NOÇÕES BÁSICAS SOBRE FALÊNCIAS DE ACORDO COM A LEI 11.101/05
Gabriela Nassyrios
FALÊNCIA
A Declaração Judicial de Falência se da de duas formas:
1) Conversão ou Convolação da Recuperação Judicial em Falência; ou
2) Pedido de Falência.
O Pedido de Falência pode ser formulado por um credor que pede, ou pelo devedor que confessa a falência.
É uma ação de conhecimento, autônoma, com os mesmos elementos de uma inicial qualquer, com as peculiaridades de um pedido de falência.
O art. 3º da Lei fala sobre o foro competente, sendo o principal estabelecimento do devedor.
Qualquer credor, segundo o art. 97, IV da lei, sendo civil, trabalhista, empresarial etc., tem legitimação para pedir. Há uma possibilidade de a Fazenda Pública pedir (por impostos) quando credora. A legitimidade extraordinária trata do agente fiduciário, que ao emitir debêntures, normalmente se escolhe um agente fiduciário (que não é credor) para representar os credores (das debêntures) caso seja necessário pedir falência, sendo assim o agente fiduciário pede um direito de terceiros e não o dele.
Se o credor for um empresário, ele tem que provar que é empresário, pois com isso a lei faz com que o empresário regular possa pedir a falência e o irregular tenha que se regularizar antes.
O pedido de falência, ação litigiosa, deve seguir os requisitos essenciais, entre eles a causa de pedir. A lei aponta 3 deles, a IMPONTUALIDADE é a mais frequente na prática. Bastando o não pagamento de obrigação liquida e certa. Não se exige do credor que prove que o devedor e insolvível (empresa cujo patrimônio líquido é negativo, ou seja, o passivo é maior que o ativo). Sendo assim, basta ter um título executivo PROTESTADO para que possa pedir a falência sem nenhuma referência ao ativo e ao passivo da sociedade empresária.
Súmula 361, STJ: A notificação do protesto, para requerimento de falência da empresa devedora, exige a identificação da pessoa que a recebeu. Dessa forma, basta a identificação da pessoa e não que seja assinada pelo diretor, qualquer preposto pode assinar a notificação.
O título protestado tem que ser de, no mínimo, 40 salários mínimos, isso porque não se decreta falência de empresas por pequenos valores, para que o pedido de falência não seja abusivo.
Para alcançar esse valor, admite-se o litisconsórcio de credores para pedir. Por exemplo, o credor A tem um crédito de 30 salários mínimos, e o credor B tem um credito de 15 salários mínimo, sendo litisconsortes podem pedir, separados não.
Insolvabilidade esta causa de pedir está fundamentada na execução frustrada. Por exemplo: o credor executa uma duplicata e nessa execução não consegue encontrar bens penhoráveis. Isso caracteriza uma execução frustrada (deve ser feito em ação autônoma). Há uma discussão doutrinária se é necessário desistir da execução para pedir a falência; a última orientação do STJ é de que tem que desistir da execução para pedir a falência (e aqui não é necessário um valor mínimo, nem um título protestado).
Outra causa de pedir é o ATO DE FALÊNCIA, que está previsto no art. 94, III, sendo esta previsão legal idêntica à do artigo que dispunha sobre tal na lei antiga, no Código de 45, porém nunca foi aplicado (nem na lei antiga), pois é quando o devedor esta se desfazendo dos seus bens e o autor da ação tem o ônus de provar que o devedor esta fraudando o pagamento.
PEDIDO: Declaração Judicial de Falência.
Há um entendimento que se nesta petição for feito o pedido de pagamento também, a petição será inepta, pois o que você quer é a falência e não o pagamento.
VALOR DA CAUSA: valor do título executivo.
CITAÇÃO pessoal do devedor é melhor, mas pode ser via postal também, porém pode dar nulidade da citação pela empresa não estar mais no local e etc.
PRAZO PARA RESPOSTA: deve-se oferecer a resposta em até 10 dias previstas na Lei, por isso não muda com o NCPC.
* Se no pedido de falência o credor concordar com a suspensão do processo, para que as partes se componham, por exemplo, é entendido como moratória, o que fará com que o pedido de falência venha a se extinguir.
O réu, em sua defesa, pode alegar o que a lei chama de relevante razão de direito. O art. 96 diz que a falência não será decretada se o requerido provar (ônus do réu) os casos previstos nos incisos.
