NOMEAÇÃO DO INVENTARIANTE E SEU PAPEL NO PROCESSO DE INVENTÁRIO
Amanda Marinho
O cargo de inventariante é um munus, um serviço público prestado, devendo submeter-se à fiscalização do juiz, posto que o inventariante desempenhe função de auxiliar do mesmo, de modo que mantenham uma relação de confiança.
Ao inventariante atribui-se, resumidamente, a função de listar e descrever os bens do espólio, declarar os nomes de todos os herdeiros e legatários, usar dos meios judiciais para proteger os bens do espólio, em caso de turbação ou esbulho, trazer ao acervo hereditário os frutos percebidos desde a abertura da sucessão, sejam eles naturais, civis ou industriais, pagar as dívidas do espólio, arrendar e alienar bens da herança, desde que em acordo com os demais herdeiros e mediante autorização judicial[1].
A função de inventariante pode ser comparada à de depositário ou a de mandatário. A diferença do inventariante para o depositário está nas penalidades aplicadas em caso de transgressões, caso em que o depositário submete-se à punibilidade, já ao inventariante, o máximo que pode acontecer é a sua destituição do cargo e reparação dos danos causados aos bens. A diferença entre o inventariante e o mandatário é que aquele não tem poderes tão amplos quanto este, no que tange ao poder de decisão, além disso, ao contrário do mandatário, nem sempre o inventariante age em conformidade com os interesses dos herdeiros, e, ainda, o inventariante não alcança o cargo devido à confiança nele depositada pelos herdeiros, e sim, por disposição legal, por fim, o inventariante só pode ser destituído caso desobedeça a disposições legais, já o mandatário pode ser destituído por simples conflitos de interesses ou pela vontade dos representados[2].
A nomeação de inventariante deve seguir a ordem estabelecida no art. 617, do CPC. De forma prática, o nomeado assumirá as obrigações decorrentes dos bens do espólio, representá-lo-á ativa e passivamente, se responsabilizará pela guarda e conservação dos bens e diligenciará para atender determinações processuais, como pagamento de taxas, impostos e despesas processuais. Veja-se o art. 617 do CPC:
Art. 617. O juiz nomeará inventariante na seguinte ordem:
I – o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste;
II – o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou se estes não puderem ser nomeados;
III – qualquer herdeiro, quando nenhum deles estiver na posse e na administração do espólio;
IV – o herdeiro menor, por seu representante legal;
V – o testamenteiro, se lhe tiver sido confiada à administração do espólio ou se toda a herança estiver distribuída em legados;
VI – o cessionário do herdeiro ou do legatário;
VII – o inventariante judicial se houver;
VIII – pessoa estranha idônea, quando não houver inventariante judicial.
Parágrafo único. O inventariante, intimado da nomeação, prestará, dentro de 5 (cinco) dias, o compromisso de bem e fielmente desempenhar a função.
Tem-se que a ordem para a nomeação de inventariante antes prevista no art. 990 do CPC/1973 está disposta no art. 617 do CPC/2015 com duas inclusões: no inciso IV, o herdeiro menor, por seu representante legal, e no inciso VI, o cessionário do herdeiro ou legatário.
A partir daí, observa-se que o cônjuge ou companheiro sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens do casamento, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste, tem prioridade na investidura ao cargo de inventariante, uma vez que, achando-se na posse e administração dos bens, pode prestar mais precisa e mais completas declarações, de modo a facilitar o andamento do inventário. Se estivessem separados, presume a lei que o supérstite não possua conhecimento suficiente do acervo da herança deixado pelo falecido, não se habilitando, portanto, a prestar declarações completas e fiéis. Ainda, não poderá exercer função de inventariante, cônjuge ou companheiro sobrevivente que tenha em mãos alvará de separação de corpo, como medida para viabilizar futura separação judicial, ainda que estivessem morando juntos.
