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FAMÍLIA MONOPARENTAL COMO ENTIDADE FAMILIAR

FAMÍLIA MONOPARENTAL COMO ENTIDADE FAMILIAR

Jeferson Botelho Pereira

Cristiane Xavier Figueiredo

Eduarda Gonçalves Ramos

 

 INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira passou por inúmeras transformações ao longo dos últimos séculos.

Os padrões morais, culturais e financeiros foram os principais fatores que alteraram a dinâmica social no Brasil. A estrutura familiar também sofreu alterações consideráveis. Atualmente, os modelos de família são diversos, desconstruindo o padrão tradicional da família brasileira de estrutura biparental.

A família tradicional formada por pai, mãe e filhos, tendo a figura masculina como provedora e chefe de família, é um modelo que imperou desde o descobrimento do Brasil.

A sociedade, por muito tempo, preservou os padrões machistas, a qual era atribuída à mulher o papel de dona de casa, destinada exclusivamente aos cuidados do lar e educação dos filhos. O genitor possuía a função como chefe de família e provedor do sustento dela, responsável pela tomada de decisões.

Com a evolução das relações sociais e em razão das alterações dos padrões de relacionamento heteronormativos, a mulher vai ganhando mais espaço na sociedade, principalmente no mercado de trabalho, com autonomia em suas decisões, independência financeira, e como poder de decisão no lar. Assim, a estrutura familiar foi se reorganizando.

Diante dessas constantes transformações e ascensão do papel da mulher, tornou-se cada vez mais comum a diversificação do modelo de família, podendo ser classificadas como família anaparental, homoafetiva, monoparental, poliafetiva, ampliada, dentre outras.

Para realizar esse estudo, focar-se-á na família monoparental, estrutura composta por um dos ascendentes e a(s) prole(s). Objetiva-se acompanhar a evolução do conceito de família, descrevendo a sua formação na sociedade machista e patrimonialista, até os atuais modelos, bem como as diversas formas de surgimento dela, considerando as possibilidades de divórcio, viuvez, abandono, adoção e reconhecimento de paternidade afetiva. Também se faz necessário apresentar a vulnerabilidade da família monoparental, seja ela regida por homem ou mulher, explorando o direito da família e sua aplicação a essa organização familiar.

Nesse sentido, inicialmente aborda-se o conceito de família e suas transformações ao longo dos tempos; em seguida destacou-se a evolução do conceito de pátrio poder e as questões elencadas na decisão de guarda do menor; abordando ainda a complexidade da monoparentalidade, bem como as dificuldades enfrentadas pelas famílias monoparentais femininas e masculinas.

A metodologia utilizada para a construção desse artigo se deu-se com base na pesquisa bibliográfica de cunho descritivo, análise de artigos, livros, julgados e acervos disponibilizados via internet, tendo como principal fonte para elucidação de dúvidas, os artigos da Constituição Federal (1988) e do Código Civil (2002).

Espera-se que ao final da leitura seja possível identificar como essas famílias surgem, as dificuldades financeiras e psicológicas pelos quais os mesmos passam, e como o Estado brasileiro atua juridicamente para garantir os direitos fundamentais a essas famílias.

 

1. ASPECTOS PERFUNCTÓRIOS SOBRE FAMÍLIA

A família é a instituição mais antiga de convivência do ser humano; é nela que ocorrem as primeiras experiências de socialização do indivíduo. Ela se apresenta como um grupo estrutural que busca construir um modelo de desenvolvimento voltado para formação da identidade da prole. As constantes transformações das normas sociais, dos padrões éticos e culturais fizeram com que a estrutura definida nesse conceito fosse alterada, ao longo do tempo, frente a este vasto campo de informações limitar-se-á a tratar da família monoparental, tendo como base duas concepções de família, a saber: a psicológica e sociológica.

Na visão psicológica: “Um grupo de pessoas, vivendo em uma estrutura hierarquizada, que convive com uma proposta de uma ligação afetiva duradoura, incluindo uma relação de cuidado entre os adultos e deles para crianças e idosos que aparecem no contexto. Pode-se também entender como uma associação de pessoas que escolhe conviver por razões afetivas e assume um compromisso de cuidado mútuo e, se houver, com crianças, adolescentes e adultos” (GOMES, 1988, p,35).

Essa definição demonstra o caráter afetivo na relação familiar, envolvendo sentimentos.

Consiste em uma relação hierarquizada na qual os pais são responsáveis pelos cuidados dos seus filhos. A visão sociológica apresenta um conceito mais prático da situação, definindo família como: “Um grupo que apresenta organizações estruturadas para preencher as contingências básicas da vida biológica e social. Trata-se de uma unidade social básica, ou seja, o grupamento humano mais simples que existe, por isso a família é a instituição básica da sociedade” (DURKHEIM, 2007, p. 22).

De acordo com Engels (1891), a palavra família deriva do termo em Latim “famulus” que fazia referência a “servidores, escravos, séquito, escravo doméstico”, sendo o mesmo criado para indicar modelos organizacionais de sobrevivência que surgiram nas tribos latinas inseridos no trabalho escravo e agrícola. No entanto, esse é um conceito ocidental, que sofreu alterações ao longo do tempo, não podendo ser tomado como unânime por estar inserido em um contexto histórico e cultural. Compreendendo-se dessa forma, a ideia de família é tida como sendo algo volátil que evoluiu de acordo com os costumes sociais, mudanças religiosas, econômicas, socioculturais e avanços científicos, não sendo possível para a antropologia definir o que é uma família, quais suas variações e características (SILVA, 2009, p. 39).

