FATO CONSUMADO, DIREITO MATERIAL E DIREITO PROCESSUAL
Francisco Glauber Pessoa Alves
SUMÁRIO: I – Introdução. II – Razoável Duração do Processo, Celeridade e Tempo como Condicionante de Legitimação de Direito Material. III – Crítica Doutrinária. IV – O Leading Case do STF e o Desenrolar da Jurisprudência Superior. V – Fato Consumado à Luz do Direito Material e do Direito Processual. VI – Elementos para uma Teoria do Fato Consumado. VII – Conclusão. Bibliografia.
I – Introdução
Já há algum tempo o direito processual depara-se com um problema que demanda soluções mais claras. O direito material cede passo ao decurso do tempo como fator legitimador de decisões provisórias com efeitos duradouros? Como o direito processual civil lida com esse fenômeno? É possível falar-se em uma teoria do fato consumado[1]? Essa teoria comportaria aspectos meramente processuais, meramente materiais ou híbridos?
O assunto, comum na jurisprudência durante muito tempo, parece não encontrar um rumo claro na doutrina, que é escassa. As decisões ora ressaem por tangentes discursivas que mais se valem da conveniência do objeto do problema em si (efeitos processuais que perduram, conquanto ausente o direito material) transformando-o em resposta (direito material ou o equivalente que se reconhece em face dos efeitos processuais que perduraram), o que pouco ajuda. Um diferencial nessa abordagem doutrinária é a obra de Ferreira (2002), que analisa a matéria de forma bem acentuada tanto sob o prisma da doutrina, como, especialmente, da jurisprudência. Ainda assim, como num axioma matemático [2] que vai se repetindo pela reiteração de construções argumentativas, num utilizar de jurisprudência acriticamente invocada, poucas luzes são lançadas para tornar mais seguro seu conteúdo, até mesmo se se há de falar em teoria.
Porém, a incorporação de inovações ao direito positivo (como a tutela antecipada, havida em 2004) e à própria doutrina de direito material (como o princípio da proteção da confiança) bem como uma reviravolta jurisprudencial recente ensejam uma reanálise do tema. Procuraremos, nesse ensaio, modestamente é verdade, mas com destemor, lançar linhas desafiadoras ou, ao menos, minorar essa desconfortável omissão de enfrentamento. Para tanto, faremos uma rápida digressão sobre a importância do tempo no processo civil para em seguida trazer as luzes doutrinárias sobre o chamado fato consumado. Depois, estudaremos os precedentes superiores, notadamente a decisão do STF no RE 608.482/RN. Depois, lançaremos elementos para uma teoria do fato consumado. Ao cabo, apresentaremos nossas conclusões.
II – Razoável Duração do Processo, Celeridade e Tempo como Condicionante de Legitimação de Direito Material
A doutrina longamente já estudou, aprofundou e consolidou a importância de abreviar o tempo de tramitação do processo, conferindo uma solução ao litígio num tempo razoável. É princípio constitucional expresso – e como tudo o que se escritura na Carta Política é preceito caro e cobrável – aquele cujo teor assegura que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (inciso LXXVIII do art. 5º da CF). Dito princípio (de duplo enfoque: razoável duração do processo e celeridade) foi inserido pela Emenda Constitucional nº 45/04. Por muito tempo, defendeu-se carecer a CF de preceito que claramente assegurasse tramitação judicial em notas de razoabilidade. Após a Emenda Constitucional, restaram superadas eventuais claudicâncias sobre o assunto. A razoável duração do processo, prevista na CF, foi reproduzida no CPC (art. 4º) [3], no capítulo de importância inegável (Das Normas Fundamentais do Processo Civil), embora, curiosamente, dito preceito não tenha reproduzido a celeridade, à semelhança da CF. Entrementes, o ponto de tensão entre seus contornos efetividade e segurança, esse que é o maior dilema do processo como um todo, continua sem fácil solução:
“De regra, ter-se-á sempre uma tensão entre os valores efetividade (ao qual se atrela o direito fundamental ora referido) e segurança (à qual se ligam, por exemplo, a pesquisa sobre os fatos e a busca da verdade, ainda que relativa, no processo). Assim, é no caso concreto que se verificará, com o auxílio de postulados aplicativos normativos como o da proporcionalidade (juízes de necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito), se as medidas determinadas pelo juízo ou requeridas pelas partes, considerado o tempo necessário para o seu desenvolvimento, justificam-se para a concretização do valor segurança e para o regular desenvolvimento dos escopos processuais, ou se igualmente concretizados – ou satisfatoriamente concretizados ainda que com algum sacrifício – sem a dilação provocada por aquelas medidas.” (AMARAL, 2015, p. 50-51)
Nunca houve sentido em defender-se o oposto, é dizer, que o processo poderia ou deveria durar mais que o estritamente necessário para chegar-se a uma solução judicialmente imposta. Razões de ordem econômica (custo da máquina judiciária), política (litígios não solucionados) e ética (apresentação de uma decisão para quem a vindicasse) sempre se fizeram imperiosas. Ainda assim, há décadas se fala em tempo e processo, repetindo-se, à exaustão, um mantra – de resto, óbvio – no sentido de que processo que demande tempo demais para terminar não é adequado – quando menos – ou justo – no limite. Inevitável o paralelo com o personagem da obra de James Matthew Barrie (Peter Pan), na qual o vilão, o caricato Capitão Gancho, foge sempre que ouve o tic-tac do relógio que se encontra no estômago do crocodilo. Tal qual o personagem, a decisão final do processo, e, principalmente, sua realização no mundo empírico, está sempre escapando do relógio.
Há doutrina que atenua (ou sepulta, a nosso ver) a importância da celeridade para a tutela jurisdicional. Câmara destaca que existe um tempo do processo, que precisa ser respeitado, não havendo processos instantâneos. Segundo o jurista, o “processo excessivamente lento é incapaz de promover justiça, pois justiça que tarda, falha. De outro lado, porém, o processo excessivamente rápido gera insegurança, sendo quase impossível que produza resultados justos” (2006, p. 58-60).
Destacando que o que não pode haver são dilações indevidas no tempo do processo, metaforiza o autor que automóveis excessivamente rápidos acarretam acidentes graves. Por sua vez, Didier Junior (2015, p. 96) entende que o “processo não tem de ser rápido/célere: o processo deve demorar o tempo necessário e adequado à solução do caso submetido ao órgão jurisdicional“. Seguindo, o processualista baiano destaca a conquista de um “direito à demora na solução dos conflitos“, rematando que a celeridade como valor não pode suprimir etapas obrigatórias do direito fundamental ao devido processo, como contraditório, direito à produção de provas e aos recursos. Defende não existir um princípio da celeridade, e, sim, um direito à demora na solução dos litígios (para que possam ser exercidas as etapas obrigatórias), concluindo, em tons fortes, que os julgamentos da Inquisição eram rápidos, sem que haja saudades deles.
Não concordamos com tais premissas. O princípio da celeridade foi expressamente registrado na Constituição Federal junto com o asseguramento da razoável duração do processo, a partir da introdução do inciso LXXVIII ao art. 5º, pela Emenda Constitucional nº 45/04. A opção legislativa clara pela inserção da expressão celeridade não deixa margem a dúvidas, sem olvidar já existir, por exemplo, no âmbito da Lei nº 9.099/95, já se consignava-a como princípio, ao destacar, no art. 2º, que o “processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação“. Longe de ver diminuída sua importância, como se celeridade fosse sinônimo de tutela jurisdicional capenga, lançou-se um desafio maior, muito mais pungente e importante do que o conteúdo antes refletido: deve-se dar a melhor decisão da maneira mais rápida! Claro que, como regra, tão melhor será uma decisão quanto tenha permitido um processo contraditório, observador do devido processo legal, no qual oportunizadas provas, uma sentença fundamentada e o direito a um recurso, pelo menos, conteúdo este que se constitui no entendimento doutrinário sobre razoável duração do processo. Óbvia essa constatação! Porém, ela não é escudo para permitir-se um processo longo, interminável, com solução aquinhoada às calendas gregas. Assim, celeridade não implica um óbice à razoável duração do processo; muito pelo contrário, são princípios e valores complementares.
Outrossim, o pleno direito à argumentação, às provas e aos recursos é encontrável no modelo procedimental constitucional comum. Mas a Constituição Federal pode autorizar outros modelos, como expressamente o fez (art. 98, I) com os Juizados Especiais, por exemplo. Mesmo que não houvesse esse permissivo constitucional expresso, os Juizados Especiais permitem argumentação e defesa suficientes, prova a tal respeito, direito à tutela jurisdicional e recurso sobre as decisões proferidas, de sorte que sua estrutura procedimental é expressão tanto de celeridade como de devido processo legal, da tempestividade de tutela jurisdicional e da razoável duração do processo. Querer generalizar o CPC para o específico constitucionalmente autorizado (= Juizados Especiais) ou mesmo para o que não está no CPC é tornar letra morta, indiretamente, o próprio Texto Constitucional que legitima modelos procedimentais excepcionais.
