A DOUTRINA DOS PRECEDENTES NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Emílio Gutierrez Sobrinho
SUMÁRIO: Introdução; 1 Aspectos gerais dos procedentes; 1.1 As origens e os fundamentos do precedente judicial; 1.2 O stare decisis;1.3 Conceito e elementos do precedente; 1.4 Técnicas de aplicação dos precedentes; 1.4.1 Técnicas de confrontação dos precedentes; 1.4.2 Técnicas de superação dos precedentes; 2 A doutrina dos precedentes no CPC/2015; 2.1 Precedentes vinculantes; 2.2 Decisões do STF em controle concentrado e súmulas vinculantes; 2.3 Súmulas persuasivas; 2.4 Orientação do plenário ou do órgão especial dos Tribunais; 2.5 Acórdãos em incidentes de assunção de competência; 2.6 Acórdãos de incidente de resolução de demandas repetitivas; Conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho terá por tema o estudo da doutrina dos precedentes à luz do vigente Código de Processo Civil. Referido assunto é um dos mais importantes na atualidade, porque importa no reconhecimento da inserção, no sistema jurídico brasileiro, dos paradigmas doutrinários da tradição jurídica anglo-saxônica.
Referida inserção conduz a uma absoluta mudança no modo de encarar o fenômeno jurídico, notadamente quando considerado o processo em si, porque, com os precedentes, não mais é possível a convivência de repostas jurídicas a casos análogos. Nesse sentido, os precedentes impõe um modo verticalizado de resolução das demandas pelo respeito aos precedentes firmados em níveis hierarquicamente superiores, conforme as disposições expressas do CPC/2015.
Assim, o trabalho analisará especificamente o modo como os precedentes serão estabelecidos, analisando as decisões judiciais que lhes darão origem. Além disso, buscaremos demonstrar as relações entre os modelos jurídicos da civil law e da common law, já que o CPC promoveu uma mescla entre os dois sistemas jurídicos. Nesse ponto, a questão mais frisante a ser analisada será o conteúdo atual do princípio da legalidade.
Com a mescla de tais modelos ou tradições jurídicas, surge o problema da má compreensão do precedente judicial, que, à primeira vista, pode ser considerado incompatível com a tradição civilista, calcada exclusivamente no paradigma da lei. Entretanto, a evolução do Direito clama por inovações e a mais frisante delas é a mudança do conteúdo do princípio da legalidade advinda com os preceitos da common law. É com essa problemática que o trabalho será estruturado, advindo a constatação de que a doutrina anglo-saxônica, em nosso contexto, apenas reforça referido princípio constitucional.
Com este artigo, busca-se a compreensão do modelo de precedentes à luz de ambas as tradições jurídicas, e, para tanto usaremos, fundamentalmente, o método dedutivo de pesquisa, efetuando um raciocínio descendente, partindo de conceitos gerais para atingir conceitos específicos. Como técnicas de pesquisa, usaremos a análise bibliográfica, que nos permitirá estabelecer as premissas maiores relativas ao tema.
Evidentemente que o conhecimento é ilimitado; porém, para cumprir com a delimitação do tema, promovemos um corte metodológico segundo o qual não serão abordadas as opiniões doutrinárias contrárias à ideia de que o CPC/2015 introduziu um sistema de precedentes no ordenamento jurídico brasileiro. Não abordaremos tais ideias, ainda que para refutá-las, pois o trabalho parte da premissa de que referido sistema existe, cabendo-nos sua análise.
Para bem cumprir nosso intento, o trabalho foi estruturado em dois capítulos. No primeiro, serão abordados os aspectos gerais relativos à doutrina dos precedentes. Nesse capítulo, serão examinadas as origens e os fundamentos do precedente judicial, bem como a doutrina que lhe inspira. Analisaremos, também, as técnicas de aplicação do precedente, discorrendo, nesse tópico, dos modos como os precedentes são confrontados e como são superados.