De forma romantizada, atualmente, no Brasil, a família é considerada como um espaço no qual os indivíduos estão organizados socialmente para viverem e criarem seus filhos. Sendo um ambiente tido como aquele em que se deve cuidar dos filhos, garantir o afeto, educação, confiança, bem-estar, proteção e toda uma estrutura que permita ao indivíduo um desenvolvimento saudável e que ao mesmo tempo, ensine sua prole a lidar com responsabilidades e conflitos sociais.

No art.226 da Constituição Federal, o termo família aparece como sendo a base da sociedade, que tem especial tutela do Estado. Também qualificada no art.3º, parágrafo 1º, do mesmo diploma legal, é considerada como um dos fundamentos da afetividade e busca da solidariedade. Nesse sentido Diniz (2002, p.15) define: “Família é conceituada em um sentido técnico como um grupo fechado de pessoas, composto dos pais e filhos, e para efeitos limitados, de outros parentes, unidos pela convivência e afeto numa mesma economia e sob a mesma direção.”

Do ponto de vista jurídico, a família se apresenta em duas categorias: as que são criadas por vínculos sanguíneos e as formadas por vínculo afetivo. Podendo essas categorias serem formadas por cônjuges, pais e filhos, outros parentes e afins, também sendo incluídos nesses casos os lares adotivos (LÔBO, 2011).

Voltando à evolução histórica, Augusto e Tavares (2015) apontam que antigamente, os modelos de família predominantes eram o patriarcal, patrimonial e matrimonial, sendo o homem tido como chefe da família, provedor e responsável por tomar decisões importantes que moviam o grupo familiar.

No modelo de família patriarcal, à mulher foi atribuído o papel da maternidade, da feminilidade, de cuidadora do lar, obediente às vontades do cônjuge passivelmente, passível de renúncias pessoais em prol da família. A essas relações de submissão profissional, familiar e religiosa que se dá o nome de patriarcado (FREYRE, 1990).

A ideia de família patrimonial também se originada idade antiga; nela as relações familiares se davam em função dos seus patrimônios. Assim, a união das pessoas era baseada nas escolhas dos patriarcas, de cônjuges para suas filhas com intuito de aumentar ou garantir a estabilidade financeira, o patrimônio e o poder das famílias, não considerando relações afetivas. Em sua maioria, os contraentes do casamento só se conheciam por visitas rápidas ou no dia da celebração, não havendo a possibilidade de recusa ou divórcio dos cônjuges, pois o casamento tinha o objetivo de honrar e preservar

o nome da família, bem como fortalecer, ambos, economicamente (AUGUSTO; TAVARES, 2015).

A noção de família que se tem, atualmente, e suas diversas variações, sem obrigações contratuais regidas pelo matrimonio é um avanço perante as lutas por dignidade da pessoa humana, igualdade e respeito ao diferente. A família hoje é vista como sendo o meio afetivo pelas quais as pessoas se relacionam e interage, na busca da formação do indivíduo, como já citado acima.

Com essas transformações e evolução da estrutura familiar novos tipos de famílias estão presentes na sociedade e o reconhecimento jurídico das mesmas é essencial para garantir o direito à igualdade. Vários são os modelos que se têm atualmente, podendo as famílias ser constituídas por: casamento entre homem e mulher; união estável; monoparental (mãe ou pai solteiro); multiparental, composta, pluriparental ou mosaico (composta por membros provenientes de outras famílias); parental ou anaparental (todos possuem vínculo sanguíneo); eudemonista (união de indivíduos por afinidade); homoafetiva; homoparentalidade (família homoafetiva com a adoção de filhos).

 

1.1 PODER DE FAMÍLIA E A GUARDA DO MENOR

Antigamente o poder de família era conhecido como Pátrio Poder conferido ao pai, detentor total do controle da vida dos filhos, decidindo até se poderiam ser oferecidos para sacrifício, tendo como justificativa o valor moral do mesmo por sua condição de provedor das necessidades vitais familiares. Com o passar dos tempos a mãe também passou a ter o direito de tomar decisões em relações a seus filhos. Posteriormente esse direito evoluiu, contemplando também obrigações civis.

Na definição de Diniz (2007) o poder familiar:

“É um conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido em igualdade de condições, por ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do filho” (DINIZ, 2007, p. 15).

Nesse sentido, pode-se dizer que o poder de família não é constituído apenas de direito, mas também de obrigações para com o menor. O art. 1.634 do Código Civil (2002), traz que tais obrigações envolvem prover sustento, criar, educar, se responsabilizar civilmente pelos atos do menor, conceder permissão para casar, viajar, zelar por sua integridade física, emocional, moral e social, dentre diversas outras ações que garantam o desenvolvimento do menor (VENOSA, 2005). Em síntese, é um conjunto de deveres conferidos aos pais em relação à pessoa e aos bens dos filhos menores de 18 anos.