Isso é tanto mais sério quando se vê remédios constitucionais que não deixam de ser ações especiais, com procedimentos igualmente especiais, nos quais o modelo procedimental comum é repelido, como o caso do mandado de segurança (art. 5º, LXIX e LXX; Lei nº 12.016/09) e do habeas data (art. 5º, LXXII; Lei nº 9.507/97), nos quais não há dilação probatória. Ninguém jamais pregou devessem ser menos céleres tais espécies de tutela jurisdicionais! Dessa forma, o legislador pode criar procedimentos que ora alarguem, ora restrinjam direitos à argumentação, ao contraditório, ao devido processo, à produção de provas, à sentença e aos recursos, porque isso é justamente a calibração infraconstitucional entre dois princípios relevados (razoável duração do processo e celeridade). A celeridade é claramente um valor constitucional que se presta legitimamente a repelir a incidência de normas outras que lhe anulem a vigência. Se ninguém quer processos que aqui ou ali atropelem as melhores recomendações procedimentais e constitucionais, tanto pior os processos que não saiam do lugar, arrastando-se infinitamente sem uma solução e provocando insegurança jurídica e perpetuação de conflitos.
Volvendo ao âmago do presente tópico, importa dizer que a vida é mais complicada que as teorias muitas que sobre ela versam e, por mais tentativas (legislativas, de gestão, de estrutura, etc.) que sejam feitas no sentido de garantir-se razoável duração do processo (e presteza jurisdicional, para os que situem diferença entre ambos), uma realidade permanece incólume: o campo das decisões provisórias, geralmente liminares, cujos efeitos duradouros ensejam uma dramática reversibilidade, sob a ótica do reconhecimento da ausência de direito material a lhes subsidiar quando do julgamento definitivo. Dito de uma forma mais simples: a sensível possibilidade de desconsideração de situações precariamente havidas ou criadas por força de decisões provisórias.
Não foram poucas as vezes em que a jurisprudência utilizou este (exclusivamente ou concomitante com outras razões) como argumento decisório. A título meramente ilustrativo, temos, ainda na primeira metade do século passado, julgado do STF que ressalvou o recebimento de vencimentos feitos sob color de boa-fé referente à lei que cassou vantagens pecuniárias concedidas a funcionários que não gozavam de irredutibilidade de vencimentos (ACi 8.070, Rel. Min. Philadelpho Azevedo, j. 30.09.1943). Ferreira (2002, p. 19-24) situa a invocação do fato consumado pelo meio da década de 1960, em várias ações que questionavam a possibilidade de os regimentos internos das universidades exigirem de seus alunos nota mínima de cinco para aprovação. Em razão disso, o STF editou a Súmula nº 58, considerando válida “a exigência de média superior a quatro para a aprovação no estabelecimento de ensino superior, consoante o respectivo regimento“.
A genética do problema, assim, era ligada ao tema preenchimento de requisitos educacionais, o que continuou como a maior fonte produtora dessa jurisprudência (FERREIRA, 2002, p. 33-38), em casos cada vez mais abrangentes, como ingresso em universidade sem conclusão do segundo grau, dispensa de disciplina pré-requisito de uma subsequente, transferência universitária fora das hipóteses previstas em lei, matrícula de aluno especial como regular, matrícula em curso superior sem requisitos ou idade, convalidação de diploma com instituição irregular, etc. Ao depois, como ricamente historiou Ferreira (2002, p. 33 e 38-39), ampliou-se para remoção de agente de polícia federal da fronteira, concurso público, manutenção de vencimentos, lavra mineral, construção em sítio tombado pelo patrimônio histórico, importação de produto sem atestado fitossanitário, eleição sindical, questão trabalhista, sucessão eleitoral em cooperativa, eleições para Conselho Regional de Contabilidade, liberação de valores, saque de FGTS, pagamento de preparo, política açucareira, participação de leilão em estoque regulador de propriedade estatal, expedição de certidão negativa da Previdência Social, licitação e inserção de time de futebol em divisão de campeonato, entre muitos outros.
Muitas decisões foram proferidas após as primeiras invocações, nas décadas de 1940 e 1960 (pelo próprio STF, pelo extinto TFR, pelo STJ, pelos TRFs e TJs), ora invocando apenas a incidência temporal como fator legitimador da confirmação de situações fáticas – à míngua de direito material reconhecível ao beneficiado -, ora assomando a este algum outro argumento. Ferreira (2002, p. 151-154) afirma que os critérios utilizados pela STF no nascedouro das decisões que invocaram o fato consumado (excepcionalidade do caso e dúvida objetiva sobre o direito aplicável ao caso) findaram por serem abandonados ou subvertidos ao longo dos anos, acarretando uma degradação da sua jurisprudência.
O fundamento decisório ora era de mérito propriamente dito, ora não, e no mais das vezes desafiando alguma justificativa racional, como “situação consolidada“, “equidade“, “injustiça“, “bom senso“, etc. Tanto que já se alertara:
“Assim, uma das opções abertas ao leitor consiste em se curvar diante da afirmação inexplicada dos Tribunais de que o ‘bom senso’ e a ‘justiça’ impediriam a desconstituição do fato consumado. (…) Essa postura jurisprudencial contraria o art. 93, IX, da Constituição, que impõe fundamentação racional às decisões judiciais. A exteriorização de convicções pessoais não o satisfaz.” (FERREIRA, 2002, p. 86)
Como vimos, as áreas de especial predileção jurisprudencial foram: educação, saúde, ambiente e administração (notadamente concursos públicos). E, via de regra, o ente em detrimento de quem esse fato consumado tem servido de argumento decisório foi o Estado, em seus diferentes níveis federativos e autárquicos. Ferreira (2002, p. 48) já aponta a curiosa eleição da jurisprudência quanto ao reconhecimento do fato consumado somente para pessoas privadas, rejeitando-o fortemente quando favorável aos entes de direito público.
Aparentemente, os juízes têm incorporado uma postura antagônica à ideia de Thomas Hobbes, em seu clássico Leviatã, na qual havia um hiperbólico Estado sob autoridade do soberano absoluto, ao qual todos deveriam irrestrita submissão, conquanto irresponsabilizável perante as leis que ele mesmo editasse.
Para o momento, uma conclusão já se apresenta clara. O decurso do tempo no processo, seja sob a ótica da razoável duração do processo, seja sob a ótica mais precisa e consistente da celeridade, não pode ser utilizado como argumento decisório de mérito, tanto mais em detrimento de quem, à luz do direito, não tem razão. Razoável duração do processo e celeridade são princípios constitucionais que têm por escopo assegurar uma decisão justa, e não um resultado injusto.
III – Crítica Doutrinária
Não é fácil sustentar alguma juridicidade ao que se chama de fato consumado. Há um grande claro doutrinário no estudo do assunto. Sua construção tem sido produto exclusivo da jurisprudência, cujas decisões repetem argumentos de decisões anteriores, sucessiva e acriticamente, com início pelo menos na década de 1940. Como já adiantado, uma obra de relevo e fôlego tratou com mais vagar sobre o tema (FERREIRA, 2002, passim).
Primordialmente, Ferreira (2002, p. 45-50) esclarece o desencaixe lógico-formal da adoção do fato consumado, havendo erro no raciocínio de que a ilegalidade (o agir contra o direito) possa servir de premissa maior à qual se encaixe a premissa menor da consumação do fato como autorizante da conclusão da manutenção do fato como regrado na liminar. Corretamente, esclarece que a premissa maior do silogismo jurídico não pode ser uma situação contra legem, o que repudia logicamente o cabimento do fato consumado.
Avançando, o autor destaca e repele os cinco fundamentos ostensivos (2002, p. 50-74 e 106-179) do fato consumado: a) ausência da interposição de recurso voluntário contra as sentenças que reconhecem a situação de fato consolidada (a remessa necessária é mecanismo de correção da ilegalidade e não pode ser ignorada pela ausência de recurso interposto pela pessoa jurídica de direito público prejudicada); b) segurança jurídica (falsa premissa, porque tenta legitimar o descumprimento da lei pelo próprio Estado-juiz, transmitindo, ainda, a ideia de desigualdade de particulares perante uma mesma norma); c) prejudicialidade, pelo provimento cautelar, do pedido contido no processo principal (a tutela cautelar visa assegurar o resultado útil e não a substituir o processo principal como definidor do direito, sabedor o beneficiário que pode ser revogada e desfeita); d) ponderação entre o dano e o sucesso hipotético do autor (não cabe ao judiciário dimensionar danos potenciais, não aferíveis na esfera de um processo, sem considerar interesses maiores, de terceiros, protegidos pelo ordenamento, como o caso de prejudicados por cautelares permissivas de importação de produtos sem inspeção sanitária ou do médico que se forma sem atender todos os requisitos acadêmicos, ambas as situações afetando toda a coletividade); e e) equidade (que, como meio de integração da norma jurídica e não fonte do direito, não permite sua aplicação para afastar a incidência de norma específica, tanto mais quando calcada em decisões racionalmente injustificáveis, donde se constitui em arbitrariedade judicial).
