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ESCLARECIMENTOS SOBRE A IMPARCIALIDADE DO JUIZ NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO

ESCLARECIMENTOS SOBRE A IMPARCIALIDADE DO JUIZ NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO

Gisele Leite

 

A figura do juiz em diversos aspectos representa a jurisdição, sendo o juiz um delegado do Estado na atuação de função jurisdicional[1]. Mas sublinhe-se que exerce funções específicas do Estado, pertencendo à categoria profissional dos funcionários públicos lato sensu.

Porém, em razão de elevada relevância dessas funções exercidas, para as quais se exigem especiais garantias que lhe assegurem a mais plena independência, sendo mesmo considerado funcionário público sui generis, daí se justificar a sua não suspeição ao Estatuto dos Funcionários Públicos.

Assim se regem as condições de sua investidura, atribuições e condições do exercício da função jurisdicional pelas leis da organização judiciária, cujas fontes e diretrizes são ditadas pela Constituição Federal brasileira vigente.

Ao disciplinar a independência do Judiciário além de estar constitucionalmente assegurada por meio de garantias como a irredutibilidade, a inamovibilidade e a vitaliciedade das quais decorrem diversos direitos que somados a outros, que lhes são específicos os provenientes da sua condição de servidor do Estado, que são estabelecidos pelo texto constitucional ou ainda pelas leis de organização judiciária.

O juiz e as partes são os sujeitos principais da relação jurídica processual. Dentre os sujeitos, no entanto, como órgão que desempenha o papel preponderante, o juiz ocupa ou exerce pelo menos a figura central do processo (ou pelo menos foi assim durante muito tempo), sendo chamado por Chiovenda de coluna vertebral da relação processual.

JÁ Manzini e Frederico Marques apontaram-no como o sujeito mais eminente da relação processual, e Carnelutti salientou que se distingue das partes não apenas pelos poderes que lhes são atribuídos, mas, particularmente, pela posição superior a elas.

É compreensível a predominância do juiz em razão do contexto processual e, como órgão do Estado que exerce o poder jurisdicional, no interesse da coletividade, qual seja, a de compor a lide, conforme a vontade da lei.

A relação processual instaura-se com a finalidade de se alcançar a prestação jurisdicional num caso concreto, extraindo, pela subsunção da norma genérica e abstrata, a norma in concreto traduzida na decisão judicial, promovendo e assegurando a paz social, a soberania da lei, o interesse das partes, sobrelevando-se o interesse público norteado pelos princípios de justiça.

Por essa razão que se legitima a concessão de vastos e amplos poderes sem os quais não seria possível conhecer, decidir, dar execução, resguardar e ainda tutelar os interesses dos litigantes.

Porém, no exercício de tais poderes, o juiz coloca-se entre e acima das partes, como órgão desinteressado, tudo no sentido de prover o estrito cumprimento do dever jurisdicional.

Já com o advento do Código de Processo Civil de 2015, permanece o juiz como ente desinteressado e que obrigatoriamente deve ser desimpedido e insuspeito, o que torna patente ser imparcial.

Tecnicamente a imparcialidade do julgador corresponde ao pressuposto processual[2] subjetivo, sem o qual o processo é nulo, ou, pelo menos, anulável[3].

A natureza jurídica das nulidades é controvertida: para uns doutrinadores, é vício ou defeito correspondendo a uma falha, uma imperfeição que poderá tornar ineficaz o processo, seja no todo ou em parte; já para outros doutrinadores, a nulidade corresponde a uma sanção, importando que o ato irregular declarado nulo, se considerado em si e para todos os feitos, será tido como não realizado.

Porém, há duplo aspecto sobre a nulidade. O primeiro para indicar o motivo que torna o ato imperfeito e o outro para expressar a consequência que deriva da imperfeição jurídica do ato ou sua inviabilidade jurídica. Portanto, a nulidade, a um só tempo, é vício e sanção.

A causa justificadora da existência das nulidades advém da necessidade de que a marcha processual transcorra em consonância com as formalidades exigidas para os atos processuais, já que estas exprimem as garantias às partes de um processo apto, regular e justo para galgar seu desiderato supremo, que é de trazer a lume a verdade substancial contida no caso concreto.

A nulidade relativa é aquela que viola a exigência fixada por legislação infraconstitucional, no prevalente interesse das partes. A formalidade é essencial ao ato, posto que visa resguardar o interesse de um dos litigantes, não tendo um fim em si mesma.

A nulidade relativa é capaz de gerar prejuízo, dependendo do caso concreto, sendo interesse da parte arguir; assim, a invalidação do ato fica condicionada à demonstração de efetivo prejuízo, além da arguição do vício em momento processual oportuno.

A nulidade absoluta refere-se a uma formalidade violada, não está estabelecida simplesmente em lei, havendo uma ofensa direta e frontal ao texto constitucional vigente, particularmente precisamente aos princípios constitucionais do devido processo legal (ampla defesa, contraditório, publicidade, motivação das decisões judiciais e juiz natural etc.). Atende as exigências que se vinculam ao interesse da ordem pública do que propriamente no das partes; por essa razão, o prejuízo é presumido e sempre ocorre.

Além disso, a nulidade absoluta também prescinde de alegação pelos litigantes e jamais preclui, podendo ser reconhecida ex officio pelo juiz, em qualquer fase do processo e em qualquer instância.

Trata-se de nulidades insanáveis e que jamais precluem. A única exceção é prevista pelo enunciado da Súmula nº 160 do STF que proíbe o Tribunal de reconhecer ex officio nulidades absolutas ou relativas existentes, em prejuízo do réu.

De qualquer forma, a nulidade absoluta exige um pronunciamento judicial sem o qual o ato produzirá os seus efeitos.

Boa parte da doutrina enquadra a imparcialidade do juiz na categoria de pressupostos processuais de validade, inclusive negando valor aos atos praticados por autoridade judiciária reconhecidamente parcial, ou seja, aquela que seja suspeita ou impedida.

Porém, tal entendimento não é isento de críticas, sendo fundamental uma tomada de posição sobre o tema, posto que sejam sérias e graves as consequências que derivam da atuação parcial da autoridade judiciária.

Segundo Eduardo Couture, os pressupostos processuais que os define como sendo os antecedentes necessários para que o processo tenha existência jurídica e validade formal. Os pressupostos processuais representam circunstâncias que devem ser examinadas previamente pelo juiz, antes mesmo de qualquer pronunciamento sobre o mérito da causa, já que, sem estes, não seja possível haver o desempenho eficaz e ético da função jurisdicional.

Classicamente se costuma dividi-los em duas categorias, a saber: os pressupostos processuais de existência do juízo, como a propositura da demanda judicial, um órgão dotado de jurisdição e partes que se apresentem como sujeitos de direitos; já os pressupostos de validade de juízo, como, por exemplo, a competência do órgão jurisdicional, a regularidade de representação da parte e a imparcialidade do juiz.

Reconhece-se que, sem os primeiros pressupostos citados, o processo propriamente e tecnicamente não existe, daí não se pode esperar ipso facto um provimento judicial sobre o meritum causae; sem a presença dos segundos, o processo é existente, porém não é válido, havendo a necessidade, nesse caso, de haver um pronunciamento jurisdicional ao menos para sanar as nulidades encontradas.

Através da natural e habitual clareza de Liebman, recorda que não se pode cogitar simplesmente em pressupostos do processo, mas antes pressupostos de um processo regular, ou seja, idôneo e suficiente a ensejar o exercício eficaz do poder jurisdicional. Um processo subsiste ainda quando ausentes os pressupostos de sua validade, e é neste mesmo que se irá examinar a sua presença ou ausência.

Assim, se ausente um pressuposto necessário à validade do processo, este afinal se torna irregular e inválido, impedindo, destarte, o conhecimento e a decisão de mérito. Evidentemente, tais pressupostos processuais não devem ser confundidos com as denominadas exceções dilatórias, as quais, segundo a antiga doutrina, apenas dilatavam a necessidade de responder no mérito e suspendiam o exercício da ação.

Chiovenda, por sua vez, qualifica os pressupostos processuais como as condições para obtenção de um pronunciamento qualquer, favorável ou desfavorável sobre o pedido contido na demanda; já as condições da ação[4] são aquelas necessárias para a obtenção de pronunciamento favorável.

A saudosa e querida Professora Ada Pellegrini Grinover, além de Araújo Cintra e Cândido Rangel Dinamarco, enquadraram na categoria de pressupostos processuais apenas o pedido formulado da parte, a capacidade de quem o formula e a investidura do destinatário do pedido (juiz), afirmando ainda Arruda Alvim que os pressupostos relativos ao juiz são apenas a competência absoluta e a imparcialidade, esta entendida em stricto sensu, na ausência de impedimento.

Analisando rigorosamente os significados outorgados aos pressupostos processuais, o também saudoso e ilustre José Carlos Barbosa Moreira concluiu não ter maior sentido o seu enquadramento como categoria jurídica. Justificou, desta forma:

Se é verdade que “a utilidade prática da reunião de várias figuras sob o mesmo rótulo consiste em permitir o tratamento em conjunto: o que se disser de substancial acerca de qualquer delas poderá dizer-se de todas“, também é certo que, quando se diz “que determinado requisito é pressuposto processual, a rigor é pouquíssimo o que se fica sabendo a seu respeito“, já que a própria divergência existente entre os vários regimes específicos de pressupostos processuais põe às claras o caráter heterogêneo e a escassa coesão interna da categoria.

Entende que o reconhecimento da suspeição do juiz, por iniciativa sua ou mediante provocação da parte, só implicará o afastamento da autoridade judiciária da presidência do processo, em nada atingindo a validade dos atos por ele até então praticados – ressalvados aqueles que o foram indevidamente após a suspensão do processo, em desobediência ao disposto no art. 306 do Código de Processo Civil de 1973. Quanto ao impedimento, lembra de ser rescindível a sentença proferida por juiz impedido, daí extraindo a conclusão de que, nesse caso, existiria nulidade (apenas da sentença, não de todo o processo) antes do trânsito em julgado.

O exame até aqui feito das diversas correntes e tendências doutrinárias é suficiente para a constatação da existência de fundadas dúvidas envolvendo não apenas a qualificação jurídica dos pressupostos processuais, como, também, da pertinência ou não da inserção da insuspeição do juiz nessa categoria.

Mas quer se enquadre a imparcialidade no rol dos pressupostos processuais de validade do processo, quer se entenda que ela representa um requisito específico e necessário para o válido julgamento do pedido formulado pela parte, o fato é que a lei impõe a presença de uma autoridade judiciária isenta, distanciada dos interesses particulares em conflito, assegurando assim não só a probidade da atividade jurisdicional, mas, sobretudo, a segurança dos provimentos através desta obtidos.

Conforme recorda Micheli, a lei preocupa-se não somente em assegurar, no plano jurídico, a independência funcional do juiz, como também a sua independência quanto às influências estranhas, e, justamente para assegurar de fato essa independência, o sistema legal impõe-lhe a obrigação de abster-se de julgar quando existam determinadas circunstâncias, taxativamente previstas, sob pena de, não o fazendo, poder ser recusado por qualquer das partes.

