DROP DOWN NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Rénan Kfuri Lopes
A Lei nº 11.101, de 9 de novembro de 2005- LREF, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, tem por objetivo viabilizar a superação da crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores.[1]
A preservação da empresa, ao invés de sua falência, é de interesse de toda sociedade, já que aumenta a probabilidade de pagamento de seus débitos, promove a manutenção dos empregos e benéfica para a economia.
O instituto da recuperação é destinado aos empresários, ou seja, pessoa jurídica que exerce profissionalmente, com habitualidade e fim lucrativo, atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços.
O art.50 da LREF, dentre outras, cataloga nos incisos I usque XVIII, 18 meios de práticas negociais para serem aplicadas “dentre outros”, sobrelevando neste bosquejo a fusão, incorporação, cisão e transformação [inciso II do art. 50 da LREF].[2]
O “Drop Down” de origem norte americana “é realizado por meio de aumento de capital que uma sociedade faz em outra, conferindo a esta bens de natureza diversa, tais como estabelecimentos comerciais e indústrias, carteira de clientes, atividades, contratos, atestados, tecnologia, acerto técnico, direito e obrigações, et. Na relação de bens acima enumerados – que não esgota a capacidade criadora dos empresários – verifica-se a presença de elementos do ativo (inclusive intangíveis) e do passivo da sociedade conferente…”.[3]
Assim, de pronto se afirma que o Drop Down não está previsto na LREF e tão pouco de forma expressa na legislação civil e esparsa. Todavia, se trata de uma criação negocial com validade se respeitar os dispositivos legais aplicáveis que a tornam exequível, atrelado às circunstâncias de passar pelo crivo do Plano de Recuperação Judicial aceito pelos credores em Assembleia.
Em recente decisão o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo confirmou decisão homologatória da Assembleia de Credores quanto ao Plano de Recuperação Judicial[4] que aprovou a criação de sociedade empresária subsidiária e transferência de ativos para buscar otimizar e viabilizar o soerguimento da empresa em crise com esteio no art. 50, II da LREF através da operação de “Drop Down”, assim ementada, no ponto:
“RECUPERAÇÃO JUDICIAL. Homologação do Plano- Drop Down- Abusividade não verificada- Criação de Sociedade Empresária Subsidiária e Transferência de Ativos que buscam otimizar e viabilizar o soerguimento da empresa em crise- Medida legítima prevista no art. 50, inciso II da lei 11.101/05. Precedentes. Recurso Improvido” [TJSP, 1ª Câmara Reservada de Distrito Empresarial, AI 2290263-65.2020.8.26.0000, DJe 28.10.21].
Também possível, por ter validade jurídica dentro das normas que regulam estas atividades, o “Drop Down” (i) com o aumento do capital feito por uma empresa em outra, mediante conferência de bens em troca dos quais recebe ações ou quotas da sociedade receptora, sem causar prejuízo aos credores, uma vez que não há configuração genérica de alienação de ativos, mas sim especificação de lícita operação, de acordo com cláusula do plano de soerguimento e cumprimento da recuperação judicial [TJSP, AI 2025806-71.2021.8.26.0000, DJe 6.7.2021] ou (ii) criando uma nova sociedade como unidade produtiva isolada, cujo resultado líquido apurado com a exploração das atividades e com a venda da unidade serão revertido ao pagamento dos créditos na recuperação judicial [TJSP, AI 2156567-35.2017.8.26.0000, DJe 14.2.2018].
Revestido de legalidade e aprovado pelos credores, o “Drop Down” poderá ser utilizado como uma estratégia inteligente na busca de incrementar a atividade para atingir melhores lucros e superação da crise econômico-financeiro da recuperanda, na busca de atender à regra maior da LREF em seu art. 47.
[1] LREF, art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
[2] Fusão: união de duas ou mais empresas, as quais se extinguem para a formação de uma nova sociedade [CC, art. 1.120 e 1.121; Lei 6.404/76, art.228]. Incorporação: uma ou mais empresas são incorporadas por outra empresa, havendo a extinção das empresas incorporadas [CC, arts.1.116 a 1.118; Lei 6.404/76, art.227]. Cisão: transferência integral ou parcial do patrimônio de uma ou mais empresas para outra, por meio de pagamento, acarretando a diminuição do capital social da empesa transferidora, ou até mesmo sua extinção, caso a cisão seja total [Lei 6.404/76, art.229]. Transformação: uma empresa altera o seu tipo societário, independentemente de dissolução ou liquidação [CC, arts. 1.113 a 1.115 e Lei 6.404/76, art.220 a 222].
[3] VERÇOSA, Haroldo M. D.; BARROS, Zanon de Paula. A recepção do “drop down” no direito brasileiro. Revista de Direito Mercantil, São Paulo, v. 125, a. XLI, p. 41 – 47, jan/mar. 2002, p. 41,
[4] A Assembleia Geral de Credores compete analisar, a um só tempo, a viabilidade econômica da empresa, assim como da consecução da proposta apresentada. Ao Poder Judiciária, por sua vez, incumbe velar pela validade das manifestações expendidas, e, naturalmente, preservar os efeitos legais das normas que se revelarem cogentes [STJ, Resp 1.532943/MT, DJe 10.10.2016].