Oliveira (2005) nos diz que esse termo antes era descrito no Código Civil de 1916 como “Poder Pátrio”, sendo o pai o detentor do mesmo. A alteração para o termo “Poder de Família” veio para estabelecer que os direitos e deveres para com o menor devem ser exercidos por pai e mãe, conforme a Lei nº 12.010, acompanhando a Constituição Federal em seu artigo 226: “os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher“. O Estatuto da Criança e do Adolescente corrobora com a Constituição no sentido de deveres iguais para ambos os pais, destacando que:

Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência (BRASIL, 1990, art.21).

Nesse mesmo sentido, o ECA defende a obrigatoriedade da proteção da criança e adolescente como sendo função do Estado, sociedade e família como expresso em seu art. 4º:

“Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.

Com os documentos expostos evidencia-se que o poder de familiar, está legalmente amparado nos dispositivos citados, que garantem os direitos fundamentais essenciais à pessoa em estado de desenvolvimento, sendo eles aplicados à criança e ao adolescente.

Cabe ainda observar que conforme apresentado no art. 1.630, do Código Civil (2002), o Poder de Família é um direito\dever irrenunciável, indisponível e imprescritível, cessando apenas quando o menor alcança a maioridade, casos de nomeação de um tutor, transferência de guarda, emancipação do menor ou quando evidenciado pelas autoridades que os progenitores não têm condições de exercer suas funções como detentores da guarda do menor. Não estão inseridos nas exceções citadas, os casos de dissolução de matrimônio ou entidades familiares não oficializadas, pois eles não cessam os deveres dos pais para com seus filhos.

Em relação à guarda, o Poder de Família pressupõe que os progenitores possuem a guarda do menor. No entanto, como expresso no art. 1.632 do Código Civil (2002), mesmo quando um dos progenitores não detém a guarda, ele continua a exercer o poder de família. Um dos exemplos dessas situações é quando ocorre divórcio entre um casal, ambos permanecem com o poder de família, mas a guarda pode ser unilateral.

Mesmo quando um dos pais estabelece novo matrimônio ou união estável, o poder de família para com os filhos de relacionamento anterior ainda é exercido pela parte contraente. Dito isto, evidencia-se que o poder de família não provém da relação entre os genitores, mas sim do parentesco com o menor (BRASIL, 2002, art. 1.636).

Ainda sobre o exercício do poder de família, o art. 1.631 do Código Civil (2002) deixa claro que ele compete aos dois genitores, sendo exercido exclusivamente por ambos, podendo ser unilateral, apenas quando uma das partes estiver impedida ou falecer. Nos casos em que a paternidade do menor não é reconhecida, essa responsabilidade fica com a mãe e quando ela também não é conhecida ou incapaz de exercer essa função, o poder é destinado a um tutor (BRASIL, 2002, art. 1.633).

No que diz respeito a suspensão ou extinção do poder de família, o art. 1.635 do Código Civil (2002) apresenta as previsões legais: Extingue-se o poder familiar: I – pela morte dos pais ou do filho; II – pela emancipação, nos termos do art. 5o, parágrafo único III – pela maioridade; IV – pela adoção; V – por decisão judicial, na forma do artigo 1.638 (BRASIL, 2002).

Em relação a perda do poder de família, como descrito no art. 1.637, o juiz, quando informado, pelo Ministério Público ou parente, de atos abusivos ou falta dos genitores para com os deveres inerentes ao exercício de sua função para com o menor pode suspender o mesmo, visando a segurança do menor.

Complementar ao art. 1.637, o art. 1.638 traz em seu conteúdo que perderá o poder de família, por ato judicial, o genitor que praticar atos que afetem a integridade física e moral, além de transgressões familiares com a natureza de estupro, homicídio, feminicídio e lesão corporal contra outrem, igualmente titular do poder de família ou contra o próprio menor. Nesses casos de destituição por ordem judicial, em que o menor for inserido em família substituta, ela terá a guarda, mas não o poder de família.

 

1.2 FAMÍLIA MONOPARENTAL E O DIREITO

A organização familiar como descrito é uma instituição que foi sendo moldada ao longo dos tempos em função da cultura, condições econômicas, morais e históricas da sociedade. O Direito de Família surgiu, posteriormente com o intuito de normatizar, no âmbito jurídico, as diversas formas de convivência em pares ou em grupos informais presente na sociedade.

A família como fato cultural, está antes do Direito e nas entrelinhas do sistema jurídico. Mais que fotos nas paredes, quadros de sentido, possibilidades de convivência. Na cultura, na história, prévia a códigos e posteriores a emoldurações. No universo jurídico, trata-se mais de um modelo de família e de seus direitos. Vê-la tão só na percepção jurídica do Direito de Família é olhar menos que a ponta de um “iceberg”. Antecede, sucede e transcende o jurídico, a família como fato e fenômeno (FACHIN. 1999, p. 14).

O modelo de convivência familiar foi sendo alterado ao longo dos tempos, sob a influência das transformações culturais que abarcam novas formas de relacionamento fora dos padrões heteronormativos, bem como por alterações estruturais como função da mulher no mundo do trabalho.

Frente às transformações sociais e demandas por novas regras jurídicas para as demais formas de convivência, a Constituição Federal de 1998, passou a contemplar a união estável como entidade familiar, bem como a organização formada por um dos pais e seus

descendentes, como descrito no artigo 224, parágrafo 4º, reconhecendo as famílias monoparentais (DIAS, 2007).

