja, “toda execução deve ser econômica, isto é, deve realizar-se da forma que satisfazendo o direito do credor, seja o menos prejudicial possível ao devedor”.([72])
No ponto, vale a célebre lição de Cássio Scapinella Bueno,([73]) segundo o qual:
Se, de um lado, a tutela jurisdicional executiva caracteriza-se pela produção de resultados materiais voltados à satisfação do exequente, a atuação do Estado-juiz não pode ser produzida ao arrepio dos limites que também encontram assento expresso no “modelo constitucional do processo civil”. Daí a necessária observância de determinadas restrições e de determinadas garantias no plano do exercício da tutela jurisdicional executiva, por exemplo, a imposição de que os atos executivos recaiam sobre o patrimônio do devedor e não sobre sua pessoa […] e, mesmo assim, observadas as restrições da expropriação patrimonial com vistas à manutenção de uma vida digna pelo executado e seus familiares […], tudo com vistas a buscar o necessário e indispensável equilíbrio entre os referidos princípios, dando origem ao que a doutrina costuma referir como “execução equilibrada”, que, em foros de princípios constitucionais, tem tudo para significar o resultado concreto da aplicação do chamado “princípio da proporcionalidade”.
Com efeito, a ideia de execução equilibrada atende, justamente, aos dois princípios fundamentais da execução: o do resultado e do menor sacrifício possível ao devedor. A bem da verdade, o princípio da efetividade da execução é corolário do direito fundamental à execução balanceada, de modo que um complementa o outro. Destarte, a tutela jurisdicional equitativa “propicia o pleno atendimento do direito do exequente sem sacrificar inutilmente o patrimônio do executado”.([74])
Pode-se mencionar, entre outros, uma série de mecanismos no NCPC que atendem ao princípio da menor gravosidade da execução para o devedor. O art. 847, por exemplo, possibilita ao devedor pedir a substituição do bem penhorado por outro, no prazo de dez dias depois de intimado da penhora, desde que comprove que isso não trará prejuízos ao credor e que será menos oneroso para ele, devedor. Na mesma linha, o art. 848 dispõe que é direito tanto do devedor, quanto do credor, requerer a substituição do bem penhorado – ainda que fora do prazo estabelecido no art. 847 -, desde que atendidas determinadas diretrizes previstas nos incisos do art. 848 (por exemplo, se não obedecer à ordem legal de preferência).
Na mesma toada axiológica, o art. 840, § 2º, permite que o devedor possa ficar como depositário dos bens penhorados: “Os bens poderão ser depositados em poder do executado nos casos de difícil remoção ou quando anuir o exequente”. Igualmente, o art. 891 do CPC de 2015 proíbe a arrematação de bens do devedor por preço vil. A utilidade da execução, pode-se afirmar, constitui pressuposto inafastável para imporem-se determinados atos executórios. É nessa medida que o art. 836 do NCPC, por exemplo, aduz que “não se levará efeito a penhora, quando ficar evidente que o produto da execução dos bens encontrados será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da execução”.
Ademais, não custa reiterar que a impenhorabilidade de certos bens (arts. 833 e 834 do CPC e Lei 8.009/90) também confere densidade ao princípio da menor onerosidade da execução.
Decerto, é possível sustentar que o princípio do resultado e da efetividade da tutela jurisdicional executiva orienta o cumprimento da prestação inadimplida. Entretanto, havendo mais de uma possibilidade hábil para que se confira resultado efetivo à execução, cabe às partes e ao Estado-juiz diligenciar pela opção menos gravosa ao executado. Ao magistrado, sobretudo, competirá equilibrar os interesses em juízo, visando, a um só tempo, à satisfação do credor por um caminho mais benéfico para o devedor.
2.2.5. Princípio da disponibilidade
Pelo princípio da disponibilidade, o credor terá a faculdade de dispor sobre a execução como um todo ou de apenas alguns atos executivos. Isso porque ele não é obrigado a executar seu título, nem se encontra impelido a continuar com a execução forçada.
