ESCÓLIOS ACERCA DAS TUTELAS PROVISÓRIAS DE URGÊNCIA (CAUTELARES E ANTECIPADA) REPRISTINANDO O INSTITUTO DAS LIMINARES. A EQUIVOCADA TENTATIVA DE O LEGISLADOR DE 2015 PLASMAR INSTITUTOS, SORVENDO ESSAS DISTINÇÕES
Caio Sérgio Paz de Barros
O novo Código de Processo Civil (NCPC), endossando as últimas reformas processuais, versa as liminares sob a epígrafe de tutelas provisórias de urgência, apresentando-se-as como cautelar e antecipada, apesar de tentar plasmar institutos tão distintos, permitindo – inclusive – aditamentos de pedidos e causas de pedir. Cria a tutela (proteção) de evidência, e, sob este signo, ingente novidade, mediante anomalias, ditadas por esse equivocado Diploma de 2015, a “transformar” o julgamento antecipado de antanho nesta (tutela provisória de evidência).
Pontuando, temos as tutelas provisórias, divididas em proteções de urgência ou de evidência, daquelas trataremos nestas mal traçadas linhas.
LIVRO V – Da Tutela Provisória / TÍTULO I – Disposições Gerais
Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.
Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.
O legislador do novo Código de Processo Civil preferiu respigar um dos elementos das liminares, que se caracteriza por ser provisória, e nominar “tutela provisória“. Esta a denominação do Livro V, ou seja: “Tutela Provisória“.
Na verdade, a provisoriedade emerge como uma das características das liminares, conforme pontuaremos nas subsequentes linhas.
Emerge estranho – ao estudioso – versar o instituto da liminar por uma de suas características. Pior: elemento nem sempre determinante, porque a liminar pode transformar-se em proteção perene.
Infelizmente, os procedimentos legiferantes quedam-se a piorar e, a esses institutos, o legislador demonstrou nenhum conhecimento acerca de cautelar a distingui-las da tutela antecipada, e isso emerge cristalino ao mencionar, no art. 305 do Código de Processo Civil de 2015, que existem ações cautelares, senão: “Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente […]“.
Ora, o próprio Buzaid, bem antes de pacificada a ingente distinção, asseriu acerca de medidas cautelares, não ação; porque não há processo cautelar e, não militando processo, não há ação.
Reiteramos que a ação jurisdicional sempre está afeta a processo, que nutre características básicas, por isso, apesar de o gênio Alfredo Buzaid ter imposto o título “processo” cautelar, versou entre os arts. 796 usque 889 medidas cautelares, não ações. Essas são algumas distinções, entre tantas aos dois institutos.
Referiu-se à ação – também – porque tentou plasmar esses distintos institutos (cautelar e tutela antecipada), apesar de a medida cautelar emergir exterior ao pedido principal.
O novo diploma optou – também – por permitir liminares, ou tutelas provisórias genericamente concebidas, sem serem típicas. Nisso andou bem o legislador, definindo – apenas – alguns procedimentos típicos em sede de cautelares, ou, melhor intuindo, citando exemplos no próprio texto legal.
Assim, firmamos a premissa: o legislador denominou tutela provisória às liminares de antanho, entendendo que a sua nomenclatura pudesse ser subdividida pelo momento da concessão da proteção jurisdicional, por exemplo, se a denominada tutela provisória fosse concedida imediatamente, seria liminar; caso concedida ao longo do procedimento emergiria mediante outra nomenclatura, mas ambas hipóteses seriam tutelas provisórias.
Repisamos: o legislador do novo Código de Processo Civil denominou as antigas liminares como tutelas provisórias, utilizando, para isto, apenas uma das características das liminares.
A descortinarmos o alvitre do legislador citamos o § 2º ao art. 300 do Código de Processo Civil, ocasião que aquele define liminar, considerando-se o iter procedimental, a qual queda-se concedido o pedido, senão:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo:
[…]
- 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
Aqui simples esclarecimentos aos leitores menos atentos, pontuando que, justificação prévia geralmente representa a oitiva do réu com audiência à produção de prova testemunhal e informações das partes. Mas, neste texto legal, o termo (justificação prévia) emerge a contrapor-se ao iter procedimental inicial, definido como liminar.
No Direito pátrio, as liminares hauriram conotação de imediatidade, rapidez à prestação jurisdicional, caracterizadas, principalmente, porque obtidos os “bens da vida” por ocasião da distribuição da medida (ou da ação, quando a liminar sobrevier em processo de conhecimento).
A consideração de liminar pela doutrina pátria, conforme o vezo, representa a imediatidade pela obtenção do bem da vida submetido à prestação jurisdicional. Seria o já, o imediatamente; p. ex.: o chefe solicita – à secretária – copo com água, e esta, muito atarefada, responde: “deixe-me terminar de digitar as 400 folhas […]“. O chefe redargui: “Já“, “agora“, liminarmente.
A liminar, concebida pela doutrina pátria, como ato do procedimento, seria este “já“, conferida a imediatidade, tão logo chegue ao conhecimento do juiz, por ocasião da distribuição do pedido. Porém, imprimindo técnica à assertiva, asserimos que liminar é a decisão do Estado-juiz, respondendo positivamente ao requerimento da parte – normalmente do autor -, concede o pedido mediato (“bem da vida“) sem extinguir o procedimento que – invariavelmente – ocorre muito próximo à distribuição da petição inicial.
Por isso asseveraram, não com tanta propriedade, que a liminar “ocorre” no início do procedimento, reiteramos: tão logo haja a distribuição da medida. Talvez por isso o legislador tenha optado pela alteração do nome para tutela provisória, excogitando abarcar ambas situações.
Mas a caracterização de liminar como prestação imediata, concedida tão logo a realização do pedido, não é regra. Aliás, para os italianos, liminares são decisões conferidas antes do julgamento final, são provimentos que antecedem a sentença, concebendo resultado prático.
Escoliamos que os italianos consideram o iter procedimental até a sentença (desde a distribuição da inicial até o julgamento final da causa, colocando termo ao procedimento inaugural, ato denominado por sentença), portanto, antes desta, como interstício hábil à concessão de liminares. Diferentemente do vezo pátrio, que caracteriza a liminar como realização imediata à distribuição da medida (ou da ação).
Neste momento é importante escoliarmos acerca de nossas ressalvas: “distribuição da medida, ou da ação“. Por que da distinção?
Pontuação plausível emergiu mediante o legislador do novo diploma marginalizar a denominação de processo cautelar. Aliás, assumiu a inexistência de processo cautelar, tecnicamente concebido, característica palmar do próprio Código Buzaid que, apesar de militar título: “Processo Cautelar“, o art. 806 do revogado diploma impunha a dependência das medidas cautelares ao processo principal (cognição e execução).
É dizer, o Jurisfilósofo Alfredo Buzaid denominou medidas cautelares ao se referir aos procedimentos (cautelares) e utilizou o termo ação quando se referiu a processo, ou seja, a ação principal orientada pelas regras (processo) da cognição ou da execução.
Entrementes, asseveramos medidas (e não ações) quando nos reportamos às cautelas, e ação quando milita a possibilidade de a tutela provisória ser conferida na cognição ou na execução.
De outra banda, mister escólio histórico ao descortino das medidas de urgência, agora versadas como tutelas antecipada e cautelar. Vale dizer, até 1997, pelo menos ao Direito pátrio, imaginava-se que as liminares nutririam natureza cautelar ou seriam realizadas mediante o critério de urgência. Assim, para a quase unanimidade dos “operadores do Direito” [1], pelo menos em nosso País, toda liminar seria cautelar (até 1997).
Ressalvamos que nem todos entendiam desta maneira. Por óbvio, o gênio Alfredo Buzaid e alguns estudiosos de suas obras nutriam o descortino acerca da existência de liminares, das quais a característica preponderante de seu deferimento não era o critério de urgência[2].
Claro que esse elemento (urgência) poderia ser algo mais, emergiria como reforço ao desiderato; porém, neste caso sob comento, ao provimento do pedido de liminar preponderaria o aspecto relevância do direito. E, se militasse a urgência, esta emergiria mediante plus a seu deferimento.
Com este lastro são as liminares em mandado de segurança e ordem de habeas corpus, ou seja, quando o juiz lega provimento à decisão que reflete no pedido mediato (“bem da vida“), antes da sentença, em ordem de habeas corpus ou no mandado de segurança, não a concede considerando-se o critério de urgência, e sim em decorrência da relevância[3] do direito em causa, a importância daquele resultado prático (pedido mediato) em razão da norma.
Ao escoliar esta assertiva, impomos o seguinte exemplo: o senhor X permaneceu por 30 anos preso e, como sucedâneo do cumprimento do art. 75 do Código Penal, ou seja, que ninguém será mantido encarcerado por período acima de 30 anos, galgara a sua liberdade. Diferentemente do propalado pela mídia, o indivíduo encarcerado por ingente interstício perde o seu referencial. Assim ocorreu com X, que, enquanto preso, a sua esposa fugiu com outro, os seus pais e irmãos faleceram etc.
Ao sair da penitenciária recebera – apenas – bilhete de trem e, enquanto estava neste, fora “reconhecido” por passageira como o indivíduo que a teria violentado meses antes. Explicou aos funcionários da estação que permanecera preso pelos últimos 30 anos e que este pretenso reconhecimento fora equivocado. Mas as explicações restaram infrutíferas, resultando o seu retorno ao cárcere.
A situação pode ser absurda, porém, se fosse necessária a impetração da ordem de habeas corpus para a liberação imediata do senhor X, qual seria o supedâneo para a concessão da liminar?
Diriam alguns: para a concessão da liminar em ordem de habeas corpus, o critério seria a urgência da liberdade deste indivíduo.
Notem que, nessa frase, existem – obnubilados – dois aspectos: a urgência e a liberdade. Esta é garantia fundamental do indivíduo, de acordo com a Constituição da República.
Mas, excogitando tratar-se de urgência pela medida, desavisado bacharel fulcraria o seu pedido: “[…] queda-se urgente a concessão da liminar, porque X está preso com perigosos bandidos“.
Seria válida esta argumentação, ou seja, a urgência em razão de seu habitat? Por óbvio não seria plausível, porque, nos últimos 30 anos, o senhor X permaneceu preso com perigosos delinquentes!
Assim, preclaros colegas, o único supedâneo ao deferimento desta liminar é a relevância do direito em causa. A importância da liberdade como sucedâneo do Direito Constitucional; repisamos: relevância do direito em causa[4].