A Constituição Federal ao alargar o conceito de família, elencou como entidade familiar uma realidade que não mais podia deixar de ser arrostada (CF 226. 4.º): a comunidade formada por qualquer um dos pais e seus descendentes. Esses núcleos familiares passam a ser nominados de famílias monoparentais, para ressaltar a presença de um somente dos pais na titularidade do vínculo familiar. A expressão pertinente, pois não se pode negar caráter familiar à união de afeto que caracteriza as entidades com somente uma parentalidade (DIAS, 2007, p. 193).

A denominação “família monoparental” surgiu na França e, atualmente, é aceita em todo o mundo ocidental. Essa condição surge frente a diversos fatores, que geralmente são alheios à vontade dos indivíduos, tais como óbito de um dos genitores, divórcio, produção independente, incapacidade de um dos genitores de cuidar da prole, dentre diversos outros fatores que afetam a capacidade de convivência mútua (VIANA, 1998).

A Constituição Federal de 1988 trouxe ao seio da sociedade a organização familiar monoparental no âmbito jurídico, no entanto, ela já existia de um tempo que não é possível precisar. Muitos são os casos de viúvas e mulheres abandonadas por seus maridos, mães solteiras e filhos com paternidade não reconhecida que continuaram a reger a família sozinha.

Outro fator que contribuiu para esse tipo de organização familiar foi a Lei do Divórcio de 1977, “como a maioria dos casais desunidos tem filhos, os lares dirigidos por um só genitor sofreram um aumento considerável e uma intensa visibilidade.” (DANDURAND apud LEITE, 1997, p.725). Fator que contribuiu para a alteração da realidade brasileira e desencadeou a necessidade de reconhecimento das famílias monoparentais na Constituição de 1988.

Independente dos motivos que levaram a formação das famílias monoparentais, é evidente que elas aumentaram consideravelmente. E mesmo estando expressa na Constituição, não há no Direito Civil e Direito Social, diplomas normativos que garantam sua tutela. Não fica claro se o Estado abarcou por completo essa nova estrutura familiar, necessitando de transparência e definição para essa situação, já que a legislação aplicável é a mesma que na composição familiar tradicional.

A família monoparental não é dotada de estatuto jurídico próprio, com direitos e deveres específicos, diferentemente do casamento e da união estável. As regras de direito de família que lhe são aplicáveis, enquanto composição singular de um dos pais e seus filhos são as atinentes as relações de parentesco, principalmente da filiação e do exercício do poder familiar, que neste ponto são comuns as das demais entidades familiares. Incidem-lhe sem distinção e discriminação as mesmas normas de direito de famílias nas relações reciprocas entre pais e filhos, aplicáveis ao casamento e a união estável, considerando o fato de integrá-los apenas um dos pais (LÔBO, 2011, p.89).

Compreende-se que todas as legislações aplicadas às famílias que vivem em regime matrimonial são estendidas às famílias monoparentais, mudando apenas a origem da mesma.

A ideia de que a família biparental tradicional é a melhor para a criança está sendo desfeita, pois atualmente, o que se analisa é a capacidade de prover alimentos, educação, saúde e principalmente amor, afeto e estabilidade emocional para os filhos, independente de estas relações serem regidas por laços consanguíneos ou por adoção. De acordo com Baptista (2010), o essencial é a dedicação destinada ao filho e não a origem da família.

A família Monoparental é formada por um dos pais e seus descendentes, e pode surgir tanto da dissolução de uma entidade familiar biparental com filhos, como de uma pessoa “celibata”, ou seja, inicialmente sem filhos, que passa a ter filhos e viver com eles sem a presença do outro genitor. No primeiro caso, a família Monoparental ocorrerá pela falta ou saída de um dos genitores da relação de convívio familiar permanente, o que se dá pela morte de um dos pais (viuvez), pela separação de fato, separação judicial ou extrajudicial, pelo divórcio ou pela dissolução de união estável. A segunda categoria é formada pela agregação de um ou mais filhos naturais ou civis a pessoa solteira, viúva, separada, divorciada ou saída de união estável, o que pode ocorrer com o reconhecimento unilateral de filiação, pelo nascimento voluntário (programado) ou não voluntário (não programado) oriundo de relação sexual ou de inseminação artificial heteróloga que é com o sêmen de um terceiro, com o consentimento do ex-marido ou ex-companheiro, ou pela adoção (BAPTISTA, 2010, p.88).

Para regular as questões referentes à responsabilidade e direitos em relação aos filhos, o Código Civil de 2002 trouxe novo parecer para as questões envolvendo a guarda, ficando determinado que a guarda dos filhos deve ser decidida com base em quem têm melhores condições de exercê-la. Com a evolução da legislação, em 2008, um novo projeto de Lei foi aprovado, garantindo o direito da guarda compartilhada, com o entendimento que a convivência com o pai e a mãe pode ser benéfica quando acontece de maneira harmoniosa e com vistas ao bem-estar do menor.

Como já descrito, essas famílias podem ser formadas por pai ou mãe e seus descendentes. No entanto, mesmo não apresentando dados estatísticos, em sua grande maioria, sabe-se que elas têm como o chefe a figura materna. A sociedade imputa à mulher o deve de cuidar dos filhos, colocando-a como a possuidora de caráter inato para a criação dos filhos.

