IMPROBIDADE E BLOQUEIO: O TEMA REPETITIVO 1.213 DO STJ
Melissa Ribeiro dos Santos
Luana de Oliveira Doca
A primeira seção do STJ vai definir a constrição de bens em ações de improbidade com múltiplos réus, afetando quatro recursos do TRF-1 para fixar critérios equitativos na indisponibilidade patrimonial até o limite do suposto dano ao erário ou enriquecimento ilícito.
A Primeira Seção do STJ afetou a sistemática de temas repetitivos quatro recursos de relatoria do Ministro Herman Benjamin, com o objetivo de fixar entendimento sobre a constrição patrimonial determinada por tutela antecipada em ações de improbidade que possuem diferentes réus.
Nos recursos afetados, REsps 1955440/DF, 1955300/DF, 1955957/MG e 1955116/AM – todos provenientes do TRF-1, os acórdãos haviam determinado que a indisponibilidade cautelar de bens fosse dividida equitativamente entre o patrimônio dos réus até o limite do valor dos supostos dano ao erário ou enriquecimento ilícito, diante da impossibilidade de se aferir em cognição sumária a extensão e o limite de participação de cada réu.
Esse entendimento já foi reformado pelo STJ em outras oportunidades, mesmo diante do entendimento da Primeira e da Segunda Turma no sentido da solidariedade entre os réus até o final da instrução processual[1].
A tese do Tema Repetitivo 1213 aponta para desnecessidade de divisão equitativa do ônus entre os réus: “A responsabilidade de agentes ímprobos é solidária e permite a constrição patrimonial em sua totalidade, sem necessidade de divisão pro rata, ao menos até a instrução final da ação de improbidade, quando ocorrerá a delimitação da quota de cada agente pelo ressarcimento“.
No acórdão que afetou os recursos ao referido Tema foi destacado que a questão em análise não é abordada pela lei de Improbidade Administrativa. Em decisão monocrática, o Ministro Herman Benjamin, relator do Tema, esclareceu que: “a lei não estabelece que a limitação da indisponibilidade deva ocorrer de forma individual para cada réu, mas, sim, de forma coletiva, considerando o somatório dos valores. Esse ponto é fundamental para se constatar que a lei autorizou a constrição em valores desiguais entre os réus, desde que o somatório não ultrapasse o montante indicado na petição inicial” (AgInt no REsp 1984805/PA, publicação: 13.12.22).
Embora a lei não proíba a distribuição desigual da restrição judicial entre os réus, também não veda o alcance dos bens de todos os réus.
A proposta de tese apresentada para o Tema 1213 busca agilizar a constrição de bens, permitindo o direcionamento direto ao patrimônio do réu mais financeiramente capaz de garantir um eventual ressarcimento ao erário. Com essa medida, ameniza-se a quantidade de pedidos de desbloqueio de bens, alegações de impenhorabilidades, alegações de prejuízo às atividades empresariais, interposição de recursos e impugnações – comuns para processos com litisconsórcio passivo.
No entanto, há uma clara injustiça inerente à restrição do patrimônio de apenas um réu quando múltiplos sujeitos respondem à mesma ação. Segundo entendimento do E. TRF1, a medida de indisponibilidade deve observar requisitos de justiça e razoabilidade, não podendo atingir o patrimônio dos réus de forma desmedida[2]. Afinal, se até o término da fase instrutória ainda não estão apuradas as responsabilidades todos os acusados devem ser tratados de forma equitativa.
O debate acerca do assunto instiga a curiosidade, pois a impossibilidade de quantificar a responsabilidade de cada um dos réus na fase inicial do processo é utilizada como argumento tanto pelo STJ – para sustentar a inviabilidade de divisão pro rata dos valores indicados na inicial – quanto pelos tribunais, como o TRF-1, para defender que a indisponibilidade deve atingir igualmente o patrimônio de todos os réus. Nesse sentido, o julgamento do Tema Repetitivo 1213 será benéfico à segurança jurídica, na medida em que assentará a previsibilidade do assunto a todos aqueles submetidos ao julgamento de ações de improbidade.
[1] Confiram-se precedentes nesse sentido: “no âmbito de ações civis por atos de improbidade administrativa, até a conclusão da instrução do feito, não se revela possível o fracionamento do valor da constrição pelo número de réus (quota parte)” (REsp 1907998/MG, Ministro Sérgio Kukina, publicação 08.04.2022). “No caso em questão o acórdão recorrido afirma expressamente que não é possível determinar desde já a efetiva participação de cada um dos envolvidos na prática do ato de improbidade administrativa.” (AgInt no REsp 1.687.567/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, DJe 2.3.2018).
[2] Nesse sentido: “O fato de cuidar-se, sendo o caso de condenação, de responsabilidade solidária (art. 942 – CC), não quer dizer que a indisponibilidade deva ser praticada de forma nominalista, sem nenhuma centralidade de justiça e de razoabilidade, atingindo o patrimônio dos demandados de forma desmedida, em cifras muitas e muitas vezes superiores ao suposto dano. A solidariedade, no presente, não pode nem deve ser tratada de forma estritamente patrimonialista.” (TRF-1, AG: 10048562920174010000, Rel. Des. Federal OLINDO MENEZES, julgamento: 13.09.2021, 4ª Turma, publicação PJe: 13.09.2021).