Claro que os percucientes leitores poderiam lastrear o pedido na impossibilidade de inculpação prévia, também entendida como “princípio da presunção de inocência“; no devido processo legal; na amplitude de defesa e, principalmente, pelo não preenchimento dos requisitos ensejadores da custódia cautelar.
Em síntese, aqueles que vinculavam o deferimento de medidas liminares considerando-se o critério de urgência duvidavam da pertinência da liminar, situação – neste caso – hilariante seria não a requerer, pois não conseguira encontrar o “aspecto de urgência“.
De outra banda, e avançando ao tema, utilizamos – como exemplo – as liminares em tutelas possessórias.
O Código Buzaid – desde 1973 – permitia a concessão de liminares, em sede possessória, se o esbulho (perda indevida) ou a turbação (moléstia, perturbação) ocorresse menos de ano e dia.
Atenção, senhoras e senhores: o diploma legal asseriu acerca de 365 dias […], isto não pode ser considerado como se fosse urgente.
Notem “ano e dia“. Onde está a urgência à obtenção do direito? E, mesmo não residindo a urgência, o juiz poderia (e poderá) conceder a medida liminar (agora tutela provisória), nos termos do revogado art. 928 [5] do Código Buzaid.
Não é diferente o verso intuído do art. 3º do Decreto-Lei nº 911/1969, vulgarmente denominado “alienação fiduciária“, conferindo ao juiz a possibilidade de concessão da liminar à financeira, se a inicial estiver instruída com documentos hábeis à comprovação da fidúcia e da malversação do fiduciário.
Considerando-se esses textos, perguntamos: onde reside o critério de urgência ao deferimento, se a financeira entregou o veículo ao devedor-fiduciante e – invariavelmente – nutre outras garantias à satisfação de seu crédito?
Sintetizando, pontuamos que existem liminares orientadas pelas regras (processo) da cognição, e estas não dependem da urgência à sua concessão. Mas esta assertiva emergiu ímpar a partir de 1995, quando a reforma processual identificou algo denominado “tutela antecipada“, que representa a concessão de liminar na própria “ação principal” nos processos de conhecimento e execução, independentemente de medidas exteriores (cautelares): preparatória e incidental. Sim, porque as liminares (tutela provisória) cautelares seriam exteriores à ação principal.
Ao pontuar as distinções entre cautelar e tutela antecipada, excogitamos exemplo, asserindo que Palmeirense da Silva (gente fina) adentrou boteco da periferia (Freguesia do Ó), adquirindo garrafa com água, lançando o seu valor de R$ 3,00 sobre o balcão.
O dono do bar viu quando Palmeirense da Silva lançou o dinheiro sobre o balcão do bar e, sem apanhar a nota de R$ 2,00 e a moeda de R$ 1,00, fora pegar a água, colocando-a (garrafa) ao lado do dinheiro (também sobre o balcão do bar), enquanto ambos distraíram-se com o rebolado de uma linda mulher. Após a passagem do “avião“, ambos olharam para o local onde estava o dinheiro, constatando o seu sumiço. Este (sumiço) suscitou ingente discussão entre o dono do bar e o cliente, quando este grassou a infartar. A água, neste caso, passou a ser essencial para o cliente tomar o seu remédio e, consequentemente, sobrestar o “procedimento de infarto“.
Imaginamos que a discussão acerca do pagamento (ou não) da água e a sua entrega ao freguês do bar seja conduzida ao Estado-juiz. Todo este affair seja transcrito ao papel e submetido à apreciação do juiz.
A discussão principal é o pagamento (ou não) da água. A lide total resume-se no dinheiro estar sob o jugo do dono do bar ou não se operou o pagamento (pagamento ou não) da água.
Mas, o líquido deve ser entregue imediatamente ao freguês, pois este necessita tomar o remédio para “sobrestar o infarto“. Então a água deve ser concedida liminarmente, antes de decidir se ele pagou ou não.
Se a água for concedida somente pelo critério de urgência, ou seja, o magistrado decide: “entregue a água ao jurisdicionado para evitar o infarto“. Esta liminar nutrirá natureza jurídica de cautelar, pois prepondera o aspecto de urgência, um dos requisitos às liminares cautelares: o periculum in mora. Também deve ser considerado o fato de liminares com natureza jurídica de cautela estarem fora da questão principal.
Diferentemente se a urgência não for o critério preponderante ao deferimento da liminar, e sim o aspecto do pagamento, emergindo a seguinte decisão: “[…] Entregue a água ao freguês, pois, não obstante a urgência, prepondera o fato de o dinheiro ter sumido enquanto estava sobre o balcão, dentro do bar, nutrindo responsabilidade ao seu proprietário […]“.
Note que, em ambas as situações, a liminar queda-se concedida em decorrência da urgência; porém, no segundo caso, prepondera, emerge mais importante o aspecto do pagamento, apesar de as liminares serem provisórias, sempre dependentes de futuro julgamento da medida ou da ação.
Reiterando: se a água for concedida considerando-se a responsabilidade do dono do bar pelo dinheiro, a mesma ação permitirá a discussão de toda a matéria (pagou ou não; deve entregar definitivamente a água, ou não), emergindo liminar concedida na própria ação principal, portanto, com natureza jurídica de “antecipação dos efeitos da tutela” (a nomenclatura de antecipação dos efeitos da tutela representa a pura realidade, pois, quando formulamos pedido ao Estado-juiz, este pedido será julgado no final do procedimento, mediante sentença, ocasião que o juiz decidirá acerca do “bem da vida“, reflexo do conteúdo da sentença. Ora, se a concessão do “bem da vida” reflete o conteúdo necessário da sentença e, normalmente, a sua concessão ocorre no final do procedimento, a liminar que o entrega antecipa os efeitos da decisão – final -, denominada antecipação da tutela).
Mister destacar que o autor formula o pedido de tutela jurisdicional, pleiteando a concessão do “bem da vida” antes do julgamento da questão principal, ocasião que o juiz poderá conceder este – noticiado – “bem da vida” liminarmente, ou seja, antes de julgar a questão principal (pagou ou não a água). Posteriormente, esta (questão principal) será julgada mediante sentença, operando-se este julgamento com a concessão – ou não – do “bem da vida” definitivamente.
Note que o pedido mediato seria concedido apenas mediante o julgamento final, decidido mediante sentença; porém, preenchidos alguns requisitos, o Estado-juiz poderá antecipar seus efeitos, concedendo a tutela provisória (liminar) decidida em razão do direito em causa ou conteúdo da lide (discussão total do problema).
Pontuamos que este tipo de liminar preexistia à “Reforma de 1997” e, apesar disto, alguns prematuros trabalhos asseriram “ser algo novo“. E esta preexistência fora descortinada aos leitores mediante a apresentação das liminares concedidas em sede de possessórias ou em decorrência do Decreto-Lei nº 911/1969.
Ao ressaltar a ingente distinção, realizamos breve digressão ao definirmos pedidos imediato e mediato. Este representa as liminares, é sempre o pedido mediato que o requerente da liminar alvitra, senão vejamos.
1 PEDIDOS IMEDIATO E MEDIATO
Para melhor distinguirmos as cautelares da “tutela antecipada“, ou seja, para identificarmos as naturezas jurídicas das tutelas provisórias de urgência (liminares), ajudar-nos-á a reafirmação dos conceitos acerca de pedido (imediato e mediato).
Este (mediato) é o objeto da tutela pretendida perante o Estado-juiz. Aquele (imediato) é o conteúdo da sentença que permitirá a obtenção (ou não) do “bem da vida“, resultado da ação (ou do processo, na concepção dos doutrinadores pátrios).
O pedido imediato é o conteúdo da sentença que permitirá a obtenção do “bem da vida” pleiteado ao Estado-juiz, ou seja, o autor requereu a separação judicial (“bem da vida“). Este é o pedido mediato. Porém, à obtenção da separação judicial, o Estado-juiz deverá aplicar a lei ao caso concreto; à situação submetida, a sua apreciação (tutela jurisdicional); e, ao decidir – aplicando a lei àquele caso -, o julgador profere comando existente na sentença (decisão final do procedimento discursivo, ocasião que o juiz declara “a quem pertence o direito” perseguido mediante coerção). O pedido imediato é respondido na sentença, mediante a prolação deste – noticiado – comando.
Por outras palavras, na inicial, é formulado pedido (mediato) de separação judicial, mediante o (pedido) imediato de desconstituição dos deveres do casamento.
Notem que o juiz, ao homologar ou decidir acerca da separação judicial, deverá desconstituir os deveres do casamento e, no divórcio, desconstituirá o próprio “contrato” de casamento.
Assim, o pedido imediato é de desconstituição e o mediato é a separação judicial. Aqui, atenta leitora – porque as mulheres são denodadas -, o equívoco daqueles que na inicial asserem: “[…] vem, mui respeitosamente, propor a presente ação de separação judicial […]”; quando, na verdade, deveriam articular: “[…] a presente ação constitutiva (negativa), objetivando a separação judicial […]“; ou: “[…] ação constitutiva (negativa), com pedido de divórcio […]“.
Reiterando: há dupla característica no pedido insculpido [6] na inicial. É imediato quando se refere ao comando existente na sentença, e é este que torna possível a concretização do pedido mediato, caracterizado pelo “bem da vida“[7] objeto da apreciação jurisdicional.
A propalada “tutela antecipada” repercute em conferir imediatidade a este pedido mediato, permite que o juiz o entregue liminarmente. Aos mais recentemente graduados, entendam o termo “liminarmente” mediante a nova denominação “tutela provisória“.
Vejam que a antecipação da resposta a este pedido resta afeta à discussão total da pendenga entre as partes. É a resposta do Estado-juiz, concedendo – liminarmente – o pedido (mediato = “bem da vida“) formulado pelo autor, afetando a discussão total da pendenga entre as partes.
Não pode ser concedido o pedido imediato liminarmente, porque este é o conteúdo da sentença, o que implicaria em julgamento antecipado do caso, não à antecipação dos efeitos da tutela final.
2 DISTINÇÕES ENTRE A ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA E A (LIMINAR) CAUTELAR
Aos doutrinadores e, enquanto pontuamos os nossos ensaios, é muito fácil distinguir entre a antecipação dos efeitos da tutela final, que ocorre no processo de conhecimento, e a (liminar) com natureza jurídica de cautelar. Porém, aos mesmos escritores resta tormentoso o tema, quando elaboram petições iniciais ou quaisquer outras peças que demandam escólios às distinções.