É consabido, nesses termos, que a instauração do processo de execução ou de uma fase executiva necessita, em regra, de requerimento do credor. Desse pressuposto deriva a ideia de que os atos executivos estão ao dispor do exequente, ou seja, o credor pode desistir de alguns atos executivos ou de todos eles, se lhe convier, não tendo que se sujeitar necessariamente ao executado. Essa é a inteligência do art. 775 do CPC: “O exequente tem o direito de desistir de toda a execução ou de apenas alguma medida executiva”.
O parágrafo único do referido dispositivo prevê que, após a desistência da execução, se observará o seguinte: serão extintos a impugnação e os embargos que versarem apenas sobre questões processuais, pagando o exequente as custas processuais e os honorários advocatícios (inciso I); nos demais casos, a extinção dependerá da concordância do impugnante ou do embargante (inciso II).
2.2.6. Princípio do título ou da cartularidade
O princípio da nulla executio sine titulo estabelece que toda execução é fundamentada em um título executivo judicial ou extrajudicial. O título, pode-se dizer, é condição necessária e suficiente para a existência regular do processo executivo. Não se fundando em título executivo, nula será a execução. Entretanto, não basta a mera existência do título. É preciso mais que isso, daí a exigência de que este deve demonstrar obrigação líquida, certa e exigível.
Enquanto a liquidez da obrigação se refere à aferição da expressão monetária, valor ou especificidade da obrigação promovida no título, a certeza se refere à existência regular e efetiva da obrigação, ou seja, com os elementos subjetivos e objetivos claramente definidos. Doutro lado, a exigibilidade relaciona-se com o inadimplemento do devedor.
Com efeito, dispõe o art. 783 do NCPC que “a execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível”. A ausência de título gera nulidade cominada (nulla executio sine titulo), a teor do art. 803, I.
Dessas premissas, importante pontuar que somente a lei poderá criar títulos executivos e, em consequência, somente ela poderá estabelecer em quais situações jurídicas a execução pode ser admitida. É nesse sentido que Marinoni, Mitidiero e Arenhart([75]) sustentam que “não se admite a formação de títulos sequer por negócios processuais (art. 190 do CPC) ou por qualquer outra espécie de ato de vontade”.
Em termos gerais, o CPC de 2015 enumera os documentos qualificados como títulos executivos nos arts. 515 e 784:
Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título:
I – as decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa
II – a decisão homologatória de autocomposição judicial;
III – a decisão homologatória de autocomposição extrajudicial de qualquer natureza;
IV – o formal e a certidão de partilha, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou universal;
V – o crédito de auxiliar da justiça, quando as custas, emolumentos ou honorários tiverem sido aprovados por decisão judicial;
VI – a sentença penal condenatória transitada em julgado;
VII – a sentença arbitral;
VIII – a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça;
IX – a decisão interlocutória estrangeira, após a concessão do exequatur à carta rogatória pelo Superior Tribunal de Justiça;
Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais:
I – a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque;
II – a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor;
III – o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas;
IV – o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos advogados dos transatores ou por conciliador ou mediador credenciado por tribunal;
V – o contrato garantido por hipoteca, penhor, anticrese ou outro direito real de garantia e aquele garantido por caução;
VI – o contrato de seguro de vida em caso de morte;
VII – o crédito decorrente de foro e laudêmio;
VIII – o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio;
IX – a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei;
X – o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas;
XI – a certidão expedida por serventia notarial ou de registro relativa a valores de emolumentos e demais despesas devidas pelos atos por ela praticados, fixados nas tabelas estabelecidas em lei;
XII – todos os demais títulos aos quais, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva.
É de se ver, pois, que pelo princípio do título, toda execução basear-se-á em título executivo, sendo este concebido como o documento ou fato/ato processual que recebe da lei a força e eficácia executiva, não sendo possível o processamento da atividade executória sem esse requisito para a administração da execução forçada.