Preocupa-se o autor em, sob as luzes do direito alemão (Verwirkung e Erwirkung), afastar a invocação da boa-fé como sustentáculo do fato consumado. Esclarece que nem a suppressio e nem a surrectio prestam-se a justificá-lo, eis que o primeiro somente “impede o exercício abusivo ou extingue determinado direito subjetivo, mas não se revela apto a criar direitos” (2002, p. 81), ao passo que o segundo pressupõe um sujeito normal acreditar no não exercício superveniente do direito da contraparte (2002, p. 82), o que não sucede nas demandas judiciais contra o Estado, nas quais ele apresenta insurgência na via processual.
Assenta o autor (2002, p. 116-144) que o fato consumado ofende a legalidade, o Estado de Direito, a segurança jurídica, a igualdade, a transparência no ordenamento jurídico, a independência dos poderes e a legitimidade democrática. Reforça Ferreira (passim) a necessidade de preocupação dos juízes para com os resultados irrefletidos a partir do descumprimento de normas legais: acadêmicos de medicina a atuarem sem suficiente aptidão, liberação de mercadorias sem inspeção sanitária adequada, assunção de cargos públicos sem atendimento das qualificações suficientes, entre outros. Para ele, o fato consumado não passa de tópico ou lugar-comum judicial que pretende validar decisão fundada no senso de justiça subjetiva do juiz da causa, não sendo, contudo, logicamente demonstrável (2002, p. 114). Sua definição é clara:
“O fato consumado é o tópico jurisprudencial pretensamente a serviço da equidade por meio do qual o Judiciário, em sentença, ratifica a liminar autorizadora da prática de ato ilícito, apenas porque, no momento de apreciar o mérito da causa, o detentor do provimento cautelar ilegal já desenvolveu, de fato, a atividade que lhe interessava.” (2002, p. 115)
Há uma inerente dificuldade de se invocar o princípio da proteção da confiança como substrato do fato consumado. Monografista que estudou a fundo o assunto, Araújo (2009, p. 32-57) tratou da suposta justificativa jurídica do princípio da proteção da confiança ser a boa-fé objetiva, chegando à conclusão contrária porque esta se presta à invocação entre particulares, entre particulares versus Estado e entre Estado versus particulares. A proteção da confiança, opostamente, “só ofereceria proteção num único sentido: em favor do particular que se relaciona com o Estado” (2009, p. 36). Outro fundamento da proteção da confiança seria a derivação de Estado de direito-segurança jurídica, reconhecido na doutrina de Luís Roberto Barroso e na jurisprudência do STF (2009, p. 47-50). Mesmo o chamado estoppel (instituto anglo-saxônico cuja ideia é impedir que uma parte aja contrariamente a uma de suas manifestações anteriores) não chega a se constituir um fundamento isento de críticas (2009, p. 54-56).
Curiosamente, Araújo não consegue definir contornos precisos de aplicabilidade do fato consumado, preferindo “sustentar a necessidade de uma análise mais criteriosa pelo Poder Judiciário quando do deferimento de medidas de natureza cautelar ou satisfativa de forma antecipada” (2009, p. 163). Contraditoriamente, entende que apenas cabe a proteção da confiança quanto a atos jurisdicionais quando sejam estes divergentes da jurisprudência firmada pelo STF e pelo STJ (observadas as competências constitucionais quanto à última palavra em cada uma deles – direito constitucional e direito legal) ou mesmo de Cortes inferiores (quando não caiba, constitucionalmente, recurso para instâncias superiores) em sede de direito material (2009, p. 173-183). Nisso, comporta-se não só a modulação dos efeitos, como também a aplicação de jurisprudência antiga a fatos que pendem de julgamento de muito tempo, concomitante à própria jurisprudência invocada (2009, p. 191).
Mas, não há sombra de dúvidas, por exemplo, quanto à opinião de Ferreira:
“Antes de tudo, a decisão que prestigia o fato consumado protege situação contrária ao direito. Com o passar de décadas e com a utilização de fórmulas prontas ‘fato consumado’ e ‘situação de fato consolidada’, perdeu-se a consciência de algo fundamental: o Judiciário preserva sempre uma ilicitude, quando usa ambos os apelidos para decidir causas.” (2002, p. 41)
Evidente que praticado o ato sob o ensejo de tutela provisória, será válido até que revogada. Não haverá convolação à definitividade legal pelo só transcurso do prazo. Bem a propósito:
“O art. 37, II, da CF/88 exige prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos para que o indivíduo possa ser investido (definitivamente) em cargo ou emprego público, salvante os cargos em comissão. Sua inobservância é sancionada pelo § 2º do art. 37 da Constituição mesma: nulidade do ato e punição da autoridade responsável. Ora, o vínculo formado irregularmente (= nulo de pleno direito) com a Administração Pública não poderá permitir a investidura definitiva do indivíduo no cargo (efeito próprio, direito, principal do ato válido), mas permitirá que o ‘funcionário de fato’ faça jus à percepção de um ressarcimento pecuniário (efeito reflexo, secundário, indireto reconhecido ao ato absolutamente nulo) pelo dispêndio de energia e tempo, pois do contrário haveria enriquecimento ilícito da parte do Estado, o que é implicitamente vedado pela Constituição. O funcionário de fato poderá ainda especar seu pedido de ressarcimento nos princípios da legalidade e da moralidade da Administração (CF/88, art. 37, caput), e/ou nos arts. 186 e 927 do CC/02 (correspondentes ao art. 159 do CC/1916), em virtude dos quais o causador do dano deve indenizar a vítima. Ademais, os efeitos dos atos praticados pelo ‘funcionário de fato’, pela sua aparência de legalidade, são válidos, não podendo prejudicar terceiros de boa-fé.” (2009, p. 102-103)
À luz do direito à educação e da progressão regularmente prevista dentro das condições da Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), mostrou-se refratariedade ao reconhecimento do fato consumado:
“Os julgados acima descritos devem conduzir o Judiciário a uma séria reflexão sobre o seu papel, notadamente frente às decisões liminares. Se, por um lado, elas emprestam eficiência à garantia do direito de ação, mediante rápida prestação jurisdicional quando o tempo se anuncia como fator de invalidação da eficácia do provimento futuro, por outro, competindo ao Judiciário, igualmente por missão constitucional, assegurar o cumprimento da lei, a evidência do periculum in mora não pode justificar o afastamento da norma vigente conforme a Constituição, para abranger situações que com ela conflitam.” (VELOSO, 2004, p. 48)
No específico, Ferreira (2002, p. 160-161) transcreve sábio voto do Ministro Aliomar Baleeiro, que manteve a reprovação de estudante que não obteve nota mínima para aprovação em disciplina de curso superior. Destacou o Ministro:
“Sr. Presidente, é possível que meu voto esteja influenciado pela observação de mais de vinte anos de professor, vinte anos durante os quais muitos desses mandados de segurança foram concedidos aos piores estudantes da Faculdade
Vai, aqui, uma reminiscência. Meu avô costumava dizer uma frase, que me ficou até hoje: ‘Como eles se formam eu sei; como eles aprendem a ler é que eu fico admirado’.
De modo que é possível que isso perturbe o meu espírito, nesse momento.