Na falta de cônjuge ou companheiro sobrevivente ou em caso de impossibilidade de nomeação, desde que justificado o motivo para tal impossibilidade, a inventariança será atribuída ao coerdeiro que se achar na posse e administração dos bens da herança. Se nenhum deles preencher esse requisito, o coerdeiro será preterido de acordo com a idade.
Assim, conforme ensina Washington de Barros Monteiro[3], a posse corporal dos bens e a idoneidade moral do herdeiro são os títulos mais importantes, de modo que, em não havendo cônjuge ou companheiro sobrevivente, a nomeação recairá, dentre os filhos de cujus, no mais idoso, no mais idôneo, no que convivia com o inventariado na mesma casa, no que melhor conhecia os negócios do extinto, ou no indicado pela maioria dos interessados.
No CPC/1973 não havia disposição expressa a respeito da possibilidade de o herdeiro menor de idade ser inventariante, apesar de ser possível, porém, havia discussões acerca da sua capacidade para exercer a função, ainda que por intermédio de representante legal, devido à responsabilidade exigida para o exercício do cargo. O CPC/2015 pacificou tal questão ao incluir no inciso IV, do art. 617, o herdeiro menor, desde que devidamente representado.
Em seguida, está o testamenteiro universal, ou seja, a quem o testador outorgou a posse e a administração dos bens, na forma prevista pelo art. 1.977 do CC/2002. Ressalte-se que o testamenteiro só prefere aos colaterais, porém, se o testamenteiro for particular, sem a posse e a administração da herança, somente caberá sua convocação após todos os herdeiros legítimos, compreendendo os necessários e os colaterais, de acordo com Washington de Barros Monteiro[4].
O cessionário do herdeiro ou legatário foi incluído no inciso VI do art. 617, do CPC/2015, tornando possível sua investidura ao cargo de inventariante quando da inexistência de herdeiros, uma vez que não faria sentido nomear um estranho ao cargo em detrimento do cessionário de direitos.
Na falta de cônjuge ou companheiro, herdeiro necessário, testamenteiro universal, outros herdeiros legítimos, testamenteiro particular, cessionário de direitos e não havendo inventariante judicial, será nomeada pessoa estranha idônea e da confiança do juiz, chamado inventariante dativo, o qual desempenhará todas as funções inerentes à inventariança, exceto a representação ativa e passiva da herança. Sua remuneração pelos serviços prestados será acordada entre os interessados e, na falta de acordo, será utilizada a regra relativa ao testamenteiro contida no art. 1.987 do CC[5].
Em relação aos herdeiros, quando não houver nenhum na posse e administração dos bens, o juiz nomeará um deles discricionariamente, as desavenças e incompatibilidade entre os herdeiros não são levadas a efeito. Porém, não há total falta de critério, sendo escolhido o herdeiro mais idôneo, com mais experiência, o mais próximo ao de cujus, o que tenha endereço mais próximo ao do de cujus e de seus negócios[6].
Quanto à idoneidade, requisito essencial para a nomeação ao cargo, Arnaldo Rizzardo[7] considera pessoa inidônea aquela que seja:
… Perdulária, irresponsável com suas obrigações familiares, aquela que responde a inúmeras dívidas e ações judiciais, a insolvente, ou titular de estabelecimento falido, a condenada por delitos relativos ao patrimônio, ou pervertida nos costumes, a viciada e desocupada.
Além disso, não constitui óbice ao cargo de inventariante o herdeiro que mora no estrangeiro, desde que tenha advogado constituído em território nacional, de outro lado, perde o direito à inventariança aquele que cedeu seus direitos hereditários a terceiro estranho. Veja-se o que entende Pacheco[8]:
O fato de residir o herdeiro fora do país ou em lugar distante não o impede de exercer a função, desde que tenha advogado constituído e mantenha, regularmente, a administração. […]
Cedendo algum filho ou herdeiro seus direitos hereditários a terceiros estranhos, cabe a inventariança ao outro filho ou herdeiro que satisfaça as exigências legais.