No que diz respeito ao surgimento das famílias monoparentais, a Constituição Federal reconheceu como família, as organizações formadas por um dos pais e seus descendentes. Este novo modelo é fruto de transformações históricas e culturais pelas quais a sociedade passou. Pode-se dizer que ele decorre de atos involuntários ou por vontade própria do genitor. Para melhor entender essas situações far-se-á apontamentos sobre os casos mais comuns que geram a família monoparental, tais como divórcio, celibato, união livre, mães solteiras, viuvez e outros fatores.

O divórcio foi regulamentado pela lei nº 6.515/77 visando atender a demanda das novas relações sociais que estavam se instaurando no Brasil. De acordo com o IBGE, em 2011 foram registrados no Brasil 351.153 divórcios (SILVA, 2016).

Nesses casos, existe a possibilidade de guarda compartilhada ou unilateral, ficando a cargo do casal e da justiça decidir quais as melhores condições para o menor. Essa condição não desabona os pais de seus deveres e direitos, como expresso no art. 1.579 do Código Civil. Observa-se que nessas situações mesmo quando o divorciado contrai novo matrimônio ou união estável esse novo vínculo afetivo não tira o caráter de entidade monoparental (SILVA, 2016).

O celibato não está expresso na legislação. Ele é uma nova forma de vida advinda da “revolução sexual”, na qual os genitores optam por não estabelecerem relações que exigem estabilidade, fidelidade, comprometimento, ou seja, baseada na individualidade do indivíduo. Desse modelo de relacionamento, sem compromisso, nascem filhos que são criados com a ausência dos pais (SANTOS; SANTOS, 2008).

A união livre adveio da revolução sexual da década de 60, esses relacionamentos também são caracterizados pela ausência de compromisso formal, em que os indivíduos vivem juntos, como em uma experiência preliminar para o casamento. O casamento só ocorria em casos de gravidez. O ponto central dessa condição era que caso fosse da vontade de um dos parceiros, a união era encerrada sem burocracias, porém essa modalidade acabou gerando excessivos nascimentos de filhos ilegítimos durante a década de 80.  Buscando sanar a questão de filhos ilegítimos, foi criada a Lei nº 9.278/96, reconhecendo como organização familiar à convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição familiar, estabelecendo direitos e deveres similares aos do casamento em caso de dissolução (LEITE, 2003).

As mães solteiras são uma realidade no Brasil que sofrem muita discriminação e preconceito. Anteriormente à Constituinte de 1988, não havia uma legislação que reconhecia o direito do filho a ter sua paternidade reconhecida. Com as alterações advindas, os filhos que nasceram de relacionamento extraoficial ou de relações casuais tiveram amparo na lei para que sua paternidade fosse reconhecida, bem como para solicitar pensão de alimentos. Essa situação é muito comum, e pode ser descrita em quatro modalidades, a saber:

As “maternidades impostas”, quando se trata de mães solteiras que não quiseram nem ter, nem conservar seu filho, mas que a perda dos prazos legais, autorizando a interrupção voluntária da gravidez, compele a assumir sua gravidez (mas não forçosamente sua maternidade: algumas mães abandonam a criança). Esta categoria tende a diminuir bastante; As “maternidades involuntárias”, na medida em que, embora não desejando a gravidez, certas mães solteiras decidem assumi-la e, portanto, educam seu filho sozinho; As “maternidades voluntárias”, quando se trata de solteiras que decidiram conceber e educar sozinhas seu filho; e As “maternidades de coabitantes”, situação particular na qual a mãe solteira decide com seu coabitante ter um filho (ABREU, 2015, p 4-5.)

Outro fator gerador da monoparentalidade é a viuvez; este é um fato involuntário. Ele se apresenta como a causa geradora mais antiga da monoparentalidade, pois mesmo em sociedades machistas e sexistas, esse não é um fato reprimível. Como essa família nasce automaticamente, um dos genitores fica com a responsabilidade unilateral da criação dos filhos.

Por fim, a monoparentalidade gerada pela adoção é uma realidade recente, pois quando incluída no Código Civil de 1916, contemplava as situações nas quais o ordenamento jurídico estabelecia normas para que uma família formada por um homem e uma mulher casados pudessem trazer ao seio familiar, atendendo a todos os requisitos, uma criança ou adolescente não gerado biologicamente para ser reconhecido como filho, sendo este ato de caráter irrevogável e irretratável. A adoção por pessoas solteiras só foi possível em 1990, através da Lei Federal nº 8.069, descrita no artigo 20 do Estatuto da Criança e do Adolescente, com a ressalva de que o adotante tivesse as mesmas responsabilidades e direitos para com filhos biológicos ou adotados (HORTA; PINTO, 2017).

 

1.3 FAMÍLIA MONOPARENTAL E SUA COMPLEXIDADE

As dificuldades e complexidades das famílias monoparentais são semelhantes às de grupos minoritários, principalmente no que diz respeito às dificuldades econômicas, tendo em vista que o núcleo familiar responsável por prover recursos financeiros é limitado a uma única pessoa. Em consequência, essas famílias encontram-se em maiores dificuldades econômicas que o restante da população (LEITE, 2003).