Assim, preclaros leitores, com – apenas – uma frase poderíamos distinguir a tutela provisória em sede cautelar, daquelas (proteções provisórias) possíveis na cognição, denominadas “tutelas antecipadas“. Vale dizer, as tutelas provisórias cautelares são exteriores à discussão principal. Distintas são as “tutelas antecipadas“, porque “adiantam” o resultado do pedido, enquanto este serve à solução de toda pendenga entre as partes.
Mas o legislador de 2015 tentou acabar com esta importante distinção, conforme o escoliado ao final deste trabalho.
Prepondera o caráter independente da tutela provisória de natureza cautelar, pois, não existe cautelar satisfativa e, como sucedâneo, essas (as cautelares) nutrem o escopo de proteger futura discussão que, em sede de ação principal, orientada pelas regras da cognição ou da execução, possibilitam a discussão de toda a “lide” entre as partes.
Afirmamos, em alguns trabalhos escritos a partir de 1997, e cada vez mais temos certeza da assertiva, de que é o autor quem define a natureza jurídica da tutela provisória (liminar), realizando esta identificação mediante a demonstração de sua intenção. E, sob o pálio do novo diploma de 2015, o pedido de tutela provisória de urgência deverá ser realizado como se chutassem uma tampinha de refrigerante jogada no leito carroçável. Apenas chuta-se o pedido, sem técnica; mormente, o legislador retirou-a (técnica).
Antes, o autor do pedido de urgência deveria analisar se este emergiria na própria demanda (cognição) ou seria apenas para assegurar outra demanda (antecedente ou incidental), com natureza cautelar.
É dizer, a partir de seu escopo, tudo que desejasse “contra” [8] aquela parte seria possível pontuar o meio a ser empregado; p. ex.: o autor possui cheque devolvido sem provisão de fundos e deseja receber a importância, fruto de parte do pagamento de veículo, ciente de que o comprador tentará vendê-lo para frustrar a execução.
O autor quer receber o cheque que fora emitido como parte do pagamento de automotor e, necessita de liminar para evitar a alienação de seu veículo a outrem.
Ainda sob a égide do Código Buzaid, pontuamos que esta liminar não poderia ser relacionada ao recebimento do dinheiro (toda a discussão da causa resume-se ao pagamento do cheque), pois, caso fosse, seria satisfativa (acabaria o affair). E, não eram permitidas cautelares satisfativas, porque essas medidas não têm “vida” própria, restando sempre dependentes dos processos de conhecimento e de execução.
Abrimos parêntese para reafirmar que a expressão satisfativa queda-se interligada à discussão principal, a todas as questões entre as partes, não aos bens, como alguns juízes entendiam [9]. Será que o legislador de 2015 alvitrou retirar esta característica de não militar satisfação do direito às medidas cautelares? Questionamos isso em decorrência de o Código de Processo Civil de 2015 determinar o aditamento “da ação” (perdão pelo escandaloso equívoco) mediante a apresentação de pedidos e causas de pedir afetas às “questões principais” entre as partes.
Permaneceremos articulando este tópico no tempo verbal do presente, porque não emerge óbvio o escopo do legislador de 2015. Aliás, não é possível identificar as distinções entre as mencionadas tutelas provisórias de urgência, possivelmente porque o legislador colimou plasmar as diferenças, conforme pontuaremos no último tópico.
Asserimos que as cautelares não objetivam a solução da questão principal, sempre restam como meio para – simplesmente – assegurar a utilidade da ação orientada pelas regras (processo) da cognição ou da execução – nestas, a solução de todas as questões. Esta (a solução dos problemas entre as partes) deverá ser discutida na ação principal, sempre orientada pelas regras (processo) da execução ou do conhecimento.
Reafirmamos que as medidas cautelares não têm “vida própria“, por isso, o art. 806[10] do Código Buzaid impôs a propositura da ação principal no período máximo de 30 dias – estas (cautelares) restam sempre dependentes das regras (processo) da cognição ou da execução. Repristinando a orientação de Alfredo Buzaid, também utilizada no art. 308 do Código de Processo Civil de 2015, ou seja, o autor da medida cautelar deverá articular o pedido principal nos subsequentes 30 dias da concessão da liminar, senão: “Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar […]“.
O desiderato queda-se igual, porém as anomalias emergem cristalinas. Por primeiro, esta nova redação permite que o autor adite a inicial, com novos fatos e pedido, vale dizer, causas de pedir – no mínimo – aditadas; tirante, por óbvio, a permissão legislativa de serem alteradas (alterações das causas de pedir), transformando a orientação anterior acerca de o Direito Processual pátrio adotar a teoria da substanciação da ação em detrimento da doutrina da individuação (da ação), emergindo pernicioso ao réu, macula – inclusive – a garantia fundamental da ampla defesa. Porém, este assunto demanda outro trabalho de fôlego, a ser – posteriormente – proposto aos nossos consulentes.
É fato que as medidas cautelares não nutrem autonomia e restam dependentes dos processos de conhecimento ou execução. Esta técnica é mundial, existe na Alemanha, na Itália, na Argentina, em parte da Espanha e em muitos outros países; porém, inovando sensivelmente, o legislador de 2015 permitiu que militasse aditamento ao pedido e causas de pedir, após a concessão da tutela provisória de urgência com natureza cautelar. Pontuou, no art. 308 do CPC de 2015, o que seria respigado do art. 806 do Código Buzaid, impondo a apresentação do pedido principal nos subsequentes 30 dias. Aliás, dispôs sem técnica, não excogitou possível má-fé do autor ou mácula à garantia fundamental de ampla defesa.
Asseverou que este mencionado pedido principal emergirá mediante aditamento da inicial, determinando a sua realização “nos mesmos autos“. Ora, este fato filia o Processo Civil pátrio à teoria da individuação da ação, situação que dificulta a defesa do réu.
Mas não enfrentaremos este tema neste artigo, sucedâneo de tornar ingente lavra, dificultando a sua publicação. Não bastasse, mais recentemente, a Revista Repertório de Jurisprudência da IOB (2ª quinzena de dezembro de 2016, n. 24/2016, v. III, p. 881-868 – ordem decrescente), sob a epígrafe “As causas de pedir e o descortino da ‘misteriosa’ (causa de pedir) próxima. As teorias da substanciação e individuação“, de Caio Sérgio Paz de Barros, abordou a temática, apesar de outros enfoques.
Aqui, interessa a tutela provisória de urgência, apresentando distinções entre antecipação dos efeitos da proteção final e as cautelares, institutos plasmados no novo código, destacando que estas (as cautelares) quedam-se externas à ação principal, característica nodal, ignorada pelo legislador de 2015.
Desde antanho, asserimos acerca da inexistência de processo cautelar fulcrando-nos – principalmente – no art. 806 do Código Buzaid, ou seja, as cautelares não nutrem “vida própria“, quedam-se dependentes da cognição e da execução; vaticínio do grande mestre Galeno Lacerda, intuído desde a década de 1970 em: “Processo e função cautelar“. Emergem exteriores à ação principal, caracterizando-se por serem distintos os objetos, conforme escoliado nas subsequentes linhas.
Caldo de cultura, negamos a definição de processo como relação jurídica entre os sujeitos do procedimento [11], cópia nefasta de parte da doutrina italiana, a banda podre, que altera a definição de processo a cada circunstância. Para nós não há dúvida de que processo se caracteriza pelo conjunto de regras orientadoras da prestação jurisdicional, emergindo o primeiro regramento com o ofício do Estado-juiz como terceiro desinteressado (jurisdição).
Notem os equívocos daqueles que importaram doutrinas sem atentar aos elementos constituidores de falsa tese, ou seja, “processo como relação jurídica das partes em contraditório“. Ora, emerge possível profligar esta definição utilizando Giorgio Del Vecchio, que intuiu relação jurídica como jus et obligatio correlata sunt, ou seja, a cada direito corresponde uma obrigação correlata que o tutela, vinculando obrigação a direito, pessoas a pessoas; quando, na verdade, ninguém pode vincular manu militari pessoas.
Isso emerge cristalino no processo penal, quando o juiz recebe a denúncia e grassa a ação judiciária penal. Mas o juiz e os membros dos ministérios públicos não estão vinculados aos acusados, aliás, se os fossem (vínculo), praticariam delitos.
Esta verve não é nossa, emergiu da pena de Rogério Lauria Tucci, o falecido – infelizmente – catedrático da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – USP que tanto profligou a definição de “processo como relação jurídica entre os sujeitos do procedimento em contraditório“.
Nós (eu), após a desconstrução da tola tese (processo como relação jurídica em contraditório) realizada pelo Jurisfilósofo da São Francisco, sistematizamos (sistematizei) o Direito Processual, definindo processo como o conjunto de regras que orientam a prestação jurisdicional, quer estanque (Direito Processual) ou dinâmico, mediante a incidência de regramentos, enquanto o jurisdicionado formula pedidos ao Estado-juiz.
A isso importam as subsequentes linhas, vale dizer, a conferir a qualidade de regras próprias à definição de processo, negando a existência de processo cautelar, porque emerge cristalina a inexistência de regras próprias às cautelas, quedando-se sempre dependentes da cognição e execução.
Residem essas capitulações (art. 806 do Código Buzaid e art. 308 do Código de 2015) como demonstrativos de nossa doutrina, vale dizer, asserir que não há processo cautelar, e sim medidas (cautelares).
Com efeito, se propusermos medidas cautelares deveremos – sempre – buscar o fim de nossos problemas mediante os processos de conhecimento ou de execução, porque aquelas (cautelares) somente asseguram o resultado útil mediante excussão de bens, não extirpam as questões entre as partes. Porém, não foi isso que o legislador de 2015 intuiu, conforme o nosso fustigar nos últimos tópicos.
Assim, por ocasião do manejo das medidas cautelares, deveremos nutrir ciência acerca de suas limitações a – apenas – assegurarem o direito a ser perseguido pela ação principal (norteada pelas regras da execução ou do conhecimento).
Nisso a distinção básica entre as tutelas de urgência (liminares) conferidas pela cognição e as medidas cautelares.
Retomando o exemplo, reafirmamos que o autor quer o recebimento do valor representado pelo cheque. Liminar que mande pagar satisfaz a pretensão total do autor e acaba com o caso entre essas partes.