Verifica-se que a referida imparcialidade do julgador pode ser arranhada ou até totalmente desaparecer em virtude de situações relacionadas ao processo e envolvendo a pessoa do juiz, incompatibilizando-o para a presidência do feito, pois não basta ao juiz ser competente para julgar a demanda; deve, igualmente, ser compatível com a causa. A compatibilidade do juiz é, pois, a decorrência de sua condição de terceiro desinteressado, atuando superpartes, em caráter substitutivo e subsidiário.

Por conta da destacada superioridade do juiz na relação jurídica processual colocando-se acima das partes, isso levou grande parte da doutrina a proclamar ter sido instituído, no processo brasileiro, o juiz autoritário, uma espécie de dono do processo.

Efetivamente, a concepção publicista do processo conforme a qual este é instrumento da jurisdição, e não mero instrumento das partes (como concebia a teoria privatista), acarretou a majoração de poderes do juiz, a fim de habilitá-lo cabalmente a ser gestor do processo de uma forma a conseguir adequada e justa pacificação social.

Em verdade, ao juiz inerte, ao juiz passivo de outros tempos, substituiu-se o juiz ativo, proativo, conforme bem compreende a doutrina contemporânea, instituindo-o como sujeito predominante e proeminente da relação processual e conforme desenvolve as amplas e variadas atividades não só quanto ao ordenamento do processo, como, ainda, no que toca à instrução do processo e à formação do material de convicção necessário para as suas decisões judiciais.

Ao juiz é atribuído o poder de dirigir o processo por forma que assegura o andamento célere, mas sem prejuízo da defesa dos interessados, quando lhe são atribuídos poderes de iniciativa até mesmo na colheita das provas.

Os poderes do juiz eram fixados no art. 125 do CPC/1973, que estão atualmente disciplinados pelo art. 139 do CPC/2015, que informa, in litteris:

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:

I – assegurar às partes igualdade de tratamento;

II – velar pela duração razoável do processo;

III – prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias;

IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;

V – promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais;

VI – dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito;

VII – exercer o poder de polícia, requisitando, quando necessário, força policial, além da segurança interna dos fóruns e tribunais;

VIII – determinar, a qualquer tempo, o comparecimento pessoal das partes, para inquiri-las sobre os fatos da causa, hipótese em que não incidirá a pena de confesso;

IX – determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais;

IX – determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais;

X – quando se deparar com diversas demandas individuais repetitivas, oficiar o Ministério Público, a Defensoria Pública e, na medida do possível, outros legitimados a que se referem o art. 5º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, e o art. 82 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, para se for o caso, promover a propositura da ação coletiva respectiva.

Parágrafo único. A dilação de prazos prevista no inciso VI somente pode ser determinada antes de encerrado o prazo regular.

Por outro viés, no fundo, a mais ampla liberdade para formação de sua convicção quanto aos fatos da causa, mas que lhe impõem a motivação do seu convencimento, o que foi reforçado pelo Código Fux, que passou a exigir uma fundamentação mais específica e adequada nas decisões judiciais, sob pena de nulidade do processo.

Outros poderes do juiz fazem ainda do julgador brasileiro uma prevalente figura e protagonista da relação processual, traduzindo-se num Magistrado ativo, mas não propriamente autoritário, e sim um julgador que exerce os poderes atribuídos por lei e conforme a lei, concretizando o devido processo legal.

Em resumo, as atividades do juiz[5] regem-se especialmente pelo princípio da legalidade. Os pressupostos processuais referentes ao juiz são os requisitos necessários à existência e validade da relação processual.

Exige-se que seja o órgão estatal investido de jurisdição, que tenha a competência absoluta (que é a medida de jurisdição) e, finalmente, que seja imparcial.

Como órgão do Estado, faz-se indispensável que nessa função tenha sido investido, atendendo, assim, ao fundamental princípio da jurisdição, que é o princípio da investidura.

O juiz, no Direito brasileiro, é o juiz constitucional, ou seja, natural posto que seja o órgão judiciário, com o poder de julgar derive de fontes constitucionais.

Lembremos que existem órgãos judiciários monocráticos como os juízos singulares representados por uma pessoa física. E, ainda, existem os órgãos coletivos ou colegiados, os tribunais que foram criados e estruturados pelas leis processuais e as de organização judiciária, com base na fonte constitucional, que, para terem capacidade de ser sujeitos da relação processual, deverão estar legitimamente investidos do poder jurisdicional.

É inseparável da figura do juiz o seu caráter de órgão imparcial, situado entre e acima dos litigantes. A primeira é condição para que o juiz exerça suas atividades na relação processual com integral e manifesta imparcialidade.

É pressuposto da relação processual e se diz que o órgão judicante deve ser subjetivamente capaz.

A incapacidade subjetiva do juiz afeta diretamente a relação processual, seja por ser suspeito de parcialidade, ou mesmo impedimentos, que significam a proibição de exercer funções no processo.

Quanto aos tribunais, acrescenta-se mais um impedimento previsto no art. 136 do CPC/1973, quando houver entre dois ou mais juízes a relação de parentes consanguíneos ou afins, em linha reta e, mesmo, no segundo grau na linha colateral, o primeiro que conhecer da causa no tribunal impede que o outro participe do julgamento, caso em que o segundo se escusará, remetendo o processo ao seu substituto legal.

Já mais adiante, no art. 135 do CPC/1973, trata-se propriamente da suspeição em que há situações nas quais se reputa fundada a suspeita de parcialidade do juiz. Acrescente-se que o parágrafo único ainda prevê que poderá o juiz se declarar suspeito por motivo íntimo.

O que permite ao próprio julgador, em quaisquer das hipóteses arroladas, dar-se por impedido conforme o art. 137 do CPC/1973.

E se a parcialidade for do Tribunal ou da maioria absoluta do Tribunal[6]? Não há um procedimento definido.

O STF que julgará a arguição e, se for o caso de o tribunal ser considerado parcial, a própria causa. O art. 148 do CPC/2015 ainda prevê a parcialidade do membro do Ministério Público, dos auxiliares da justiça e dos demais sujeitos imparciais do processo. E não suspende o processo.

A decisão sobre a parcialidade do juiz é uma decisão de mérito. A questão, quando resolvida, deve tornar-se indiscutível não apenas para o processo em que foi proferida, mas também para outros, em que a mesma situação se repita (mesmas circunstâncias de fato e de direito). Logo, portanto, quando o juiz receber a causa em que exista a situação que já fora reconhecida como apta a gerar sua parcialidade, deve declarar-se suspeito ou impedido.

Observa-se ainda que o impedimento afeta a capacidade do juiz de modo absoluto, e a manifestação nesse sentido torna-se imprescindível, porquanto a sentença de mérito que viesse a proferir seria anulável, ainda que transitada em julgado, por via de ação rescisória.

O antigo art. 137 do CPC/1973 configurava para o juiz o dever de abstenção. Mas, se for a hipótese de suspeição propriamente, também deverá o próprio juiz denunciá-la e declará-la.

Principalmente quando for por motivo íntimo, percebe-se nitidamente que nessas hipóteses as partes não se encontraram geralmente em condições de conhecer da suspeição.

Cumpre destacar as distinções entre impedimento e suspeição: elas se diferenciam de acordo com o nível e a intensidade de comprometimento que o julgador tem com a causa e que pode prejudicar sua imparcialidade.

De fato, no impedimento há presunção[7] absoluta ou juris et jure de parcialidade de juiz, enquanto que na suspeição vige apenas uma presunção relativa ou juris tantum.

A imparcialidade do juiz é um dos pressupostos processuais subjetivos do processo, e as causas de impedimento e suspeição são elencadas no CPC.

O CNJ informa que, conforme prevê o CPC, um juiz declara-se impedido de julgar certo processo por critérios objetivos. Quando só existem razões subjetivas que possam comprometer a parcialidade do julgador, este deve declarar-se suspeito.

O juiz também deve se considerar impedido de julgar caso tenha dado sentença ou decisão quando a ação tramitava na primeira instância, se tiver atuado como mandatário de qualquer uma das partes envolvidas na disputa, perito, órgão do Ministério Público, ou ainda se tiver prestado depoimento como testemunha do caso.

Segundo o art. 11 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, os impedimentos constitucionais e legais, assim como as suspeições observadas pela magistratura, valem para todos os conselheiros.

E a regra também se aplica aos seis conselheiros que não são Magistrados: dois dos quinze conselheiros são indicados pelo Ministério Público, outros dois representam a OAB, um é indicado pela Câmara dos Deputados e o outro pelo Senado Federal.

Um dos deveres dos conselheiros do CNJ é comunicar, motivada e imediatamente à Presidência, impedimentos e suspeições, de acordo com o art. 18 do Regimento Interno. A única exceção prevista é quando o julgamento tratar de atos normativos, como as resoluções do Conselho.

Os critérios subjetivos que determinam a suspeição do juiz incluem ser “amigo íntimo ou inimigo capital“, “herdeiro presuntivo (tido como tal), donatário ou empregador” de uma das partes do processo.

Também se deve considerar suspeito o juiz que tiver aconselhado uma parte a respeito da causa ou aquele que estiver interessado em julgamento favorável a uma das partes. A norma prevê também que o juiz possa alegar “motivo íntimo” para declarar-se suspeito.

Segundo o lendário Pontes de Miranda[8], é uma enumeração taxativa. Porém, Calmon de Passos entende que o rol de impedimentos não é exaustivo, posto que englobe toda a situação em que exista uma incompatibilidade lógica entre a função de julgar e decidir e o papel do juiz no processo, mesmo que ainda não prevista expressamente naqueles dispositivos legais.

A propósito, o impedimento é arguível a qualquer tempo, jamais precluindo, daí se constituir como fundamento para ação rescisória, posto que seja matéria de ordem pública.

Conforme lecionou Couture, os cidadãos ou jurisdicionados não possuem direito adquirido quanto à sabedoria do juiz, mas têm direito adquirido quanto à independência, à autoridade e à responsabilidade do juiz.

Ademais, é dever do Magistrado declarar-se impedido ou suspeito, podendo, inclusive, alegar motivos de foro íntimo. Assim, para o juiz não preclui o dever de se declarar suspeito ou impedido.

As regras sobre impedimento e suspeição, tanto no Código de Processo Civil (CPC) como no Código de Processo Penal (CPP), diferem ligeiramente, chegando até mesmo os institutos a mudarem de nome de um Código a outro (o que é suspeição num Código pode ser impedimento num outro, e vice-versa).

Tomemos, como exemplo, para auxiliar-nos na análise sobre a parcialidade do tribunal, uma reportagem da Folha de São Paulo do dia 02.10.2010 intitulada “Genro de ministro atuou para ex-senador“, na qual se relata que este afim do Ministro Ayres Britto teria cobrado honorários de vulto para defender um ex-senador barrado pela Lei da Ficha Limpa (LC 135/2010)[9].