2.2.7. Princípio da atipicidade dos meios executivos
O princípio da (a)tipicidade dos meios executivos estabelece que para cada obrigação (dar, fazer, não fazer ou pagar) a lei determina um procedimento próprio. Entretanto, as contínuas “reformas” realizadas pelo legislador levaram vários doutrinadores a repensar essa prévia tipicidade dos atos executivos. Nesse sentido, Cassio Scarpinella Bueno([76]) comentava:
[…] ao mesmo tempo que diversos dispositivos do Código de Processo Civil continuam, ainda, a autorizar apenas e tão somente, a prática de atos jurisdicionais típicos, […], é inegável, à luz do “modelo constitucional do direito processual civil”, que o exame de cada caso concreto pode impor ao Estado-juiz a necessidade da implementação de técnicas ou de métodos executivos não previstos expressamente na lei e que, não obstante – e diferentemente do que a percepção tradicional daquele princípio revelava -, não destoam dos valores ínsitos à atuação do Estado Democrático de Direito, redutíveis à compreensão do “devido processo legal”.
Na mesma direção, José Miguel Garcia Medina, ainda na vigência do CPC revogado, chamava atenção para o fato de que o princípio da atipicidade das medidas executivas vinha, cada vez com mais veemência, ocupando a posição do princípio da tipicidade.([77])
A atipicidade dos meios executivos, vale dizer, consagra-se na regra segundo a qual o juiz poderá, em cada caso específico, utilizar o meio executivo que lhe pareça mais adequado para dar, de forma justa e efetiva, a tutela jurisdicional executiva.([78])
No contexto do CPC de 2015, afora a manutenção dessa tendência, o novo diploma processual acabou consolidando o princípio da atipicidade. Sobre o tema, o professor José Miguel Garcia Medina([79]) leciona que no sistema jurídico que se dá primazia ao princípio da atipicidade, nota-se uma série de características, a saber:
(a) a participação do juiz na elaboração da solução jurídica dos litígios passa a ser mais intensa, ante o abrandamento da tendência – veemente no Estado Liberal de outrora – de se reduzir ao máximo os poderes do juiz;
(b) a atividade jurisdicional deve proporcionar aos demandantes respostas capazes de propiciar uma tutela mais aproximada possível da pretensão violada, bem como de impedir que a violação ocorra (cf., p. ex., art. 497 do CPC/2015), o que impõe sejam criados instrumentos capazes de proporcionar à jurisdição o alcance de tal desiderato;
(c) ante a multiplicidade e a complexidade das situações litigiosas que podem ser levadas a juízo, tais mecanismos não podem ser previstos num rol taxativo, numerus clausus, pois há risco de se excluir direitos igualmente merecedores de tutela;
(d) as medidas executivas que podem ser postas em prática podem não ser aquelas requeridas pelas partes, necessariamente, porque o juiz pode constatar a viabilidade de um meio executivo mais adequado à satisfação (fim) da pretensão do exequente.
Nesse sentir, o CPC neonato prevê o princípio da atipicidade nos arts. 139, IV, e 536. Na mesma direção, a atipicidade também se aplica para a justa efetivação da tutela provisória, como prescreve o art. 297 do CPC. Vejamos os referidos dispositivos:
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: […] IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;
Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.
Art. 297. O juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória.
Vale anotar que a previsão contida no art. 139, IV, trata-se de grande novidade no NCPC; possibilitando ao magistrado cumular com os meios típicos, outros meios coercitivos e indutivos para obtenção adequada da tutela, inclusive a pecuniária, nos termos expressos do dispositivo. A doutrina, comentando a novidade legislativa, vem chamando-a de “cláusula geral executiva”. Sobre o tema, inclusive, há o Enunciado nº 48 da ENFAM:
O art. 139, IV, do CPC/2015 traduz um poder geral de efetivação, permitindo a aplicação de medidas atípicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial, inclusive no âmbito do cumprimento de sentença e no processo de execução baseado em títulos extrajudiciais.