Há – no Direito pátrio – medida deste jaez (“liminar” que mande pagar), porém ela é morosa (o executado é citado para pagar na execução por quantia certa contra devedor solvente; que – normalmente – demora três meses até a citação). Ora, se o autor nutre conhecimento acerca da possibilidade de alienação do veículo a outrem, não poderá correr o risco de aguardar meses.
O autor quer o recebimento da importância representada pelo cheque, este é o verdadeiro escopo; porém, corre o risco de o executado alienar o veículo.
O automóvel é meio, não se refere ao pedido final. Este (pedido final) é o recebimento do cheque. Se o autor quisesse o recebimento do cheque liminarmente (já, agora, imediatamente), esta (liminar) equivaleria ao mesmo pedido final (recebimento do cheque), portanto, seria antecipação dos efeitos da tutela final (processo de conhecimento). Ressalvamos que o presente exercício emerge como exemplo, mesmo porque, anteriormente, asserimos acerca da execução. Mas, neste caso, o autor quer a proteção contra possível alienação do bem.
Assim, o bloqueio da transferência do veículo perante o órgão responsável, ou o arresto [12] de bens, ou sequestro [13] do próprio automóvel, são medidas que não estão afetas ao escopo – final – do autor (este quer o recebimento do dinheiro).
Em decorrência de a tutela provisória de urgência, aqui também denominada liminar, não estar afeta ao pedido final, não ser antecipação dos efeitos da proteção (tutela) final, ela (a liminar) não é orientada pelas regras da cognição. É medida apartada da discussão principal e, como tal, não satisfaz a pretensão final, nutrindo natureza jurídica de cautelar. Retomaremos este assunto mais adiante, agora interessa pontuar que as cautelares não podem extinguir a discussão principal, porque não há cautelar satisfativa (exaurimento da lide ou, esgotar a discussão total). Aliás, situação não escoliada pelo legislador de 2015, que possibilitou, intuindo no art. 308 do novo diploma, a satisfatividade.
Outra distinção emergia mediante a característica de a cautelar assegurar subsequente ação, com outro pedido (no novo diploma, art. 308).
Então, se o pedido mediato (“bem da vida“) restar afeto à “lide” principal ou for parte desta, a liminar será em cognição, a propalada “tutela antecipada“.
Depurando o caput do art. 273 do Código Buzaid, aqui utilizado a descortinarmos as diferenças entre liminares cautelares e tutela antecipada (antecipação dos efeitos da sentença positiva, obtendo o bem da vida tão logo distribuída a inicial), asserimos que o processo de conhecimento reside em alegações das partes.
Quando estas possuírem – apenas – alegações, por ocasião da distribuição da inicial, terão de manejarem a cognição, nessas, os regramentos para resolverem o pedido de tutela lastreado em – repisamos – alegações (considerando-se a distribuição da petição inicial).
Diferentemente opera-se a execução, enquanto o exequente tem de colacionar o título executivo, impondo relacionamento anterior entre as partes.
Essas distinções não foram apresentadas pelo legislador de 2015, apenas asseverou acerca da contemporaneidade pela necessidade da medida e a questão ensejadora do pedido, conforme emergirá comentado nos últimos tópicos.
Justificando o nosso pensamento acerca das liminares em processo de conhecimento, em sede de ações condenatórias, como natureza jurídica da propalada “tutela antecipada“, reafirmamos que o caput do art. 273 do Código Buzaid conferia a possibilidade de o autor obter parte, ou integralmente, o seu pedido mediato (“bem da vida“), ainda que lastreado em alegações (cognição), caso colacionasse prova inequívoca do direito alegado. A prova incide sobre o fato e o Estado-juiz realizará a sua valoração.
Nesse embalo, prova inequívoca confirma o fato, legando valor positivo máximo, mas o Direito deve ser interpretado, emergindo a sentença, como o ideal momento à sua valoração mediante a incidência do Direito ao fato.
Quando a lei reformista fora promulgada, alterando – sobremaneira – o texto do art. 273 do revogado código, considerando-se, principalmente, o inciso I, muitos doutrinadores impuseram a natureza jurídica de cautelar às liminares concedidas com base no art. 273, inciso I, do Código Buzaid.
Causou-nos perplexidade aquela justificativa, porque militava o Título III do Código de Processo Civil de 1973, dispondo acerca das medidas cautelares, possibilitando – inclusive – a sua obtenção em (medidas) atípicas, homenageando a existência de cautelares inominadas, por meio do poder geral de cautela conferido à jurisdição.
É dizer, se a legislação processual já homenageava a concessão de liminares pelo critério de urgência, sem a necessidade da tipicidade, qual o motivo para a reiteração daquela possibilidade?
A nosso ver, nenhum.
Não haveria necessidade de outra norma a possibilitar a concessão de liminares cautelares (critério urgência), ainda que em medidas atípicas, se os arts. 798 e 799 do revogado diploma conferiam esta possibilidade.
Entrementes, ousamos asseverar que não conseguíamos antever (naqueles idos) no inciso I [14] do art. 273 do Código Buzaid a – noticiada – natureza jurídica de liminar cautelar (apesar de nosso Mestre Antonio Claudio da Costa Machado discorrer, com maestria e talento, em 600 páginas, esta assertiva), ressalvando que o texto da lei, a nosso ver, conotava a relevância do Direito, não com a urgência à obtenção da medida.
Por outras palavras, asseveramos que, por ocasião da sanção da Lei nº 9.494, de 10 de setembro de 1997, norma que introduziu a “tutela antecipada“, muitos trabalhos emergiram a imprimir conotação cautelar a este instituto (tutela antecipada).
Vale dizer, a partir de 1997, surgiram inúmeros trabalhos, de renomados autores, asserindo que a tutela antecipada, em decorrência do critério urgência inserido no inciso I ao art. 273 do Código Buzaid, nutriria conotação de medida cautelar.
O nosso preclaro Professor Antonio Claudio da Costa Machado, jovem processualista da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – USP, que, não obstante a sua tenra idade, já lecionava nas arcadas pelos idos de 1983, e tivemos a honra de haurir os seus conhecimentos naquela ocasião. Posteriormente, publicou excelente obra acerca da tutela antecipada, porém equivocara-se ao elencá-la como medida cautelar, considerando-se a urgência disposta no mencionado inciso I ao art. 273.
Esta tese, albergada por muitos, não resistiu à argumentação acerca da possibilidade de serem concedidas medidas liminares em cautelar inominada.
Depurando o instituto (cautelar inominada) quer dizer: cautelar sem nome e rito específicos, são cautelares que podem ser concedidas pelo juiz, considerando-se o seu Poder Geral de Cautela. Vale dizer, constatada a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora, e não homenageando – a codificação – medida específica, o juiz poderia conceder a medida, ainda se a lei não mencionasse o tipo específico.
Com efeito, se o texto que emergia do art. 273, inciso I, do CPC de 1973 fosse criado a conferir medida liminar à cautelar inominada, estaria fora do livro das cautelares (a partir do art. 796 do Código Buzaid), bem como reiteraria o existente nos arts. 798 e 799 daquele diploma.
Ao necessário cotejo dos textos da norma, transcrevemo-los:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; […].
E, sob a epígrafe do “Livro III – do Processo Cautelar“, os arts. 798 e 799 do Código Buzaid, senão:
Art. 798. Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação.
Art. 799. No caso do artigo anterior, poderá o juiz, para evitar o dano, autorizar ou vedar a prática de determinados atos, ordenar a guarda judicial de pessoas e depósito de bens e impor a prestação de caução.
Ora, esses textos foram conferidos pela Lei nº 5.869 de 11 de janeiro de 1973, norma que promulgou o Código de Processo Civil.
Então, a permissão para a concessão de medidas cautelares inominadas ocorrera em 1973, a partir do Código de Processo Civil, que homenageou o poder geral de cautela do juiz.
Nesse diapasão, se o Código permitia tal situação, por que recriar a norma em 1997, mediante alteração do art. 273, inciso I, do Código Buzaid, se este versava acerca das mesmas cautelares existentes nos arts. 798 e 799 do Diploma de 1973?
Por óbvio, o legislador não seria redundante, tampouco militaria tamanha falta de técnica, pois, em artigo afeto ao processo de conhecimento, reiteraria norma especificamente cautelar.
Fê-lo a permitir liminares na cognição, e as locuções acerca de “dano irreparável ou de difícil reparação” referiam-se ao direito em causa, ou poderiam ser interpretadas como plus ao deferimento de liminar em processo de conhecimento.
Então, se todos os artigos e seus incisos deveriam ser considerados a melhor hermenêutica da norma, não seria possível (afirmamos em 1997) dois textos legais para homenagear o mesmo desiderato, mormente em capítulos distintos, permitindo liminar cautelar, apesar de o título e o capítulo restarem afetos à cognição.
É dizer, o processo cautelar nutria o seu regramento a partir do art. 796 do Código de Processo Civil de 1973 e não seria técnico “recriar“, no mesmo Código, no art. 273 e incisos, sob o título do processo de conhecimento, aqueles textos legais.
Reiteramos: caso fosse, emergiria mediante a recriação, após vinte e tantos anos, da mesmíssima hipótese do texto inserto nos arts. 798 [15] e 799 [16] do revogado diploma, ambos sob a epígrafe de processo cautelar.
Identifique, também, a medida cautelar, se militar dúvida entre o pedido imediato e o mediato, ou se aquele for fixo: “urgência“.
A escoliar o parágrafo anterior, asserimos que, nas medidas cautelares, milita – invariavelmente – a dificuldade de distinguir entre o pedido imediato e o mediato, por exemplo: “U” adquiriu da loja “W” computador última geração, emitindo dois cheques pós-datados, frustrando os seus pagamentos subsequentemente.
A loja vinculou os cheques ao pagamento do computador.
Escoliando, asserimos que cheque queda-se como título executivo autônomo e, normalmente, não está coarctado à obrigação principal. A evitar problemas, a loja escreveu, no verso do cheque, que seria ao pagamento de um determinado computador, vinculando-se-o àquele, com o desiderato de pleitear medidas à retomada do bem (computador).
Nesse passo, a empresa contratou profissional à retomada urgente do bem. O bacharel, sem tanta experiência, quedara-se com dúvida ao elaborar a petição inicial e, como se fôssemos o profissional, propomos a discussão: (a) o pedido é de devolução do computador ou tecnicamente concebido (o pedido) de sequestro, pertinente, nesses casos, quando a constrição [17] emerge sobre patrimônio determinado e, em decorrência da urgência, provando o requerente a aparência do direito alegado.