No segundo capítulo, analisaremos especificamente a disciplina dos precedentes de acordo com as disposições do CPC/2015. Assim, analisaremos os meios pelos quais nascem os precedentes, que se expressa, no geral, por decisões vinculantes. Desse modo, serão analisadas as figuras dispostas no art. 927 do CPC, dando especial relevo aos acórdãos dos incidentes de assunção de competência e de resolução de demandas repetitivas.
Por fim, em conclusões, procuraremos demonstrar que a doutrina dos precedentes impõe uma nova interpretação do princípio da legalidade e um fortalecimento e a efetiva aplicação do princípio da isonomia, razões contributivas a respeito do princípio da segurança jurídica.
1 ASPECTOS GERAIS DOS PRECEDENTES
É de conhecimento geral que os ordenamentos jurídicos dos países latino-americanos e dos países da Europa continental foram estabelecidos segundo os paradigmas da civil law, que é o sistema jurídico que tem a lei como fonte principal do Direito, sendo coadjuvado pela jurisprudência, que apenas o afirma, ao contrário do ocorre nos países de tradição anglo-saxã, cujos ordenamentos jurídicos foram estabelecidos segundo os padrões ditados pela common law, que se caracteriza substancialmente pelo uso dos costumes como fonte primordial e principal do Direito, expressando-se na cultura pelo seu reconhecimento pretoriano reiterado, o que se dá pelo reconhecimento da normatividade dos precedentes.
É o que nos explica Estefânia Maria de Queiroz Barboza:
Já o common law se desenvolveu com base nas decisões judiciais, com pouco ou quase nenhuma influência do Direito romano, podendo se apresentar as seguintes distinções do civil law: i) é um direito histórico, sem rupturas; ii) é um judge-made-law, em que a jurisprudência exerce papel de grande importância no sistema jurídico; iii) é um direito Judiciário; iv) é um direito não codificado; v) sofreu pouco influência do direito romanista. Importante ressaltar que o Direito inglês moderno, diversamente do civil law, é muito mais um direito histórico, sem rupturas entre o passado e o presente como aconteceu nos direitos de tradição civil law da Europa Continental, especialmente na França que rompeu com o direito preexistente com a Revolução Francesa. Diferentemente do civil law, no qual a autoridade da lei está na autoridade de quem a promulgou, no common law a autoridade do direito está em suas origens e em sua geral aceitabilidade por sucessivas gerações. Por essa razão admite-se a autoridade do direito construído jurisprudencialmente. (2014, p. 44)
Como se vê, a common law é um sistema jurídico aberto, pois nele é possível encontrar resposta jurídica a um dado caso concreto de modo posterior, sem necessidade de norma jurídica prévia, pois as normas são elaboradas e reinterpretadas continuamente. Já a civil law é um sistema fechado, pois parte da presunção de que para cada lide deve haver uma norma legal aplicável à espécie.
De um modo geral, ao longo da história, esses modelos ou tradições jurídicas sempre foram considerados e observados de modo individualizado, segundo a posição geográfica dos países, vale dizer, nas localidades onde a tradição romana foi bastante assimilada vigeu o paradigma da lei, isto é, do estatuto posto pela força do Estado, ao contrário dos territórios de cultura bárbara.
Entretanto, no mundo atual, estamos a constatar importantes transformações no âmbito das estruturas do Direito, porquanto os sistemas jurídicos ora tratados estão se fundindo, sendo inegável a influência dos padrões da common law nos sistemas de tradição civilista (notadamente com o uso da figura dos precedentes), bem como uma onda de regulação pela lei no âmbito da common law.
Nesse sentido, temos o entendimento de Thomas da Rosa de Bustamante, para quem, “durante séculos, foram propagadas as ideia de total separação entre as tradições civil law e common law. Apesar de até os dias de hoje alguns estudiosos entenderem que existe uma rígida separação entre essas duas tradições, concordamos com aqueles que vislumbram uma gradual fusão de tradições” (2012, p. 158).