Segundo trecho da reportagem in litteris:

No ano passado, Britto foi sorteado relator de um inquérito no Supremo que investiga Expedito. Uma semana depois, Borges entrou na causa e obrigou o ministro a se declarar impedido.[10]

A melhor resposta, a dar-se uma leitura sistemática ao nosso ordenamento jurídico, é que os advogados impedidos de atuar por parentesco não poderão fazê-lo no STF enquanto o ministro que causar a vedação não se afastar do Tribunal.

O STF tem apenas 11 (onze) ministros. A composição do STF é informação notória, facilmente consultável no site do STF. Qualquer advogado, ao atuar no STF, sabe que tem 1/11 de chances de que seu processo será relatado por um dado ministro. Não há surpresas…

Além do mais, os ministros do STF não têm substitutos, ao contrário dos juízes de primeira instância ou de tribunais ordinários.

Um parente de ministro que atue como advogado no STF sabe de forma inequívoca que o ministro em questão não poderá ser relator ou mesmo votar no que caso em que atue, com graves prejuízos à formação do quórum de votação, ou mesmo afastando compulsoriamente um ministro cuja posição é conhecida por seus muitos votos e opiniões.

Em determinadas votações relevantes no STF, como a de matéria constitucional (art. 22 da Lei nº 9.868/1999, RISTF, art. 143, parágrafo único), o quórum é de oito ministros, ou de 2/3 dos ministros (art. 8º da Lei nº 9.882/1999, que trata da arguição de descumprimento de preceito fundamental [ADPF]).

Apesar de significar uma drástica medida para advocacia, conclui-se que os parentes de ministros do STF não poderão advogar perante aquela egrégia Corte enquanto nele atuar o parente causador da vedação.

Crucial diferença é a existente quanto à classificação técnica do impedimento que corresponde à questão de ordem pública que pode ser arguida a qualquer tempo no processo, posto que inocorra a preclusão e, assim, acarreta a nulidade do processo.

A suspeição é questão de ordem privada, posto que arguida pelo litigante em preliminar da defesa[11], o que pode ser em contestação ou em contrarrazões, e se submete ao regime de preclusão. Além de somente acarretar a anulabilidade do processo, pode até salvar-se os atos processuais já realizados e que não configurem parcialidade do juiz e prejuízo à parte que arguiu tal suspeição.

Frise-se ainda que, mesmo quando o juiz não se declarar impedido ou mesmo suspeito, poderá a parte obstar a sua participação no processo, o que era feito por meio da exceção de suspeição ou de impedimento (que foram extintas pelo CPC vigente).

Esse direito pode ser exercido em qualquer tempo, grau de jurisdição, o que antes poderá ser feito no prazo de quinze dias, a contar do fato que ocasionar o impedimento ou a suspeição, conforme o CPC/1973 no art. 305.

Dentro do rol de supressões trazidas pelo CPC/2015, ao tratar o princípio da identidade física do juiz[12], além do fato de que o novo Codex, que não reiterou todos os dispositivos que abordavam a diferenciação conceitual dos prazos, não determina que a distinção simplesmente tenha desaparecido, sendo necessária a manutenção da distinção, inclusive para que se possa realmente reconhecer que a maioria dos dispositivos recentemente trazidos que estabelecem prazos sejam passíveis de prorrogação, salvo manifestas exceções em que o prazo deve ser entendido como peremptório.

A ratio do novo sistema processual vigente coloca, em linhas gerais, o nivelamento e aproximação do Magistrado para com as partes, sugerindo, inclusive, a realização de três audiências antes da prolação de sentença, a saber: a primeira, a audiência inicial para acordo ou mediação e contestação; a segunda, a audiência de saneamento para eventual prosseguimento do processo dentro dos termos ajustados; e, finalmente, a audiência de instrumento e julgamento, para a coleta, especialmente, da prova oral.

Observa-se, pois, que o Magistrado realiza tais movimentos em busca da cognição exauriente da causa, mantendo-se, dessa forma, no controle do feito, ao menos a partir do saneamento, com a postura ativa, até o final da prolação da decisão final e do encerramento de sua jurisdição.

Ressalte-se outrora a exceção de suspeição, quando se aponta para concreta suspeita de parcialidade que pode ser feita não somente em face do juiz, mas também em face do Ministério Público, contra o escrivão, oficial de justiça e até serventuário, contra o perito nomeado para atuar na causa.

É direito dos litigantes, em matéria civil, ou mesmo o acusado, em matéria penal, e quiçá mesmo indiciado em inquérito policial ou administrativo.

Registrem-se variadas razões que podem fundar a suspeita. Embora possa ocorrer por motivo superveniente, quando a ação já se encontrava em curso, e aí possa ser alegada em matéria de defesa, em regra, a antiga exceção de suspeição deveria ser proposta no início da lide, antes que o juiz ou o órgão suspeito atue no feito, a fim de que não se configure haver sido o ato inicialmente aceito.

E, nesse particular, outra distinção se instaura entre impedimento e suspeição: a primeira é inaceitável, enquanto que a segunda é tolerável, podendo ocorrer a presunção tácita relativa de aceitação da parte.

No passado, a exceção de suspeição podia ser oposta pelo juiz, de ofício, ao tomar conhecimento do processo, quando pelo réu deverá ser levantada após a citação, como a matéria preliminar. Se, feita pelo autor, deve ser feita logo que seja distribuída a ação, antes que se promova a citação do réu.

Era a exceção de suspeição processada em apenso aos autos principais da causa, com a suspensão da mesma na hipótese de recebimento.

O impedimento do juiz pode ser entendimento como obstáculo judicial resultante de fato de ordem material, como pode ser consequente de regra legal, que veda o juiz executar o ato, cuja prática lhe é defesa ou simplesmente proibida.

No primeiro caso, o impedimento é resultante de fatores materiais de natureza variada, como moléstia, motivos de força maior, acúmulo de serviço, enfim, de qualquer contingência que venha interceptar ou embaraçar a prática do ato forense, conforme estava determinado.

No segundo caso, o impedimento não será mero obstáculo judicial, mas uma proibição para que se pratique o ato processual, até que se decida sobre a matéria contida no processo. Em regra, decorre de suspeição ou da incompetência.

As hipóteses de impedimento haverá quando o juiz for parte ou houver intervindo anteriormente no processo a qualquer título, quando nele figurar ou intervir a qualquer título o cônjuge ou parente, mesmo que representante de pessoa jurídica.

Haverá a suspeição quando o juiz for amigo íntimo ou inimigo capital, credor, devedor, herdeiro, donatário ou empregado de qualquer das partes, seus cônjuges ou parentes quando aconselhar qualquer das partes sobre a causa ou, por qualquer meio, demonstrar seu interesse nela, sempre em relação à parte e não seus advogados.

A doutrina comentava que o art. 135 do CPC/1973 é taxativo quanto ao rol das hipóteses, contemplando apenas quando existir ligação entre o juiz e a parte, de modo que não constitui motivo de suspeição a ocorrência de quaisquer possibilidades legais se configuradas com relação ao advogado (TJSC, ES 2002.159-15-3, 3ª CDC, Rel. Des. Fernando Carioni, J. 24.04.2003 e, no mesmo sentido, TJPA, ES 36.483)[13].

Tais prescrições quanto ao impedimento ou suspeição são exaustivas, não se admitindo interpretação extensiva.

A arguição do impedimento ou da suspeição podem ser suscitados a qualquer tempo ou grau de jurisdição, sendo cabível mesmo em procedimentos de jurisdição voluntária.

Tais incidentes processuais passaram a ser internas questões preliminares da defesa, cabendo ainda proceder a juntada de documentos, arrolamento de testemunhas e, sendo o caso, o instrumento procuratório sem a necessidade de poderes específicos, de modo que não se constitui motivação para suspeição quando da ocorrência de quaisquer possibilidades legais, se configurado mediante pagamento de custas atuadas em apenso à principal mesma ação cautelar preparatória (TJSC, ES 2002.15915-3, Rel. Des. Fernando Carioni, J. 24.04.2003).

Chama-se de excipiente aquele que ajuizava a exceção e de excepto aquele que figura no seu polo passivo, o demandado. Se a arguição for relacionada ao juiz de tribunal, sempre com efeito suspensivo.

O exame da tempestividade da contestação juntada ao processo deve ser feito de ofício a qualquer tempo, sendo desnecessário o requerimento da parte.

Não está obrigado o Magistrado a se manifestar sobre a questão, se o processo não se encontra saneado e tem seu processamento sobrestado por ajuizamento de exceção de suspeição[14].

Recurso provido parcialmente para que a réplica seja considerada tempestiva, sendo juntada aos autos da ação civil pública, que deverá retomar seu normal processamento assim que julgada a exceção de suspeição respectiva (TJDF, AI 715996, Relª Nancy Andrighi, DJ 26.02.1997).

A suspensão do processo impede a prática de atos decisórios, exceto os atos de urgência, para evitar o perecimento do direito a ser tutelado em tese, e se prolonga até a definição da decisão do juiz, no primeiro grau, ou do relator, perante o Juízo ad quem, não mais cabendo arguição da exceção se já foi proferido o seu voto, sendo certa a interposição de recurso especial ou extraordinário não em condão de manter a suspensão.

Entretanto, poderia a parte interessada requerer e possivelmente conseguir efeito suspensivo, seja diretamente ao relator do recurso especial ou do recurso extraordinário, conforme previa o art. 558 do CPC/1973, caso admitido o recurso, e em processamento, seja por medida cautelar direta ao STJ ou STF, a depender da matéria questionada, por regra de competência funcional, quando urgente a pretensão de manutenção de suspensividade reclamada.

O prazo ordinário para seu ajuizamento foi mantido e é de quinze dias fluindo para o autor da data de distribuição; para o réu, o mesmo prazo para a defesa, ou por ambos, da data de ocorrência do fato superveniente ensejador da arguição ou, em segundo grau, da intimação da pauta de julgamento, observando-se os arts. 188 e 191 do CPC/1973.

Lembremos que as hipóteses de impedimento e de suspeição são taxativas[15], não comportando a interpretação extensiva, conforme já exposto, de modo que enseja a rejeição liminar a exceção fundamentada em itens que não estão tipificados pelos dispositivos processuais.

Reconhece-se a suspeição ou impedimento em qualquer grau de instância; os autos devem ser remetidos ao substituto legal daquele juiz definido como suspeito ou impedido, permanecendo o processo sob registro e responsabilidade da secretaria do mesmo juízo originário.

Se a exceção foi suscitada pelo réu, a fluência ao seu prazo para contestar terá reinício a partir da intimação da decisão que a rejeitou, em primeiro ou segundo graus, porém, se acolhida a arguição, o prazo remanescente seguirá da intimação da decisão ordinatório do novo juiz da causa.

A suspeição, portanto, é matéria relativa, que, se não for arguida no momento oportuno, leva à preclusão e à aceitação da imparcialidade do juiz, ou dos demais excepcionáveis, enquanto que o impedimento já corresponde a matéria de ordem pública, não estando sujeita a preclusão.

Convém ainda sublinhar que os mesmos motivos de impedimento e suspeição cabem ser suscitados em face do Ministério Público ou serventuários da justiça, ao perito e aos intérpretes, cabendo ao litigante arguir na primeira oportunidade que tiver (somente quanto a suspeição), posto que o impedimento jamais preclui.