Na ação principal o pedido mediato (“bem da vida“) é o pagamento do restante do computador (cheques devolvidos).
Em cautelar, o pedido mediato (“bem da vida“) é a “custódia” do computador, assegurando-se-o até a quitação do devido.
O pedido imediato (conteúdo a ser disposto na sentença) é o sequestro do computador (a sua custódia até o efetivo pagamento).
Assim, conforme asserimos anteriormente, nas medidas cautelares os pedidos (imediato e mediato) são semelhantes.
Outra questão a escólio: “C” adquiriu fundo de comércio mediante o pagamento parcelado em 10 vezes; tornando-se inadimplente a partir da sexta prestação. O vendedor “Z” necessita receber e tem pressa. Se for requerida medida liminar e, ao seu deferimento preponderar a característica da urgência, provavelmente será medida cautelar.
Como segundo critério identificamos a lide principal, vale dizer, a ausência de pagamento das parcelas após a quinta. Esta é a questão principal (na verdade, esta seria a pretensão do autor e a resistência do réu = lide).
A cobrança, mediante ação condenatória, demandaria ingente interstício, sucedendo – possivelmente – a alienação do bem a outrem.
A execução do contrato exigiria a cláusula confissão de dívida, algo não pensado pelos elaboradores do contrato.
Milita a necessidade de orientação pela “lide” total. Qual a pretensão e a resistência? Seria o pagamento do fundo de comércio.
A lide é o pagamento do restante das parcelas referentes ao fundo de comércio, não se confunde com o próprio (fundo de comércio), pois parte fora paga.
Assim, identificamos a “lide” total com o pagamento do remanescente das parcelas.
A tutela provisória de urgência (liminar) irá garantir este pagamento das parcelas remanescentes, porém não incidirá sobre este pagamento (decisão da discussão total), e sim admitirá coação para o pagamento das parcelas, mediante o arresto dos bens que guarnecem o fundo de comércio.
Notem que esta liminar (tutela provisória de urgência) está fora do pedido principal que reflete a decisão da “lide” total (pagamento das parcelas remanescentes).
Reiteramos, ao fixarmos o nosso pensamento, que a tutela provisória incidirá sobre os bens que guarnecem o fundo de comércio e a “disputa” geral representa o pagamento das parcelas à quitação do débito atinente àquele fundo de comércio.
Então, a tutela provisória de urgência (sobre os bens que guarnecem o fundo de comércio) não está coarctada à “questão” geral (pagamento das parcelas faltantes), concluindo que esta (a liminar) é para assegurar o resultado da ação principal, portanto, liminar cautelar.
A ausência de “certeza” na distinção dos pedidos mediato e imediato também pode ser aferidora da caracterização das medidas liminares entre cautelar e principal.
A cotejo, asserimos que nas ações condenatórias, orientadas pelas regras da cognição, a distinção – entre pedidos mediato e imediato – emerge fácil; pois requer-se a condenação a algo (condenação ao pagamento dos lucros cessantes; dano moral, ao cumprimento de determinada obrigação etc.), sendo o conteúdo da sentença (pedido imediato) esta condenação, caracterizando o pedido imediato. Com esta condenação, obtém-se o “bem da vida“, ou seja, o pedido mediato.
Com efeito, nas ações condenatórias, orientadas pelas regras da cognição, os pedidos mediato e imediato são distintos, e esta distinção emerge mediante simples análise.
O problema surge a distinguir os pedidos imediato e mediato nas medidas cautelares, pontuando-se-a (distinção) mediante a utilização do mesmo exemplo do indivíduo que adquire o fundo de comércio enquanto paga a metade de seu valor.
Proposta a medida cautelar de arresto dos bens ou do estoque que guarnece aquele (fundo de comércio), o autor requer – ao juiz – a prolação de comando inserido na sentença (pedido imediato), arrestando os bens a garantir o pagamento das parcelas remanescentes e a concessão do pedido mediato (“bem da vida“) será o arresto dos bens. Vale dizer, não há distinção entre um e outro (pedidos mediato e imediato).
É bem verdade que “forçosamente” poderíamos encontrar, nas decisões proferidas nas medidas cautelares, certo comando declaratório, porém, ainda que assim o fosse, a declaração seria à confirmação do pedido mediato; com o mesmo resultado, ou seja, os pedidos mediato e imediato são idênticos.
Como síntese, pontuamos mais uma distinção, ou possibilidade de identificação entre liminares cautelar e na cognição (tutela antecipada). Esta (liminar na cognição com natureza de antecipação dos efeitos da tutela) não pode ocorrer nas ações declaratórias, porque este é o comando único existente na sentença, e as liminares ocorrem antes desta (sentença).
Entrementes, quando não conseguirmos distinguir os pedidos mediato e imediato, identificamos a medida liminar em cautelar, ou, quando muito, ação declaratória na cognição. Nesta, não poderia militar a tutela provisória de urgência; naquelas, a liminar restaria coarctada ao requisito urgência.
3 NAHA MIHI FACTUM, DABO TIBI IUS COMO REGRAMENTO PREPONDERANTE DA ATIVIDADE JURISDICIONAL
Temos visto inúmeras decisões que extinguem o procedimento (propalada – erroneamente – extinção do processo) sem o julgamento do mérito, negando a tutela jurisdicional àqueles que, no entendimento dos julgadores, utilizam o meio inidôneo à formulação de seus pedidos.
Assim, muitas petições iniciais eram indeferidas porque o juiz entendia que o autor deveria ter realizado o pedido por ação orientada pelas regras da cognição (tutela antecipada), quando o realizara por intermédio de medida cautelar.
Esses indeferimentos feriam o art. 2o do Código Buzaid, porque o juiz negava a prestação jurisdicional ao indivíduo, sucedâneo de seu advogado, na opinião do julgador, utilizar o meio inadequado a formular o pedido.
O novo diploma afastou esta anomalia, porém criou outras, por exemplo: a possibilidade de o autor realizar novo pedido, na mesma demanda, alterando – inclusive – causas de pedir, prostrando a ampla defesa do réu, posto causar perplexidade.
Os indeferimentos de iniciais quedavam-se lastreados em simples entendimentos distintos entre advogados e juízes. Eram reiterados nos meios forenses e restavam como anomalias da atividade jurisdicional. Esta deve legar o direito, aplicando a norma, de acordo com os fatos narrados na inicial, respeitando o regramento inerente à atividade jurisdicional: da mihi factum, dabo tibi ius.
Claro que o advogado deve pautar-se pela técnica e, como tal, preencher os requisitos insculpidos no art. 282 do revogado Código de Processo Civil, ou seja, apresentar “os fatos e fundamentos jurídicos do pedido“; o correto endereçamento; a qualificação completa das partes e o pedido certo e determinado, com o valor da causa etc. Mas, a partir dos fatos e dos fundamentos jurídicos do pedido, bem como deste (pedido), a ação nutrirá identidade, possibilitando ao Estado-juiz julgar o pedido.
Ainda se o advogado do autor utilizar o meio inidôneo, equivocando-se quanto à medida, se articular o pedido e os motivos deste, bem como os demais requisitos inerentes à inicial, cumprindo o determinado pelos arts. 319 e 320 do Código de Processo Civil de 2015, o juiz deverá adequá-los à medida que entenda pertinente, sob pena de macular o regramento da prestação jurisdicional: naha mihi factum, dabo tibi ius.
Não bastasse a imperiosidade do sistema à nossa pontuação, asserimos que a definição da medida pelo nome implica em conferir tipicidade às ações, concebendo-se-as em sua acepção civilista, havia tempo banida do Direito Processual.
É dizer, ação é o meio de concitar a atuação do Estado-juiz. Para os processualistas pátrios, a ação transforma-se em processo após a citação válida do réu. Para nós, louvando-nos em Luís Eulálio Bueno Vidigal, asseveramos que a ação é o exercício da jurisdição, ela (a ação) conduz o pedido até o seu julgamento final. Porém ambas doutrinas concebem-na como o poder de concitar a atividade jurisdicional.
Se a ação é este poder de concitar a atuação imparcial do Estado-juiz, (ela) não pode restar atrelada a procedimentos específicos. Utilizando as palavras de nosso algoz Flávio Luiz Yarshell: “não há ações típicas“, porque a ação emerge sempre mediante o poder de concitar o Estado a atuar como terceiro desinteressado, o que altera são os procederes, esses são distintos.
Vale dizer, impetrado o mandado de segurança à reintegração de funcionário público, caso decaia (para a impetração milita prazo de 120 dias) do direito, poderá manejar outra ação colimando a reintegração do servidor.
Neste sentido intuiu Flávio Luiz Yarshell [18], identificando profusão de procedimentos à obtenção da mesma tutela jurisdicional, diferentemente ao ocorrido no período das legis actiones em Roma. Naqueles idos, havia único e específico proceder à obtenção da proteção do magistrado, representante do Rex.
4 O AUTOR DEFINIA A NATUREZA JURÍDICA DA LIMINAR, FULCRANDO-SE NA QUESTÃO PRINCIPAL
Asserimos, em alguns trabalhos de somenos importância, que seria o autor, ao pleitear a tutela jurisdicional, que determinaria a natureza jurídica da liminar, caso fosse.
É dizer, ao identificar os pedidos imediato (conteúdo da sentença) e mediato (“bem da vida“, alvo da tutela jurisdicional), o autor poderia definir se a liminar nutriria natureza jurídica cautelar ou anteciparia os efeitos da sentença na cognição.
Asseveramos que o autor, ao identificar a lide, objeto da busca pela tutela jurisdicional, define se a liminar está na própria ação ou manejará medida específica para tutelar o direito a ser perseguido por outra ação.
A isso, pontuamos que as cautelares não discutem a questão principal. Esta (a “lide” total entre as partes) somente pode ser versada por intermédio da ação principal, que incoa orientada pelas regras (processo) da cognição ou da execução.
Aqui, diminuta digressão a esclarecer a definição de lide e escoliar o fato de a maioria versá-la como disputa judicial, na verdade, como sinônimo de “mérito”.
Francesco Carnelutti, o idealizador da lide, definiu-a como: “o conflito de interesses, qualificado por pretensão resistida (cognição) ou insatisfeita (execução)“.
A lide antecede a propositura da ação, quando inserta nesta, transforma-se em mérito. Imaginamos que milite colisão de trânsito. “R” avançou o semáforo desfavorável e provocou acidente de pequena monta no veículo de “Z“. Este aceitaria – apenas – que “R” lho oferecesse as peças danificadas. Mas “R” resistiu à pretensão de “Z“.