Nosso Direito não ficou imune a esse processo evolutivo, pois, com o atual Código de Processo Civil, após um longo movimento de flexibilização do paradigma da lei, o Brasil adere totalmente a essa fusão, o que foi possibilitado pelos efeitos do neoconstitucionalismo, que demanda uma maior atividade judicial em prol da concretização dos direitos constitucionais, não mais se admitindo a existência de programas sem implementação, haja vista a constatação de que as normas constitucionais, por si só, detém normatividade.
É o que revela a doutrina: “Não há dúvida de que o civil law passou por um processo de transformação das concepções de direito e de jurisdição. Se o direito não está mais somente na lei, pois depende da Constituição, a jurisdição passa a ter a incumbência de controlar a validade da lei a partir dos direitos fundamentais” (Marinoni, 2014, p. 53).
Assim, o CPC/2015 consolida em nosso Direito um movimento evolutivo iniciado com a Emenda Constitucional nº 45, de 2004, que criou os institutos da súmula vinculante e da repercussão geral, momento em que passamos a internalizar em nosso sistema a figura do precedente judicial, antes matéria atinente exclusivamente aos sistemas de matriz anglo-saxônica.
Para o melhor entendimento do tema, necessário se faz uma breve digressão histórica sobre as origens do precedente judicial, bem como uma análise de suas bases fundamentais.
1.1 As origens e os fundamentos do precedente judicial
Sabemos que, na tradição da common law, o direito é predominantemente costumeiro e, por consequência, jurisprudencial, encontrando suas origens históricas na remota Inglaterra, que, embora tenha sido possessão romana, não aderiu ao sistema civilista e este não se fez sentir mesmo após a conquista normanda, porque Guilherme, o Conquistador, manteve as regras de direito e os tribunais locais, como forma de manter e consolidar seu poder político.
Naquela região a cultura romana, no que concerne ao direito, não havia rendido frutos, de modo que quase não existiam leis postas. Por essa razão, os conflitos de interesses, em um primeiro momento, passaram a ser resolvidos pelo próprio monarca, respeitando-se os costumes de cada localidade (counties) de onde provinham as lides.
Analisando as bases históricas do precedente judicial, Gustavo Santana Nogueira explica que o Duque da Normandia, Guilherme, queria ser rei por sucessão legal, e um dos primeiros atos foi prometer que a Inglaterra poderia manter seu direito antigo. Os invasores normandos eram bélicos, incultos e analfabetos, e, gostando ou não, eles encontraram na Inglaterra um sistema de governo e de direito muito bem desenvolvido se comparado com o direito praticado na Normandia. (2011, p. 88)
Assim, dado que a Inglaterra estava longe demais do poder central romano, inviabilizando a introdução, na ilha, do direito de matriz civilista, e que Guilherme não inovou nessa matéria, o Direito anglo-saxão pode ser mantido, o que possibilitou o seu desenvolvimento ao longo do tempo, sendo facilitado em razão do fato de que o Direito inglês não provinha de uma fonte única, sendo mais um direito local, oriundo dos costumes e reconhecido pelos Tribunais de cada localidade, segundo a cultura vigente.
Nesse sentido, é o que nos ensina Amílcar Carneiro Júnior, para quem a região onde atualmente se situa a Inglaterra também fez parte do domínio romano; porém, a partir do início do século V, sofreu a invasão de povos bárbaros – os saxões, os anglos e os dinamarqueses – que a compartilharam, dominando-a por aproximadamente dois séculos, introduzindo uma cultura pagã num ambienta que já conhecia o cristianismo. Não existia um direito comum a todo a terra, mas sim Direitos locais, guardando suas características próprias, apesar de estarem sob à égide de um soberano comum. Este era o direito anglo-saxônico. (2012, p. 128)
Essas são as razões principais pelas quais a região não sofreu a influência do Império Romano, tal qual ocorreu em França, por exemplo. O sistema da common law se manteve em toda a Inglaterra, que o repassou para as suas colônias em período posterior, notadamente os Estados Unidos da América, localidade onde o costume, fonte do Direito, foi positivado pelas decisões judiciais.