Nada obstante isso, o professor José Miguel Garcia Medina compreende que:
Essa regra (do art. 139, IV) não pode, como é intuitivo, tornar despiciendas as medidas executivas típicas, previstas na lei processual. Fosse assim, bastaria a existência de tal disposição e todo o regramento restante previsto na lei processual quanto às medidas executivas poderia ser desprezado.
Com efeito, de uma forma ou de outra, o princípio da atipicidade não pode nem deve ser aplicado com desproporcionalidade. Sua limitação é imposta por outro princípio, o da menor onerosidade possível ao executado, que norteará e conterá à justa aplicação da atipicidade dos meios executivos. É nesse sentido que Daniel Baggio Maciel, em obra coordenada por Angélica Arruda Alvim,([80]) leciona:
[…] o que verdadeiramente importa é que essas providências sejam adequadas para a concretização do comando judicial, proporcionais à finalidade por ele perseguida, não excedam o estritamente necessário para a tutela do direito a ser efetivado e produzam o menor gravame possível ao sujeito que experimentá-las.
2.2.8. Princípio da lealdade
Ao analisar as normas fundamentais do NCPC apontou-se o art. 5º como importante vetor axiológico do princípio da probidade e da cooperação entre as partes. O dispositivo, não custa lembrar, prevê que “aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé”.
Na execução civil, precisamente, a tutela da lealdade e da probidade processual encontra-se prevista especialmente nos arts. 772, II, e 774. Enquanto aquele possibilita ao juiz “advertir o executado de que seu procedimento constitui ato atentatório à dignidade da justiça”, este prevê uma série de condutas que a legislação resolveu caracterizar como atentatórias à dignidade da justiça:
Art. 774. Considera-se atentatória à dignidade da justiça a conduta comissiva ou omissiva do executado que:
I – frauda a execução;
II – se opõe maliciosamente à execução, empregando ardis e meios artificiosos;
III – dificulta ou embaraça a realização da penhora;
IV – resiste injustificadamente às ordens judiciais;
V – intimado, não indica ao juiz quais são e onde estão os bens sujeitos à penhora e os respectivos valores, nem exibe prova de sua propriedade e, se for o caso, certidão negativa de ônus.
Parágrafo único. Nos casos previstos neste artigo, o juiz fixará multa em montante não superior a vinte por cento do valor atualizado do débito em execução, a qual será revertida em proveito do exequente, exigível nos próprios autos do processo, sem prejuízo de outras sanções de natureza processual ou material.
O substrato axiológico do novo diploma processual, tudo leva a crer, tem o claro propósito de fortalecer a ética e a boa-fé no processo de execução. Aliás, o já citado art. 6º do CPC de 2015 também prevê que é obrigação das partes contribuir para a rápida solução da demanda, evitando provocações ardis ou até mesmo incidentes meramente procrastinatórios.
2.2.9. Princípio do desfecho único
Pelo princípio do desfecho único infere-se que a execução existe para satisfação dos direitos do credor, sendo este o único desfecho possível.([81]) Daí a lição do Professor Alexandre Freitas Câmara no sentido de que, em verdade, o princípio do desfecho único é “corolário da própria finalidade da execução forçada, a satisfação do crédito exequendo, com a realização concreta da vontade do direito substancial”.([82])
Com efeito, o legislador nitidamente escolheu privilegiar, e não poderia ser diferente, a satisfação do direito do exequente representado no título executivo. A posição do executado, nesse contexto, limita-se a controlar a legalidade e regularidade dos atos executórios, os quais devem ser praticados sempre em conformidade com as normas fundamentais do CPC.