Note-se, in casu, que a exceção não teria efeito suspensivo, quando for atuada nos autos principais decidindo o juiz após ouvido o excepto, com o prazo de cinco dias e eventual instrução, sempre por Decisão terminativa.

Ensina o notável doutrinador baiano Fredie Didier Junior que existem cinco mitos sobre os pressupostos processuais que devem ser arduamente combatidos.

O primeiro mito é o que refere que nem toda falta de pressuposto processual leva ao juízo de inadmissibilidade do processo. É o caso de incompetência, cujo reconhecimento acarreta a remessa dos autos ao juízo competente e, ainda, no impedimento ou suspeição, cujo reconhecimento acarreta a remessa dos autos ao juiz substituto (vide art. 146, § 5º, CPC/2015).

O segundo mito é o que cogita que nem toda falta de pressuposto processual pode ser conhecida de ofício. É o caso da incompetência relativa na existência de convenção de arbitragem e na falta de autorização do cônjuge para propositura da ação real imobiliária (art. 1.650 Código Civil brasileiro).

O terceiro mito alega que nem toda falta de pressuposto processual pode ser conhecida a qualquer tempo ou grau de jurisdição. É o caso da alegação de convenção de arbitragem e na alegação de falta de citação; se o réu contestar e não a alegar, ocorrerá naturalmente a preclusão.

Lembremos que existe valorização da preclusão em razão do princípio e garantia constitucional da duração razoável do processo, o que foi enfatizado ainda mais pelo CPC de 2015, juntamente com o princípio da primazia do julgamento do mérito, que recomenda a maior sanabilidade do feito processual.

Extremamente coerente é a frase de Miguel Reale, in litteris: “A vida do direito é o diálogo da história“. Temos que o estudo e a pesquisa da origem do processo e a gênesis do princípio da duração razoável do processo marcam um momento histórico crucial, pois constroem as conexões que unem o conceito de vida, Estado e processo.

Com a criação do Estado Liberal, a partir do século XIX, após a formação dos Estados Nacionais – em que o poder era do soberano, mas estava sujeito às tradicionais limitações.

A vida social era fracionada por categorias que reprovavam a descentralização do poder de julgar, o que justificou a preconização da concentração do poder e também desencadeou uma gama infinita de organismos e regras, embora todos pudessem se reportar diretamente ao rei; este não poderia julgar a todos igualmente, pois cada estamento social possuía peculiarmente a sua própria.

A origem do Estado Liberal, enfim, trouxe a esperança de igualdade e cidadania, rompendo os paradigmas precedentes e ampliando os direitos para alcançar todas as classes sociais de forma uniforme e equânime.

É fato que o triunfo do Estado Liberal significou a perspectiva de universalização da cidadania, em que todos são iguais perante a lei, e a lei, por sua vez, será uma só para todos.

Advém da Magna Carta de 1215, em seu § 40, in litteris: “A ninguém venderemos, negaremos ou retardaremos direito ou justiça“. O que foi ratificado pela Convenção Europeia (1950), em seu art. 6º, § 1º:

Direito a um processo equitativo. 1. Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de caráter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela.

No mesmo sentido, fora formulado na Convenção Interamericana sobre Direitos Humanos, ou mais conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, na qual o Brasil é signatário.

Compreende-se que, na evolução histórica, um dos mais importantes direitos individuais é o referente à garantia da correta administração de Justiça, e, no que se refere aos instrumentos protetivos contra os abusos de poder, o que corresponde ao direito a um juízo justo ou a um processo equitativo, igualmente chamado de direito ao devido processo, ou direito a um processo regular previsto no art. 8º do Convênio Americano de Direitos Humanos.

Tal materialização principiológica só se deu no ano de 2004 por meio da Emenda Constitucional nº 45. Além da celeridade processual, clama-se também, de forma expressa, a razoabilidade processual; alguns tratados como a Convenção Europeia e a Convenção Interamericana sobre Direitos humanos versaram sobre, em suas entrelinhas, o direito fundamental de um processo razoável.

Particularmente após a difusão da doutrina de Ronald Dworkin[16], que se deu no final da década de 1980 e continuou ao longo da década de 19990, o tema galgou maior desenvolvimento dogmático. E, na sequência histórica, Dworkin ordenou a teoria dos princípios em categorias mais próximas da perspectiva romano-germânica.

Os princípios consignam normas em que se imprimem decisões políticas fundamentais, confirmando certos parâmetros, tal como a república, o Estado Democrático de Direito e a federação.

Luiz Roberto Barroso nos ensina que a perspectiva de princípio assemelha-se aos valores os quais devem ser analisados e interpretados em consonância e proporcionalmente em razão de sua dimensão ética, neste caso a dignidade da pessoa humana, a segurança jurídica e a razoabilidade.

O doutrinador e atual ministro do STF ainda expõe que a definição do princípio é muito semelhante à dos fins públicos, objetivos jurídicos a serem tutelados e efetivamente exercidos pelo Poder Público, tal como o desenvolvimento nacional, a busca do pleno emprego e a extinção da pobreza.

A soma da revolução do direito canônico, das revoluções iluministas e ainda a criação do Estado Neoliberal perfez o coeficiente histórico obtido na Declaração Universal dos Direitos do Homem.

E, ao final da Segunda Grande Guerra Mundial, o mundo preocupou-se em enfocar os conceitos concebidos pelo Iluminismo e, até então, olvidados em face do capitalismo ortodoxo e selvagem.

A razoável duração do processo caminha nos limites da linha dos direitos fundamentais, sendo que, como exemplificado nos processos legislativos ditatoriais, a função e utilização da celeridade processual sem o menor controle e a análise de suas consequências e perspectivas podem resultar em um coeficiente grave com amplitude desconstitucionalizadora dos fins estatais do processo.

O quarto mito aduz que nem toda falta de pressuposto processual é defeito que não possa ser corrigido. Ao revés, a regra é a de que se deve aplicar, do exame dos pressupostos processuais, o sistema de invalidades do CPC, segundo o qual se deve buscar sempre a correção do defeito proces­sual, mesmo que se refira à falta de um pressuposto processual.

É o que nos informa o princípio da primazia da decisão de mérito em face das invalidades processuais.

O quinto e derradeiro mito é o que informa que nem toda falta de pressuposto processual impede realmente a decisão de mérito. Aliás, o art. 488 do CPC/2015 determina que, mesmo quando houver defeito no processo, o juiz não deve levá-lo em consideração, se a causa puder ser julgada no mérito em favor daquele que se beneficiaria com a decisão de inadmissibilidade.

De sorte que, se a petição for inepta em razão da existência de um pedido indeterminado (art. 330, § 1º, II, do CPC/2015), mas a demanda puder ser julgada improcedente, o juiz deve ignorar o defeito e julgar o mérito.

A imparcialidade é, pois, requisito processual de validade, portanto o ato do juiz parcial é ato que pode ser invalidado.

E existem dois graus de parcialidade, a saber: o impedimento e a suspeição. A parcialidade é vício que não gera a extinção do processo: uma vez verificado o impedimento ou a suspeição do Magistrado, os atos do processo devem ser remetidos ao seu substituto legal.

Os atos decisórios praticados devem ser invalidados. Importante recordar, por oportuno, que a imparcialidade e a competência são pressupostos processuais relativos ao órgão julgador que derivam da garantia fundamental do direito ao juiz natural.

O incidente de arguição de impedimento ou suspeição é a forma estabelecida em lei para afastar o juiz da causa, por faltar a imprescindível imparcialidade que representa o pressuposto processual subjetivo referente ao juiz.

Registre-se que tal suspeição ou impedimento estende-se à testemunha, que se dá por incidente de contradita, regulado pelo art. 457, § 1º, do CPC, com a ressalva do § 4º do art. 148.

O Enunciado nº 234 do STJ[17] aplica-se por analogia ao Ministério Público, quando autor, no processo civil.

A imparcialidade do julgador é requisito processual de validade, portanto, o ato do juiz parcial é ato que pode ser invalidado.

A parcialidade como vício não gera a extinção do processo, pois o processo deve ser encaminhado ao seu substituto legal. Os atos decisórios praticados devem ser invalidados, no caso de suspeição ou de impedimento (art. 146, § 7º, do CPC/2015).

As hipóteses de impedimento no art. 144 do CPC dão ensejo à nulidade do ato, posto que exista uma presunção legal absoluta[18] de que o Magistrado não tenha condições subjetivas para atuar com imparcialidade no processo.

É vício que pode ser alegado a qualquer tempo e grau de jurisdição; à arguição de impedimento não se aplica o prazo de quinze dias úteis previsto no art. 146 do CPC/2015, além de poder ser reconhecido ex officio pelo juiz.

E ressalte-se que o impedimento é vício tão grave que admite até mesmo a futura ação rescisória, conforme prevê o art. 966, II, do CPC vigente, pois se conclui que toda condução procedimental restou comprometida.

Quanto às hipóteses de suspeição previstas no art. 145 do CPC/2015, dão azo à invalidade do ato processual praticado pelo juiz suspeito.

Sucede que, neste caso, embora o Magistrado possa reconhecer-se suspeito (art. 145, § 1º, do CPC/2015), a parte tem, pois, prazo preclusivo para arguir suspeição (quinze dias úteis) e pedir a nulificação do ato.

É o que não tem a presunção absoluta de parcialidade, mas, por ser menos grave, sequer autoriza uma futura rescisória.

A suspeição erige apenas uma situação de dúvida quanto ao bom procedimento do julgado, ou do Ministério Público, ou relator ou perito. Já nos casos de impedimento, há presunções legais de parcialidade e se referem às situações que apontam claramente para a parcialidade do julgador.

O art. 146, § 7º, do CPC/2015 resolveu uma remota polêmica, pois havia quem entendesse como invalidável a decisão apenas no caso de impedimento. Mas não era essa a melhor interpretação, e já havia dispositivos normativos do CPC de 1973 que apontavam para a solução ora positivada no CPC de 2015.

O art. 285 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF) menciona, in verbis: “Afirmada a suspeição pelo arguido, ou declarada pelo Tribunal, ter-se-ão por nulos os atos por eles praticados“.

Os arts. 279 e 280 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ) além do art. 229: “Reconhecida a procedência da suspeição, se haverá por nulo o que tiver sido processado perante o ministro recusado, após o fato que ocasionou a suspeição. Caso contrário, o arguente será condenado ao pagamento de custas“.

O art. 101 do Código de Processo Penal brasileiro: “Julgada procedente a suspeição, ficarão nulos os atos do processo principal, pagando o juiz as custas, no caso de erro escusável“.

O juiz está proibido de atuar no processo quando: a) interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, ou funcionou como Ministério Público, ou prestou depoimento como testemunha (portanto, atuou como advogado, promotor, perito, ou fonte de prova, resta proibido de atuar como julgador da causa); quando conheceu da causa em outro grau de jurisdição, tendo proferido decisão (portanto, não pode participar do julgamento de recurso, no mesmo processo em que atuava); quando estiver postulado como defensor público, advogado, ou membro do Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro ou qualquer parente seja consanguíneo ou afim, seja em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive.

