É NAMORO OU UNIÃO ESTÁVEL?
Thaiyller Kery Conceição Martiniano
Uma breve análise dos limites entre namoro qualificado e união estável.
1.INTRODUÇÃO
Desde o primórdio o Direito tende a acompanhar a evolução social, para que assim consiga abarcar as lacunas existentes durante as evoluções. Neste sentido, com a forma de duas pessoas se relacionarem não é diferente. Nota-se que o namoro do século atual se diferencia na forma em que as pessoas se relacionavam das décadas passadas.
Nos tempos de outrora, o namoro era tido especificamente como uma forma de constituir família, como se fosse um dever, não sendo bem visto caso isso não acontecesse. Já nos dias atuais, existe a liberdade das pessoas focarem mais no prazer e de se depreenderem do (a) parceiro (a) sem que isso lhe cause tantos julgamentos de desrespeito.
Além do mais, em 2015 em decisão proferida pelo STJ o ministro Bellizze utilizou a expressão namoro qualificado para se referir a relacionamento de longo tempo, com a intenção futura de constituir família.
Desta feita, com o intuito de esclarecer de forma breve os limites entre o namoro qualificado e a união estável, o presente artigo abordará suas peculiaridades.
Nesse interim, antes de adentrarmos nos limites que diferenciam namoro e união estável, importante arrazoar o conceito de cada uma.
2. NAMORO
A palavra “namoro” vem de uma expressão Espanhola estar em amor, no qual se formou o verbo enamorar originando assim, na língua portuguesa, o vocábulo namoro.
Após esclarecer a origem da referida expressão tem-se que namoro é a forma em que duas – ou mais – pessoas têm de se relacionar a fim de se conhecerem melhor, além de envolverem-se sentimentalmente e/ou sexualmente, compartilhando conhecimentos, experiências, gostos, bem como utilizado como uma pré-condição para a concretização de uma união estável e/ou matrimônio.
Conforme leciona Maria Berenice Dias:
“O namoro – chamado de uniões livres -, atualmente, tende a ter requisitos objetivos muito próximos, para não dizer idênticos aos da união estável, com intimidade ímpar, comunhão de leitos e publicidades exacerbada. [1]
Assim sendo, o namoro é considerado aquele de tempo curto, sem responsabilidades e não produz efeitos jurídicos para os namorados.
Ademais, em 2015, após decisão do STJ surgiu à expressão namoro qualificado[2]. No qual, refere-se da relação amorosa e madura que por vezes até residem no mesmo domicilio, dividem contas bancárias, no entanto não possui no presente, a intenção de constituir família.
3. UNIÃO ESTÁVEL
A união estável é uma relação jurídica reconhecida na Carta Magna[3] como entidade familiar em que se constitui com a união de duas pessoas que convivem como se casadas[4] fossem.
Para que este instituto seja reconhecido é necessário que o casal tenha convivência duradora, contínua e pública, com a intenção de constituir família. Ou seja, é formada uma família de fato, não sendo necessário nenhum documento que a comprove, apenas a relação vivida na prática. O que não exclui a faculdade dos conviventes registrar a referida união em cartório.
É o que prevê o Código Civil em seu título III:
CC, art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
Nessa linha, Maria Berenice Dias menciona: “a união estável nasce da convivência, simples fato jurídico que evolui para a constituição de ato jurídico, em face dos direitos que brotam dessa relação”.
4. DIFERENÇA ENTRE NAMORO E UNIÃO ESTÁVEL
É notório que atualmente os namoros têm muitos laços em comum com a união estável. Nos tempos modernos, os casais passam mais tempo juntos, dormem um na casa do outro, dividem gastos, viagens bem como dividem a mesma residência, ou seja, tem sido comum casais firmarem relacionamentos duradouros, contínuos e públicos. Nota-se que as mencionadas características são justamente as mesmas que ensejam na constituição da união estável.
Desta feita, quais as diferenças de um instituto do outro?
De início, vale frisar que são basicamente duas as distinções entre o namoro e a união estável:
Primeira, não há legislação específica no Brasil para o namoro, não possuindo qualquer consequência jurídica. Diferentemente da união estável em que é protegida pelos direitos patrimoniais e familiares.
Segunda, e principal diferença, é que no namoro há intenção de constituição de família somente no futuro. Conforme escreve Maria Berenice: “tal fato, é o grande diferenciador para a união estável, instituto familiarista e que demanda animus familiae atual”.
Em outras palavras, na união estável há intenção, no presente, de constituição de família, já no namoro essa intenção é futura.
Neste sentido, Leonardo Amaral Pinheiro da Silva ilustra a distinção e diversidade dos institutos:
União estável: configurada na convivência pública de duas pessoas, contínua e duradoura e estabelecida com o fim de constituição imediata de família. Objetivamente, uma relação afetiva pública notória, cuja convivência tenha que ser contínua estável, duradoura, perpetrada no tempo, uma vez que não há prazo, mas, com algum tempo de convivência para que se estabeleça, já que se espera é que seja duradoura, não podendo ser breve ou transitória. Uma comunhão de vida em que convivam como se cônjuges fossem, prescindível a obrigatoriedade de ser sob o mesmo teto. Subjetivamente, a intenção imediata de constituição de uma família, postura de assumir um real, efetivo e firme compromisso, com direitos e deveres pessoais e patrimoniais semelhantes aos do casamento.
Namoro qualificado: convivência íntima, sexual, de duas pessoas podendo ou não haver coabitação, em que os namorados frequentam as respectivas casas, eventos sociais, viajam, passam férias juntos, comportam-se no meio social ou profissional como se encontrando num relacionamento amoroso. Objetivamente, assemelha-se a uma união estável, faltando-lhe, porém, um elemento inafastável — presente no critério subjetivo — a constituição imediata como entidade familiar. Subjetivamente, a ausência da vontade de constituição imediata de uma entidade familiar. Mesmo que o namoro seja longo, consolidado, daí a nomenclatura “namoro qualificado”, não há nos namorados o desejo imediato de constituir uma família, ainda que se o admita futuramente, mas não o é no momento. Por esta razão não há de se falar em direito e deveres jurídicos, notadamente de ordem patrimonial entre os namorados, não se cogitando em falar de regime de bens, alimentos, sucessão, partilha e outros direitos”.[5]
Salienta-se ainda que, por mais que o casal de namorados firme contrato de namoro, com o intuito de se eximirem dos efeitos jurídicos originados pela união estável, este perderá sua eficácia, caso demonstrem, de fato, o desejo de constituir família.
5. REFERÊNCIAS
Maria Berenice Dias, Manual de Direito das Famílias.
Leonardo Amaral Pinheiro da Silva, Pacto dos namorados.
Constituição Federal de 1988.
Código Civil de 2002.
STJ – 3ª Turma, REsp.nº 1.454,643-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze, DJe. 10.03.2015.
[1] DIAS, Maria Berenice.
[2] STJ – 3ª Turma, REsp.nº 1.454,643-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze, DJe. 10.03.2015.
[3] art. 226, § 3.º, da CF/1988
[4] Art. 1.511. O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.
[5] Leonardo Amaral Pinheiro da Silva, Pacto dos namorados, 105.