CONCLUSÃO
A busca por melhor desempenho processual na execução deve orientar os atores jurídicos. A efetividade do processo, enquanto garantia relacionada ao direito de acesso à justiça, deve ser encarada como verdadeiro norte a guiar a solução de litígios.
Nesse contexto, ganham forte relevância a boa compreensão das normas fundamentais do novo Código de Processo Civil, bem como dos princípios gerais da execução.
A forte aliança das normas fundamentais do código com os princípios gerais da execução, por certo, garantirá o melhor norte para a obtenção da tão necessária efetividade na execução por quantia certa contra devedor solvente.
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[1] BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 47.
[2] AGRA, Walber de Moura. Curso de direito constitucional. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 45.
[3] CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo. Panóptica, ano 1, n. 6, 2007. p. 2. Disponível em: <http://www.panoptica.org/seer/index.php/op/article/view/Op_2.2_2007_1-44/64>. Acesso em: 25 maio 2016.
[4] ALVIM, Thereza Arruda. O novo Código de Processo Civil Brasileiro: estudos dirigidos: sistematização e procedimentos. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 280.
[5] THEODORO JÚNIOR, Humberto. O compromisso do projeto de novo Código de Processo Civil com o processo justo. Revista de Informação Legislativa. p. 239.
[6] MACHADO JR., Dario Ribeiro; CARNEIRO, Paulo Pinheiro, PINHO, Humberto Dalla de. Novo Código de Processo Civil: anotado e comparado. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 7.
[7] Sobre o tema, disserta Paulo Cezar Pinheiro Carneiro: “O novo Código, logo em sua primeira disposição, deixa claro a adoção da teoria do direito processual constitucional. Assim, longe de parecer simplesmente um enunciado, o dispositivo possui importante aplicação prática: vale de garantia eficaz contra qualquer dispositivo que contrarie a Constituição, bem como é fator de interpretação para aplicação dos dispositivos processuais. Aqui, a lei processual e a própria atividade jurisdicional em si, submetem-se às normas e aos valores constitucionais, os quais lhes servem de fonte e legitimam o seu exercício, ao tempo em que impedem o autoritarismo e o abuso”. CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. (Org.). Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 16.
[8] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Primeiros comentários ao novo código de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 13.
[9] BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de processo civil: baseado no novo Código de Processo Civil. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 78.
[10] CABRAL, Antonio Passo; CRAMER, Ronaldo (Org.). Comentários ao novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 15.
[11] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Novo Código de Processo Civil anotado. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 16.
[12] Disponível em: <https://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf>. Acesso em: 12 jun. 2016.
[13] CABRAL; CRAMER, op. cit., p. 17.
[14] MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. O projeto do CPC: críticas e propostas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 15.
[15] CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER et al., op. cit., p. 22.
[16] MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; ARENHART, Sérgio Cruz. Novo Código de Processo Civil comentado. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 28.
[17] CUNHA, Leonardo Carneiro da. Art. 8º. In: STRECK, Lenio; NUNES, Dierle; CUNHA, Leonardo Carneiro da (Org.). Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 47.
[18] CUNHA, Leonardo Carneiro da. Art. 3º. In: STRECK; NUNES; CUNHA, op. cit., p. 32.
[19] CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER et al., op. cit., p. 27.
[20] Idem.
[21] Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-out-06/paradoxo-corte-cpc-traz-mudancas-audiencia-conciliacao>. Acesso em: 10 jun. 2016.
[22] MARINONI; MITIDIERO; ARENHART, op. cit., p. 28.
[23] ROSENVALD, Nelson. A dignidade da pessoa humana no CPC/15. Disponível em: <http://www.nelsonrosenvald.info/#!A-dignidade-da-pessoa-humana-no-CPC15/c21xn/567465c30cf2c2b7798a7adc>. Acesso em: 12 jun. 2016.
[24] Idem.
[25] MARINONI; MITIDIERO; ARENHART, op. cit., p. 32.