Cumpre aludir às duas regras complementares decorrentes dos §§ 1º e 3º do art. 144 do CPC/2015.

Também se verifica o impedimento quando o juiz tenha atuado como advogado, defensor público ou membro do Ministério Público e já integrava a causa antes do início da atividade judicante do juiz.

Podendo ser fato superveniente, configurando o impedimento provocado por conta da atuação de cônjuge, companheiro ou parente (conforme o § 2º do art. 144 do CPC/2015).

Já no § 3º, verifica-se igual impedimento no caso de mandato conferido ao membro de escritório de advocacia que tenha em seus quadros de advogados que ostente individualmente a condição nele prevista, mesmo que não intervenha diretamente ao processo.

A regra visa evitar a burla ao impedimento: não se constitui expressamente o parente do juiz como advogado, mas se contrata o escritório de que esse parente faz parte.

Há impedimento do juiz que faz parte no feito ele próprio, seu cônjuge, ou companheiro(a), ou parente consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive quando for sócio, ou membro da direção ou da administração de pessoa jurídica que é parte na causa.

Do mesmo modo, sendo membro de direção ou de administração da pessoa jurídica (embora não seja sócio, possivelmente, são atos seus os que estão discutidos em juízo).

Porém, não configura o impedimento quando o juiz seja mero acionista de uma sociedade anônima, sem que tenha poder de gestão ou mesmo sem ter expressiva participação societária.

Seria temerário afirmar que o juiz que adquiriu as ações de sociedades empresárias como bancos como Banco do Brasil ou Vale do Rio Doce.

Quando for herdeiros presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes, o juiz que seja donatário ou possível herdeiro de uma das partes, ou em seu empregado, também está impedido de atuar.

Comenta Fredie Didier Junior que poderá ajustar-se melhor às hipóteses de suspeição, mas o legislador brasileiro houve por bem apenas presumir, de modo absoluto, a parcialidade em tais situações.

Em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo patrocinado por advogado de outro escritório.

Essa a regra de impedimento mais rigorosa, embora compreensível. Tal regra aplica-se mesmo quando a parte estiver sendo representada, no caso concreto, por outro escritório.

Quando o juiz promover ação contra a parte ou seu advogado: novamente aqui Fredie Didier Junior aponta que se trata de hipótese de suspeição, porém o legislado pátrio presumiu a parcialidade de tal situação.

A regra impede que o juiz, por exemplo, tenha proposto, na condição de consumidor, ação contra um banco ou uma concessionária de serviço público processo e julgue causa de que seja parte um desses entes.

Convém ainda apontar o art. 147 do CPC/2015 quando dois ou mais juízes forem parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral até o terceiro grau: o primeiro que conhecer do processo impede que o outro nele atue, caso em que o segundo se escusará, remetendo os autos ao seu substituto legal.

As hipóteses de suspeição traduzem indícios de parcialidade, com base em conceitos jurídicos indeterminados, como amigo íntimo ou inimigo capital.

A razão de uso de uma enumeração construída com termos mais vagos é evidente, posto que seja impossível imaginar e arrolar todas a situações passíveis de suspeição.

Porém, não se pode tolerar, em razão do princípio do juiz natural, que um juiz suspeito julgue a causa. Daí a justificável e relativa elasticidade dessas hipóteses, que devem abranger todos os casos em que o juiz não tenha condições de imparcialidade (que inclui distanciamento, equilíbrio e equidistância[19]) para julgar a causa.

É certo que o impedimento diz respeito da relação entre o julgador e o objeto da lide (causa objetiva), e não menos correto é afirmar que a suspeição o vincula a uma das partes (causa subjetiva).

Tanto o impedimento quanto a suspeição visam garantir a imparcialidade do Magistrado, condição sine qua non do devido processo legal, porém, diferentemente do primeiro, cujas hipóteses podem ser facilmente pré-definidas, seria difícil e até impossível, ao legislador brasileiro, prever todas as possibilidades de vínculos subjetivos de comprometer a sua imparcialidade.

Para se atender mais propriamente ao real objetivo do instituto da suspeição, o rol de hipóteses contido no art. 254 do CPP, que não deve absolutamente ser havido como exaustivo.

Portanto, faz-se necessária razoável e certa mitigação, passível de aplicação também e em princípio da cláusula aberta de suspeição inscrita no art. 135, V, do CPC/1973 c/c o art. 3º do CPP.

Porém, o STJ tem preferido optar por interpretar restritivamente as hipóteses de suspeição (STJ, REsp 1.425.791/MT, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, J. 11.03.2014, DJe 19.03.2014; STJ, Ag Rg-Ag 1.422.408/AM, 4ª T., Relª Min. Isabel Galloti, J. 05.02.2013, DJe 21.02.2013).

O juiz pode declarar-se suspeito por motivo de foro íntimo, sem necessidade de declinar suas razões (art. 145, § 1º, do CPC). Afinal, o Magistrado possui o direito de proteger sua intimidade.

Constata-se, no art. 145 do vigente CPC, que o juiz é suspeito quando:

  1. a) for amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados. E a novidade trazida pelo Código Fux, pois também configura suspeição quando a inimizade ou amizade se refira ao advogado da parte;
  2. b) quando receber presentes de pessoas que tiverem interesse na causa antes ou depois de iniciado o processo, aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou subministrar meios para atender às despesas do litígio.

Cumpre sublinhar que não se considera suspeito o juiz[20], com base nesse dispositivo, que, na qualidade de doutrinador ou professor, manifesta-se em tese sobre questão jurídica, sem referência ao caso concreto.

A arguição de impedimento ou suspeição do juiz ou do órgão colegiado é causa de suspensão do processo, vide o art. 303, III, do CPC/2015.

Tal incidente é sempre de competência de um tribunal, sendo distribuído a um relator, que deverá declarar os efeitos em que o recebe.

Se recebido sem efeito suspensivo, o processo volta a transitar. Porém, se ocorrer o efeito suspensivo, o feito será suspenso até o julgamento do incidente (art. 146, § 2º, do CPC).

Enquanto não for declarado o efeito em que foi recebido o incidente ou se recebido com efeito suspensivo, a tutela de urgência será requerida ao substituto legal do juiz considerado como parcial (art. 146, § 3º, do CPC).

Desde logo, frise-se que na suspeição do Ministério Público ou de auxiliar da justiça não haverá suspensão processual[21], conforme bem prevê o § 2º do art. 148 do CPC vigente.

A arguição de impedimento ou suspeição pode ser formulada por qualquer das partes, em petição específica dirigida ao juiz da causa, na qual indicará os fundamentos da recusa e que será instruída com documentos e, se for, o caso, o rol de testemunhas, vide o art. 146, caput, do CPC.

Questiona-se, caso haja a arguição de suspeição, se seria necessário poder especial do advogado. Há, de fato, vigorosa controvérsia. Entende-se que não, pois o elenco de poderes especiais[22] estaria estabelecido no art. 105 do CPC/2015.

Porém, existem doutrinadores que aconselham que o advogado tenha procuração com poder específico de arguir a suspeição do Magistrado, pois, além de consequências criminais que podem advir desta conduta em desfavor da parte, quem julgará a causa, se a arguição for rejeitada, é o mesmo juiz anteriormente acusado e apontado de estar peitado.

É perfeitamente possível que o autor já alegue a suspeição ou o impedimento do juiz concomitantemente ao ajuizamento da demanda. E isso é possível de ocorrer quando só houver um juiz da causa; o autor terá quinze dias úteis, contados da distribuição, para arguir impedimento ou suspeição.

Caso o motivo de suspeição ou impedimento já for conhecido pelo réu, também terá igual prazo de quinze dias para proferir a sua respectiva arguição.

Mas, se a parcialidade ocorrer por fato superveniente, autor e réu terão, igualmente, prazo de quinze dias para suscitar a questão, lembrando que, em se tratando de impedimento, tal prazo é irrelevante (pois não ocorre a preclusão).

Se o réu foi citado diretamente para apresentar a resposta, pois o caso não é a marcação da audiência preliminar da mediação ou conciliação prevista no art. 334 do CPC/2015.

É possível que o réu ofereça arguição de impedimento ou suspeição sem contestação, pois a lei não exige o oferecimento simultâneo.

Se apresentada somente a arguição de parcialidade, não poderá o réu oferecer contestação, em razão da suspensão do processo. Mas, com a suspensão processual, o prazo da defesa será então restituído por tempo igual ao que faltava para sua complementação, se é que faltava algum tempo.

O réu pode, por exemplo, arguir impedimento no décimo dia, dentro dos quinze dias de prazo que teria para oferecer a contestação; como a arguição suspende o processo, o prazo doravante só voltará a fluir quando o efeito suspensivo for retirado, conforme o art. 146, § 2º, do CPC/2015, ou somente após a decisão do incidente.

Ressalte-se que há prazos em dobro para se manifestar nos autos: o Ministério Público, à guisa do art. 180 do CPC/2015, para o réu representado por defensor público ou advogado de Núcleo de Prática Jurídica (art. 186 do CPC) ou litisconsorte com advogado diferente do outro litisconsorte (art. 229 CPC). Conclui-se, em todos esses casos, que o prazo para suscitar o incidente é de trinta dias.

Caso a suspeição ou o impedimento forem verificados após a prolação da sentença, a arguição de tais defeitos, pode ser feita no bojo da apelação como matéria preliminar – se o órgão do tribunal competente para apreciar essa arguição for o mesmo que tiver a competência para julgar a aplicação.

Se as competências forem diversas, haverão de ser feitas em duas peças, a apelação e o instrumento de arguição da parcialidade; os autos serão enviados primeiramente ao órgão competente para a solução da questão sobre a parcialidade do juiz para, após, a depender do resultado, ser enviados ao órgão fracionário do tribunal competente para o julgamento da apelação, ou ser remetidos de volta à primeira instância, para o que o juiz substituto profira nova decisão, caso reconhecida a suspeição ou o impedimento do juiz que proferiu a primeira sentença.

De qualquer maneira, porém, o juiz, após receber a apelação, terá a oportunidade de oferecer a sua defesa. O juiz apontado de ser suspeito[23] ou de ser impedido receberá a petição do incidente.

Acolhendo a alegação, remeterá os autos ao juiz substituto; caso não acolha, determinará a atuação apartada da alegação e, em quinze dias, apresentará as suas razões, acompanhadas de documentos que reputar convenientes e o rol de testemunhas para provar o que alega; em seguida, ordenará a remessa do incidente ao tribunal (art. 146, § 1º, do CPC).

Sublinhe-se que o juiz tem capacidade postulatória para fazer a sua defesa no incidente, não precisando de advogado. Para Nelson Nery Junior e Rosa Nery, a referida capacidade postulatória do Magistrado o habilita, também, para subscrever os recursos para o STJ e STF, caso seja derrotado no julgamento da exceção, sem a necessidade de representação judicial por advogado.

A capacidade concedida ao Magistrado foi apenas a de elaborar a sua defesa. A outra parte não é ouvida e não participa do incidente.