Art. 96. A falência requerida com base no art. 94, inciso I do caput, desta Lei, não será decretada se o requerido provar:
I – falsidade de título;
II – prescrição;
III – nulidade de obrigação ou de título;
IV – pagamento da dívida;
V – qualquer outro fato que extinga ou suspenda obrigação ou não legitime a cobrança de título;
VI – vício em protesto ou em seu instrumento;
VII – apresentação de pedido de recuperação judicial no prazo da contestação, observados os requisitos do art. 51 desta Lei;
VIII – cessação das atividades empresariais mais de 2 (dois) anos antes do pedido de falência, comprovada por documento hábil do Registro Público de Empresas, o qual não prevalecerá contra prova de exercício posterior ao ato registrado.
1o Não será decretada a falência de sociedade anônima após liquidado e partilhado seu ativo nem do espólio após 1 (um) ano da morte do devedor.
2o As defesas previstas nos incisos I a VI do caput deste artigo não obstam a decretação de falência se, ao final, restarem obrigações não atingidas pelas defesas em montante que supere o limite previsto naquele dispositivo.
O Réu tem ainda a possibilidade de apresentar o depósito elisivo, que é o depósito da quantia correspondente ao crédito acrescido de juros, honorários e correção monetária, com isso está elidida a possibilidade de decretar a falência e o juiz julga o pedido prejudicado.
O Réu pode ainda contestar para dizer que já pagou.
Se há depósito elisivo + a contestação, o juiz tem que prosseguir o processo para analisar a contestação (ver quem tem direito de levantar o dinheiro e etc.).
Feita a instrução do processo o próximo passo é a sentença de mérito que será julgada procedente ou improcedente. Caso seja julgada improcedente não declara a falência e poderá gerar a indenização por parte do autor se o pedido de falência foi feito com dolo por parte do credor. O art. 101, caput, dessa forma o juiz pode agir de oficio sem que o réu tenha pedido (mas é raro).
A sentença declaratória tem eficácia constitutiva, pois instaura um novo regime jurídico para o devedor, que passa a ser falido. Não produz efeitos retroativos, ela atua prospectivamente, portanto tem efeito ex nunc, atuando daquele momento em diante.
O efeito é a partir da prolação da sentença e não da publicação, por este motivo alguns juízes ainda colocam a hora da sentença. Na lei anterior era pedido que se colocasse o horário em que foi prolatada (mas agora não é mais necessário), pois os pagamentos feitos depois daquela hora já padecem de nulidade.
O art. 99 trata dos requisitos da sentença de declaração de falência.
Art. 99. A sentença que decretar a falência do devedor, dentre outras determinações:
I – conterá a síntese do pedido, a identificação do falido e os nomes dos que forem a esse tempo seus administradores;
II – fixará o termo legal da falência, sem poder retrotraí-lo por mais de 90 (noventa) dias contados do pedido de falência, do pedido de recuperação judicial ou do 1o (primeiro) protesto por falta de pagamento, excluindo-se, para esta finalidade, os protestos que tenham sido cancelados;
III – ordenará ao falido que apresente, no prazo máximo de 5 (cinco) dias, relação nominal dos credores, indicando endereço, importância, natureza e classificação dos respectivos créditos, se esta já não se encontrar nos autos, sob pena de desobediência;
IV – explicitará o prazo para as habilitações de crédito, observado o disposto no § 1o do art. 7o desta Lei;
V – ordenará a suspensão de todas as ações ou execuções contra o falido, ressalvadas as hipóteses previstas nos §§ 1o e 2o do art. 6o desta Lei;
VI – proibirá a prática de qualquer ato de disposição ou oneração de bens do falido, submetendo-os preliminarmente à autorização judicial e do Comitê, se houver, ressalvados os bens cuja venda faça parte das atividades normais do devedor se autorizada a continuação provisória nos termos do inciso XI do caput deste artigo;
VII – determinará as diligências necessárias para salvaguardar os interesses das partes envolvidas, podendo ordenar a prisão preventiva do falido ou de seus administradores quando requerida com fundamento em provas da prática de crime definido nesta Lei;
VIII – ordenará ao Registro Público de Empresas que proceda à anotação da falência no registro do devedor, para que conste a expressão “Falido“, a data da decretação da falência e a inabilitação de que trata o art. 102 desta Lei;
IX – nomeará o administrador judicial, que desempenhará suas funções na forma do inciso III do caput do art. 22 desta Lei sem prejuízo do disposto na alínea a do inciso II do caput do art. 35 desta Lei;
X – determinará a expedição de ofícios aos órgãos e repartições públicas e outras entidades para que informem a existência de bens e direitos do falido;
XI – pronunciar-se-á a respeito da continuação provisória das atividades do falido com o administrador judicial ou da lacração dos estabelecimentos, observado o disposto no art. 109 desta Lei;
XII – determinará, quando entender conveniente, a convocação da assembleia-geral de credores para a constituição de Comitê de Credores, podendo ainda autorizar a manutenção do Comitê eventualmente em funcionamento na recuperação judicial quando da decretação da falência;
XIII – ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento, para que tomem conhecimento da falência.