Formada a lide, esta é o objeto da propositura da ação, ou seja, a pretensão de “Z” (pagamento das peças) e a resistência de “R“.
Ao elaborar a petição inicial, quedando-se junto com “Z“, seu cliente, este aduziu que agora necessita do pagamento total do conserto, não aceita apenas as peças, porque esta emergiu mediante o seu declínio para facilitar o claudicado acordo.
Assim, a anterior lide, que era diminuta, agora emerge ampliada pela vontade de “Z” de ser ressarcido pela totalidade dos prejuízos suportados, inclusive pintura das peças e lucros cessantes. Com a resposta de “R” aos termos da inicial, esta lide transforma-se em mérito, podendo ser ampliada pela discussão entre as partes (mérito), ou quedar-se reduzida (mérito), por exemplo, se “R” concordar em pagar as peças, porém não concorda em pintar o veículo. Neste caso, o mérito da ação (dito do processo), queda-se com o mesmo conteúdo à lide, que antecedeu a propositura da ação, porém emergiu ampliada em decorrência do quixote do autor.
Mas importa, neste momento, distinguir mérito e lide. Esta antecede à propositura da ação e lega ensejo à busca pela prestação jurisdicional, no dizer de Francesco Carnelutti.
A confusão fora praticada por Liebman, que versou a lide endoprocessual, e o jurisfilósofo Alfredo Buzaid, homenageando o Mestre, em alguns poucos artigos, fez constar a lide endoprocessual, por exemplo: “o julgamento antecipado da lide“. Claro que, neste caso, tentou ser didático, pontuando lide como questões tormentosas existentes na ação. Porém todos os demais doutrinadores intuíram a lide endoprocessual, desdizendo a definição do gênio Francesco Carnelutti. E agora é moda asserir “lide“, considerando-se o mérito, ou seja: endoprocessual, vale dizer, o conjunto de questões a serem resolvidas pelo Estado-juiz.
Retornando ao tema das distinções entre tutela provisória de urgência de natureza cautelar ou antecipação dos efeitos (tutela antecipada), esta conferida na cognição, digamos que “A” e “B” contraiam obrigações. Caso “B” não remunere os serviços prestados por “A“, este poderá promover ação para receber o devido. Porém, se “B” tentar alienar os seus bens para alterar o seu domicílio, “A” poderá propor medida cautelar, narrando os fatos e pleiteando o deferimento de liminar de arresto para garantir o futuro pagamento a ser discutido em ação principal. Esta (a lide total = deve – ou não – pagar) será discutida mediante ação orientada pelas regras da cognição. A medida cautelar pleiteará – apenas – a garantia ao futuro pagamento.
A isso repristinamos todas as assertivas anteriores: as medidas cautelares não discutem a lide principal.
Entrementes, a causa principal poderá não restar atinente à mesma medida, neste caso (medida liminar distinta da lide principal), com natureza jurídica cautelar.
Sempre a tutela provisória de urgência com natureza cautelar está fora do conjunto de questões entre as partes, ou seja, não está afeta ao pedido principal.
Geralmente, a tutela provisória de urgência com natureza cautelar serve para assegurar a decisão acerca do pedido principal, que será conduzido por ação orientada pelas regras (processo) da cognição ou execução. Com o novo diploma, permitiu-se a inserção de novo pedido e causas de pedir na mesma demanda. Aliás, perigo à garantia fundamental de ampla defesa, porque ao réu não será conferida estabilidade na prestação jurisdicional.
Mas aqui interessa o nosso vaticínio, praticado havia mais de década, acerca de o autor definir a natureza jurídica da liminar (naqueles idos, agora tutela provisória de urgência), pois, se colacionasse a “lide” principal, não poderia pleitear a tutela provisória de urgência por meio de medida cautelar. É dizer, as medidas cautelares não poderiam discutir a causa principal, porque não são satisfativas, situação que não está afeta a bens.
Asserir satisfatividade representa o exaurimento da discussão entre as partes, nunca a entrega do “bem da vida“.
5 “TUTELAS ANTECIPADAS TÍPICAS” E LIMINARES ATÍPICAS NA COGNIÇÃO
A propalada “tutela antecipada” não foi criada – conforme já o dissemos – pela reforma processual que grassou a partir de 1994. Esta – apenas – ampliou a possibilidade de concessão de liminares no processo de conhecimento, concebendo-se-as às ações condenatórias, em situações atípicas.
Escoliando o parágrafo anterior, asserimos que, em 1969, conforme o Decreto-Lei nº 911/1969, já se permitia a concessão de liminar – hoje: tutela provisória de urgência – em processo de conhecimento, natureza jurídica da tutela de busca e apreensão de automotor, a denominada “alienação fiduciária“. Porém, esta liminar, permitida pelo art. 3o da mencionada norma, emergia com previsão legal, conotando a tipicidade à concessão de liminares.
Asseveramos que a previsão da norma a casos específicos tornam típicas as liminares, vale dizer, se a lei confere a oportunidade àqueles casos específicos, a liminar (tutela provisória de urgência) emerge típica.
Assim o fora nos casos supervenientes a 1969, traduzidos pela genialidade do Mestre Buzaid, que cuidou de conceber liminares em tutelas possessórias; na Lei do Inquilinato, anterior à Lei nº 6.649/1979; ao mencionado Decreto-Lei nº 911/1969 etc.
Teori Albino Zavascki vaticinou que os casos típicos (previamente imaginados pelo legislador e, insculpidos na norma, fulcrados procederes específicos) de concessão de liminares na cognição nutririam natureza jurídica de (liminares em) ações executivas lato sensu. Estas (liminares na cognição) são típicas porque o legislador tratou de nominá-las, determinando os requisitos inerentes ao deferimento, os atos de seu procedimento específico e o tipo de tutela que poderia – o Estado-juiz – prestar.
O mérito de Teori Albino Zavascki fora identificar as liminares produzidas em processo de conhecimento, concebendo-se-as como ações executivas lato sensu.
Mas o doutrinador gaúcho, que infelizmente nos deixou neste início de 2017, equivocou-se enquanto generalizou, asserindo que toda a liminar na cognição seria realizada em ação executiva lato sensu.
A isto presta-se o presente escólio, vale dizer, a reforma processual de 1997 não criou a “tutela antecipada“, denominação comum às liminares em processo de conhecimento, mas ampliou a possibilidade de sua concessão (liminares na cognição) em casos genéricos, criando, consequentemente, liminares em ações condenatórias.
Estas (as liminares em ações condenatórias) não são típicas, porque são concebidas – genericamente – sem previsão específica.
Para distinguirmos esses dois casos (liminares típicas, produzidas nas ações executivas lato sensu e aquelas criadas pela reforma processual que grassou a partir de 1994, ou seja, a possibilidade genérica de obter liminar em ação condenatória), utilizamos novamente as tutelas possessórias, situação que o autor poderá obter medida liminar se a turbação ou o esbulho datar a menos de ano e dia, presentes os requisitos específicos.
Então, pleiteando a tutela possessória, portanto, caso específico (proteção à posse), cumpridos os requisitos, o autor poderá obter a proteção a sua posse. Neste caso, tutela possessória conferida por intermédio da ação executiva lato sensu.
Nisto o acerto de Teori Albino Zavascki, o excelente doutrinador que, tornado Ministro, não mereceu os mesmos elogios conferidos pela lavra doutrinária (esqueceu-se da garantia fundamental do contraditório às delações, a permitir a participação do incriminado desde o primeiro depoimento contrário a seus desígnios, conforme pontuamos em: “A ação penal sem limites, apanágio da teoria geral do processo – também – profligada por Rogério Lauria Tucci” (Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal, n. 99, dez. 2016)); mas identificou a natureza jurídica das liminares concebidas em processo de conhecimento, considerando os casos típicos que incoam mediante ritos especiais, emergindo em ação executiva lato sensu.
Mas a notícia da reforma da década de 1990 conferiu a possibilidade de concessão de liminares em casos não específicos, desde que cumpridas algumas determinações, generalizando – a tal – para resolver o problema das ações condenatórias. Aliás, o problema do Judiciário queda-se à ação condenatória, mediante o rito ordinário, (esta) a vilã, tornando morosa a obtenção da tutela jurisdicional.
Reiteramos os escólios acerca da distinção entre cautelares e antecipação dos efeitos da tutela, desenvolvendo o raciocínio com base na história, a reforma processual que grassou a partir de 1994 e protraiu-se, principalmente a 1997.
Reafirmamos que as medidas cautelares são exteriores à ação principal, porque pedido e causas de pedir quedam-se distintos. Mas o legislador de 2015 plasmou os institutos (liminar na cognição e medidas cautelares), apesar das mencionadas distinções.
Escoliamos a tutela antecipada, asserindo que esta conferiu a possibilidade de conceder liminares em sede de ação condenatória, mitigando o maior problema enfrentado pelo Judiciário (as ações condenatórias, que incoavam por intermédio do procedimento ordinário, sempre foram as mais morosas à obtenção da proteção jurisdicional).
Notem que o legislador de antanho, o gênio processualista de Alfredo Buzaid, inseriu no Código de Processo Civil de 1973 possibilidades de o Estado-juiz conceder liminares em ações principais, ou, melhor dizendo: liminares (tutela provisória de urgência) na cognição.
Conferiu esta possibilidade ao autor que demonstrasse a pertinência do direito alegado, preenchendo alguns requisitos definidos em tutelas especiais (e específicas). Como tutelas específicas, citamos a proteção à posse (erroneamente denominada ação possessória). A tutela é possessória, não a ação, que, neste caso, é (ação) executiva lato sensu, segundo a excelente lavra de Teori Albino Zavascki.
Então, aos procedimentos especiais, pelos quais se desenvolvem os pedidos de proteção possessória, conduzidas pela ação executiva lato sensu, o Professor Buzaid conferiu a possibilidade de antecipar os efeitos da concessão do pedido a ser positivado pela sentença. Mas a esta antecipação coarctou os procedimentos especiais; determinadas tutelas (busca e apreensão de veículos, possessórias etc.), e ao cumprimento de requisitos.
A possibilidade de concessão de liminares em ação principal, ou melhor, em processo de conhecimento, antes da reforma que grassou a partir de 1994, emergiu – única e exclusivamente – em ações executivas lato sensu.