Conforme explica Fernanda Néri Rosa, o termo common law deriva do normando comune lay, justamente porque o Direito inglês surge com a conquista normanda, em 1066, eis que era comum porque era originário das sentenças dos Tribunais de Westminster, que valiam em toda a Inglaterra, em oposição aos direitos costumeiros e particulares de cada uma das tribos que formavam o povo da ilha. O ato de julgar era prerrogativa real, mas os reis o delegavam aos judges, que perambulavam pelo reino, à semelhança do pretor romano, realizando um circuito (e esta é a origem do termo circuit, ainda hoje usado para definir a circunscrição territorial das cortes da Inglaterra e Estados Unidos). Os juízes concediam writs, que constituíam ordens dadas pelo rei à autoridade para que respeitassem um determinado direito de quem obtinha o remédio. Depois de concedido o writ, um júri formado por leigos julgava as pretensões da pessoa beneficiada. (2016, p. 18)
O sistema de common law puro, consubstanciado no princípio segundo o qual o juiz positiva o direito (judge made law), vigorou na Inglaterra até a era vitoriana, já que posteriormente a Inglaterra tem recebido várias leis escritas, o que fica cada vez mais frisante, tendo em vistas os compromissos com a União Europeia, que demanda um direito escrito por legisladores supranacionais. Os EUA, por seu turno, segue a tradição da common law; porém, desde sua independência, convive com um direito de natureza romano-germânica, notadamente pela existência de uma constituição escrita e pela repercussão legislativa advinda de seu federalismo descentralizado.
Disso podemos verificar que não é incomum a mescla das tradições jurídicas ocidentais, sendo até um elemento importante para o progresso e desenvolvimento do Direito. Nesse sentido, podemos trazer o entendimento de René David, segundo o qual a common law conserva hoje a sua estrutura, muito diferente da dos direitos romano-germânicos, mas o papel desempenhado pela lei, foi aí aumentado e os métodos usado nos dois sistemas tendem a aproximar-se; sobretudo a regra de direito tende, cada vez mais, a ser concebido nos países de common law como é nos países da família romano-germânica. (1998, p. 26)
Enquanto, no sistema romano-germânico (civil law), o paradigma normativo está na lei posta pelo Estado; no sistema inglês, referido paradigma deriva das regras estabelecidas pelos juízes, em observância ao direito costumeiro, o que é possível pelo respeito à doctrine of stare decisis et non quieta movere, que em transliteração representa a regra segundo a qual as coisas devem ficar como foram decididas pelos juízes e pelas cortes do passado.
É essa doutrina que possibilita a segurança jurídica, pois imprime coesão e coerência nas decisões judiciais, permitindo o surgimento de uma jurisprudência, considerada em seu sentido técnico-jurídico, isto é, um conjunto de decisões cientificamente harmônico e coerente.
Entretanto, o alcance do stare decisis não é absoluto, pois, no sistema anglo-saxônico, não é qualquer decisão que possui o caráter vinculante. As cortes, ao se debruçarem sobre um caso, deverá questionar a força do precedente, que pode ter caráter obrigatório/vinculante (binding ou constraining) ou apenas persuasivo ou meramente argumentativo (persuasive ou advisory).
Assim, nesse sistema, a aplicação de um dado precedente não se dá de forma incontinente ou automática, sem a devida reflexão jurídica. Ao contrário, o julgador deve ter maior cautela para fazer, por exemplo, um mero juízo de subsunção, pois, antes de analisar o caso em si, deverá cotejá-lo com o corpo de precedentes, verificando o seu alcance, não podendo, como regra, ir contra o direito legislado.