Em sentido semelhante, o STJ, ao criticar a decisão que admitiu o adversário do excipiente como assistente simples, por entender que somente “aquele de quem se poderia exigir isenção e imparcialidade pode ser apontado como suspeito e, assim, tem legitimidade para reconhecer ou relutar alegações, considerando as hipóteses de suspeição[24] previstas no art. 135 do CPC/1973“.

O art. 145 do CPC/2015 corresponde ao art. 135 do CPC/1973 (vide STJ, REsp 909940/ES, 4ª T., Rel. Min. Raul Araújo, J. 17.09.2013, Informativo nº 528).

Em sendo acolhida a arguição pelo tribunal, ocorrerá: a) fixação do momento a partir do qual o juiz atuou com parcialidade, o termo de suspeição ou impedimento (art. 146, § 6º, do CPC); b) decretação de invalidade dos atos do juiz, se praticados quando já presente o motivo de impedimento ou suspeição. São, enfim, os atos praticados dentro do termo da suspeição ou impedimento (art. 146, § 7º, do CPC) eivados de parcialidade do julgador; c) no caso de acolhimento da alegação de impedimento ou de manifesta suspeição, se condenará o juiz ao pagamento de custas processuais, podendo o juiz recorrer dessa decisão (art. 146, § 5º, do CPC); d) a remessa dos autos ao substituto legal.

Do acórdão que julgar o incidente, somente são cabíveis os recursos extraordinários (especial para o STJ ou extraordinário para o STF).

Não cabe recurso ordinário constitucional, que somente é pertinente em mandado de segurança de competência originária de tribunais. E precisam ser preenchidos, obviamente, os pressupostos peculiares aos recursos extraordinários.

Questiona-se ainda: o adversário do excipiente poderá recorrer? A parte contrária não poderá recorrer, pois ninguém tem direito a ser julgado por determinado juiz e todos têm o direito de ser julgados pelo juiz competente.

Ademais disso, cuidando-se de suspeição ou impedimento reconhecidos pelo juiz, sequer seria possível cogitar em recurso, pois inexiste decisão de primeiro grau que seja impugnável.

Ocorre apenas a modificação física da pessoa do juiz, sem alterar o foro ou o juízo competente. Destacar que, se a arguição for em face do Ministério Público ou auxiliar da justiça, somente compete ao juiz julgar o incidente processual.

Dessa decisão não caberá recurso de imediato; o interessado deverá recorrer da decisão por ocasião da apelação contra sentença, vide o art. 1.009, § 1º, do CPC.

Se o incidente for de competência do tribunal (art. 148, § 3º, do CPC), o sistema recursal é o mesmo do incidente proposto contra o juiz. Também o MP e o auxiliar da justiça possuem, de igual modo, a legitimidade recursal.

Interessante questão merece exame apurado em separado se a decisão sobre a parcialidade do órgão jurisdicional produz efeitos em outros processos em que se repetiu a situação que da causa ao defeito.

Exemplificando, uma vez reconhecida a suspeição em razão de amizade íntima, em outro processo perante o mesmo juiz, em que o mesmo sujeito volte a ser parte, a decisão naquele incidente deve ser observada?

A decisão sobre o referido incidente produz efeitos para além das fronteiras do processo onde foi proferida?

A discussão sobre a qualidade do órgão julgador (seja suspeição ou impedimento) é o objeto litigioso (mérito) do mencionado incidente.

Destacou Fredie Didier Jr. que a decisão de mérito é não sobre o mérito da causa (mérito do procedimento principal), mas sim sobre o mérito do incidente processual instaurado para a apuração da parcialidade do julgador.

O objeto litigioso passa a ser o conjunto das afirmações de existência de um direito feitas pelo autor e pelo réu. Assim, em resumo, o réu exerce um contradireito, pois o mérito do processo é a soma de dois binômios, que se expressam primeiramente pela afirmação do direito pelo demandante (pedido somado a causa de pedir) e, ainda, a afirmação do contradireito pelo demandado (pedido somado a causa de exceção).

Porém, é verdade que, durante o processo, o objeto litigioso pode ser ampliado com a propositura de demandas incidentais, como a denunciação da lide e o incidente de falsidade documental, ou incidente de suspeição ou de impedimento.

A decisão sobre a afirmação do contradireito, por ser decisão sobre o mérito da causa, torna-se indiscutível por causa da coisa julgada material.

A não inclusão do contradireito pelo réu no conceito de objeto litigioso gera uma esdrúxula situação, pois haverá uma espécie de direitos que somente são exercidos como reação ao exercício do direito por outra pessoa, cuja apreciação judicial não galgaria tornar-se indiscutível pela coisa julgada material, o que não coaduna com os princípios da segurança jurídica e da igualdade.

Portanto, conclui-se que todo o procedimento possui um objeto litigioso, que é o tema a ser resolvido pelo ato final, do qual todos os demais atos que o compõem são preparatórios.

O objeto litigioso de cada procedimento é definido pelo ato inaugural, normalmente quando a demanda é formulada por uma das partes, com a possibilidade de ampliação em razão da postulação do réu (através da afirmação de direitos, reconvenção ou pelo pedido contraposto ou por contradireitos, na defesa).

Em verdade, o juízo de admissibilidade do procedimento nada mais é do que o exame da possibilidade de o objeto litigioso ser apreciado. E serve para qualquer procedimento, e não apenas para o procedimento principal.

Identifica-se, assim, a existência de objeto litigioso no recurso, na exceção de suspeição ou impedimento, na exceção de incompetência relativa.

De sorte que, uma vez decidida a exceção de suspeição ou de impedimento, deve tornar-se imutável e indiscutível não só para o processo em que foi proferida, mas também para outros, em que a situação se repita.

Obviamente, se entre a decisão do incidente e o novo processo houver mudança do quadro fático (o órgão julgador perde o vínculo que mantinha com a parte, por exemplo), a decisão in casu não deverá ser observada, pois, como toda decisão, submete-se à cláusula rebus sic stantibus.

Repise-se que, se mantidas as mesmas circunstâncias de fato e de direito, essa primeira decisão deverá ser observada. Portanto, a causa justificadora de suspeição não se extingue com o fim do processo – deve e pode o julgamento do incidente de suspeição[25] produzir os efeitos futuros.

É ainda possível cogitar também na possibilidade de ação rescisória contra a decisão que julgar o incidente de suspeição ou impedimento, já que se trata de decisão de mérito (do incidente), sendo apta a produzir os efeitos externos, ou seja, para fora do processo em que fora proferida.

Comenta, com razão, Fredie Didier Jr. que não está claro qual seja o procedimento para arguir a suspeição ou o impedimento de todo tribunal, ou de sua maioria absoluta.

O doutrinador baiano destaca ainda que existem cruciais duas questões, a saber: a) de quem seja a competência para apreciar a arguição; b) de quem será a competência para o julgamento do processo, no caso de o tribunal for considerado impedido ou suspeito e, ainda, quem seria o tribunal substituto?

Todos esses questionamentos recebem a mesma resposta: o Supremo Tribunal é que julgará a arguição, e, se for o caso de o tribunal for considerado parcial, a própria causa.

Nesse ponto, é necessário arguir a suspeição ou o impedimento perante o próprio tribunal. Se este não se reconhecer suspeito ou impedido, os autos serão remetidos ao STF, que julgará a arguição; uma vez acolhida, o próprio STF será competente para o julgamento da causa (aplicável integralmente o disposto nos §§ 3º ao 7º do art. 146 CPC).

Se o tribunal reconhecer-se suspeito ou impedido, mesmo que independentemente de arguição pela parte interessada, remeterá os autos ao STF para que julgue a causa (art. 102, I, da CF/1988).

Sublinhe-se que o procedimento de arguição de impedimento ou suspeição, nesses casos, foi muito bem detalhado no julgamento da Questão de Ordem na Ação Cível originária nº 58/BA, pelo Pleno do STF em 05.02.1990.

O juiz, na qualidade de terceiro estranho no processo, não compartilha dos interesses e sentimentos dos litigantes, devendo ter uma postura externa capaz de examinar o processo com serenidade e desapego.

Porém, nunca deverá o motivo que o leva julgar ser de interesse pessoal e nem é movido pelos sentimentos pessoais existentes no conflito; o interesse que o move é apenas um superior interesse de ordem coletiva, para que a contenda resolva-se de modo pacífico, com o fito de restaurar e preservar a paz social.

Por essas razões que o juiz deve ser mantido afastado quando ocorrer as hipóteses discriminadas na lei, seja a caracterizar a suspeição ou o impedimento.

Ademais, a imparcialidade do julgador erige-se como exigência fundamental decorrente do devido processo legal, sendo uma garantia processual básica.Conclui-se que, para que o processo seja verdadeiramente justo e válido, é necessário que o Magistrado atue de forma imparcial, isenta, equidistante das partes, sem qualquer animus tendencioso.

Não obstante alguns doutrinadores defendam a taxatividade das causas de impedimento, Calmon de Passos entendia que o respectivo rol não era exaustivo, posto que englobe toda situação em que exista uma incompatibilidade lógica entre a função de julgar e o papel do juiz no processo, ainda que não prevista expressamente no diploma legal.

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[1] Função social, consequentemente, pode ser entendida como o resultado que se pretende obter com determinada atividade do homem ou de suas organizações, tendo em vista interesses que ultrapassam os do agente. Pouco importa traduza essa atividade exercício de direito, dever, poder ou competência. Relevantes serão, para o conceito de função, as consequências que ela acarreta para a convivência social. O modo de operar, portanto, não define a função, qualifica-a. (J. J. Calmon de Passos)

[2] Os pressupostos processuais, segundo a doutrina já consolidada, são requisitos de existência e validade da relação jurídica processual. Enquanto as condições da ação são requisitos para viabilidade do julgamento de mérito, os pressupostos processuais estão atrelados à validade da relação jurídica processual. Por isso, a avaliação dos pressupostos processuais, em nossa visão, deve anteceder às condições da ação. Não há consenso na doutrina sobre a classificação dos pressupostos processuais, e cada doutrinador acaba adotando um critério diferente.

[3] A imparcialidade do juiz é um pressuposto processual de validade do processo. Por isso, caso um juiz impedido atue no processo, ele será nulo. Se o juiz for suspeito, o processo será anulável.

[4] Em tempo, o CPC/2015 não extinguiu a categoria das condições da ação, já que não o fez expressamente. Apenas fez adequação do texto legal às modernas doutrinas e jurisprudência. Além disso, o interesse e a legitimidade estão diretamente relacionados à viabilidade da pretensão posta em juízo. A interpretação sistêmica dos arts. 17 e 483 do CPC/2015 não sinaliza nesse sentido.

[5] A presteza jurisdicional é um compromisso do contrato social, que corresponde ao requisito elementar para a vida em sociedade, sendo a mais elevada fonte de paz social, pois a insaciável busca pela justiça gera a todo o jurisdicionado a visão de verdade.