Há, ainda, aqueles que são incompatíveis com o cargo de inventariante, por possuir interesses contrários ao espólio, como o credor ou devedor do espólio, ou um dos respectivos herdeiros, até mesmo ao herdeiro que seja credor ou devedor do espólio, presumindo-se que faltará imparcialidade[9]. Não cabe a inventariança ao genro, após o falecimento de sua esposa, à pessoa foragida em lugar incerto ou ignorada, ao devedor do espólio e ao que lhe move ação[10].
De outro lado, o analfabeto, o cego, as pessoas deficientes e os cessionários de direito, desde que os direitos tenham sido adquiridos de todos os herdeiros, podem ser inventariantes[11].
Na falta de cônjuge ou herdeiros para a investidura no cargo, será nomeado inventariante dativo, pessoa estranha da confiança do juiz, atendidos os requisitos da idoneidade, de preferência, advogado. Este, apesar de não representar o espólio ativa e passivamente, pode se utilizar de meios necessários para a proteção, a posse e a administração do espólio[12].
Além disso, assevera Pacheco[13] que pessoa estranha pode ser nomeada em três hipóteses, a) quando não houver cônjuge, herdeiro, testamenteiro, ou inventariante judicial em condições; b) quando estes não aceitarem o cargo ou estiverem impedidos à investidura; c) quando houver conflito entre eles.
Ademais, conforme Maximiliano[14]:
Se um magistrado, espontaneamente ou em obediência a determinações do falecido, confere as atribuições de inventariante em desacordo com a ordem de preeminência fixada em lei, pode ser anulado o seu despacho, e até, o inventário todo. […] O juiz decide apenas a questão de idoneidade, quando, entre vários sucessores forçados, lhe cabe escolher o mais apto para a função ou destituir e substituir o inepto.
Porém, a ordem de nomeação de inventariante poderá ser desobedecida quando houver flagrante dissensão entre os interessados, na hipótese de conflito ou controvérsia quanto à condição de herdeiro, quando houver plausíveis divergências entre os interessados quanto à nomeação do inventariante, devendo ser nomeado inventariante judicial ou pessoa estranha idônea, que estejam acima dos interesses dos herdeiros, para dar andamento ao processo[15].
Depois de nomeado, o inventariante terá 5 (cinco) dias para prestar compromisso pessoalmente ou através de seu advogado, desde que tenha conferido-lhe poderes para tanto, conforme art. 617, p. U., do CPC, ocasião em que se comprometerá a exercer fielmente suas funções. Todos os herdeiros serão citados da nomeação, momento em que tomarão conhecimento do processo e, ainda, em caso de discordância quanto ao inventariante nomeado, poderão impugná-la, alegando a ordem de nomeação prevista no art. 627 do CPC[16], através de reclamação feita nos próprios autos.
Do despacho que acolher ou não a substituição do inventariante, bem como do que acolher, mas designar outro para a investidura no cargo, caberá agravo de instrumento. Por outro lado, caso o inventariante nomeado não preste compromisso, o juiz poderá removê-lo ex officio, de acordo com o art. 622 do CPC[17], tendo em vista que o processo precisa ter andamento[18].
Arnaldo Rizzardo[19] entende que estão entre as atribuições do inventariante dar início ao processo de inventário, prestar as primeiras e últimas declarações, prestar contas, administrar os bens do espólio, tudo isso até que a sentença de partilha transite em julgado.
O CPC lista as funções designadas ao inventariante que independem de autorização judicial ou de anuência dos herdeiros. Veja-se:
Art. 618. Incumbe ao inventariante:
I – representar o espólio ativa e passivamente, em juízo ou fora dele, observando-se, quanto ao dativo, o disposto no art. 75, § 1º;
II – administrar o espólio, velando-lhe os bens com a mesma diligência que teria se seus fossem;
III – prestar as primeiras e as últimas declarações pessoalmente ou por procurador com poderes especiais;
IV – exibir em cartório, a qualquer tempo, para exame das partes, os documentos relativos ao espólio;
V – juntar aos autos certidão do testamento, se houver;
VI – trazer à colação os bens recebidos pelo herdeiro ausente, renunciante ou excluído;
VII – prestar contas de sua gestão ao deixar o cargo ou sempre que o juiz lhe determinar;
VIII – requerer a declaração de insolvência.