Porém, com a devida vênia dos eminentes Ministros que votaram da maneira que acabamos de ouvir, rejeito os embargos. Não posso admitir que transponhamos para o direito aquilo que, no meu tempo de político, ouvi muitas vezes ser difundido, o fait accompli – o fato consumado. Ninguém pode tirar proveito de um erro do juiz, sobretudo rapazes que não se empenharam em bem cumprir os seus deveres e vão servir mal à sociedade durante a vida.“
Em sede de direito ambiental, a doutrina que procurou tratar do tema, supedaneada em jurisprudência do STJ e TRFs, também indica descabimento do fato consumado como fator decisório:
“Infere-se da análise dos excertos transcritos acima que, dada a natureza do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, que pressupõe a salvaguarda desse direito para a presente e para as futuras gerações, não se tem admitido a alegação de direito adquirido, nem mesmo a alegação de situação consolidada, para as situações em que se verificar a ocorrência de degradação ambiental.” (YOSHIDA; FRANCO, 2013, p. 114)
Por outro lado, com alicerce em jurisprudência do STJ (3ª Seção, EREsp 446.077/DF, Rel. Min. Paulo Medina, DJ 15.12.04) anterior ao RE 608.482/RN, defendeu-se o cabimento do fato consumado em sede de concurso público, desde que cumpridas as demais cláusulas editalícias:
“A teoria do fato consumado exige mais que o simples decurso de tempo para sua incidência no caso concreto e, em se tratando de concurso público, reclama, ainda, o cumprimento das regras do edital.” (CARMO, 2011, p. 193)
Dito tudo isso e com respeito às posições divergentes, não há substrato jurídico, à luz do direito material, no chamado fato consumado. Não há um permissivo legal e, muito pelo contrário, sua incidência, por si, deriva de uma ilicitude que nenhum juiz pode desprezar ou acolher. Isso não importa dizer que ele não mereça ser estudado e cotejado, mesmo porque a frequência com que a jurisprudência dele se utiliza enseja um tratamento mais forte, até para evitar a continuidade dessa circunstância.
IV – O Leading Case do STF e o Desenrolar da Jurisprudência Superior
Após um longo período no qual o fato consumado serviu como argumento decisório praticamente alheio a crítica razoável nesse ou naquele sentido, o STF sedimentou, em 07.08.2014, o seguinte entendimento:
“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO REPROVADO QUE ASSUMIU O CARGO POR FORÇA DE LIMINAR. SUPERVENIENTE REVOGAÇÃO DA MEDIDA. RETORNO AO STATUS QUO ANTE. ‘TEORIA DO FATO CONSUMADO’, DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA E DA SEGURANÇA JURÍDICA. INAPLICABILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Não é compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo, sob fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou posse em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro provimento judicial de natureza precária, supervenientemente revogado ou modificado. 2. Igualmente incabível, em casos tais, invocar o princípio da segurança jurídica ou o da proteção da confiança legítima. É que, por imposição do sistema normativo, a execução provisória das decisões judiciais, fundadas que são em títulos de natureza precária e revogável, se dá, invariavelmente, sob a inteira responsabilidade de quem a requer, sendo certo que a sua revogação acarreta efeito ex tunc, circunstâncias que evidenciam sua inaptidão para conferir segurança ou estabilidade à situação jurídica a que se refere. 3. Recurso extraordinário provido.” (STF, RE 608.482/RN, em regime de mérito em repercussão geral, Pleno, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe-213 30.10.2014)
A hipótese julgada era emblemática. O acórdão recorrido mantivera no cargo de agente de Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Norte candidata que tomara posse em virtude de decisão liminar proferida em ação cautelar, a despeito de ter sido reprovada na segunda etapa do concurso (teste físico) e não ter se submetido à terceira etapa (exame psicotécnico). A liminar havia sido concedida há mais de sete anos da data da decisão analisada pelo STF [ou um pouco mais de 12 anos, segundo o voto do Ministro Marco Aurélio] [4]. O Relator, Ministro Teori Zavascki, analisou a matéria mencionando textualmente a “teoria do fato consumado” em juízo de colisão com a norma constitucional de investidura em cargo ou emprego público exclusivamente mediante prévia aprovação em concurso público (art. 37, II), concretizador, segundo ainda o eminente relator, de outros princípios da Administração Pública, como impessoalidade, moralidade, eficiência e igualdade. Calçou-se em ampla jurisprudência das Turmas do STF (RE 405.964/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., DJe 16.05.2012, em um caso similar, em que a parte estava há sete anos na Polícia Militar gaúcha; AI 794.852 AgR/MG, Relª Minª Cármen Lúcia, 1ª T., DJe 13.03.2011; AI 813.739 AgR/RJ, Relª Minª Cármen Lúcia, 1ª T., DJe 01.02.2011; AI 504.970 AgR/MG, Rel. Min. Cezar Peluso, 2ª T., DJe 29.08.2012, sendo que neste caso a parte já estava exercendo o posto de sargento; AI 504.987 ED/MG, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª T., DJe 01.07.2011; RE 476.783 AgR/SE, Relª Minª Ellen Gracie, 2ª T., DJe 21.11.08) e de decisões monocráticas, notadamente no RE 635.739, Rel. Min. Gilmar Mendes, no qual o Plenário afastara a modulação de efeitos fundada em alegação de fato consumado. Destacou-se que não cabia invocar a boa-fé e a proteção da confiança legítima, que pressuporia ato da própria administração a inspirar no íntimo do administrado “uma natural e justificável convicção de que se trata de um status ou de uma vantagem legítima”. Pelo contrário, o ato se deu por provocação do autor e contra a vontade da própria administração, que se opusera ao pleito. Ressaltou, no que merece transcrição:
“Ora, considerando o regime próprio da execução provisória das decisões judiciais – que, como se sabe, é fundada em títulos marcados pela precariedade e pela revogabilidade a qualquer tempo, operando, nesse último caso, por força de lei, automático retorno da situação jurídica ao status quo ante -, não faz sentido pretender invocar os princípios da segurança jurídica ou da proteção da confiança legítima nos atos administrativos. Pelo contrário: o que se deve considerar é que o beneficiário da medida judicial de natureza precária não desconhecia, porque isso decorre de lei expressa, a natureza provisória e revogável dessa espécie de provimento, cuja execução se dá sob sua inteira responsabilidade e cuja revogação acarreta automático efeito ex tunc, sem aptidão alguma, consequentemente, para conferir segurança ou estabilidade à situação jurídica a que se refere.
Com efeito, é decorrência natural do regime das medidas cautelares antecipatórias que a sua concessão se cumpra sob risco e responsabilidade de quem as requer, que a sua natureza é precária e que a sua revogação opera automáticos efeitos ex tunc. Em se tratando de mandado de segurança, há até mesmo súmula do STF a respeito (Súmula nº 405: ‘Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária’. A matéria tem, atualmente, disciplina legal expressa, aplicável a todas as medidas antecipatórias, sujeitas que estão ao mesmo regime da execução provisória (CPC, art. 273, § 3º). Isso significa que a elas se aplicam as normas do art. 475-O do Código: o seu cumprimento corre por conta e responsabilidade do requerente (inciso I), que, portanto, tem consciência dos riscos inerentes; e, se a decisão for revogada, ‘ficam sem efeito’, ‘restituindo-se as partes ao estado anterior’ (inciso II). O mesmo ocorre em relação às medidas cautelares, cuja revogação impõe o retorno das partes ao status quo ante, ficando o requerente responsável pelos danos oriundos da indevida execução da medida (art. 811 do CPC).“
Assim, o voto do relator, seguido pela maioria, destacou um prisma de direito material (a prevalência de princípios constitucionais, proteção da confiança e boa-fé, inaplicáveis ao caso) e outro de direito processual (a precariedade das situações criadas por tutelas provisórias).
A isso opuseram-se os Ministros Roberto Barroso e Luiz Fux. O primeiro entendia que o nome dado ao fenômeno (teoria do fato consumado) não seria adequado, mas existiria a proteção da confiança, como subprincípio da segurança jurídica e daí o juízo de ponderação a ser feito concretamente ante o princípio da obrigatoriedade do concurso público. Dever-se-ia considerar o prazo quinquenal do art. 54 da Lei nº 9.784/99, dada a boa-fé do administrado, bem como da Lei Complementar nº 135/2015 (Lei da Ficha Limpa), destacando a razoabilidade de que decisões de mérito de órgãos colegiados que determinem a posse em cargos públicos confiram ao servidor legítima expectativa de preservação de sua condição de servidor público. Citou dois precedentes do Colegiado (RE AgR 429.906/SC, Rel. Min. Eros Grau, 2ª T., DJe-172 12.09.08; MS 22.357/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, Pleno, DJ 05.11.04). Propôs o Ministro Barroso a seguinte tese para o caso:
“No caso de investidura em cargo público por força de decisões judiciais ainda sem trânsito em julgado, a aferição da eventual confiança legítima a ser protegida envolverá a consideração dos seguintes fatores: (a) a permanência no cargo por mais de cinco anos; (b) a plausibilidade da tese jurídica que justificou a investidura e a ausência de conduta processual procrastinatória; (c) decisão de mérito proferida em segunda instância.”
O Ministro Luiz Fux, por seu turno, destacou que o princípio da proteção da confiança seria oponível tanto ao Estado-administração quanto ao Estado-juiz. Valendo-se do exemplo da Lei da Ficha Limpa e de uma tendência mundial de se estimular que o jurisdicionado se contente com uma só decisão judicial, cuja juridicidade, ainda que precária, haja sido reconhecida e confirmada por uma instância superior. E que o direito fundamental à segurança jurídica, encartado no art. 5º, deveria preponderar no caso.
