INTERNET DAS COISAS E O DIREITO À PRIVACIDADE
Charles M . Machado
Não resta a menor dúvida da importância da internet das coisas no Plano de Desenvolvimento Nacional; afinal, é um assunto estratégico para o desenvolvimento do País e que vai revolucionar os mais diversos setores da economia. Saúde, mobilidade urbana, agropecuária, energia, mineração e varejo são apenas alguns deles. A ideia é de que os objetos ao nosso redor sejam sensores capazes de monitorar todas as nossas atividades para nelas agregar inteligência. Imagine, a título de exemplo, que um marca-passo poderia registrar todo o ritmo cardíaco de um implantado, o que permitiria diagnósticos e prognósticos mais precisos. Imagine também que automóveis possam transmitir – e muitos já transmitem – os dados de deslocamento aos responsáveis pelo gerenciamento das rotas de tráfego, informando onde, como e quanto abastece, permitindo que essa informação possa ser utilizada por uma rede de postos de combustíveis. Esse mesmo carro informa a rádio e a música que você houve, o locutor que prefere e os roteiros preferidos. Logo, com todos essas possibilidades de registros, a pergunta que não quer calar é: como fica a privacidade das pessoas?
Por isso é necessário que a Lei de Proteção dos Dados tenha efetividade e oferte segurança ao cidadão, pois somente com ela o uso dessa informação fica protegido. Somente com essa lei são fornecidos os conceitos chaves para o desenvolvimento da agenda de Io T no Brasil. Por exemplo, o que são dados pessoais e de que forma a tecnologia (e.g., técnicas de anonimização) poderia ser aplicada para mitigar os riscos à privacidade dos cidadãos que estão atrás desses dispositivos. Referida regulação poderia conferir uma maior segurança jurídica tanto ao cidadão como também ao setor estatal e privado a respeito de como tais dados deveriam ser coletados, processados e compartilhados. Essa lei é, por definição, transversal, multissetorial, em justaposição à moldura normativa fragmentada existente no Brasil, e que se soma ao Marco Civil da Internet e ao Código de Defesa do Consumidor. É justamente por isso que a demanda regulatória de Io T é heterogênea. Independentemente do setor econômico, os vácuos normativos não cobertos pela legislação setorial brasileira de proteção vão criar zonas de sombra para discussão.
Até onde a empresa pode monitorar o funcionário, no serviço ou na extensão da empresa através do endereço eletrônico ou no uso dos equipamentos e máquinas da empresa? Tem muito por se discutir e avançar nesse setor, que, desde já, desenha um mar de oportunidades.
O avanço da tecnologia, por mais promissor que seja, precisa seguir os valores sociais que a sociedade deixou depositada na Constituição Federal.
O sopesamento desses valores será sempre um desafio permanente entre o intérprete da norma e os desenvolvedores de novas tecnologias.