Nesse sentido, Fernanda Néri Rosa explica que a autoridade dos precedentes é constantemente posta em xeque. Mesmo a sustentação do precedente, no âmbito das Cortes Supremas, deve ser motivada para além do simples stare decisis uma vez que os Tribunais podem deixar de aplicar a regra anteriormente posta. Por conta da primazia da Constituição nos EUA e do direito comum europeu na Inglaterra, as Cortes são obrigadas a levar em conta os textos postos quando as questões envolvam matéria constitucional, sendo frequentemente alvos de crítica quando baseiam a interpretação do texto unicamente em precedentes. (2016, p. 20-21)
Assim, no âmbito da common law, o direito primordialmente é formado pelo costume que se expressa normativamente pelo precedente, que é o reconhecimento judicial do costume e não o costume em si. O Direito inglês se desenvolveu e tornou-se um sistema porque desde o século XIII existiram coletâneas de jurisprudências, que serviam de base para os juízes resolverem os litígios (David, 2006, p. 13).
Nesse sistema, em suma, há o paradigma do judge-made-law, isto é, a norma é produzida pelo Poder Judiciário, que reconhece os direitos a partir do caso concreto e vincula decisões futuras, daí o papel fundamental da jurisprudência.
As razões de tal possibilidade são muito bem explicadas por Cezar Saldanha Souza Junior, para quem, no common law, a legislação formal é fonte secundária, e não primária, do direito. Direito é, antes de tudo, produto do costume e do precedente judicial. O direito legislado formal (o statue law), mesmo quando crescente, funciona como um instrumento para ajudar o Judiciário a resolver conflitos; ele é sociodigerido pelo common law, constumeiro e judicial. O Judiciário não é um órgão (burocrático) do Estado, mas um braço (em muitos lugares ainda eletivo) da sociedade. É o poder mais importante em matéria de direito. Cria direito, com a força vinculante do precedente, erga omnes. E a Constituição – aí o segredo – funde-se ao núcleo desse sistema sociodigestor, o common law, e, incrustada nela, torna-se critério a ser legitimamente usado pelo Judiciário no julgamento das aplicações concretas do direito legislado. (Carvalho, 2008, p. 374)
Entretanto, na tradição do common law há espaço para a existência do direito legislado ou positivado (statute law). Assim, não é possível afirmar que referida tradição se fundamenta somente nos precedentes (case law), cuja ideologia, embora estivesse difusamente presente no sistema jurídico inglês, foi reconhecida e aceita somente no início do século XIX, quadra histórica em que houve pronunciamento expresso no sentido de reconhecê-lo.
Sobre isso, temos o entendimento de Fernanda Néri Rosa:
A Câmara dos Lordes inglesa reconheceu a eficácia vertical e vinculante do precedente, ou seja, a partir do julgado proferido, procedia-se ao seu registro, que por sua vez era publicado em coletâneas (chamadas reports) e passavam a ter força obrigatória, ou regras de precedentes (rules os precedents). Deste ponto, serviam para reger situações futuras enquanto juízes e demais estudiosos do direito retiravam deste mesmo julgado as regras e princípios que iriam ampliar os limites da common law de forma generalizada. (2016, p. 22)
Esse pronunciamento da Câmara dos Lordes consagrou a antiga prática de citar, nos casos judiciais, as decisões de casos pretéritos que guardassem semelhança com o caso atual sob discussão, visando, assim, dar exemplos do direito pretendido (citação do case law ou precedente), que se fazia impor pela respeito à doutrina do stare decisis.
1.2 O stare decisis
No tópico anterior, verificamos a origem histórica da tradição jurídica denominada common law, bem como sua base fundamental: a ideia do precedente. Neste tópico, verificaremos precisamente o stare decisis, doutrina primordial para o estudo aqui proposto, vez que se refere ao efeito vinculante do precedente, que é garantidor do anseio de segurança jurídica, porque é essa doutrina que impede a balbúrdia judicial, vez que impõe aos órgãos jurisdicionais o dever de observância das decisões anteriores proferidas em casos análogos.