Nos debates, alguns pontos importantes foram levantados, como: a) a possibilidade de fraude, mediante aposta na obtenção de liminares positivas (Ministros Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Marco Aurélio) e na morosidade da justiça (Ministro Marco Aurélio); b) a oposição do Estado desde sempre, a afastar a proteção da confiança (Ministro Gilmar Mendes); c) a ciência da precariedade da situação pela parte (Ministra Cármen Lúcia); d) no caso concreto, a parte sequer submeteu-se à terceira etapa do concurso, o teste psicotécnico (Ministra Rosa Weber); e) a necessidade das pessoas terem fé no princípio constitucional do concurso público (Ministra Cármen Lúcia); f) não há fato consumado nas decisões judiciais (Ministro Gilmar Mendes); g) a estranheza de se utilizar a teoria do fato consumado como razão decisória (Ministro Ricardo Lewandowski).
Pescamos uma frase, porém, do Relator, Ministro Teori, que é emblemática: “Ninguém pode ter confiança na definitividade de uma medida cautelar“. Sob esse prisma do direito processual, o STF assentou que (ao menos no âmbito do concurso público) a tutela provisória que autoriza o candidato a superar etapa do concurso e/ou assumir o cargo não gera, ainda que sucedida por longo tempo de vigência até o julgamento definitivo da causa, o direito à consolidação da situação por ela criada pelo só transcurso do tempo. Essa parece ter sido a ratio decidendi. E nessa toada foram calcados os julgados que se seguiram, conforme ordem cronologicamente disponibilizada no site de jurisprudência do STF a partir do indexador “608.482” (registro do leading case) em 12 de outubro de 2016: a) STF, RE AgR 629.558/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowsky, 2ª T., DJe-171 04.09.2014; b) STF, RE AgR 805.243/MG, Rel. Min Luiz Fux, 1ª T., DJe-221 11.11.2014; c) STF, RE 534.738, 2º Julg/DF, Rel. p/ o Acórdão Min. Roberto Barroso, 1ª T., DJe-32 19.02.2015, tendo ficado vencido o relator originário, Ministro Dias Toffoli, que acompanhara a maioria formadora da exegese do RE 608.482/RN; d) STF, RE AgR 846.930/RN, Rel. Min. Teori Zavascki, 2ª T., DJe-039 02.03.2015; e) STF, RE 724.347/DF, em regime de repercussão geral, Rel. p/ o Acórdão Min. Roberto Barroso, Pleno, DJe-088 13.05.2015, o qual, com base no RE 608.482/RN, firmou o STF que na hipótese de posse em cargo público determinada por decisão judicial, o servidor não faz jus a indenização, sob fundamento de que deveria ter sido investido em momento anterior, salvo situação de arbitrariedade flagrante; f) STF, AI AgR 695.507/AL, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª T., DJe-123 25.06.2015; g) STF, RMS 31.538/DF, Rel. p/ o Acórdão Min. Marco Aurélio, 1ª T., DJe-130 23.06.2016; h) STF, RE AgR 736.881/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª T., DJe-101 18.05.2016; e i) STF, RE AgR 471.129/SE, Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª T., DJe-083 29.04.2016.
Porém, uma situação de distinguishing teria sido decidida, não pelo Plenário, mas pela Primeira Turma:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. COLAÇÃO DE GRAU. NÃO SUBMISSÃO AO ENADE. TEORIA DO FATO CONSUMADO. CONTROVÉRSIA DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIONAL. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. SÚMULA Nº 636 DO STF. INCIDÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO.” (STF, 1ª T., RE AgR 896.651/PE, Rel. Min. Luiz Fux, DJe-165 08.08.2016)
A ementa diz bem menos que a discussão realmente travada e o voto do relator. No caso, as partes, sob força de liminar, concluíram o curso de medicina. O recurso extraordinário foi interposto contra o acórdão do STJ. No que essencial, assentou como razões de inaplicabilidade da ratio decidendi do RE 608.482:
“A operação interpretativa que estabelece marcos decisórios diversos dos invocados não somente é possível no âmbito deste Supremo Tribunal Federal, como se constitui em legítima medida para salvaguardar o postulado da ‘proteção judicial efetiva’ (CRFB/88, art. 5º, XXXV), com especial destaque para a diferença fática incontroversa nestes autos: o acórdão paradigma versa sobre hipótese concreta de concurso público; estes autos, por sua vez, sobre a obrigatoriedade de realização do Enade, para fins de conclusão de curso superior universitário.
Essa circunstância é decisiva para que se estabeleça, na espécie, a distinção nesta sede recursal extraordinária. Nesse particular sentido, veja-se o precedente firmado, por unanimidade, pela Primeira Turma, no RE 839.732/RJ-AgR-segundo, DJe 11.09.2015.”
Embora pese a sensibilidade do relator para a matéria (ele ficou vencido no julgamento do RE 608.482/RN juntamente com o Ministro Roberto Barroso, como já vimos), não parece haver fundamento jurídico dissonante (decurso do tempo como fator legitimador de situação fática criada por tutela provisória) quanto ao RE 640.482/RN, tanto mais pelo amplo debate neste havido.
Em um sistema de precedentes como o do Código de Processo Civil recém-instituído, somente dois comportamentos podem ser racionalmente trilhados. O primeiro, a observância horizontal da própria jurisprudência da Casa, a partir da própria dicção do art. 926 do CPC (“os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente“) – que não estava em vigor à época do julgamento -, obviamente, já inspiraria uma observância lógica de segurança jurídica processual:
“O art. 926 do CPC institui claramente o que a doutrina chama de stare decisis horizontal. Ao dizer expressamente que há dever de outorgar unidade ao direito e de fazê-lo seguro – o que implica torná-lo cognoscível, estável e confiável -, o legislador obviamente determinou ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça respeito aos próprios precedentes, além de ter determinado aos Tribunais Regionais Federais e aos Tribunais de Justiça respeito à própria jurisprudência formada a partir dos incidentes de resolução de demandas repetitivas e de assunção de competência. Isso porque a primeira condição para que exista um sistema de precedentes e de compatibilização vertical das decisões judiciais é o respeito por parte das Cortes Supremas aos seus próprios precedentes.” (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2015, p. 872)
O segundo, a necessidade de uma técnica de julgamento mais apurada e um quórum mais qualificado para estabelecimento de distinções ao precedente, quiçá a posição do próprio Plenário, consoante regrado pelo § 4º do art. 927 (“a modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia“). É bem de se dizer:
“Para que exista fidelidade ao precedente as distinções têm de ser consistentes, isto é, têm de ser realizadas a partir de uma real diferenciação subjacente entre as questões examinadas pelo órgão jurisdicional.” (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2015, p. 875)
Ou bem no mesmo sentido:
“Ademais, a norma também se preocupa em evidenciar que, para deixar de aplicar precedente obrigatório – do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal -, o juiz ou o tribunal deve demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.” (WAMBIER et al., 2015, p. 2.077-2.078)
No mesmo caminho parece ter incorrido o seguinte aresto:
“DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. DEVOLUÇÃO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes. 2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº 8.213/91. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF, ARE 734.242 AgR/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª T., DJe-175 08.09.2015)
A própria divergência, apresentada pelo Ministro Marco Aurélio no ARE 734.242 AgR/DF, foi diretamente ao nó górdio, para além das considerações contidas no RE 608.482 e que elencamos logo atrás quanto ao RE AgR 896.651/PE (Rel. Min. Luiz Fux), ao destacar que não poderia a Turma afastar a constitucionalidade da norma autorizativa do desconto (art. 115 da Lei nº 8.213/91) sem ofensa à Súmula Vinculante nº 10 (“viola a cláusula de reserva de plenário a decisão de órgão fracionário de tribunal, turma, câmara ou seção, mesmo sem declarar a inconstitucionalidade, afasta a sua incidência no caso concreto, no todo ou em parte“).
Nada obstante ilhadas essas duas decisões até aqui e sem análises, por parte delas, mais clara, segura e efetiva referentemente ao que firmado no RE 608.482, revelam um hábito um tanto não incomum de órgãos fracionários não seguirem a ratio decidendi das decisões dos Colegiados máximos dos tribunais brasileiros, o que não ocorre apenas no STF.