Com isso, o inventariante representa o espólio ativa e passivamente, independente de alvará judicial, podendo ele atuar em defesa dos bens do espólio em ações judiciais, salvo se o inventariante for dativo, posto que não represente o espólio ativa nem passivamente, caso em que todos os herdeiros devem ser autores ou réus nas ações em que o espólio for parte, uma vez que este, apesar de não possuir personalidade física nem jurídica, constitui-se de massa patrimonial autônoma e possui legitimidade ad causam[20].
A administração do espólio é uma função exercida fora do processo, em que o inventariante tem o dever de zelar pelo patrimônio, perceber os frutos e dá-los à partilha, realizar as despesas necessárias à sua manutenção, entre outros, podendo ser responsabilizado por sua inércia ou omissão no desempenho de suas funções. Porém, não pode o inventariante, sem autorização judicial ou o consentimento de todos os herdeiros, onerar, arrendar ou alienar os bens do espólio[21].
Ademais, ao inventariante cabe prestar as primeiras e as últimas declarações. Aquelas, no prazo de 20 (vinte) dias, contados do dia em que prestou compromisso em juízo, devendo conter informações claras e precisas acerca do falecido, do cônjuge meeiro, dos herdeiros, dos bens, das dívidas e dos valores depositados, se houver, ocasião em que será lavrado termo circunstanciado e dar-se-á ciência do seu conteúdo aos herdeiros, Fazendas Públicas, Ministério Público, se houver incapaz, e ao testamenteiro, se houver testamento. As últimas declarações, após a avaliação e depois de resolvidas todas as controvérsias, momento em que o inventariante prestará contas, poderá suprir omissões ou retificar informações prestadas nas primeiras declarações, conforme art. 636, do CPC[22].
O art. 620, do CPC, disciplina o conteúdo das primeiras declarações. Veja-se:
Art. 620. Dentro de 20 (vinte) dias contados da data em que prestou o compromisso, o inventariante fará as primeiras declarações, das quais se lavrará termo circunstanciado, assinado pelo juiz, pelo escrivão e pelo inventariante, no qual serão exarados:
I – o nome, o estado, a idade e o domicílio do autor da herança, o dia e o lugar em que faleceu e se deixou testamento;
II – o nome, o estado, a idade, o endereço eletrônico e a residência dos herdeiros e, havendo cônjuge ou companheiro supérstite, além dos respectivos dados pessoais, o regime de bens do casamento ou da união estável;
III – a qualidade dos herdeiros e o grau de parentesco com o inventariado;
IV – a relação completa e individualizada de todos os bens do espólio, inclusive aqueles que devem ser conferidos à colação, e dos bens alheios que nele forem encontrados, descrevendo-se:
a) os imóveis, com as suas especificações, nomeadamente local em que se encontram, extensão da área, limites, confrontações, benfeitorias, origem dos títulos, números das matrículas e ônus que os gravam;
b) os móveis, com os sinais característicos;
c) os semoventes, seu número, suas espécies, suas marcas e seus sinais distintivos;
d) o dinheiro, as joias, os objetos de ouro e prata e as pedras preciosas, declarando-se lhes especificadamente a qualidade, o peso e a importância;
e) os títulos da dívida pública, bem como as ações, as quotas e os títulos de sociedade, mencionando-se lhes o número, o valor e a data;
f) as dívidas ativas e passivas, indicando-se lhes as datas, os títulos, a origem da obrigação e os nomes dos credores e dos devedores;
g) direitos e ações;
h) o valor corrente de cada um dos bens do espólio.