[6] Devemos lembrar que a colegialidade é uma defesa do próprio Poder Judiciário, sendo um escudo protetor contra pressões externas que, se não as alivia integralmente, pelo menos dissipa seus efeitos entre os julgadores. É, portanto, indiscutivelmente, forma de se assegurar a independência, a imparcialidade e a imagem do Judiciário. Enfim, a colegialidade incita a moderação, forçando cada juiz à neutralidade e maior objetividade. Há nesta um freio natural, imposto pelos próprios pares do julgador. É verdade que muitos doutrinadores não enxergam o princípio da colegialidade como uma garantia fundamental do jurisdicionado ou uma garantia processual, tal como Fredie Didier Junior e Cunha. Por sua vez, o doutrinador Leonardo Greco enumera, dentre os fatores que contribuem para o déficit garantístico do sistema recursal, a supressão da colegialidade. E ainda esclarece que, ainda que as instâncias internacionais humanitárias não têm acolhido a assertiva de que a colegialidade seja uma garantia fundamental do processo, o nobre professor considera uma garantia estrutural do direito processual.

[7] O intuito dos romanos, transformando presunções comuns em presunções legais, era o de assegurar eficácia de fontes de direito aos rescritos dos príncipes e às respostas dos jurisconsultos. Os doutrinadores discutem a questão de saber se essa transformação se operou na época bizantina ou a partir da aparição do processo extraordinário; uns veem a presunção como “uma criação infeliz de Bizâncio”; outros entendem que ela nasceu no dia em que o juiz, de simples particular que era, se tornou “um funcionário submetido cada vez mais aos regulamentos que lhe impunham seus superiores hierárquicos”. Se se não pode fixar com precisão a data do nascimento, a filiação, entretanto, é certa: a presunção legal representa a herança das presunções que o juiz estabelecia por instigação dos jurisconsultos; o papel destes últimos era tão importante que Quintus Mucius Scaevola pode ligar o seu nome à presunção referente à origem dos bens adquiridos pela mulher durante o casamento. É o que nos informa Roger Deccottignies (Les présomptions en droit prive. Paris: Pichun et Durand, 1950. p. 30, n. 12). Era a presunção muciana. Semelhantemente, os legisladores, que os seguiram, também criaram presunções legais por motivos de ordem pública, que exige maiores garantias a determinadas relações jurídicas, isto é, para tutelar o interesse social, facilitando a prova, diminuindo o arbítrio do juiz na apreciação das provas ou na decisão de certas questões de fato.

[8] Pontes de Miranda verberou que “quem está sob suspeição está em situação de dúvida de outrem quanto ao seu bom procedimento. Quem está impedido está fora de dúvida, pela enorme probabilidade de ter influência maléfica para a sua função. Olha-se, em caso de suspeição, para baixo, para se ver o suspectus e poder-se averiguar”.

[9] A Lei da Ficha Limpa é fruto da iniciativa da população brasileira e determina a inelegibilidade, por oito anos, de políticos condenados em processos criminais em segunda instância, cassados ou que tenham renunciado para enfim evitar a cassação, entre outros critérios. A inelegibilidade alcança, ainda, os que forem condenados pelos crimes contra a economia popular, a fé pública, a Administração Pública e o patrimônio público; contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência; contra o meio ambiente e a saúde pública; crimes eleitorais, para os quais a lei determine a pena de prisão; de abuso de autoridade, nos casos em que houver condenação à perda do cargo ou à inabilitação para o exercício de função pública; de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; de tráfico de entorpecentes e drogas afins, racismo, tortura, terrorismo e hediondos; de redução à condição análoga à de escravo; contra a vida e a dignidade sexual; e delitos praticados por organização criminosa, quadrilha ou bando.

[10] Segundo trecho da referida reportagem da Folha: “Em agosto, Borges (nota nossa: genro do Ministro Ayres Britto) e a mulher Adriele (filha do Ministro Ayres Britto) entraram para a lista de advogados que defendem pelo menos cinco dos oito Magistrados suspeitos de desvio de cerca de R$ 1,4 milhão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso. Eles foram aposentados pelo Conselho Nacional de Justiça e recorreram da decisão no STF. Assim, teoricamente, Britto deverá se declarar novamente impedido”. Em outro trecho da reportagem, é dito que o procurador-geral da República “investigará a tentativa do ex-candidato Joaquim Roriz (PSC) de contratar o genro do Ministro Carlos Ayres Britto com o intuito de deixá-lo impedido de julgar seu caso”, referindo-se a outro caso em que o genro do ministro em questão atuaria. Sendo excelente ocasião para aplicar a doutrina neste artigo preconizada, permanecendo o Ministro Ayres Britto no feito e afastando-se da defesa da causa seu genro e filha. Ademais, nenhumas outras investigações serão necessárias para casos similares no futuro, pois são os advogados que deverão ser afastados do feito quando atuar o ministro causador do impedimento, e não o contrário, como, data vênia, vem sendo erroneamente feito.

[11] A forma de arguição do vício de incompetência territorial tem, no Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), tratamento diverso daquele estipulado pelo antigo sistema processual do Código de Processo Civil de 1973 (CPC/1973). Na lei revogada, a insurgência do réu contra o vício operava-se mediante interposição de uma exceção instrumental, cuja apresentação podia se dar antes ou concomitantemente à contestação, mas de forma autônoma. Na sistemática da nova legislação processual, o réu deve arguir a incompetência relativa no bojo da contestação, assim como a incompetência absoluta, por força da regra constante no art. 337, II, do CPC/2015.

[12] Segundo o princípio da identidade física do juiz, ao Magistrado que encerrar a instrução processual caberá também proferir a sentença nos autos, posto que este estará vinculado ao processo, por entender melhor todo o conjunto probatório colhido durante o transcorrer da instrução. Em verdade, o instituto da identidade física é relevante para regular o fechamento da atividade jurisdicional de primeiro grau e, por isso, então deve ser confirmado como verdadeiro princípio processual, ao passo que considerado não em si mesmo, mas no seu complexo, organizado em sistema dentro da estrutura processual, decorrente de uma evolução processual histórica. Há doutrina que considera que o referido princípio, por ter essa natureza, não poderia ter sido suprimido da legislação processual, pois tal revogação trará incontáveis prejuízos ao julgamento da causa e as partes litigantes, ainda que, na prática, o referido princípio não seja muitas vezes respeitado pelo Judiciário.

[13] Para um juiz honesto, afirmava Calamandrei, “que tenha de decidir uma causa entre um amigo e um indiferente, é preciso maior força para dar razão ao amigo do que para lhe negá-la; é preciso maior força para dar razão ao amigo do que para lhe negá-la; é preciso maior coragem para se ser justo, arriscando-se a parecer injusto, do que para ser injusto, ainda que fiquem salvas as aparências da justiça” (Eles, os juízes, vistos por nós, os advogados. 3. ed. Lisboa: Clássica, 1960. p. 159).

[14] O exame à luz da comparação jurídica revela que inúmeras legislações processuais modernas dispõem como causa de afastamento do juiz o seu parentesco com o advogado de um dos litigantes (vide, por exemplo, art. 120, 1, do CPC português; art. 170, IV, do CPC do México; art. 17, n. 1, do CPC argentino; art. 50, n. 1, da Lei de Procedimiento Civil, Administrativo e Laboral de Cuba; art. 234 do CPC do Québec).

[15] Nesse mesmo sentido, a lei processual da Itália prevê, entre as hipóteses de suspeição presumida, a intimidade notória do juiz com um dos procuradores atuantes no processo. Com redação deveras peculiar, dispõe o art. 51 do Codice di Procedura Civile. Verifica-se também que o CPC do Paraguai contempla, a esse respeito, no art. 20, a mesma disciplina da legislação italiana. Nesse sentido, entre outros, confira-se o julgamento proferido pela 3ª Turma do STJ, no Recurso Especial nº 600.737/SP, de relatoria do Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: “A simples antipatia entre advogado e juiz não pode dar ensancha à suspeição, pois pode o juiz, por motivo íntimo, julgar-se impedido se assim entender. A suspeição em casos de amizade íntima ou inimizade capital diz com a relação entre o juiz e as partes, o que não é o de que se cuida nestes autos”.

[16] Ronald Myles Dworkin (1931-2013) foi filósofo do Direito norte-americano. As últimas posições acadêmicas por ele ocupadas foram a de Professor de Teoria Geral do Direito na Univesity College London e a New York University School of Law. É reconhecido por suas contribuições para a Filosofia do Direito, Filosofia Política. A sua tese do direito como integridade é uma das principais visões contemporâneas sobre a natureza do direito. A atitude interpretativa reivindicada por Dworkin pode ser entendida em oposição a outros projetos teóricos dos seus adversários intelectuais. Para o doutrinador, a mera descrição empírica distingue-se da interpretação. Observar um fenômeno ou fazer um enunciado normativo não é o mesmo que investir uma norma de significado. Essa terceira função envolve sempre o papel da interpretação, que sempre depende de algo ter um sentido (point). A teoria dworkiniana comporta espaço para divergências sobre o que é o Direito. A explicação para estas divergências está em diferentes conceitos de Direito, como também em concepções concorrentes sobre como o Direito pode ser interpretado. Concepções distintas sobre como interpretar o Direito evidenciarão os valores e as razões de cada intérprete. Alguns traços da Teoria do Direito de Dworkin são distintivos e traduzem o alcance da sua teoria. É uma teoria que enfatiza o papel dos juízes e dos tribunais, além de possuir um projeto de interpretação. Sua tese exclui o âmbito da filosofia política – não reflete como opções políticas e governamentais influenciam o Direito. Desconsidera, também, o papel do interesse e do poder como influências negativas à interpretação, melhor dizendo, como influências que podem comprometer a legitimidade dos Tribunais e dos juízes.

[17] A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia. Referências: CF/1988, art. 129, I e VI; RHC 829/SP (5ª T., 21.11.1990, DJ 10.12.1990); HC 7.445/RJ (5ª T., 01.12.1998, DJ 01.02.1999); HC 9.023/SC (5ª T., 08.06.1999, DJ 01.07.1999); RHC 4.074/PR (6ª T., 28.11.1994, DJ 20.02.1995); RHC 6.662/PR (6ª T.,20.10.1997, DJ 27.04.1998); RHC 7.063/PR (6ª T., 26.08.1998, DJ 14.12.1998), DJ 07.02.2000, p. 185.