Um apanhado do STJ também revela uma consistência jurisprudencial com alguns senões, a partir de consulta pelo indexador “fato e consumado e 608.482” junto ao site daquela Corte em 12 de outubro de 2016. Apareceram 26 julgados. A ampla maioria deles, inclusive por seu Órgão Especial, em linha com o RE 640.482/RN: a) STJ, AgRg no AREsp 314.884/SP, Relª Minª Ministra Assusete Magalhães, 2ª T., DJe 25.03.2015; b) STJ, AgRg no AREsp 115.289/MG, Relª Minª Assusete Magalhães, 2ª T., DJe 16.04.2015; c) STJ, AgRg no REsp 1.457.689/MG, Relª Minª Assusete Magalhães, 2ª T., DJe 16.04.2015; d) STJ, AgRg no RMS 47.240/MT, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., DJe 11.05.2015; e) STJ, AgRg no RE nos EDcl nos EDcl na MC 18.744/PE, Relª Minª Laurita Vaz, Corte Especial, DJe 06.08.2015; f) STJ, AgRg no RE no RMS 29.599/RJ, Relª Minª Laurita Vaz, Corte Especial, DJe 08.09.2015; g) STJ, AgRg nos EDcl no RMS 37.904/MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 24.08.2015; h) STJ, AgRg no AREsp 638.979/ES, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª T., DJe 27.08.2015, sendo que o caso era de matrícula por força de liminar; i) STJ, AgRg no AREsp 337.499/MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 28.08.2015; j) STJ, AgRg no RE nos EDcl no AgRg no REsp 1.296.662/DF, Relª Minª Laurita Vaz, Corte Especial, DJe 14.09.2015; k) STJ, AgRg no RMS 40.682/DF, Relª Minª Regina Helena Costa, 1ª T., DJe 24.09.2015; l) STJ, AgRg no REsp 1.451.556/PB, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª T., DJe 16.09.2015; m) STJ, AgRg no REsp 1.416.320/SE, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª T., DJe 23.09.2015, em caso de matrícula de menor de 18 anos em curso de ensino superior; n) STJ, AgRg no RE nos EDcl no AgRg no RMS 42.676/BA, Relª Minª Laurita Vaz, Corte Especial, DJe 15.12.2015; o) STJ, REsp 1.212.103/RJ, Rel. p/ o Acórdão Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 28.03.2016; p) STJ, AgRg no RMS 45.341/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe 01.03.2016; q) STJ, AgRg no AREsp 171.729/RS, Relª Minª Assusete Magalhães, 2ª T., DJe 16.03.2016; r) STJ, AgRg no RMS 37.831/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 29.03.2016; s) STJ, AgRg no AREsp 675.897/CE, Relª Minª Diva Malerbi (Desª Conv. do TRF da 3ª Região), 2ª T., DJe 28.03.2016; e t) STJ, RMS 39.644/DF, Rel. Min. Gurgel de Faria, 1ª T., DJe 12.09.2016.
É fato que alguns julgados tangenciaram o entendimento do STF: a) STJ, AgRg no RMS 43.741/PE, Rel. p/ o Acórdão Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª T., DJe 01.09.2015, sendo que a hipótese era de bombeiro no cargo há nove anos e já promovido a cabo; b) STJ, AgRg no AgRg no RMS 22.727/RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª T., DJe 03.11.2015, envolvendo nomeação irregular de servidor público por erro de “interpretação da lei e dos fatos“; c) STJ, REsp 1.172.660/DF, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª T., DJe 22.02.2016, em caso de militar que participou de curso de formação de oficiais por força de liminar, destacando a ementa que “a aplicação da teoria do fato consumado na hipótese em exame não traz qualquer prejuízo para a União e tampouco para terceiros, mas apenas consolida situação que, amparada em liminar, propiciou ao ora recorrente as respectivas promoções na carreira durante o lapso temporal de 13 (treze) anos, promoções estas decorrentes da extensa folha de serviços prestados à Administração Pública“.
Tais julgados dissonantes desconsideram (ou simplesmente ignoram) a amplitude de razões do RE 640.482 e a própria dificuldade de se justificar fato consumado como argumento decisório. O exercício de cargos públicos por longo período de tempo não gera direito a neles se manter à míngua do preenchimento dos requisitos legais. Quem assume o cargo com base em tutela provisória, sabe que a decisão pode não se confirmar ao final. Como destacou o Min. Teori Zavascki no RE 608.482: “Ninguém pode ter confiança na definitividade de uma medida cautelar“.
Num julgado, estabeleceu-se um distinguishing aparente, é verdade, mas relevante para a nossa abordagem: STJ, REsp 1.086.075/MG, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, 6ª T., DJe 22.06.2016. Nele, calcando-se na razoabilidade e proporcionalidade, definiu a Turma que “o recorrente fora eliminado do concurso por força de exigência editalícia sem respaldo no ordenamento jurídico (inexistência de tatuagem como requisito de aptidão física)”. Ou seja, o óbice fático afastado pela decisão provisória, de fato, não encontraria óbice constitucional ou legal. E talvez seja essa a pista que permitirá a solução desse recorrente jurisprudencial.
V – Fato Consumado à Luz do Direito Material e do Direito Processual
Embora ousada, não é de toda descabida uma proposta de teoria do fato consumado. Calha resgatar sábias palavras a respeito do conteúdo de uma teoria:
“Teoria é um corpo de conceitos sistematizados que nos permite conhecer um dado domínio da realidade. A teoria não nos dá um conhecimento direto e imediato de uma realidade concreta, mas nos proporciona os meios (os conceitos) que nos permitem conhecê-la. E os meios ou instrumentos que nos permitem conhecer um dado domínio da realidade são justamente os conceitos que, sistematizados, forma a teoria. Daí a definição de teoria como um corpo de conceitos sistematizados que nos permite conhecer um dado domínio da realidade.” (ROCHA, 1996, p. 17)
Semanticamente, importa registrar que, consoante anota o Aurélio (2004), fato pode ter os seguintes significados: 1. Coisa ou ação feita; sucesso, caso, acontecimento, feito; 2. Aquilo que realmente existe, que é real; 3. Filos. V. fenômeno. O dicionário ainda define fato jurídico como “acontecimento de que decorrem efeitos jurídicos, independentemente da vontade humana (por oposição a ato)“. Consumado, por sua vez, importa, segundo a mesma fonte, em “acabado, perfeito“. O conteúdo semântico de fato respeita a algo ocorrido, acontecido, feito, tanto quanto consumado refere-se a perfeito, acabado, donde temos em fato consumado uma construção redundante, a repetir que algo aconteceu. O mesmo raciocínio aplica-se à outra construção linguística useira: situação de fato consolidada. De toda maneira, sendo expressão de uso corriqueiro e feita essa breve explanação, suficiente valermo-nos do que já vulgarizado, posto que mudar muito mais confundiria que ajudaria.
Firmado isso, impende destacar duas premissas simples. Os fatos da vida existem e podem ou não ter relevância jurídica. O decurso do tempo, como um fato (temporal), é algo que o direito pode ou não levar em consideração para atribuir determinado efeito de direito. Como bem lecionou Ráo (1999, p. 24), em obra clássica, os fatos, voluntários ou não, que produzam efeitos jurídicos, tornam-se fatos jurídicos. Bem assim, embora com uma linha um tanto diversa, Carnelutti (1999, p. 313). Se o direito não conferir alguma juridicidade a determinado acontecimento, será um fato, mas não um fato jurídico. Ou seja, não haverá consequência jurídica pelo decurso do tempo, a não ser que alguma norma a tanto prescreva. Assim, o decurso do tempo acarreta, por exemplo, o reconhecimento de consequências jurídicas como a prescrição (art. 189 do CC; art. 173 do CTN), a decadência (art. 210 do CC; art. 174 do CTN), a posse (art. 1.196 do CC), a usucapião (art. 1.238 do CC), dentre outros. Igualmente no direito administrativo (como em qualquer outro ramo do direito), que prevê o prazo quinquenal para invalidação do ato administrativo (art. 54 da Lei nº 9.874/99).
Porém, e essa é a segunda premissa, é sempre a lei e somente a lei a quem compete conferir ao tempo essa ou aquela consequência jurídica. Isso porque nem é viável e nem aconselhável que a lei regule todos os fatos, seja porque impossível leis regerem todos os fatos existentes (inclusive em suas interrelações), seja porque muitos fatos não geram necessidade de regulação jurídica.
Já aqui chegamos num ponto interessante. O tempo de tramitação média de um processo no Brasil da inicial até a sentença (sem contar a tramitação em graus recursais) é de 1,5 ano (CNJ, 2016, p. 69-72). Considerando-se a tramitação em sede de recursos ordinários e extraordinários (basta ver-se a habitualidade do julgamento dessas causas no STF e STJ), é bem razoável dizer que o tempo do processo, por si só, é superior, por exemplo, ao tempo necessário para: a) cursar-se uma disciplina ou concluir-se uma graduação; b) concluir-se um concurso público; c) permitir-se o exercício de um tempo de serviço público considerável; d) o exercício de várias profissões, com riscos inerentes (médicos, engenheiros, advogados), tudo sem atendimento aos requisitos normativos próprios. Daí já se advertiu:
“Logo, ao preservarem certa situação em virtude do fato consumado, os tribunais autorizam pessoas a praticar atos jurídicos em sentido amplo, sem um de seus pressupostos de validade: o objeto lícito.
