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FIADORES – CONTRATO DE LOCAÇÃO – OUTORGA UXÓRIA

FIADORES – CONTRATO DE LOCAÇÃO – OUTORGA UXÓRIA

Marco Aurélio Bicalho de Abreu Chagas

 

 

O Art. 1.647 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil) reza: “Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime de separação absoluta:

I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis:

II – pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;

III – prestar fiança ou aval:

IV – fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar a futura meação”.

Ao solicitar a alguém para ser seu fiador, se a pessoa for casada, é importante saber que a fiança não terá validade se o cônjuge não concordar com ela. A exceção é, como visto no artigo aqui transcrito, para o regime de “separação absoluta”, neste único caso, não é necessária a assinatura do cônjuge. Essa não é uma exigência do locador ou da imobiliária e sim uma exigência legal, que consta no Novo Código Civil artigo 1.647, inciso III.

Existem duas maneiras do cônjuge participar do contrato de locação. A primeira é sendo fiador em conjunto e, neste caso, o cônjuge é tão responsável quanto o fiador, podendo ser acionado por qualquer descumprimento contratual. A segunda é sendo apenas anuente, neste caso, isto deve ficar claro no contrato de locação. Desta forma, o cônjuge tem conhecimento da responsabilidade de fiador do seu marido ou esposa e portanto dos riscos ao patrimônio do casal, porém, não pode ser acionado em caso de descumprimento contratual. Veja o entendimento da Quinta Turma do STJ, que decidiu o seguinte: “A Fiança, cuja validade depende da outorga uxória, quando prestada por pessoa casada em comunhão de bens, não se confunde com a fiança conjunta. Esta se qualifica quando ambos se colocam como fiadores

No Recurso Especial 1.163.074, o STJ definiu qual regime de bens dispensa a outorga. É que o artigo que trata da autorização marital afirma que ela é dispensada no caso de separação absoluta, sem esclarecer se em tal caso se insere tanto a separação de bens consensual quanto a obrigatória, imposta por lei.

Em votação unânime, a 3ª Turma entendeu que apenas o regime consensual de separação atrai a dispensa de outorga. Conforme a decisão, a separação de bens adotada por livre manifestação da vontade corresponderia a uma antecipação da liberdade de gestão dos bens de cada um, afastando qualquer expectativa de um em relação ao patrimônio do outro.

“A separação de bens, na medida em que faz de cada consorte o senhor absoluto do destino de seu patrimônio, implica, de igual maneira, a prévia autorização dada reciprocamente entre os cônjuges, para que cada qual disponha de seus bens como melhor lhes convier”, explicou na ocasião o ministro Massami Uyeda, hoje aposentado.

O mesmo não ocorre quando o estatuto patrimonial do casamento é o da separação obrigatória de bens. Nestas hipóteses, a ausência de comunicação patrimonial não decorre da vontade dos nubentes, ao revés, de imposição legal”, concluiu.

Mesmo que o dono do imóvel que será usado como garantia seja casado em separação total de bens com pacto antenupcial, o outro cônjuge precisa concordar. É verdade que, nesse caso, o imóvel não é bem comum do casal e não entra em uma eventual partilha de divórcio; ainda assim esse cônjuge pode ser herdeiro se o fiador morrer, de acordo com o Código Civil.

No entanto, já existe decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que dispõe que o cônjuge sobrevivente casado em separação total de bens não é herdeiro necessário, o que abre margem a discussões nesse sentido.

“Essa concordância pode ser dispensada, mas é uma briga jurídica”, no entender de alguns juristas. Atualmente, mesmo que o casal esteja casado em separação total de bens, se não houver pacto antenupcial, os tribunais podem entender que a união se tornou comunhão parcial. E que, portanto, os bens adquiridos na constância do casamento se tornaram bens comuns. “Não está na Lei, mas já há jurisprudência nesse sentido”.

Em artigo sob o título: “Novo Código Civil – Efeitos da outorga uxória no aval e na fiança”, o articulista, Abel Barros assevera: “A discussão em baila está presente no artigo 1.647 do Código Civil de 2002.”

No mencionado artigo existe, em seu inciso III, ressalva expressa em nosso ordenamento quanto à necessidade de outorga uxória para que qualquer dos cônjuges preste fiança ou aval salvo no caso do regime da separação absoluta de bens.”

Quando a doutrina se refere ao regime da separação absoluta de bens, em regra, quer referir-se ao que foi assim firmado contratualmente, por meio de pacto antenupcial.” (grifamos).

Partindo do exposto, combinado com o art. 1.649, conclui-se que a fiança e o aval tornam-se atos jurídicos anuláveis se prestados sem a devida autorização, sendo o prazo prescricional de 2 anos após o findar da sociedade conjugal e de 10 anos em caso de não ocorrer o mesmo.”

Entende-se por outorga uxória a autorização dada por um dos cônjuges ao outro para a prática de determinados atos, sem a qual estes não teria validade.

Do exposto, se percebe que o citado Art. 1.647 do Código Civil, em seu inciso III há a ressalva de que, no caso de regime de separação absoluta de bens, não há a necessidade da outorga uxória.

Acontece que a jurisprudência entende que se não houve pacto antenupcial a união se tornou comunhão parcial e, nesse caso, os bens adquiridos na constância do casamento se tornaram bens comuns, exigindo-se, portanto, a assinatura do cônjuge.

Portanto, a questão, pelo visto, não é pacífica, pois o Judiciário se posicionou no sentido de que para a validade da fiança, é necessária a assinatura do cônjuge, mesmo na hipótese de separação total de bens, inexistindo pacto antenupcial, em que pese a exceção expressa na norma aqui assinalada. (inciso III, do Art. 1.647, do Código Civil).