Parágrafo único. O juiz ordenará a publicação de edital contendo a íntegra da decisão que decreta a falência e a relação de credores.
A sentença marca o período de habilitação de crédito. Por fim o juiz impedirá que o devedor pratique atos de disposição de bens, (isso é um efeito da lei, não precisava de previsão legal para tal, pois dá a entender que é a ordem do juiz que faz com que ele não possa mais vender, mas ele não pode desde a data da quebra).
AUTOFALÊNCIA
É o auto de falência pelo próprio devedor, também entendida como a confissão de falência. Alguns doutrinadores entendem isto como um problema, pois é o juiz quem decreta, sendo assim, ele pede para que o juiz decrete sua falência.
Há uma discussão sobre a autofalência ser uma faculdade ou um dever do devedor. A lei anterior previa uma obrigação, onde o devedor devia pedir, mas é uma faculdade na nova lei. Sendo assim, não há o dever de pedir a falência, até porque não há nenhuma consequência para o devedor se ele não pedir, de modo que pede a falência o próprio empresário que assim deliberar.
Autofalência depende de deliberação dos sócios, as quais serão cumpridas pelos diretores da empresa. O QUORUM para essas deliberações seve tanto para a Falência como para a Recuperação Judicial. Na Sociedade Limitada de Prazo Indeterminado, o quorum comum exigido para aprovação de pedido de autofalência é de ¾ do capital social, previsto no art. 1076, I combinado com o 1071, VI do CC/02. Na Sociedade Limitada de Prazo Determinado o art. 1033, II do CC exige a unanimidade de votos. Na Sociedade Anônima, a Lei das S/A prevê que no mínimo metade das ações com direito a voto.
A CAPACIDADE POSTULATÓRIA do advogado na autofalência, como se entende que é uma confissão, o advogado deve ter poderes para tanto.
O art. 105 arrola os documentos que devem acompanhar a inicial. Alguns juízes pretendem observar com muito rigor, no entanto, a doutrina diz que não é necessário que se aplique tanto rigor nesta análise.
A autofalência é um tanto quanto mal vista, pois dá a intenção de que tem fraude, mas é um exercício regular de um direito, por exemplo, se os sócios acham que não da mais para continuar com a empresa, que só estão fazendo dívidas, é melhor pedir a falência que continuar se endividando.
EXTENSÃO DA FALÊNCIA
Aqui é necessário tomar certo cuidado, pois, digamos que, por exemplo, o fundamento seja a desconsideração da personalidade jurídica. A sentença encera a fase de conhecimento e inicia a fase de execução concursal (atos expropriatórios, execução forçada do devedor), nesse caso pode se aplicar a desconsideração da personalidade jurídica dentro da falência. O administrador da falência pode requerer a extensão da falência ao sócio, pois geralmente eles tiram elementos de uma empresa que está falindo e constituem outra com má-fé. A extensão da falência com fundamento na desconsideração da personalidade jurídica é uma criação da jurisprudência consolidada pelo STJ.
Há outra previsão na lei, do que também é uma extensão da falência, porém esta outra hipótese é uma verdadeira extensão. Ela se aplica as sociedades limitadas e as sociedades anônimas (que são as que mais temos no país). A possibilidade de decretar a extensão da falência tem fundamento no art. 81 da Lei, que se verifica naquelas sociedades que pouco existem no país. Quando se decreta a falência de uma sociedade em nome coletivo, em comandita simples ou por ações, estende-se a falência da sociedade ao sócio que tenha responsabilidade ilimitada.