Nesse preciso sentido, podemos citar o entendimento de Marinoni:
O stare decisis, portanto, mostra-se como uma forma distinta de restrição por precedente. Sob a doutrina do stare decisis, uma Corte deve decidir as questões da mesma forma que ela decidiu no passado, mesmo que membros da Corte tenham mudado, ou ainda que os mesmos membros tenham mudado de ideia. Tanto quanto o precedente vertical, o stare decisis – precedente horizontal – trata de seguir as decisões de outros. (2013, p. 87)
Assim, podemos destacar que a principal característica da doutrina é a obrigatoriedade, pois, por ela, o precedente apresenta força vinculante, isto é obrigatória, de sorte que a atuação judicial não pode se afastar daquilo que foi estabelecido anteriormente.
Para ilustrar, trazemos o entendimento de José Rogério Cruz e Tucci, segundo o qual o fundamento desta teoria impõe os juízes o dever funcional de seguir, nos casos sucessivos, os julgados já proferidos em situações análogos. Não é suficiente que o órgão jurisdicional encarregado de proferir a decisão examine os precedentes como subsídio persuasivo relevante, a considerar no momento de construir a sentença. Estes precedentes, na verdade, são vinculantes, mesmo que exista apenas um único pronunciamento pertinente (precedent in point) de uma Corte de hierarquia superior. (2004, p. 12)
Pela característica da obrigatoriedade, é possível dizer que o precedente assume eficácia normativa e é aqui que reside o problema quando há o transporte dessa doutrina para o mundo civil law, no qual a normatividade é produto quase exclusivo da atividade legiferante, cujo consectário é o princípio da legalidade.
Entretanto, segundo o pensamento dominante atual esse é um problema aparente. Ao contrário, para a doutrina em geral, o stare decisis é a solução para o problema real de falta de segurança jurídica advinda pela exacerbação do princípio da legalidade, próprio do civil law, que, em tempos de massificação das causas jurídicas, não corresponde mais ao anseio de justiça, porque ele permite a convivência de soluções jurídicas divergentes em casos semelhantes e isso é possível porque, sendo a lei um preceito genérico e abstrato, sua aplicação demanda interpretação para adaptá-la à especificidade do caso particularizado, e, sendo essa interpretação feita por intérpretes diversos, a margem de erro é grande demais.
Daí não é incomum, em nossa realidade, a existência de soluções ambíguas e conflitantes havidas em casos iguais, o que fere, para além do primado da legalidade, os preceitos maiores de justiça.
Nesse sentido, temos a contribuição de Fernanda Rosa Néri, para quem o equívoco da civil law foi iludir-se com a segurança jurídica baseada tão-somente na lei. A lei é norma abstrata e geral e sua aplicação depende de interpretação jurídica. A insegurança se estabelece na medida em que os intérpretes da norma têm visões, posicionamentos e formações distintas uns dos outros, possibilitando um sem número de entendimentos possíveis para o mesmo texto legal, o que invariavelmente gerará decisões em diversos sentidos e por vezes contraditórias entre si. A exemplo de outros países que adotam a civil law, o Brasil também tem passado por dissabores com a jurisprudência divergente, tornando a lei insuficiente para afirmar a segurança jurídica aos jurisdicionados. Este fenômeno fomentou a aludida alteração dos sistemas, pelo que não é demais dizer que se observa a formação de uma nova civil law e uma nova common law, em que porções das duas tradições se misturam, preservando-se duas bases. (2016, p. 24)
Tendo isso em vista, a solução que o stare decisis impõe é o respeito às decisões estabelecidas pelos Tribunais, consagrando o preceito ubi eadem ratio ibi idem jus, que traz coerência à jurisprudência, proporcionando segurança jurídica, que é um dos mais importantes preceitos constitucionais.