No seio da família biparental, embora ainda existam resquícios do patriarcado, o papel da mulher foi sendo modificado e, atualmente, ela vai ganhando espaços no mercado de trabalho e assim como o marido, ambos os genitores são provedores de recursos financeiros, dividindo com seus parceiros as responsabilidades (SILVA, 2016).

Em relação à responsabilidade econômico-financeira, a resposta mais acertada é que o menor tem direito à pensão alimentícia. No entanto, a mesma, na maioria dos casos não é suficiente para complementar a renda do progenitor responsável pelo menor, ou por vezes o progenitor que deixou a relação contribui de forma minoritária a que contribuía quando havia algum tipo de relação afetiva com o outro, causando abalados financeiros na estrutura dessa família e nas condições de vida do filho. Considera-se, ainda, que em alguns casos é necessário que a pensão seja solicitada judicialmente e progenitor que não está envolvido na criação do filho conduza a ação para pagar o menor valor possível.

Leite (2003) aponta a instabilidade financeira da família monoparental em razão do abandono do outro responsável e questiona como se essa condição impacta na vida da família. “Enquanto o grupo familiar coeso encontra meios de se manter em relativa estabilidade financeira, a monoparentalidade condena seus atores (regra geral) à precariedade que atinge tanto os pais (com maior ou menor intensidade) quanto os filhos (LEITE, 2003, p.293)”.

A diferença apontada por Leite (2003) diz respeito a estabilidade financeira alcançada por um casal que vive em matrimônio ou união estável, em que ambos trabalham para prover o sustento da casa, gerando maior estabilidade financeira e na maior dificuldade que o provedor da família monoparental tem para alcançar a mesma estabilidade.

Outro fator complexo inerente à família monoparental são as dificuldades relacionadas à educação, saúde física e emocional do filho menor. A pessoa que fica responsável para com o filho, além das responsabilidades financeiras, fica com as tarefas de casa sozinho, com ir à escola, em reuniões, a médico, dentre outras atividades que seriam divididas entre ambas os genitores. Em muitos casos, o progenitor chefe de família fica dividido entre o trabalho fora de casa que o remunera, tendo em vista que sua carga horária precisa ser maior para compensar a unilateralidade dos recursos financeiros, e as atividades em que o filho necessite de acompanhamento.

A questão da saúde emocional e psicológica também precisa de atenção especial. A família monoparental que se origina de óbito, divórcio, abandono de lar, dentre outras condições alheatórias à vontade próprias, origina danos emocionais e psicológicos no progenitor e no filho. A adaptação é um processo difícil em qualquer dos casos, tendo em vista que são necessários esforços além dos financeiros para alcançar estabilidade, bem como enfrentar os olhares ainda discriminatórios da sociedade que vê com preconceito tal condição. Todos esses fatores levam a questionamentos em relação aos abalos psíquicos que o menor sofre nessa situação.

Deve-se considerar que essas colocações dizem respeito a estabilidade do ambiente em função do filho, não considerando os impactos na vida do progenitor, questão essa que não se aplica a este estudo em função da sua vertente de análise psicológica.

Retomando a questão dos filhos, Silva (2016) defende que mesmo enfrentando situações adversas, quando o matrimônio ou a união estável não vão bem, quando a família tem um ambiente de conflitos (verbais/físicos) e hostilidades é melhor que a separação aconteça para preservar o ambiente saudável e para que a infância ou adolescência não seja traumática. O aconselhável é que, mesmo nesses casos, quando acontece o divórcio/separação, os progenitores busquem a harmonização, pois os casos em que a guarda é unilateral, com pagamento de pensão alimentícia, sem contanto afetivo com o outro progenitor, pode gerar a sensação de abandono, revolta do menor, dentre outros problemas graves.

A ausência do contato familiar com os dois genitores é facilmente identificada na escola, espaço no qual as crianças passam parte do seu dia e estão mais suscintos a agir de forma espontânea. O Estatuto da Criança e Adolescente defende o direito e obrigatoriedade do ensino, cultura e lazer para as crianças, não sendo possível ao responsável legal a recusa do mesmo em função das dificuldades enfrentadas, ficam a cargo da escola informar o Conselho Tutelar sobre maus tratos ou situações que deixam a criança em estado de vulnerabilidade, para que o mesmo tome as providências necessárias.

Em algumas situações a guarda pode ser retirada do progenitor responsável é atribuída à outra parte, o que geralmente não resolve a situação, pois os impactos do rompimento de uma relação são sentidos por todos os envolvidos e, muitas vezes, geram frustações em relação a vida que esperavam após o término da relação (KEHL, 2003).

Adolescentes filhos de pais separados ressentem-se da ausência do pai (ou da mãe) no lar. Mulheres sozinhas queixam-se de que não conseguiram constituir famílias, e mulheres separadas acusam-se de não terem sido capazes de conservar as suas. Homens divorciados perseguem uma segunda chance de formar uma família. Mães solteiras morrem de culpa porque não deram aos filhos uma verdadeira família. E os jovens solteiros depositam grandes esperanças na possibilidade de constituir famílias diferentes, isto é, melhores daquelas de onde vieram (KEHL, 2003, p.163).