A antecipação dos efeitos da tutela introduzida pela reforma de 1997, especificamente pela Lei nº 9.494/1997, permite a concessão de liminares em ação condenatória, com o escopo de mitigar os problemas do Judiciário, atacando esta ação em decorrência de a obtenção do “bem da vida” quedar-se morosa.
Reiteramos, a reforma que introduziu a propalada tutela antecipada permitia a concessão de liminares em processo de conhecimento, especificamente na ação condenatória, tentando mitigar a morosidade à obtenção do “bem da vida“.
Então, o legislador de 1997 permitiu a concessão de liminares em ações condenatórias, desde que cumpridos os requisitos insertos no art. 273 do Código Buzaid, senão:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou […].
Encerramos este tópico com a assertiva: o texto, do revogado diploma, permitia a concessão de antecipação – total ou parcial – da proteção (tutela) formulada na petição inicial, desde que preenchidos alguns requisitos; considerando-se, principalmente, a existência de prova acerca do direito alegado na inicial, restando – o Estado-juiz – convencido de ser verdadeira a alegação, seriam as tutelas provisórias de urgência em sede de cognição, a erroneamente denominada: “tutela antecipada“.
O instituto da tutela antecipada encontrava-se sob a epígrafe do processo de conhecimento. Aliás, especificamente acerca dos procedimentos orientados pela cognição, conforme dessumimos do “Título VII – Do Processo e Do Procedimento, Capítulo I – Das Disposições Gerais” do revogado diploma. Porém, neste Código de 2015, o legislador tratou de juntar os dois institutos sob o mesmo título.
6 A EQUIVOCADA TENTATIVA DE PLASMAR INSTITUTOS (CAUTELAR E TUTELA ANTECIPADA)
Animou-nos a lavra deste texto, reaproveitando partes de outros artigos, sucedâneo da ausência de descortino do legislador do novo diploma, porque não há escólios a distinguir a tutela provisória de urgência com natureza cautelar, da liminar (tutela provisória de urgência) conferida em sede de processo de conhecimento, principalmente em ações condenatórias.
O art. 303 do Código de 2015 distingue a tutela provisória de urgência com natureza de (tutela) antecipada, daquelas obtidas mediante o manejo das medidas cautelares, considerando-se o termo “contemporânea“, ou seja, impondo a contemporaneidade da distribuição da ação com a urgência. Situação muito tênue à distinção.
Permite o aditamento de pedidos e causas de pedir a evitar que o autor do pedido de urgência tenha de promover a ação principal em sede cautelar, porque essas são exteriores.
Note que o legislador enveredou a alterar completamente o curso do Processo Civil pátrio, trocando a opção pela teoria da substanciação por individuação da ação, somente – repisamos – a evitar que o autor da tutela provisória de urgência promova a “ação exterior“.
Sintetizando os tópicos anteriores, em busca de fixarmos as distinções entre ambas e, principalmente, criticarmos o escopo de plasmar os dois institutos, reiteramos que a tutela antecipada não poderia ser interpretada como medida cautelar, principalmente porque já existia (1973) texto semelhante sob o pálio do Livro IV (processo cautelar). Outro tanto, considerando-se que as medidas cautelares quedavam-se dispostas a partir do art. 796 do revogado diploma, emergindo desnecessária – e incongruente – a reiteração do texto sob o pálio do “Livro II – Processo de Conhecimento, seção dos ritos comuns – ordinário e sumário“.
O novo diploma tratou a tutela antecipada (liminar concedida em ação condenatória, emergindo sem tipicidade) com base na contemporaneidade do problema por ocasião da propositura da ação, senão:
Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.
- 1º Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo:
I – o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar […].
No caso de antecipação dos efeitos da tutela (concessão do pedido mediato antes da sentença), a tutela provisória de urgência queda-se concedida no próprio processo de conhecimento, desde que cumpridos alguns requisitos.
Interessa a característica desta tutela de urgência, vale dizer; na inicial, o autor pontua os fatos, causas de pedir e pedido. Antes da sentença, o Estado-juiz concede o pedido mediato, antecipando-se-o ao autor, desde que preenchidos os requisitos.
Note que a tutela provisória de urgência, neste caso, é interior a ação. Nada emerge alterado, o pedido, já constante na inicial, apenas queda-se concedido antes da sentença, sucedâneo da prova inequívoca da veracidade do direito alegado.
De outra banda, versou as cautelares como se afetas à questão principal, plasmando regramentos, como se as cautelares fossem interiores à cognição, por exceção à execução. Outro tanto, abandonou a orientação secular acerca do Direito Processual Civil, que, até agora, vigia sob o manto da teoria da substanciação da ação.
Alhures, afirmamos acerca de o legislador de 2015 permitir que militasse aditamento ao pedido e causas de pedir, após a concessão da tutela provisória de urgência. Esta anomalia queda-se ingente, considerando-se as medidas cautelares, apesar de também permitidas em sede de “tutela antecipada“.
Lastreados no art. 308 do CPC de 2015, reafirmamos os equívocos do legislador, que, ao respigar do art. 806 do Código Buzaid, impôs a apresentação do pedido principal na mesma ação. Aliás, dispôs sem técnica, não excogitou possível má-fé do autor ou mácula à garantia fundamental de ampla defesa.
Note o equívoco do legislador a mitigar o formalismo (talvez louvando-se na balela da “instrumentalidade do processo“, panaceia copiada dos italianos por pretenso criador do Direito Processual Civil pátrio e fomentador da teoria geral do processo), permitiu aditamentos do pedido e causas de pedir, a dificultar a defesa do réu, senão:
Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de trinta (30) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas custas processuais.
Os tópicos anteriores serviram a destacarmos que as cautelares quedam-se exteriores ao pedido principal. Retomamos os mencionados exemplos, ou seja, versando a aquisição do fundo de comércio, o qual o interessado pagou – apenas – cinquenta por cento (50{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6}) do total.
Se o autor quisesse obter a tutela provisória de urgência, esta não se poderia quedar afeta ao fundo de comércio, porque a pessoa pagou cinquenta por cento (50{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6}) de seu valor.
A própria relação jurídica, neste caso, determina que a tutela provisória de urgência emerja exterior à questão principal. Qual a questão principal? O pagamento do restante do fundo de comércio. Tirante a emissão de título executivo extrajudicial que ensejaria a execução imediata, a tutela de urgência deveria assegurar o resultado útil. É exterior à discussão principal.
A escólio, sugerimos novo exemplo, agora, considerando-se a aquisição de computador ou automóvel e o pagamento de cinquenta por cento (50{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6}) do total, possível tutela provisória de urgência emergiria exterior à questão principal. Esta seria o recebimento do restante do objeto; porém, para assegurá-lo, poderia ser sequestrado (tutela provisória de urgência típica – sequestro – cautelar) o bem (computador ou automóvel).
Entrementes, são infinitos os exemplos, os quais a cautelar serve a assegurar o resultado útil, emergindo exterior ao “processo principal“, que se quedaria orientado pelas regras da cognição ou da execução.
Mas o legislador de 2015 acabou com isto.
Reiteramos o asserido alhures, o vigente Código de Processo Civil plasmou cautelar e “tutela antecipada“, permitindo aditamentos à inicial (na verdade, solicitando escusas, asserimos que a própria ação pode ser alterada, não simples aditamentos às causas de pedir e pedidos).
Certa vez, a caminho do exame proposto pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional São Paulo, onde examinaríamos, nas diversas bancas formadas pelo preclaro coordenador Advogado Antonio Di Franco, o qual exornou este comando por mais de 20 anos com ingente maestria, asserimos ao preclaro examinador Advogado Francisco Lobo da Costa Ruiz que o Processo Civil é do autor. Naquela oportunidade, comentamos que o réu possuía – apenas – trinta por cento (30{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6}) de chance de obter a improcedência do pedido do autor.
Com as mencionadas alterações, as chances do réu diminuíram para dez por cento (10{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6}), caso o advogado do autor nutra boa experiência.
Esta grassará mediante o pedido de tutela provisória de urgência com natureza cautelar e, mesmo se esta não for concedida, o autor poderá alterar pedido e causas de pedir, marginalizando a inicial defesa do réu.
Note que, na sentença, o Estado-juiz analisará as circunstâncias de dois tipos de “processos” (cautelar e cognição ou execução) ou, sob o nosso signo, julgará com base em dois tipos de regramentos (claro que as cautelas não se caracterizam por ser processo, porque dependentes, porém militam especificidades, conforme alhures afirmamos) distintos (processos).
Antes, o Estado-juiz concedia, ou não, a liminar em sede cautelar e, com a propositura da ação principal, despachava, anunciando que grassaria a praticar atos no “processo principal“.
A ação “principal” emergia orientada pelas regras (processo) da cognição ou da execução, caracterizando a liminar por ser exterior a esta ação “principal“.
O autor da cautelar deveria cumprir os requisitos inerentes a essas (cautelares), e a ação principal, geralmente orientada pelas regras da cognição, deveria observar a lógica da argumentação desenvolvida na cautelar. E, ao final, o juiz julgaria ambas simultaneamente.
O novo diploma permite que “liminar“, mediante a nomenclatura de tutela provisória de urgência com natureza cautelar, seja obtida e, subsequentemente, o autor altere pedido e causas de pedir.
Esses textos encontram-se sob a epígrafe da tutela provisória de urgência, por exemplo: art. 308 do Código de Processo Civil de 2015, senão:
Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de trinta (30) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas custas processuais.
E, tentando plasmar as características de distintos institutos, asseriu, no art.
Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.
- 1º Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo:
I – o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar […].
Com o escopo de tornar semelhantes as tutelas provisórias de urgência, o desinformado legislador de 2015 permitiu aditamentos – também – à “tutela antecipada“, distinto do texto de antanho.
Entrementes, o § 5º ao mencionado art. 273 do Código Buzaid afirmava:
Art. 273. […]
[…]
- 5º Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.
Vale dizer, o pedido de liminar, e possivelmente a sua concessão, no processo de conhecimento, quedava-se definido na inicial, não incentivando aditamentos.
Agora, além de permitir aditamentos, em sede cautelar, incentiva a própria alteração da ação (pedido e causas de pedir), determinando ao Estado-juiz que julgue, considerando dois regramentos distintos (cautelar e cognição ou execução).
A este epílogo, importa destacar que as regras inerentes à cautelar reclamam o periculum in mora e o fumus boni juris, ou, mais amplo: a medida exterior ao principal a assegurar – simplesmente – o resultado útil.
Quanto a este (resultado útil), a pueril observação, neste Código de 2015, de – também – a tutela antecipada versar, no próprio texto da lei, esse resultado útil.