Conforme advertido, o Código de Processo Civil atual não substitui o sistema civil law pela common law. O novo Código consagra a fusão entre os sistemas, buscando suprir o déficit de segurança jurídica.
Assim, a figura do precedente judicial obrigatório não coloca fim à legislação, que conserva sua importância como fonte do direito, tanto que, por preceito constitucional, ainda vige o princípio da legalidade e a noção de separação de poderes, razão pela qual não pode o juiz criar norma a partir do nada, ainda que haja omissão legal, e também não poderá desconsiderar as determinações legais.
Nesse sentido, o CPC/2015, na ideia de fusão aqui exposta, busca dar coerência às decisões judiciais e o faz pela valorização do princípio da legalidade mediante o reconhecimento de que a lei não é propriedade do juiz, de modo que não pode o julgador decidir diversamente daquilo que está cristalizado pela jurisprudência (que é expressão da legalidade), devendo guardar a coerência estabelecida pelas cortes superiores.
Tal situação é a valorização do princípio da legalidade, pois o Poder Legislativo faz a lei e os Tribunais a aplicam de acordo com tal e qual interpretação e todos os demais órgãos da justiça devem respeitar a interpretação, por coerência institucional. E isso é fator de promoção da segurança jurídica.
Assim, para nós, que estamos inseridos na tradição civilista, a ideia de precedente não terá o condão de criar o Direito, mas de afirmar o Direito posto pelo Poder Legislativo, e isso é necessário para garantir a estabilidade da jurisprudência, condição da segurança jurídica.
1.3 Conceito e elementos do precedente
Verificada a origem histórica do precedente, bem como a doutrina que lhe inspira e lhe confere sustentação (stare decisis doctrine), cabe-nos conceituá-lo. Nessa senda, podemos dizer que o “precedente é a decisão judicial tomada à luz de um caso concreto, cujo núcleo pode servir como diretriz para o julgamento posterior de casos análogos” (Didier Jr.; Oliveira; Braga, 2013, p. 385).
O precedente, portanto, é norma jurídica criada a partir de caso concreto, que irá regular casos análogos futuros, extravasando o âmbito de incidência da decisão judicial, que, para além de normatizar o caso concreto, irá normatizar casos futuros. Em nosso universo semântico, norma jurídica é o produto da interpretação do direito.
Nesse sentido, temos o entendimento de René David:
O juiz levará em conta decisões anteriormente proferidas e provavelmente não dirá que essas decisões foram mal proferidas, mas ser-lhe-á possível, considerando as circunstâncias do caso, descobrir na lide que lhe foi submetida, um determinado elemento que não existia ou que não foi considerado no caso precedente e que lhe permite descartar a regra estipulada no precedente, ou pelo menos lhe permite precisá-la, completá-la ou reformulá-la, dando ao caso decisão razoável que o mesmo requer. (2006, p. 14)
A aplicação do precedente aos casos postos em análise demanda um importante esforço de argumentação jurídica, vale dizer, o uso do precedente, como norma jurídica, demanda justificação hermenêutica. O uso do precedente não pode ensejar prática judicial discricionária e arbitrária, razão pela qual ele deve ser justificado em face da doutrina e da legislação vigente no país.
Sobre tal, podemos destacar o entendimento de Michele Taruffo, para quem o uso do precedente caracteriza de maneira peculiar a estrutura da argumentação jurídica na interpretação da regra do direito e em sua justificação, seja quando o precedente é usado em sede de análise doutrinária, seja quando o precedente é dirigido ao âmbito da interpretação judicial da lei, sendo o precedente um fator essencial e decisivo ao tempo da interpretação e aplicação do direito e esse é um fato que condiciona a estrutura da argumentação jurídica. (2014)
Para bem entender o conceito do precedente judicial, é necessário examinar seus elementos constitutivos: a ratio decidendi ou holding e o obiter dictum.