Em alguns casos, estes vestígios psicológicos precisam de atenção, pois podem levar pessoas a terem uma vida infeliz ou gerar problemas por não aceitação do fim do relacionamento, tais como agressões e perseguições. Nesse sentido, é necessário que o Estado intervenha para auxiliar as famílias nessa transição. O acompanhamento psicológico, a agilidade nos processos judiciais ou de proteção deveria ser mais eficaz, uma vez que a família monoparental, tem os mesmos direitos e obrigações que as demais, devendo ter condições de ter um ambiente seguro para o desenvolvimento do menor o desenvolvimento de forma digna é dever da família, sociedade e Estado, como expresso no art. 227 da Constituição:

“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, como absoluta prioridade, o direito à vida, à ao adolescente e ao jovem, como absoluta prioridade, o direito à vida, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda a forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Feitas essas considerações, cabe ressaltar que todos devem zelar pelo desenvolvimento saudável e de forma digna das crianças e adolescentes. No âmbito jurídico as principais contribuições se dão na Constituição de 1988, no Código Civil de 2002, com os artigos 1.630 a 1.638, que tratam das responsabilidades sobre o exercício do poder familiar como explicado em tópico anterior e no Estatuto da Criança e Adolescente.

Cabe observar, que dada a fragilidade dos envolvidos no momento do divórcio ou petição de guarda, o juiz, sempre que dada a possibilidade, demonstra os benefícios da guarda-compartilhada, determinando a mesma como unilateral somente quando uma das partes não tem condições de oferecer um ambiente saudável para a criança ou não tem interesse sobre os mesmos. Em todos os casos, o que se origina é a família monoparental.

Associado a tais responsabilidades tem-se o princípio da solidariedade familiar. Ele destaca que a solidariedade deverá sempre existir nas relações familiares, como demonstra o art. n° 1.511 do Código Civil. Tal responsabilidade, não se aplica apenas no âmbito patrimonial e material, mas também se estende a assistência afetiva. Ele visa garantir a afetividade e a prestação de assistência mútua dentro da família. A finalidade é proporcionar experiências e momentos felizes para os membros da mesma, além de desobrigar o Estado da prestação desse auxílio.

 

1.4 FAMÍLIA MONOPARENTAL FEMININA VERSUS FAMÍLIA MONOPARENTAL MASCULINA

A monoparentalidade feminina, embora não seja um fenômeno recente, ainda sofre com preconceitos, pois está atrelada à questões feministas e à mudança na condição social da mulher. Dentre os fatores que contribuem para um maior número de famílias monoparentais chefiadas por mulheres Àlvares (2003) aponta que a viuvez e ruptura de união são as principais responsáveis por esta condição.

Alguns fatores podem ser apontados como condicionantes do crescimento das famílias monoparentais femininas, entre eles citam-se o aumento da expectativa de vida da mulher brasileira, o que pode ocasionar um maior número de viuvez feminina; o crescimento do número de divórcios e separações, sendo que em grande parte dessas situações a guarda dos filhos permanece com a mãe; e as mudanças de valores tradicionais em relação ao casamento e aos valores sexuais (ÁLVARES, 2003, p. 70).

De acordo com dados do IBGE (2012), no ano de 2010,89, 5{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} dos casos de divórcio a guarda dos filhos permanece com a mãe. Mesmo essa estatística sendo grande, quando o assunto é debatido, a primeira questão levantada são os casos de “mães solteiras”, ou seja, adolescentes que engravidaram e que os pais não assumiram a paternidade do filho, ou que mesmo quando assumem a paternidade, não constituem um relacionamento que inclua a mãe.

Essas situações acopladas às situações sociais vulneráveis remetem às mulheres que tem seus filhos e os criam sozinhos, ou com pequenas participações dos genitores, a discriminação. Tal situação não planejada leva essas mulheres muitas vezes a largarem seus estudos ou se submeterem a trabalhos de domésticas ou ainda outros considerados inferiores (ÁLVARES, 2003).

Atualmente, muitos são os casos em que essas jovens mães que são forçadas a monoparentalidade conseguem sair das situações de vulnerabilidade, estudando ou encontrando empregos melhores. No entanto, precisam renunciar a ambições pessoais e ainda contar com ajuda financeira e cuidados para a criança, por parte de seus familiares, normalmente, avós, tios, primos dentre outros parentes próximos das crianças.

A mãe que se vê sozinha é confrontada, na maioria dos casos, com uma queda em seu nível de vida. Então acabam aparecendo os problemas financeiros, obrigando-a a investir mais na atividade profissional. Mas diminuir o tempo dedicado aos filhos acentua as dificuldades de administrar a vida doméstica (GARBAR; THEODORE, 2000, p. 139).

Mesmo a legislação não sendo específica para a família monoparental, a obrigatoriedade de pagamento de alimentos tem a função de proteger os interesses da criança e; consequentemente auxiliam na sobrevivência da família.

Outro ponto que cabe destaque na legislação é que atualmente o reconhecimento de paternidade já pode ser solicitado no cartório quando do registro da criança. Nesses casos o juiz intima o suposto pai a reconhecer a paternidade espontaneamente ou realizar exame de DNA, e sendo constatada a paternidade a genitora recebe um termo garantindo o registro do nome do pai e tendo condições para solicitar a pensão (BRASIL, 2002).

Cabe ressaltar mais uma vez, que o reconhecimento da paternidade e a pensão de alimentos são direitos da criança, garantidos no Direito de Família, que auxiliam a monoparentalidade feminina em seus tantos desafios e preconceitos.