[18] Moacyr Amaral Santos, em preciosa obra intitulada Prova judiciária no cível e comercial (3. ed., v. V, Editora Max Limonad, 1968), disse que opinião largamente difundida confere a presunção e indício sinonímia. E também pensam nesse mesmo sentido os renomados processualistas Carlo Lessona, Giorgio Giorgi e Marcel Planiol. Tal entendimento ancora-se no direito romano, em que, não raro, encontram-se textos referentes à prova indiciária com o significado de prova por presunção. E prossegue o nobre doutrinador paulista afirmando que a teoria dominante, todavia, esclarece perfeitamente a relação entre indício e presunção. O indício é o fato conhecido do qual se parte para o desconhecido, ou seja, o fato conhecido em que se funda o raciocínio do juiz para chegar ao fato desconhecido. O indício como ponto de partida, por inferência, chega a estabelecer uma presunção. Por isso, a prova por presunção constitui um silogismo. em que a premissa maior é o princípio geral, a premissa menor é o fato conhecido e a conclusão é o fato que se deseja conhecer. Donde o indício ser a causa, ou seja, o fato conhecido, e a presunção o efeito, isto é, o conhecimento do fato antes ignorado. Na mesma ordem de ideias, poder-se-ia dizer, com João Monteiro, que indício é o meio e a presunção um resultado. Apesar de presunção e indício serem dois conceitos distintos, é justo reconhecer que as duas palavras, na ordem lógica, equivalem-se, por isso que significam o procedimento racional pelo qual de um fato conhecido e certo se infere por concatenação, de causa a efeito, o fato desconhecido. No direito romano, príncipes e jurisconsultos submetidos que lhes eram casos particulares, ao resolvê-los, constantemente de fatos conhecidos e mediante raciocínio lógico, extraíam presunções nas quais fundavam seus julgamentos. Para assegurar a eficácia de fontes do direito atribuída aos rescritos dos príncipes e às respostas dos jurisconsultos, quando do procedimento formulário se passou para o da cognitio extraordinária, “aconteceu o fenômeno notável de as presunções livremente acolhidas por aqueles príncipes e jurisconsultos serem elevadas a textos de lei e dignidade e eficácia de normas gerais” (FERRINI, C. Le presunzioni in diritto romano Opere, v. III, Milano, 1929, p. 417 e ss. citado por ANDRIOLI, Virgílio, in Novíssimo Digesto Italiano, verbete “Presunzioni” (Diritto Romano, v. XIII, 1966, p. 765). Salienta Ferrini que essa transformação de presunções comuns em praesumptionis iuris coincidia com a mutação das ideias acerca das funções do julgador, “agora tornado um funcionário do Estado e cada vez a este mais ligado pelos laços da burocracia e dos regulamentos”. Em razão disso, tais presunções, até então havidas como inferências de um fato conhecido para outro desconhecido, livremente colhidas e apreciadas pelo juiz, perderam essa natureza e se constituíram em preceitos legislativos, dos quais os relativos às presunções condicionais (iuris tantum) tinham por efeito inverter o natural ônus da prova entre as partes em juízo. Do exemplo romano se aproveitaram as legislações posteriores, que continuaram e ainda continuam a estabelecer tais inversões do ônus probatório.

[19] “Serve de alerta o caminho inescrutável da decisão, pois esta tem dever conjectural condutor da razoabilidade. O juízo equidistante, contido à penumbra neutra, carece de existência. Isso arrasta, numa enxurrada preferencial, o puro olhar clemente, a aguaça afoga mágoas incômodas por tenaz reforço alheio. O princípio paradigmático da confiança racional acompanha severas controvérsias e dúvidas. Uma primeira fase, quando a escolha simplesmente injetava validade por força social (reação ao valor pessoal) simplesmente os termos ‘inconstitucional’ e ‘ilegal’ possuíam relevo sinônimo. Assim, a função judicial estruturava e regia argumentações simpáticas com carisma eficaz. Exemplo dessa faceta evolutiva reside em o debate Nuremberg, marcante evento epifânico da era pré-atômica (construída com simbiose individualista e similitude político–partidária nilista) propriamente polarizada. Nenhuma das fundamentações firmadas em critérios, parâmetros ou instintos deixou fora do campo visual a álea natural externa-interna construída em repertório provavelmente inesgotável.” (FERREIRA, Ramiro. Nulidade das normas inconstitucionais. Disponível em: <https://ramiroferreira91.jusbrasil.com.br/artigos/151873511/nulidade-das-normas-inconstitucionais>. Acesso em: 7 jan. 2018)

[20] Em termos resumidos, a lógica do modelo anglo-saxão é simplesmente muito diferente da lógica do sistema romano-germânico para que uma aproximação acrítica possa sair impune. Talvez o mais emblemático exemplo para a demonstração dessa diferença abissal seja o sistema de escolha dos juízes. No Brasil, como de resto na maioria dos países, os candidatos a juízes são pessoas formadas em Direito, que advogaram previamente, submetidos a rigorosos concursos de conhecimento das diversas disciplinas jurídicas. No sistema americano, 87{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} de todos os juízes das Cortes estaduais são eleitos por meio do voto popular, e em 39 dos 50 Estados da Federação, pelo menos alguns juízes são escolhidos por votação popular, segundo o National Center for State Courts. Sandra Day O’Connor, ex-Juíza da Suprema Corte americana, condena a prática: “Nenhuma outra nação do mundo faz isso porque perceberam que não é possível conseguir juízes justos e imparciais dessa maneira”. Mas a ideia por trás desse sistema populista não é garantir a imparcialidade ou a independência do juiz, valores fundamentais em países que adotam a civil law; é sim fazer com que o juiz cumpra a vontade da maioria que o elegeu. “Se você quer juízes que atendam a vontade da opinião pública, elegê-los é a melhor forma para isso”, afirmou S. Parnell, Presidente do Center for Competitive Politics.

[21] Distingue-se suspensão processual de extinção processual. Na suspensão, verifica-se apenas a paralisação temporária da marcha processual, mas a relação jurídica processual continua a gerar seus efeitos. Na extinção, seja com ou sem resolução do mérito, a relação processual desaparece, extinguindo-se também os direitos e as obrigações dela decorrentes. Aqui uma ressalva deve ser feita: tratando-se de extinção do processo com resolução do mérito, se a parte vencida na demanda não cumprir voluntariamente a obrigação fixada na sentença, será possível a execução do julgado, hipótese em que só estará extinta a obrigação com o seu efetivo cumprimento. Durante a suspensão, é defeso praticar qualquer ato processual, salvo atos urgentes, a fim de evitar dano irreparável (art. 314 do CPC/2015), como a audição de testemunha enferma e a realização de perícia. Tratando de arguição de impedimento ou suspeição, as tutelas de urgência poderão ser requeridas ao juiz que substituiu o Magistrado impedido ou suspeito (art. 146, § 3º, do CPC/2015). A suspensão do processo, mesmo a decorrente de convenção das partes, é automática e inicia-se no momento em que se dá a ocorrência do fato, tendo a decisão que a declara efeito ex tunc. Quanto ao término da suspensão, é automático nos casos em que a lei, o juiz ou as partes fixam o limite da suspensão (incisos I, II, V e VII) e dependente de intimação judicial quando o termo for indefinido (incisos III, IV, VI). Suspensão do processo pela arguição de impedimento ou suspeição. Os motivos que determinam o impedimento e a suspeição são os elencados nos arts. 144 e 145 do CPC/2015. A suspensão do processo somente ocorre nos casos de arguição de suspeição ou impedimento do juiz (grifos meus). Tratando-se de incidente relativo à suposta parcialidade do membro do Ministério Público ou dos auxiliares da justiça, o processo não se suspenderá (art. 148, § 1º, do CPC/2015). (DONIZETTI, Elpídio. Suspensão do processo. Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2016/12/21/suspensao-do-processo/>. Acesso em: 7 jan. 2018)

[22] A doutrina descreve a respeito da natureza jurídica dos poderes especiais, principiando por regra de exclusão: não são atos do processo, nem judiciais, ou seja, são atos de disposição, afetos ao direito material. Os poderes especiais, enumerados em lei, não são atos do processo e nem sequer atos judiciais. Exceto o de receber citação. São atos de disposição, todos estes são atos de direito material, que podem, em certas circunstâncias, ser praticados no processo. Justifica-se assim que tais poderes sejam regidos pelas regras do Código Civil, depois de exauridas as disposições do Código de Processo Civil, conforme dispõe o art. 692 do Código Civil brasileiro.

[23] Apesar de que as causas de suspeição carreguem grande dose de subjetividade, daí por que a alegação deverá ser acompanhada de provas da parcialidade do julgador; não se deve confundi-las com meras irresignações sobre as decisões judiciais que foram técnica e regularmente proferidas, ainda que reiteradas. E, nesse sentido, é evidente o Enunciado nº 88 da súmula do TJSP, in litteris: “Reiteradas decisões contrárias aos interesses do excipiente, no estrito exercício da atividade jurisdicional, não tornam o juiz excepto suspeito para o julgamento da causa”. E segundo André Vasconcelos Roque: “Como o receio que fundamenta tal hipótese de suspeição é que os laços pessoais entre o juiz e as partes ou seus advogados comprometam a isenção no julgamento, deve ser conferida interpretação extensiva à regra para também incluir nos casos de suspeição as figuras do defensor público, do procurador (municipal, estadual, da Fazenda Nacional), do advogado da União e do membro do Ministério Público. Amizade íntima é conceito que remete a um vínculo forte, que vai além da mera convivência profissional, estando evidenciado, em tese, pelo noivado ou compadrio, assim como pela visitação frequente de um à residência de outro. O texto do CPC/2015, em comparação ao CPC/1973, não exige mais a inimizade ‘capital’, ou seja, de se desejar a morte do inimigo. Basta, para que se configure a suspeição, que se evidencie uma emoção de caráter negativo, advinda de questões pessoais, que o juiz apresente em relação à parte ou ao advogado” (Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2016. p. 505).

[24] Uma novidade trazida pelo CPC/2015 é a que trata do impedimento quando a parte que figura no processo é instituição de ensino com a qual o juiz mantém relação de emprego ou vínculo decorrente de contrato de prestação de serviços. Como é sabido, o juiz pode acumular cargos públicos, na hipótese do inciso XVI, b, do art. 37 da Constituição Federal. Essa acumulação vale para a instituições públicas de ensino, não existindo qualquer limitação de acumulação quanto à prestação de serviços em instituições privada. Em todo o caso, sendo o juiz empregado ou prestador de serviços de instituição de ensino público ou privado, as ações em que estas figurarem como partes terão que ser submetidas ao seu sucessor. O procedimento adotado para demais casos de impedimento e de suspeição (art. 148 do CPC/2015) é um pouco diferente, porquanto não se suspende o processo e o incidente é julgado pelo juiz da causa ou pelo relator, caso o processo encontre-se no tribunal. Nesses casos – impedimento ou suspeição dos auxiliares ou membros do Ministério Público – ainda será possível a interposição de agravo de instrumento em face da decisão que julgar o incidente (art. 148, § 2º, do CPC/2015).

[25] O Código de Processo Civil de 2015 prescreve a possibilidade de o Tribunal não deferir o efeito suspensivo ao incidente de exceção de suspeição, ou seja, de que não haja suspensão do processo na origem, no qual se discute a suspeição do Magistrado que preside o feito. A arguição de suspeição do juiz excepto visa proteger a imparcialidade do julgador. No interregno entre a instauração da exceção de suspeição até a declaração e/ou omissão pelo Tribunal com relação ao efeito em que será recebido o incidente, se recebido com ou sem efeito suspensivo, o juiz excepto não poderá praticar nenhum ato processual nos autos, nem mesmo os considerados urgentes – o qual denominamos de efeito suspensivo latente ou simplesmente efeito suspensivo oculto. A legislação processual civil não apresenta um rol para as hipóteses em que o incidente deveria ser recepcionado sem o efeito suspensivo.