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JUIZADO ESPECIAL E A APLICAÇÃO DO NOVO CPC. CONFLITOS NA APLICAÇÃO DO NOVO CPC NOS JUIZADOS ESPECIAIS

JUIZADO ESPECIAL E A APLICAÇÃO DO NOVO CPC. CONFLITOS NA APLICAÇÃO DO NOVO CPC NOS JUIZADOS ESPECIAIS

Ronald Alencar Domingues da Silva

SUMÁRIO: Introdução; 1 As mudanças com a vigência do novo CPC sobre os efeitos dos embargos de declaração nos juizados especiais; 2 A contagem dos prazos processuais em dias úteis com o advento do novo CPC e sua aplicação aos juizados especiais; Conclusão.

INTRODUÇÃO

O papel do advogado na sociedade é tão necessário e importante quanto o do Magistrado, do Ministério Público ou da Defensoria Pública, no tocante à administração da Justiça, assim reconhecido pela Constituição Federal de 1988. O Código de Processo Civil é, notoriamente, norma criada por processo legislativo democrático e buscou, em sua nova redação, nos mais diversos setores da comunidade jurídica, atualizar-se em prol da sociedade. Essa atualização trouxe, além de grandes benefícios no exercício do devido processo legal, reais ganhos na prestação jurisdicional exercida pela advocacia, destacando-se a modificação dos efeitos aplicados na oposição dos embargos de declaração nos Juizados Especiais, os quais, antes do advento do novo Código de Processo Civil, possuíam efeitos suspensivos, e agora, assim como já ocorria na seara do procedimento comum e ordinário, passaram a ter efeitos interruptivos dos prazos para interposição de novos e quaisquer recursos, de acordo com a redação dada pelos arts. 1.065 e 1.066, § 2º, da nova lei em questão, Lei nº 13.105/2015 (NCPC), que alterou o comando do art. 50 da Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/1995), bem como do art. 83, caput e § 2º do mesmo diploma legal especial. Por fim, mister salientar a alteração promovida pelo novo Código de Processo Civil ao alterar, em seu art. 219, a contagem dos prazos antes ininterruptos, para contagem considerando-se apenas os dias úteis, o que tem trazido verdadeiro embate entre alguns Tribunais Estaduais que entendem não ser aplicável a nova regra processual aos Juizados Especiais ante seu conflito com o princípio da celeridade processual inerente aos Juizados. Sobre o tema, o CNJ esboçou entendimento por meio da Nota Técnica nº 01/2016. Já o TJDFT manifestou-se a favor da aplicação integral do novo Código de Processo Civil ao regime dos Juizados Especiais, aplicando, no âmbito do Distrito Federal, as regras de contagem em dias úteis também aos Juizados Especiais, merecendo, por consequência, neste artigo, singelos comentários a respeito da aplicação dessas regras e suas consequências para o ordenamento jurídico nacional.

1 AS MUDANÇAS COM A VIGÊNCIA DO NOVO CPC SOBRE OS EFEITOS DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS JUIZADOS ESPECIAIS

O novo Código de Processo Civil trouxe consigo várias inovações ao Direito brasileiro; algumas foram recebidas de forma negativa, mas, em sua maioria, foram consideradas positivas para a advocacia, função essencial à realização e alcance da Justiça.

Dentre tais mudanças, destacam-se: a) a nova contagem dos prazos;  b) as alterações feitas na Lei dos Juizados Especiais sobre a interrupção do prazo para interposição de novos recursos nos casos de embargos de declaração; e  c) as consequências dessas alterações segundo as manifestações e entendimento do CNJ e do TJDFT, que as aplicam de maneira oposta, conflitando posicionamentos e interpretações jurídicas.

A Lei dos Juizados Especiais, Lei nº 9.099/1995, em seu art. 50, sofreu modificação imposta pelo art. 1.065 do novo CPC (Lei nº 13.105/2015), em vigor desde 18 de março de 2016, alterando a redação do dispositivo para, agora, prever que: “Art. 50. Os embargos de declaração interrompem o prazo para interposição de recurso” (sem grifos no original). Ademais, a nova Lei Adjetiva Civil, por intermédio do seu art. 1.066, também alterou a redação do art. 83 da Lei dos Juizados Especiais, em especial seu § 2º, passando a constar em seu caput que: “Art. 83. Cabem embargos de declaração quando, em sentença ou acórdão, houver obscuridade, contradição ou omissão“, repetindo-se, em seu § 2º, idêntica disposição legal já prevista no art. 50 do Diploma Legal especial.