1º O juiz determinará que se proceda:
I – ao balanço do estabelecimento, se o autor da herança era empresário individual;
II – à apuração de haveres, se o autor da herança era sócio de sociedade que não anônima.
2º As declarações podem ser prestadas mediante petição, firmada por procurador com poderes especiais, à qual o termo se reportará.
Da análise do artigo supratranscrito, tem-se que, na descrição do inventariado, deve constar o regime de bens do casamento, se há pacto antenupcial, se há testamento, os números do registro civil e do CPF (Cadastro de Pessoa Física). Na dos herdeiros, devem constar a qualificação completa dos mesmos, bem como o nome do cônjuge, se casado, se é incapaz ou não, a qualidade do parentesco (linha reta ou colateral) e, ainda, se é herdeiro legítimo ou testamentário. Na descrição dos bens, deverão constar todas as suas especificações, bem como a estimativa de seu valor. Importa salientar que mesmo os bens não pertencentes ao de cujus em vida devem ser declarados e posteriormente devolvidos aos proprietários, sendo cabível embargos de terceiros caso não haja devolução[23].
A descrição dos bens, conforme ensina Caio Mário da Silva Pereira[24], deverá ser feita da seguinte maneira:
… Imóveis, com as suas confrontações e características; móveis, com as respectivas qualificações; semoventes, pelo seu número, espécie, marcas e sinais próprios: dinheiro e peças de ouro e prata; frutos percebidos; títulos da dívida pública e ações de sociedades anônimas; dívidas ativas e passivas pelo título, origem da obrigação, nome do devedor ou do credor; valores mobiliários me geral (CPC, art. 993)[25]. Entre as dívidas da herança, incluem-se as despesas de funeral e as realizadas em sufrágio da alma do falecido.
Acrescenta, ainda, Clóvis Beviláqua[26], quanto à descrição dos bens, que:
Não devem ser caladas as circunstâncias, que influem sobre o valor dos mesmos bens, como as servidões instituídas em seu favor, os gravames e ônus reais, a que estejam submetidos, as condições de exploração e produtividade, o estado de conservação, e tudo quanto melhor determine a respectiva valorização.
Assevera Pacheco[27] que “o juiz determinará que se proceda: I) ao balanço de estabelecimento se o autor da herança era comerciante em nome individual; II) a apuração de haveres, se o autor da herança era sócio de sociedade que não anônima”.
Continuando a análise do art. 618, o inventariante deverá, ainda, apresentar os documentos que comprovem o conteúdo das primeiras declarações, para que os interessados possam analisar, bem como o testamento, uma vez que o processo fica sobrestado, enquanto o testamento não for aberto, conferido, aprovado e registrado[28].
Deverá trazer à colação os bens recebidos pelo herdeiro ausente, renunciante ou excluído, de modo que acrescerão aos dos herdeiros incluídos no inventário, se estiver sido alienado, colaciona-se o seu valor.
O inventariante tem o encargo de prestar contas decorrentes de sua administração do espólio, deverá ser feito em apenso ao inventário (art. 553, CPC[29]), em ação de prestação de contas, ou em ação de sonegados, esta cabível após as últimas declarações. A prestação de contas, geralmente, vem ao final do processo, não obstante o juiz poder exigi-las a qualquer tempo, e ocorre quando os bens dão rendimentos, como locações e valores depositados em banco[30].
Para Pacheco[31], quanto à prestação de contas a que o inventariante está obrigado, seja ao final do processo ou decorrente de determinação judicial, devem ser prestadas ao inventário ou em apenso a este e, se houver impugnação dos interessados, só será remetida às vias ordinárias, caso haja necessidade de produção de outras provas, no entanto, se as provas já estiverem constituídas, o juiz do inventário deverá julgar a impugnação.
Já o art. 619, do CPC, lista as atribuições do inventariante praticáveis com a concordância ou oitiva dos herdeiros e autorização judicial. Veja-se:
Art. 619. Incumbe ainda ao inventariante, ouvidos os interessados e com autorização do juiz:
I – alienar bens de qualquer espécie;
II – transigir em juízo ou fora dele;
III – pagar dívidas do espólio;
IV – fazer as despesas necessárias para a conservação e o melhoramento dos bens do espólio.