É esse resultado útil o colimado pelas medidas cautelares, mediante especificidades.
Com efeito, torna-se vã a tentativa de plasmar regramentos, posto que a tutela antecipada não colima o resultado útil. Antecipa a entrega do pedido mediato, porque emerge evidente a plausibilidade do articulado direito, e, em decorrência da verossimilhança, quedar-se-ia torpe conceder o pedido mediato somente após anos de pendenga.
Assim ocorre nas tutelas possessórias, nos casos de “alienações fiduciárias” e, mais recentemente, sem tipicidade na cognição, por exemplo, quando, “[…] existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou […]“; este último texto transcrito do art. 273, inciso I, do Código Buzaid, que a própria doutrina refutou a inicial argumentação acerca de caracterizar os requisitos inerentes as cautelares.
As obras doutrinárias que emergiram a partir de 1997, tentando encontrar a natureza jurídica de cautelar à tutela antecipada, foram lidas de cabeça para baixo pelo legislador de 2015, porque – agora – são as cautelares que se tentam travestir de “tutela antecipada“. E, como diria o excelente comediante Agildo Ribeiro, enquanto “defendia tese” no programa humorístico Planeta dos Macacos: “um horror, bye Maria“.
Na verdade, bye a todos, “parem o trem da modernidade do Processo Civil! Queremos descer”.
[1] Operadores do Direito é expressão anômala, pessimamente criada, pois não define o escopo de seu criador, ou seja, excogitaram serem juízes, advogados e promotores; porém, restaria mais afeta a doutrinadores.
[2] Ressalvamos que, até hoje, as Cortes Superiores (STJ e STF) costumam identificar como cautelares, toda medida que houver pedido de liminar, assim ocorrendo quando versados mandados de segurança e ordem de habeas corpus. Quando, na verdade, as liminares a esses procedimentos são conferidas em razão do direito em causa, não em decorrência do critério urgência.
[3] Assim emergem as liminares em sede de mandado de segurança, com base na relevância, cumprindo os ditames do art. 7o, inciso II, da Lei nº 1.533/1951.
[4] Na primeira edição de nosso livro de prática de processo penal, com o título Prática de processo penal – Manual de estruturações de petições por ex-examinador da OAB, em 1991, mencionávamos que não poderia ser considerado o critério urgência como preponderante ao deferimento de medidas liminares em ordem de habeas corpus.
[5] Aduzia o art. 928 do revogado Código de 1973: “Art. 928. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração; no caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada”. Reportando-se, como complemento ao noticiado, o art. 924 do CPC de 1973, senão: “Art. 924. Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas da seção seguinte, quando intentado dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho; passado esse prazo, será ordinário, não perdendo, contudo, o caráter possessório”.
[6] Insculpido no sentido de existente; ou seja, o pedido realizado (existente) na inicial. Insculpido, de acordo com o Dicionário Michaelis, quer dizer: “Esculpir em; gravar”.
[7] Asserimos: “bem da vida” e o desatento leitor pode imaginar que este representa o aspecto patrimonial. Diferentemente, asseveramos que bem da vida é o objeto pleiteado perante o Estado-juiz que não se traduz, especificamente, em patrimônio; pode ser uma declaração, ou a desconstituição do contrato de casamento, por meio do pedido de divórcio.
[8] A ação é promovida contra o Estado-jurisdição, não contra a outra parte. Esta – simplesmente – emerge citada para defender-se. Esse tecnicismo fora intuído pelo próprio Jurista Alfredo Buzaid, em seu excelente trabalho acerca da ação declaratória.
[9] “12ª Vara Cível, Autos nº 04.008801-4. Vistos. Juvenal […] moveu ‘ação’ cautelar de sequestro em ‘face’ […] Fundamento e decido. Segundo se depreende da inicial, a ordem liminar pretendida pelo requerente é a de recuperação de posse de bem móvel, com o cunho nitidamente satisfativo, afigurando-se inadequada a via eleita, notadamente ante o disposto no art. 273 do CPC. […] Destarte, manifesto o descabimento da providência postulada, impondo-se a extinção ‘do processo’ […] Christina Agostini Spadoni. Juíza de Direito.” Se perdurasse o entendimento da insciente juíza, deveríamos rasgar as páginas do CPC que conferem a propositura da medida cautelar de sequestro. Neste caso, a lide total era o pagamento de cinquenta por cento (50{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6}) – apenas – do bem. Fora pleiteado o sequestro do bem material a garantir futura execução do contrato ou dos cheques. Ou ainda, a discussão acerca do pagamento (ou não) do bem. Porém, a medida cautelar não traria a lide principal, apenas possibilitaria a constrição do bem à garantia de futura execução.
[10] Aduzia o art. 806 do CPC de 1973: “Art. 806. Cabe à parte propor a ação, no prazo de trinta dias, contados da data da efetivação da medida cautelar, quando esta for concedida em procedimento preparatório”.
[11] Sempre negamos, louvando-nos em Rogério Lauria Tucci, esta definição absurda de processo como relação jurídica entre os sujeitos do procedimento em contraditório, mormente, fosse assim, não militaria processo na administração pública. Absurdo de inscientes. Já em 1999, em nosso: “Os modelos (políticos) de persecuções penais e o descortino da regra da inquisitividade. A incidência do contraditório no inquérito policial” (SP: Edmor), sustentávamos que militaria contrassenso caso a definição de processo fosse vinculada à incidência do contraditório. Naquela oportunidade, porque defendíamos a incidência deste às investigações preliminares coligidas ao inquérito policial, porém este não seria processo, e sim sob a nossa égide: procedimento jurisdicionalizado mediante a incidência – repisamos – do contraditório. Competiu ao nosso Introdução ao estudo do processo. Profligando uma teoria geral (SP: Edmor, 2001) a definição de processo como conjunto de regras. Agora, 17 anos depois de nossa definição, quase 30 de nossas críticas, Flávio Luiz Yarshell (aquele que nos conferiu nota 3 em sede de concurso público, talvez a esconder o passado, porque a nota 9,9 já destronaria o candidato, 3 emergiria possível somente a inimigos capitais, considerando-se – inclusive – que, naqueles idos, este modesto escritor já possuía cinco livros de sua lavra e atuava há – pelo menos – 15 anos como professor) publicou artigo noticiando superveniente alteração dos “martelados” – e absurdos – conceitos.
[12] Dar-se-á o arresto, nos termos do art. 813 do CPC de 1973: “Art. 813. O arresto tem lugar: I – quando o devedor sem domicílio certo intenta ausentar-se ou alienar os bens que possui, ou deixa de pagar a obrigação no prazo estipulado; II – quando o devedor, que tem domicílio: a) se ausenta ou tenta ausentar-se furtivamente; b) caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar bens que possui; contrai ou tenta contrair dívidas extraordinárias; põe ou tenta por os seus bens em nome de terceiros; ou comete outro qualquer artifício fraudulento, a fim de frustrar a execução ou lesar credores; III – quando o devedor, que possui bens de raiz, intenta aliená-los, hipotecá-los ou dá-los em anticrese, sem ficar com algum ou alguns, livres e desembargados, equivalentes às dívidas; […]”.
[13] Ocorrerá a medida cautelar de sequestro, nos termos do art. 822 do CPC de 1973: “Art. 822. O juiz, a requerimento da parte, pode decretar o sequestro: I – de bens móveis, semoventes ou imóveis, quando lhes for disputada a propriedade ou a posse, havendo fundado receio de rixas ou danificações; II – dos frutos e rendimentos do imóvel reivindicando, se o réu, depois do condenado por sentença ainda sujeita a recurso, os dissipar; III – dos bens do casal, nas ações de desquite e de anulação de casamento, se o cônjuge os estiver dilapidando; […]”.
[14] À discussão fomentada pelo autor, ao propor a ação, emergiu como relevante ao direito, possibilitando que o Estado-juiz antecipe a concessão do “bem da vida” antes da decisão final, para evitar a ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação, evitando que a dialética permitida pela cognição exauriente resultasse na perda do objeto. No entendimento da doutrina majoritária, o termo “lesão de difícil reparação” representava a urgência ao deferimento da liminar.
[15] Aduz o art. 798 do Código de Processo Civil: “Art. 798. Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação”.
[16] O art. 799 do Código de Processo Civil noticia: “Art. 799. No caso do artigo anterior, poderá o juiz, para evitar o dano, autorizar ou vedar a prática de determinados atos, ordenar a guarda judicial de pessoas e depósito de bens e impor a prestação de caução”.
[17] Constrição é a limitação, a vinculação, significa vincular a um dos órgãos do Poder Judiciário determinado bem, sempre mediante a prestação jurisdicional, após o pedido da parte.
[18] Respondendo a José Carlos Barbosa Moreira – não com a propriedade de Flávio Luiz Yarshell – que a tese deste acerca da atipicidade das ações importa ao Direito Processual, no mínimo, para esclarecer a alguns desavisados que não devem escrever na inicial: “ação de despejo por falta de pagamento”, conforme pontuamos no terceiro capítulo de nosso Prática de processo civil – Manual de estruturações de petições por ex-examinador da OAB (SP: Paz Jurídica, 2006). Asserimos algoz, ao nosso querido Flavinho, porque sempre o admiraremos como ex-colega de pós-graduação, hoje renomado professor titular da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – USP, e notável identificador da tipicidade das ações em sede civil, enquanto profligou os ditames do art. 75 do revogado Código Civil. Tirante, por óbvio, a nota 3 ministrada pelo nosso ex-colega, em concurso público à docência, cientes de que a nota 9,9 já emergiria a reprovar o candidato. É que o passado, geralmente, importuna as pessoas. Talvez com este escopo suportamos candentes críticas ao nosso Introdução ao estudo dos processos. Profligando uma teoria geral. Claro que nutrimos ciência de nossa limitação, mas a nota 3 não milita a parâmetros, apenas a menoscabos pessoais. Agora, só falta o Flavinho escrever que a melhor definição de processo emerge mediante “o conjunto regras orientadoras à obtenção da tutela jurisdicional”, depois de tanto profligar a nossa doutrina escandida em: Introdução ao estudo dos processos. Profligando uma teoria geral (SP: Edmor, 2001). É que o Jornal Carta Forense colacionou o novo pensamento do professor titular de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da USP que, depois das candentes críticas durante 17 anos, confirmou que deve rever os conceitos da famigerada teoria geral do processo.