A mudança da Lei Especial dos Juizados trazida pelo novel Código de Processo Civil é, portanto, inquestionável, por ter sido feita expressamente, e tem aplicação desde sua entrada em vigor a parti de 18 de abril de 2016, encerrando um problema que muitos advogados inexperientes com os Juizados Especiais acabavam enfrentando ao fazer a contagem integral do prazo para recurso inominado a partir da publicação da decisão que julgou os embargos de declaração opostos contra a sentença do juizado, sem considerar os dias já transcorridos entre a publicação da sentença e a oposição dos embargos, os quais, tendo em vista que antes eram apenas suspensos, e não interrompidos, tinham obrigatoriamente que ser computados no cálculo do prazo fatal para interposição do recurso inominado à Turma Recursal dos Juizados.

Com efeito, a partir do advento do novo CPC, os efeitos da oposição de embargos de declaração, agora, são os mesmos já vivenciados no rito da Justiça comum, qual seja, de interrupção do prazo para interposição de eventual recurso, “zerando-se” a contagem do prazo de 15 (quinze) dias para interposição de recurso inominado, que se inicia, agora, contando-se o primeiro dia de prazo como o dia útil seguinte à publicação da decisão que julgou os embargos de declaração, independentemente dos dias transcorridos entre a publicação da sentença e a oposição dos embargos aclaratórios, evitando-se a perda do prazo por erro ou falha na contagem, muito comum no antigo comando, que previa a suspensão do prazo para recursos.

A contagem dos 15 (quinze) dias para interposição do recurso inominado, porém, tem sido muito debatida pelos Tribunais Estaduais na seara dos Juizados Especiais no sentido de dever ou não ser aplicada em dias úteis, como prevê o novo CPC em seu art. 219 (Lei nº 13.105/2015), ou de dever ser contabilizada em dias consecutivos e ininterruptos em respeito ao princípio da celeridade processual, inerente aos Juizados Especiais e acolhido pela regra do  art. 2º da Lei nº 9.099/1998, que assim dispõe: “Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação“.

2 A CONTAGEM DOS PRAZOS PROCESSUAIS EM DIAS ÚTEIS COM O ADVENTO DO NOVO CPC E SUA APLICAÇÃO AOS JUIZADOS ESPECIAIS

O art. 219, portanto, altera significativamente a contagem dos prazos, antes contabilizados “em dias corridos“, para agora serem contados em “dias úteis“.

Por mais evidente que pareça o novo dispositivo no tocante à contagem dos prazos processuais, muitos operadores do Direito têm defendido que a aplicação prevista no novo CPC para contagem dos prazos processuais em dias úteis não deve ser imposta aos Juizados Especiais, assim se manifestando o Conselho Nacional de Justiça – CNJ em sua Nota Técnica nº 01/2016: “Primeiramente pela incompatibilidade com o critério informador da celeridade […] convindo ter em mente que a Lei nº 9.099 conserva íntegro o seu caráter de lei especial frente ao novo CPC, desimportando, por óbvio, a superveniência deste em relação àquela[1].

Possível perceber que tal argumento não se sustenta, pois a contagem em dias úteis não impede a celeridade processual, haja vista que o prazo correrá apenas por dois dias a menos a cada semana (finais de semana) e nos feriados esporádicos, o que, de fato, não atrasa o curso processual em praticamente nada, pois, no máximo, em duas semanas deverá ser retomado o andamento processual após o fim do prazo. A contagem em dias úteis preserva o direito do operador do Direito, seja ele o advogado, promotor, defensor público ou o próprio Magistrado, de ter o descanso semanal, evitando a necessidade e excesso de labor nos finais de semana, como ocorria com a contagem em prazos ininterruptos.

Assim, com a devida vênia, parece equivocada a interpretação do CNJ no tocante à justificativa de não aplicação do novo CPC aos Juizados Especiais, pois a contagem em prazos úteis iria contra a celeridade processual. Neste sentido, importante esclarecer-se o conceito de célere.

De acordo com o pacto de San Jose da Costa Rica, celeridade traduz-se no sentido de que “toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente […]” (sem grifos no original).

De acordo com o antigo Código de Processo Civil de 1973, seus  arts. 125, II, e 130 dispunham que o juiz dirigirá o processo competindo-lhe “velar pela rápida solução do litígio” e “indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias“.