Portanto, a alienação dos bens móveis e imóveis de grande monta só poderá ser feita mediante autorização judicial, sendo o alvará o título hábil para efetivar as transações. Excetuam-se os frutos, como colheitas, e animais, por sua venda estar vinculada à administração do inventário[32].
A venda de bens inventariados sem prévia autorização judicial é nula[33].
O inventariante não pode transigir em juízo ou fora dele quanto aos bens do espólio sem autorização judicial, uma vez que gera repercussão econômica no patrimônio do espólio. Com isso, não pode o inventariante realizar negócios jurídicos submetidos a legislações especiais e rigorosas que dificultem a retomada do bem sem autorização judicial, como o aluguel, que é disciplinado pela Lei do Inquilinato[34] (Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991). Porém, conforme assevera Arnaldo Rizzardo[35]: “acordos como, por exemplo, em rescisões trabalhistas, ou em prestações de serviços, ou até mesmo pagamento de dívidas, são perfeitamente válidos quando apenas o inventariante decide ou se compromete.”
O pagamento de dívidas vultosas ou que não tenham título comprovando sua liquidez e certeza prescindem de autorização judicial, já as feitas com velório, alimentação, despesas médicas e as que possuem título passível de ação de execução podem ser pagas e comprovadas ao final do processo[36].
Então, o que se percebe é que para levantamento de valores, sempre há necessidade de autorização judicial; de outra sorte, caso seja necessário adotar diligências com urgência, como constituir advogado para defender os bens do espólio que estejam sendo turbados, não precisa de alvará.
Para Pacheco[37], o inventariante “pode, quando houver conveniência, adiantar numerário ou antecipar a posse direta de bem a herdeiros, mas é impossível compeli-lo à prática de atos por ele reputáveis inconvenientes à sua gestão, de que deve, aliás, prestar contas.”
Segundo Caio Mário da Silva Pereira[38], o inventariante que descumprir seus deveres terá de ser responsabilizado na forma do direito comum, sem prejuízo de outras sanções, ocasião em que poderá ser compelido a ressarcir aos herdeiros danos causados aos bens do espólio, pagar juros de gastos que tiver feito em proveito próprio, etc.
No mesmo sentido, aduz Maximiliano[39]:
Os inventariantes pagos juros, a contar do dia em que fica em mora, pelos dinheiros do espólio não entregues logo após o julgamento da partilha; é obrigado a ressarcir os prejuízos causados por sua negligência, dolo ou imperícia, e até decorrentes de culpa leve; pois assume o dever de zelar para que os bens do acervo se não percam ou deteriorem. Não o consideram mandatário, nem depositário; porém administrador de bens alheios; portanto não prendem como depositário infiel, por indevidamente receber ou não restituir dinheiro e outros valores do espólio, assim como por não entregar ao sucessor, universal ou singular, o respectivo quinhão ou legado.
Portanto, conforme ensina Arnaldo Rizzardo[40], o inventariante:
Cuidará para que os bens não se deteriorem, estraguem ou simplesmente sejam desviados do monte-mor, inclusive, buscará as melhores formas de tornar produtivo o patrimônio e cercarão de todas as garantias os contratos de arrendamento, de locação, bem como as aplicações bancárias que fizer. Não se descurará dos impostos e encargos pendentes, dando real prioridade às obrigações já vencidas, e na iminência de serem executadas. Providenciará a aproximação de herdeiros descontentes, e dirimirá as dúvidas que geralmente surgem.
Importante ressaltar que não se faculta ao inventariante, enquanto agindo nesta qualidade, pleitear medidas de seu exclusivo interesse, como a venda de bens, adiantamento de legítima e defesa de um herdeiro, prejudicando os demais.