[26] No mesmo sentido é o art. 139, inciso II, reafirmando o compromisso do NCPC: “O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: velar pela duração razoável do processo”.
[27] CUNHA, Leonardo Carneiro da. Art. 4º. In: STRECK; NUNES; CUNHA, op. cit., p. 35.
[28] CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 19.
[29] MARINONI; MITIDIERO; ARENHART, op. cit., p. 33.
[30] CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER et al., op. cit., p. 29.
[31] WAMBIER, op. cit., p. 18
[32] CÂMARA, op. cit., p. 19.
[33] Com o mesmo objetivo do preceito do art. 4º, tem-se o § 2º do art. 282: “Quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta”.
[34] MEDEIROS NETO, Elias Marques de. O artigo 4º do novo Código de Processo Civil e o princípio da efetividade do processo. In: RODRIGUES, Geisa de Assis; ANJOS FILHO, Robério Nunes dos (Org.). Reflexões sobre o novo Código de Processo Civil. Brasília: ESMPU, v. 1, 2016. p. 253-254.
[35] MACHADO JR.; CARNEIRO; PINHO, op. cit., p. 17.
[36] ROSENVALD, Nelson. Dignidade humana e boa-fé no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 186 e ss.
[37] BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de direito processual civil: inteiramente estruturado à luz do novo CPC. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 83.
[38] CABRAL; CRAMER, op. cit., p. 27.
[39] CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER et al., op. cit., p. 31.
[40] CUNHA, Leonardo Carneiro da. Art. 6º. In: STRECK; NUNES; CUNHA, op. cit., p. 41.
[41] Ibidem, p. 43.
[42] CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER et al., op. cit., p. 34.
[43] MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 84.
[44] MITIDIERO, op. cit., p. 81.
[45] DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. 6. ed. Salvador: JusPodivm, v. 1, 2006. p. 71.
[46] Ibidem.
[47] CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER et al., op. cit., p. 36.
[48] DIDIER JR., op. cit., p. 74.
[49] Sobre o tema, lecionam Marinoni, Mitidiero e Arenhart: O direito à igualdade processual – formal e material – é o suporte do direito à paridade de armas no processo civil (Waffengleichheit, parità delle armi, égalité des armes). O processo só pode ser considerado justo se as partes dispõem das mesmas oportunidades e dos mesmos meios para dele participar. Vale dizer: se dispõem das mesmas armas, se dispõem de paridade de tratamento. Trata-se de exigência que obviamente se projeta sobre o legislador e sobre o juiz: há dever de estruturação e condução do processo de acordo com o direito à igualdade e à paridade de tratamento. Como facilmente se percebe, a igualdade – e a paridade de tratamento e de armas nela implicada – constitui pressuposto para efetiva participação das partes no processo e, portanto, é requisito básico para plena realização do direito ao contraditório (art. 7º, in fine, CPC) in: MARINONI; MITIDIERO; ARENHART, op. cit., p. 40.
[50] CÂMARA, op. cit., p. 11.
[51] CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER et al., op. cit., p. 37.
[52] CÂMARA, op. cit., p. 11.
[53] CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER et al., op. cit., p. 40.
[54] Idem.
[55] SOARES, Carlos Henrique; DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Manual elementar de processo civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2011. p. 529.
[56] Além disso, comentam Didier Jr., Cunha, Braga e Oliveira, “garante-se o contraditório em todos os incidentes cognitivos que porventura surjam ao logo do procedimento executivo, como, por exemplo, a alegação de impenhorabilidade de um bem ou a alegação de fraude à execução”. In: DIDIER JR., Fredie et al. Curso de direito processual civil: execução. 5. ed. Salvador: JusPodivm, v. 5, 2013. p. 54.
[57] ABELHA, Marcelo. Manual de execução civil. 6. ed. São Paulo: Método, 2017. p. 63.
[58] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 23. ed. São Paulo: Atlas, v. II, 2014.