Quanto a monoparentalidade masculina, ainda não existem muitos estudos em relação à mesma, pois os Códigos Civis anteriores contemplavam a guarda sempre em favor da mãe, salvos casos em que, comprovadamente, a mesma não tivesse condições de cuidar da criança. Atualmente, mesmo que em casos reduzidos, os homens estão adentrando nas disputas pela guarda dos filhos. Denardi e Borttoli (2017), apresentaram em seus estudos dados do IBGE significativos em relação a monoparentalidade masculina.

Diante desta nova realidade que envolve a paternidade, o censo de 2010 (IBGE) ainda aponta que as famílias monoparentais masculinas vêm ganhando destaque no cenário brasileiro pelo crescente número de pais que possuem a guarda da prole. No período de 1997 a 2007, a proporção de famílias monoparentais passou de 19,2{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} para 21,8{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6}, e no caso das famílias monoparentais masculinas, o percentual passou de 7,8{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} para 9,8{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6}, o que corresponde a 278 mil famílias monoparentais masculinas em 1997 e 445 mil em 2007 (DENARDI; BORTTOLI, 2017, p. 8).

A monoparentalidade masculina, assim como a feminina desencadeia transformações estruturais na vida do progenitor. As mudanças se dão tanto na esfera financeira quanto psicológica. É necessário que seja reorganizada a rotina diária do pai que recebe o filho.

No entanto, é mais comum que seja dado maior auxílio ao genitor, pois a sociedade acolhe generosamente o mesmo que tem a guarda do filho.

Goldenberg (2000) destaca que a relação afetuosa de pai e filho tem grande influência nesta transformação. Antigamente, havia um distanciamento nessas relações cultivado culturalmente, o contato diário com os filhos, a divisão de tarefas com a mãe no período de convivência e os cuidados dispensados a criança fazem com que o pai, mesmo após o fim da união queira continuar a educar e cuidar diariamente do filho.

Em um estudo sobre a paternidade, Costa (2002) entrevistou homens com o objetivo de investigar suas representações sobre a paternidade e obteve como resultados que os homens-pais buscam viver a paternidade quebrando estereótipos do passado, assumindo uma postura mais ativa na relação com os filhos. Com isso, há uma ressignificação da figura paterna para o chamado “novo pai”. Wagner (2011) salienta que o exercício do papel de pai na contemporaneidade, mesmo em contextos diferentes, é de participar do desenvolvimento da prole, não se restringindo apenas em provê-los e discipliná-los (DENARDI; BORTTOLI, 2017, p.9).

Em geral, ainda são poucos os casos em que os pais têm interesse em pedir a guarda compartilhada ou unilateral. Esse papel tem sido ressignificado aos poucos, deixando o pai de ser apenas provedor complementar em casos de separação. A busca pela convivência familiar é o alvo quando a monoparentalidade masculina ocorre.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A família monoparental é uma realidade cada vez mais presente na sociedade brasileira.

Desta forma, identifica-se a importância deste estudo para ampliar as questões relacionadas ao assunto, tendo em vista que o modelo biparental vem sofrendo alterações. Essa ideia ociosa da monoparentalidade se faz necessário para combater as diversas formas de preconceitos por quais passam essas famílias.

Viu-se que a origem da família monoparental nem sempre provém da vontade dos pais, mas são resultados de situações adversas que forçam o rompimento do relacionamento entre os pais, podendo ser desde morte até a escolha da adoção unilateral.

O objetivo de conhecer as características principais dessas famílias e suas vulnerabilidades foi alcançado, dentro das limitações desse estudo. Viu-se também que o preconceito e problemas enfrentados por famílias monoparentais com mulheres como chefe são mais latentes, haja vista a visão machista da sociedade que coloca essas famílias à margem.

Cabe que a figura masculina também faz parte desses arranjos familiares, ainda que em menor presença e que essa realidade de participação distante está sendo alterada. A figura masculina deixa de ser apenas o provedor, para assumir responsabilidades que antes eram considerados como apenas das mulheres.

No que diz respeito a questão financeira, os desafios são os mesmos para ambos os sexos, pois as dificuldades para criar os filhos e prover todas as demais despesas de uma casa com apenas a renda de uma família são elevados. As pensões ainda que estabelecidas em justiça e sendo considerado direito do filho, geralmente, não são suficientes para equiparar o valor gasto pelo progenitor responsável pelo menor, sendo, em muitos casos, necessário acionar a justiça para que esse direito seja estabelecido.

Em relação à legislação, ficou claro que o Direito de Família foi modificado na Constituição de 1988 e pelo Código Civil de 2002 para atender as demais da nova forma de organização familiar, mas não foram identificados diplomas normativos específicos à questão. Fica evidente que é necessário que o Estado promova políticas públicas, tais como prioridade em creches, equiparação de custeio das despesas dos filhos para ambos os pais, atendimento psicológico específico, dentre outras formas que visem auxiliar tais chefes dessas famílias a alcançarem estabilidade financeira e emocional para si e para os filhos.

A tutela à família, promovida pelo Estado no caso das famílias monoparentais precisa ser reestruturada, buscando minimizar os impactos já citados na vida econômica, social e emocional pelo surgimento dessa organização.

Fica evidente que o poder familiar não está associado a guarda e pode ser exercido por ambos os progenitores dentro das diversas entidades familiares presentes na sociedade.