O fato consumado é a denominação eufemística de ato jurídico ilícito, cuja prática foi autorizada por sentença consciente desse vício.” (FERREIRA, 2002, p. 90)
Lado outro, norma adverte, no campo obrigacional, no sentido de que, não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos e honorários de advogado (art. 389 do CC). Em sede de contratos, já se refere a doutrina clássica à forma de resolução. Assim que, por “disposição legal, há, em todo contrato bilateral, implicitamente, uma cláusula resolutiva, pela qual a inexecução de uma parte autoriza a outra a pedir a resolução” (GOMES, 1995, p. 172). Trata-se da cláusula resolutiva tácita, expressa no Código Civil (CC) atual pelo art. 474 (“a cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação judicial“).
A nota da responsabilização é também extracontratual por qualquer ato tido por ilícito, como preceitua o art. 186 (“aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito“) e, especialmente, o art. 927 do CC. Este comina a obrigação de reparação do ilícito ao autor que causá-lo, estabelecendo seu parágrafo único que essa reparação dar-se-á independentemente de culpa nos casos especificados em lei, ou quando a atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Assim, à luz do direito positivado e da própria vivência em sociedade, há uma regulação geral de direitos e deveres, transposta para um campo peculiar intersubjetivo na seguinte formulação propositiva básica de vivência em sociedade: para deveres descumpridos há correlatas consequências jurídicas.
Essa noção de reparabilidade é esvaziada quando se trata de pretensões não propriamente (ou apenas reflexamente) patrimoniais, como os direitos mais nobremente assegurados pela CF (e.g.: saúde e educação, principalmente), como veremos melhor a seguir. Em princípio, não se tem por resolvida uma prestação de saúde adiantada com reparação simples ao status quo ante, ao menos não no limite de se desfazer uma cirurgia. Também não se ignora o tempo de estudo cursado em uma graduação, que pode, por exemplo, ser reconhecido por uma instituição educacional distinta (particular, habitualmente), conquanto não se preste junto à instituição educacional pública, por exemplo. Contudo, a impossibilidade de reversão do estado fático não à razão legal daquele que foi beneficiado por uma tutela provisória não confirmada no mérito.
Tal premissa geral do direito civil está reproduzida no CPC, cujo regime geral, no que aqui importa, é o de que: a) as tutelas provisórias conservam sua eficácia na pendência do processo, mas podem, a qualquer tempo, ser revogadas ou modificadas (art. 296, caput); b) a efetivação da tutela provisória observará as normas referentes ao cumprimento provisório da sentença, no que couber (parágrafo único do art. 297); c) independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se a sentença lhe for desfavorável (art. 302, I); d) o cumprimento provisório corre por iniciativa e responsabilidade do exequente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido (art. 520, I); e) o cumprimento provisório fica sem efeito, sobrevindo decisão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos (art. 520, II).
A nota característica da provisoriedade das tutelas de urgência (cautelar ou antecipada) ou de evidência (provisória tanto quanto as de urgência), ciente desde logo a parte que por elas venha a ser beneficiada pela clareza do texto legal, afasta duas das condições exigidas para incidência da proteção da confiança. A primeira delas, a base da confiança (Existenz einer Vertrauensgrundlage), é o
“(…) comportamento, omissão ou ato normativo estatal (lei, decreto, portaria, decisão judicial, práticas da Administração, etc.) que origina a confiança. É o que vai servir para introduzir a confiança na mente dos particulares.” (ARAÚJO, 2009, p. 83)
A tutela provisória contra a qual se insurgiu a parte adversa estatal, direta (via recurso ou contestação ou pedido de revogação ou de reconsideração, etc.) ou indiretamente (defendendo a legitimidade da sua postura administrativa, afastada pela tutela provisória, até final julgamento) de forma muito clara repele a base da confiança.
Não só isso, outra condição para a incidência da proteção da confiança é a existência da confiança no plano subjetivo (Vorliegen von Vertrauen), sendo necessários indícios “de que o indivíduo confiou na continuidade do ato estatal, depositou racionalmente suas esperanças na sua manutenção” (ARAÚJO, 2009, p. 89). Sob esse pórtico, sabedora desde logo a parte beneficiada que é provisória a situação a qual passará a usufruir, não tocará invocar a confiança subjetivamente configurada. As outras duas condições para a proteção da confiança não se mostram aplicáveis ao fato consumado, a saber, o exercício da confiança através de atos concretos (Vertrauensbetätigung), ou seja, a demonstração de o titular haver realizado atos concretos capazes de demonstrar a confiança depositada no Estado (ARAÚJO, 2009, p. 95), e um atuar de acordo com o comportamento estatal que frustre a confiança, dividido em uma conduta estatal desviante daquela que fez surgir uma expectativa legítima e que concomitantemente seja desfavorável para o particular (ARAÚJO, 2009, p. 103). Sobre o regime de cumprimento provisório da sentença e especialmente a responsabilidade pela reversão da decisão:
“O art. 297 não promove mudanças substanciais na sistemática vigente no CPC/73. Tal qual previam os arts. 273, § 3º, e 461, § 5º, ambos do CPC revogado, para a efetivação da tutela antecipada admite-se a atipicidade dos meios executivos, podendo o juiz determinar as medidas que entender adequadas para tal desiderato, assim como se aplicam as regras da execução (ou cumprimento) provisória, inclusive no que tange às garantias necessárias e à responsabilidade na hipótese de reversão da decisão.” (AMARAL, 2015, p. 396)
Acerca da aplicação às decisões interlocutórias do regime de cumprimento provisório das sentenças:
“‘Cumprimento provisório de sentença’ é expressão que deve ser entendida como a possibilidade de os efeitos da decisão jurisdicional (de qualquer decisão, não necessariamente de sentenças, o que vem confirmado pelo art. 297, parágrafo único, ao determinar a observância desta disciplina para efetivação das decisões concessivas de ‘tutela provisória’) serem sentidos a despeito de haver recurso contra ela pendente.” (WAMBIER et al., 2015, p. 1.340)
O que merece maior destaque, porém, é a responsabilização objetiva quando a decisão definitiva for desfavorável ao beneficiário da tutela provisória. A noção de responsabilidade objetiva quanto à sentença desfavorável em tutela cautelar, existente à luz do CPC revogado, restou ampliada no CPC atual, pelo inciso I do art. 302:
“O CPC já previa a responsabilidade objetiva de reparação por eventual dano causado por força do cumprimento da medida em relação ao processo cautelar (art. 811). O novo Código ampliou a incidência da responsabilidade para a tutela de urgência, daí contemplando a tutela antecipada e cautelar.” (ALVIM et al., 2016, p. 391)
É dizer, de lege lata, há um tratamento claro e específico no direito positivo acerca da revogação da tutela provisória e seus efeitos, essencialmente: I) restituição ao status quo ante; II) responsabilidade objetiva no caso de improcedência do pedido, inclusive quanto ao dano processual; III) resolução em perdas e danos, sempre e de toda forma (o reflexo, no processo, da norma de direito material do art. 389 do CC).
Já aqui temos claro que os direitos processual e civil geral preveem a responsabilização da parte que, no processo, ensejar, independente de culpa, lesão ao patrimônio em detrimento de quem foi concedida a tutela provisória, pouco importante o tempo pelo qual perdurou a medida provisoriamente concedida. Assim, quem se beneficiar de uma tutela provisória de obrigação de pagar, independentemente de culpa, há de responder perante o réu por todo o dano (material e até mesmo moral) no caso de improcedência da ação. Dito de forma mais clara: o longo tempo de vigência de uma tutela provisória não torna lícito o direito buscado no mérito.