Ressalte-se que, por se tratar de cargo de confiança e de fé pública, as primeiras declarações são tidas como verdadeiras até que se prove o contrário. Em caso de declaração de inexistência ou apropriação de bens, será o inventariante submetido às penas de sonegados e do crime de apropriação indébita, respectivamente[41].
Então, diante do exposto, tem-se que o inventariante não pode ser nomeado arbitrariamente pelo juiz, apesar de haver certa discricionariedade, conquanto o fator idoneidade é determinante para a escolha de quem exercerá o munus. Além disso, o inventariante nomeado tem uma série de direitos e deveres aqui listados e esmiuçados, de modo que, em havendo desrespeitos, transgressões e desvio de suas funções, deverá sofrer sanções, podendo ser destituído do cargo e até mesmo, sendo responsabilizado pelos prejuízos causados.
A destituição ou remoção do inventariante de seu cargo pode ser feita de ofício pelo juiz ou a requerimento dos interessados.
[1] OLIVEIRA, 1952, p.798-801.
[2] RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Sucessões: Lei nº 10.406, de 1001.2002. 2. Ed., Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 619.
[3] MONTEIRO; PINTO, 2012, p. 39.
[4] MONTEIRO; PINTO, 2012, p. 40.
[5] MONTEIRO; PINTO, 2012, p. 40.
[6] RIZZARDO, 2006, p. 622.
[7] RIZZARDO, 2006, p. 624.
[8] PACHECO, José da Silva. Inventários e partilhas: na sucessão legítima e testamentária. 10. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 395.
[9] RIZZARDO, 2006, p. 623.
[10] PACHECO, 1996, p. 396.
[11] RIZZARDO, 2006, p. 624.
[12] RIZZARDO, 2006, p. 623.
[13] PACHECO, 1996, p. 397.
[14] MAXIMILIANO, Carlos. Direito das Sucessões. 4. Ed., v. 3. São Paulo: Livraria Freitas Bastos S. A., 1958, p. 264.
[15] PACHECO, 1996, p. 415-416.
[16] BRASIL, 2015, online. Acesso em: 02 de junho de 2016. Art. 627. Concluídas as citações, abrir-se-á vista às partes, em cartório e pelo prazo comum de 15 (quinze) dias, para que se manifestem sobre as primeiras declarações, incumbindo às partes: […] II – reclamar contra a nomeação de inventariante; […].
[17] BRASIL, 2015, online. Art. 622. O inventariante será removido de ofício ou a requerimento: (…).
[18] RIZZARDO, 2006, p. 625.
[19] RIZZARDO, 2006, p. 625.
[20] RIZZARDO, 2006, p. 626.
[21] RIZZARDO, 2006, p. 626-627.
[22] RIZZARDO, 2006, p. 627.
[23] RIZZARDO, 2006, p. 633-636.
[24] PEREIRA, 2007, p.427-428.
[25] BRASIL, 2015, online.
[26] BEVILÁQUA, 1982, p. 389.
[27] PACHECO, 1996, p. 404.
[28] RIZZARDO, 2006, p. 628.
[29] BRASIL, 2015, online. Art. 553. As contas do inventariante, do tutor, do curador, do depositário e de qualquer outro administrador serão prestadas em apenso aos autos do processo em que tiver sido nomeado.
[30] RIZZARDO, 2006, p. 629.
[31] PACHECO, 1996, p. 417.
[32] RIZZARDO, 2006, p. 630.
[33] PEREIRA, 2007, p.416.
[34] BRASIL. Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991. Brasília, DF: Presidência da República, 1991. Disponível em: 35RIZZARDO, 2006, p. 631.
[35] RIZZARDO, 2006, p. 631.
[36] RIZZARDO, 2006, p. 631.
[37] PACHECO, 1996, p. 403.
[38] PEREIRA, 2007, p.417.
[39] MAXIMILIANO, 1958, 272.
[40] RIZZARDO, 2006, p. 631
[41] RIZZARDO, 2006, p. 633.