[59] SOARES; DIAS, op. cit., p. 531.
[60] Os professores Carlos Henrique e Ronaldo Brêtas ensinam que: “Esses bens impenhoráveis são justamente formas legais de que o Estado dispõe para impedir que o devedor perca os bens que irão trazer um prejuízo coletivo e social maior do que simplesmente o pagamento do credor. O Estado opta pela proteção de alguns bens do devedor para evitar que isso possa transformar o processo de execução num instrumento de descontrole social ou de tirania, impedindo assim que as diferenças sociais sejam mantidas e patrocinadas pelo Estado”. In: SOARES; DIAS, op. cit., p. 531.
[61] Na mesma direção de patrimonialidade, o art. 824 do NCPC comanda: “A execução por quantia certa realiza-se pela expropriação de bens do executado, ressalvadas as execuções especiais”.
[62] No caso do depositário infiel, já existe entendimento pacífico no STF, especialmente na Súmula vinculante nº 25, estabelecendo que é inconstitucional a prisão civil do depositário infiel.
[63] DIDIER JR. et al., op. cit., p. 52.
[64] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 50. ed. São Paulo: Método, v. 3, 2017.
[65] ABELHA, op. cit., p. 60.
[66] CABRAL; CRAMER, op. cit., p. 798.
[67] DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 831.
[68] WAMBIER, op. cit., p. 805.
[69] Nesse ponto, especificamente, vale a anotação de Leonardo Carneiro da Cunha: “Ao alegar que a medida executiva adotada émais gravosa, cabe ao executado indicar outros meios mais efetivos e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados. Se o executado não impugnar o meio executivo adotado, alegando sua maior onerosidade, haverá preclusão. E, se alegar, deverá indicar outros mais efetivos e menos onerosos, sob pena de rejeição de sua impugnação. Essa exigência, que consta do parágrafo único do art. 805 do CPC, concretiza o princípio da cooperação, que decorre dos princípios do contraditório e da boa-fé. Pelo princípio da cooperação – aqui concretizado no parágrafo único do art. 805 do CPC – reforça-se a ética processual, com o aprimoramento do diálogo entre as partes, reciprocamente e com o órgão jurisdicional”. In: STRECK; NUNES; CUNHA, op. cit., p. 1060.
[70] CUNHA, Leonardo Carneiro da. Art. 805. In: STRECK; NUNES; CUNHA, op. cit., p. 1061.
[71] WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 3, 2017. p. 12.
[72] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 50. ed. São Paulo: Método, v. 3, 2017. p. 225.
[73] BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: tutela jurisdicional executiva. 7. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2014. p. 62.
[74] BASTOS, Antonio Adonias Aguiar. In: CABRAL, Antonio do Passo; CRAMER, Ronaldo (Org.). Comentários ao novo Código de Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 1.162.
[75] MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; ARENHART, Sérgio Cruz. O novo processo de execução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 430.
[76] BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: tutela jurisdicional executiva. 7. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2014. p. 60.
[77] MEDINA, José Miguel Garcia. Curso de direito processual civil moderno. Ebook. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 342.
[78] ABELHA, op. cit., p. 70.
[79] MEDINA, op. cit., p. 343.
[80] ALVIM, Angélica Arruda et al. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 214.
[81] A despeito, ressalva Humberto Dalla Bernadina de Pinho: “[…] esse princípio significa que a execução se destina à outorga de tutela executiva, o que não impede, porém, que durante o processo autônomo de execução (execução autônoma), ou durante a fase executiva de um processo sincrético (execução imediata), realize-se atividade cognitiva que venha a impedir a concessão de tutela executiva, ou que o exequente desista da ação (art. 775) ou renuncie a seu direito (art. 924, IV)”. DALLA, Humberto. Direito processual civil contemporâneo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2017. p. 614.
[82] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 23. ed. Rio de Janeiro: Atlas, v. 2, 2014. p. 169.