Na atual redação do novo Código de Processo Civil de 2015, o art. 139, II, já difere da redação do antigo CPC, dispondo que o juiz dirigirá o processo incumbindo-lhe “velar pela duração razoável do processo” (sem grifos no original).

Como visto, a diferença na contagem do prazo que costuma alcançar, no máximo, uma ou duas semanas a mais na atual contagem, preservando o direito de descanso dos finais de semana aos operadores do Direito na contagem dos prazos em dias úteis, mantém a duração razoável do processo, de modo que a lentidão ou demora nos julgamentos pelo ordenamento nacional pode ter, sim, problemas que afetam as partes e prejudica o direito de inúmeros litigantes, porém não é por conta da contagem do prazo em dias úteis que a celeridade processual deixará de ser observada, devendo ser aplicados, sim, os ditames do novo regramento processual civil também aos Juizados Especiais naquilo que lhes compete como regra geral.

Há muito já se comenta que o novo CPC tornou o processo mais simples e eficaz para o jurisdicionado, porém não necessariamente mais célere. Todavia, para o detentor da capacidade postulatória que defenderá o direito do jurisdicionado e até mesmo para o julgador, ter os prazos processuais contabilizados apenas nos dias úteis, de labor, parece algo que acabou sendo esquecido e tolhido pelo antigo Código Processual Civil, tendo sido acertadamente e finalmente contemplado contemporaneamente no novo CPC, dados os avanços da psicologia, da eficiência no trabalho, do bem-estar do trabalhador e, enfim, da sociedade na discussão e reforma do CPC.

Nessa linha de raciocínio, o TJDFT manifestou-se por meio do Enunciado nº 4, em notícia a seguir destacada tratando desta questão:

A Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais do DF, em sessão extraordinária, realizada na tarde desta segunda-feira, 28/3, deliberou sobre consulta formulada àquele órgão sobre a contagem de prazos nas ações que tramitam nos Juizados Especiais. O Colegiado, por maioria, decidiu que o enunciado do art. 219 do novo CPC, que estabelece que, “na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis“, alcançará também os Juizados Especiais, que seguirão a nova regra, no que tange aos prazos processuais. O questionamento surgiu uma vez que entendimento anterior estabelecia que as disposições do CPC não se aplicavam ao rito dos processos em tramitação nos juizados especiais cíveis na fase de conhecimento, mas apenas na fase de cumprimento de sentença. Com a decisão, ambas as fases passarão a ser regidas, no DF, pela nova legislação. [2]

CONCLUSÃO

Como visto, “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei“, conforme apregoa o art. 133 da Constituição Federal de 1988, exercendo, portanto, função social e prestando serviço público à sociedade e à Justiça.

A atualização do Código de Processo Civil trouxe mais benefícios do que o revés, apesar das duras críticas de alguns operadores do Direito e Magistrados acerca das inovações promovidas.

A importante modificação dos arts. 50 e 83, caput e § 2º da Lei dos Juizados Especiais promovida pelos arts. 1.065 e 1.066 do novo CPC acabou com o problema de contagem do prazo para interposição do recurso inominado, o qual agora se inicia no primeiro dia útil após a publicação da sentença que julgou os embargos de declaração, independente de quantos dias tenham transcorridos entre a publicação da sentença e o protocolo dos embargos declaratórios, haja vista que o prazo agora não mais se suspende, interrompendo-se e iniciando-se “do zero“.

Por fim, a alteração promovida pelo novo Código de Processo Civil ao prever, em seu art. 219, a contagem dos prazos antes ininterruptos, agora contabilizados apenas em dias úteis, apesar de ter trazido opiniões e orientações divergentes em alguns Tribunais Estaduais e no próprio CNJ, que entendem não ser aplicada referida regra aos Juizados Especais, em razão do princípio da celeridade processual inerente aos Juizados, parece adequada, merecendo ser aplicada também aos Juizados Especiais, sendo este o entendimento esboçado pelo TJDFT em uniformização da jurisprudência das Turmas Recursais do Tribunal para todo o Distrito Federal.

[1] Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/81833-corregedoria-prazos-do-novo-cpc-nao-valem-para–os-juizados-especiais>. Fonage. Nota Técnica nº 01/2016.

[2] Disponível em: <http://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2016/marco/contagem-de-prazos-nos- juiza­dos-especiais-seguira-regra-do-novo-cpc>.