Não afronta isso a adequada previsão de consideração, pelo julgador, das alterações de fato e de direito que se derem no curso da lide. Demanda-se que se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão (art. 493, caput, do CPC). Será o caso, inclusive, de ouvir as partes antes da decisão se constatar fato novo de ofício (parágrafo único do art. 493 do CPC). A propósito:
“A sentença deve solucionar o conflito submetido ao crivo judicial como se o fizesse no momento da propositura da demanda, justamente porque se deve impedir que a demora do processo causa dano para aquele que tem razão. É comum, todavia, surgirem, durante o curso do procedimento, fatos supervenientes que interfiram ou alterem o quadro que existia quando intentada a demanda. Por essa razão, cabe ao juiz considerar, ao proferir sua sentença, os fatos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito do autor que venham a surgir ao longo do procedimento.” (ALVIM et al., 2016, p. 1.242-1.243, sendo nosso o destaque)
Preservada a incidência da irretroatividade da norma jurídica, agasalhada no nosso direito pelos princípios constitucionais de respeito ao ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada (art. 5º da CF), havendo mudança na situação fática que possa influir no julgamento do mérito, toca ao magistrado levar em conta. O mero decurso do tempo, porém, é fato inerente ao processo, não se lhe podendo invocar como elemento supridor ou confortador do direito material da parte autora em discussão. Quem é beneficiado por tutela provisória sabe que provisória ela é e tal fato, ex lege e desde o ajuizamento, é induvidosamente conhecido. Fatos impeditivos não autorizam conclusão favorável com base em tutela provisória, o que se dá desde o nascedouro do processo:
“No dispositivo, não há referência a fato impeditivo, porque não se concebe um fato impeditivo que seja superveniente. Os fatos impeditivos são sempre anteriores ou contemporâneos à constituição do direito subjetivo. Este – o direito subjetivo – surge com o fato constitutivo. Se há um fato impeditivo, este impede que o fato constitutivo produza seus efeitos, não tendo surgido o direito. Como o próprio nome já indica, o fato impeditivo impede que se constitua o direito, não permitindo que o fato constitutivo produza efeitos jurídicos.” (ALVIM et al., 2016, p. 1.244, sendo nosso o destaque)
Aqui resgatamos um julgado já referido que parece dar a linha mestra na solução do problema. Ele não se distingue, embora a tanto tenha referido, mas complementa, a nosso ver, a decisão proferida no RE 608.482. Trata-se do REsp 1.086.075/MG, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, DJe 22.06.2016. A conclusão primeira e albergada pelo STF é: não se consolida um direito pela simples concessão de tutela provisória que se lhe reconheça. Ao buscar o que seria o distinguishing (o óbice, no caso concreto, para o avanço de candidato em concurso público era cláusula inconstitucional, a saber, a inexistência de tatuagem como requisito de aptidão física), na verdade findou o STJ por esclarecer: o direito material em discussão é quem realmente deve ser levado em conta. E já observa Ferreira (2002, p. 42) que “grande quantidade de causas nas quais o fato consumado é expressamente invocado, mas em verdade não passa de mero argumento de reforço da tese jurídica preponderante do acórdão“. A essa altura, de se perguntar: como ficarão as situações processuais criadas via tutela provisória sem reconhecimento quanto ao fundo material? Apresentamos uma resposta mais adiante.
VI – Elementos para uma Teoria do Fato Consumado
Nada obstante a tibieza metodológica e jurídica do assim denominado fato consumado, não se lhe pode negar, simplesmente, existência. Ele é fato jurisprudencialmente atribuído como jurídico, ainda que sem um embasamento científico bastante, como tem demonstrado inúmeros julgados ao longo de décadas, a título de fundamento decisório. Embora não devesse ter, quando reconhecido como argumento decisório, ainda que indevidamente, ele passa a ter efeitos jurídicos. Se assim o é, deve ser tratado e estudado, até mesmo para que não se perpetue sua aplicabilidade.
Aqui já é momento de conceituar. Podemos definir o fato consumado como aquela situação criada por uma tutela provisória que, nada obstante essa característica, é levada em conta pelo julgador, isoladamente ou não, como fundamentação por ocasião do julgamento definitivo.
Como primeira premissa hermenêutica, importa destacar essencialmente que o só decurso de tempo não confere qualquer razão ao autor beneficiado por ocasião do julgamento definitivo.
Decorrência da anterior, a segunda premissa é a de que fato consumado não é argumento decisório bastante para juízo de procedência ou mesmo confirmação dos efeitos da liminar.
Terceira premissa é a de que o fato consumado não se presta a argumento decisório válido a ser considerado mesmo que conjugado com o argumento de mérito propriamente dito. O relevante, no caso, é e sempre será a suficiência do argumento de mérito como fator bastante ao juízo de procedência, independente da consideração de fato consumado que, como visto, não se encaixa em válida categoria de julgamento.
Quarta premissa é a de que, improcedente o pedido, automaticamente restará revogada a tutela provisória, devendo seus efeitos serem revertidos e, essencialmente: I) restituída a situação fática ao status quo ante; II) sem prejuízo do item anterior, responsabilizado o beneficiário objetivamente; e III) resolução em perdas e danos, sempre e de toda forma (o reflexo, no processo, da norma de direito material do art. 389 do CC).
Evidente que existirão situações-limite nas quais não será possível e talvez nem mesmo seja o caso de indenização, como no caso de prestação de direito fundamental pelo próprio responsável que, de outro modo, haveria de prestá-lo. O exemplo mais emblemático é o de procedimento cirúrgico prestado pelo próprio ente federativo, por ordem emitida em tutela provisória, quando o julgamento definitivo seja de improcedência. Ausente o direito material, por qualquer razão que seja, o julgamento sempre deverá ser de improcedência. Inviabilizada a reversibilidade, a situação deverá ser resolvida à luz da responsabilização objetiva se houver danos a serem apurados. Imagine-se a situação em que se pede tutela provisória para cirurgia por suposta ausência de prestação do serviço público de saúde a tempo e modo que, ao fim do processo, verificou-se injustificada. O eventual prejuízo estatal pela prestação antecipada, com quadro de saúde e gastos com energia e horas extras, por exemplo, podem ensejar ressarcimento.
Fora dessa hipótese e alguma outra a tanto assemelhada, não há falar em irreversibilidade. A inscrição em nível acadêmico para o qual não preenchidas todas as condições, a colação de grau sem curso de todas as etapas da legislação educacional, a assunção de cargo público sem as condições constitucionais e legais, como de resto todas as demais, são reversíveis ou ao menos passíveis de ressarcimento.
VII – Conclusão
Razoável duração do processo e celeridade são princípios constitucionais que têm por escopo assegurar uma decisão justa, e não um resultado injusto.
O só decurso de tempo não confere qualquer razão ao autor beneficiado por ocasião do julgamento definitivo. Dito de forma mais clara, o transcurso do tempo processual não enseja legitimação do direito material discutido para aquele beneficiado pela tutela provisória.
O fato consumado não tem efeitos jurídicos derivados de lei, embora, conquanto inadequadamente isso ocorra em situações circunstanciais, possa ter consequências jurídicas oriundas do reconhecimento judicial no caso concreto.
O fato consumado não pode ser utilizado como argumento jurídico válido, ainda que conjuntamente com outro argumento de reconhecida juridicidade, para decidir casos concretos.
O fato consumado não encontra qualquer agasalho no direito material ou no direito processual.
A decisão que aplique o fato consumado, tanto mais após o caso líder do STF (RE 608.482), constitui-se em desconsideração da teoria dos precedentes, criando injustificada situação para o litigante calcada em ilegalidade, desigualdade, subversão da ordem jurídica e do ideário de Estado Democrático de Direito.
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[1] Também se registra a expressão consummated fact no direito norte-americano, equivalente a fait accompli no direito francês. Já no século XIX, fez-se menção à expressão por ocasião da Questão Mexicana, quando o Estado do Texas era alvo de disputa entre os Estados Unidos e o México. Consignou-se: “Either, the Independence of Texas may be a simple consummated fact – un fail accompli – respecting which it would be immaterial wheter a just moral right lay a its origin or not” (The United States Magazine, and Democratic Review, p. 423).
[2] Originalmente, uma disciplina matemática era um agregado de sentenças que diziam respeito a uma certa classe de objetos ou de fenômenos; eram formuladas por meio de um certo estoque de termos, e aceitas como verdadeiras. Esse agregado de sentenças carecia de qualquer ordem estrutural. Uma sentença era aceita como verdadeira ou porque parecia intuitivamente evidente ou porque fora demonstrada com base em algumas sentenças intuitivamente evidentes, ficando assim mostrado – por um argumento intuitivamente certo – ser uma consequência dessas outras sentenças. (…) Todavia, bem cedo percebeu-se que o critério de evidência intuitiva está longe de ser infalível, não possui um caráter objetivo e leva frequentemente a erros graves. Todo o desenvolvimento subsequente do método axiomático pode ser visto como uma expressão da tendência de restringir o recurso à evidência intuitiva (TARSKI, 2007, p. 223).
[3] “As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.”
[4] A ação cautelar onde concedida a liminar, registrada sob nº 0006781-72.2001.8.20.0001, aponta, segundo consta no site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (Disponível em: <http://esaj.tjrn.jus.br/cpo/pg/show.do?processo.codigo=010001KLC0000&processo.foro=1>. Acesso em: 28 nov. 2016), decisão liminar incluída no sistema em 23.05.2014.