Art. 81. A decisão que decreta a falência da sociedade com sócios ilimitadamente responsáveis também acarreta a falência destes, que ficam sujeitos aos mesmos efeitos jurídicos produzidos em relação à sociedade falida e, por isso, deverão ser citados para apresentar contestação, se assim o desejarem.
1o O disposto no caput deste artigo aplica-se ao sócio que tenha se retirado voluntariamente ou que tenha sido excluído da sociedade, há menos de 2 (dois) anos, quanto às dívidas existentes na data do arquivamento da alteração do contrato, no caso de não terem sido solvidas até a data da decretação da falência.
2o As sociedades falidas serão representadas na falência por seus administradores ou liquidantes, os quais terão os mesmos direitos e, sob as mesmas penas, ficarão sujeitos às obrigações que cabem ao falido.
Outra previsão, agora no art. 82 da Lei, é que uma vez decretada a falência da empresa, o administrador tem que examinar os atos praticados pelos administradores, o que faz parte do dever de diligência do administrador judicial, sendo assim, é um dever legal dele examinar a situação da empresa, para que possa identificar eventualmente algum ato ilícito praticado pelos administradores, com vista em entrar com ação de responsabilidade contra os administradores, o que está previsto no art. 82.
Dessa forma, o art. 82 prevê a ação de responsabilidade pessoal dos sócios de responsabilidade limitada, então aqui sim o endereço da responsabilidade é o administrador da sociedade anônima, da sociedade limitada.
Art. 82. A responsabilidade pessoal dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e dos administradores da sociedade falida, estabelecida nas respectivas leis, será apurada no próprio juízo da falência, independentemente da realização do ativo e da prova da sua insuficiência para cobrir o passivo, observado o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil.
1o Prescreverá em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência, a ação de responsabilização prevista no caput deste artigo.
2o O juiz poderá, de ofício ou mediante requerimento das partes interessadas, ordenar a indisponibilidade de bens particulares dos réus, em quantidade compatível com o dano provocado, até o julgamento da ação de responsabilização.
Portanto, de acordo com o caput, ao dizer “estabelecida nas respectivas leis” quer dizer que esta lei não cria nenhuma responsabilidade, pois a responsabilidade dos “controladores e dos administradores da sociedade falida” está prevista nas respectivas leis, sendo elas a Lei das Sociedades Anônimas, por exemplo.
Em relação ao sócio, o que a lei quer é que ele integralize o capital, o que deve ser feito por meio dessa ação, pois aquele capital que deveria estar integralizado fez falta, tanto que a empresa veio a falir. Cabe então ao administrador judicial, verificar a contabilidade da empresa e saber se o dinheiro realmente entrou, e se não entrou tem que entrar com uma ação para cobrança do sócio.
Esta ação pode e deve ser promovida pelo administrador judicial independente da venda dos bens da empresa, isto é, independentemente da realização do ativo, pois em regra o sócio só responde depois de esgotado o acervo social.
O PRAZO DE PRESCRIÇÃO é de 2 anos, conforme exposto no art. 82, § 1o. Desse modo, se a falência levar dez anos, tem ainda 2 anos para prescrever, então durante toda a pendência da falência é cabível a ação de responsabilidade para ter indenização, ou seja, enquanto subsistir a falência e dois anos após.
MASSA FALIDA
É criada com a sentença declaratória de falência, administrada pelo administrador judicial nos termos do art. 12 do CPC/73.
Tem duas acepções: Objetiva – é o acervo de bens; Subjetiva – é a coletividade de credores.
Não tem personalidade jurídica, mas tem capacidade judiciária, ou seja, pode ser parte, e tem capacidade negocial, dessa forma, se a massa falida tem um galpão, ele pode ser alugado e a massa falida recebe o credito.
Capacidade jurídica, por exemplo, de ser parte em ação judicial, representada pelo administrador judicial.
A massa falida enquanto ente jurídico é uma criação da lei para viabilizar a promessa de tutela jurídica executiva pelo Estado.
Bibliografia:
Lei 11.101 de 2005 Coelho.
Fábio Ulhoa. “Comentários À Lei de Falencias e de Recuperação de Empresas”. 11ª Ed. Revista dos Tribunais.