A ratio decidendi é a razão que foi usada para o juiz decidir a causa. Essa razão de decidir é extraída pelo processo de interpretação do caso concreto e que apresenta um caráter geral, haja vista que referenciará os casos futuros e semelhantes. A ratio decidendi é determinada pelos fundamentos jurídicos da decisão e se constitui no núcleo do precedente judicial.
Assim, sob esse prisma, os precedentes podem ser identificados nas razões que o juiz usou para julgar determinado caso. É na motivação que surgem os precedentes. Sobre isso, Bustamante entende ser o precedente a fonte do direito a ser concretizado no caso examinado em juízo, pois, para ele, é possível “considerar as decisões judiciais como ‘normas’ de caráter especialmente concreto e os precedentes como uma das espécies de ‘fontes’ dessas normas” (2012, p. 294).
É por essa razão que a doutrina, de um modo geral, entende que a ratio decidendi, como tese jurídica, se descola do caso concreto do qual emergiu e adquire abstratação e generalidade suficientes para regular os casos análogos futuros, como expressão da legalidade reconhecida:
Nesse exato sentido, temos o seguinte entendimento: […] a ratio decidendi encerra uma escolha, uma opção hermenêutica de cunho universal que repercutirá nos casos futuros […] as razões de decidir devem prever e sopesar a repercussão prática que determinada decisão poderá oferecer para o ordenamento jurídico globalmente considerado, devendo possuir grande grau de generalização, considerando não apenas o que é melhor para o caso em tela, mas o que se mostra mais adequada enquanto uma norma geral e abstrata a ser aplicada em futuros casos análogos. (Tucci, 2004, p. 176)
Genuinamente considerado, o reconhecimento do precedente, no dizer de Fernanda Néri Rosa, caberá ao juiz posterior, vez que é ele quem analisará se “existe ou não identificação do caso concreto em apreço e a situação inicial que originou o precedente para afirmar se sua aplicação é obrigatória” (2016, p. 30).
Essa sistemática, entretanto, sofre mudança no sistema do CPC/2015, porque, tendo em vista a mescla dos sistemas da civil law com a common law, o reconhecimento do precedente ocorrerá a partir de determinadas decisões judiciais com efeitos vinculantes, conforme veremos adiante.
Dito de outro modo: o efeito vinculante, em nosso sistema, não ocorrerá pelo reconhecimento difuso da ratio decidendi, que será identificada para efeito de subsunção do precedente criado às demandas analisadas. É por essa razão que, parte da doutrina, em especial o Professor Lenio Streck, entende que o CPC/2015 não inaugura um sistema de precedentes, mas um sistema de decisões vinculantes por imperativo legal.
De um modo ou de outro, a compreensão do precedente passa pela compreensão da ratio decidendi. É esse elemento que tem normatividade. Nesse sentido, temos o seguinte entendimento:
Ponto importante a ser ressaltado para a correta compreensão da sistemática dos precedentes judiciais é que não é a decisão judicial como um todo que vincula, mas apenas a ratio decidendi do precedente […] a norma jurídica geral (tese jurídica, ratio decidendi) estabelecida na fundamentação de determinadas decisões judiciais tem o condão de vincular decisões posteriores, obrigando que o os órgãos jurisdicionadas adotem aquela mesma tese jurídica na sua própria fundamentação. (Didier Jr.; Oliveira; Braga, 2013, p. 389)
O outro elemento do precedente é o obiter dictum, que pode ser conceituado como o dado acessório que complementa a ratio decidendi, auxiliando na sua argumentação. O obiter dictum não tem caráter vinculante, mas pode servir de elemento persuasivo para a exata compreensão da norma firmada pelo precedente.
É nesse sentido o entendimento de Gustavo Santana Nogueira, para quem o obtier dictum é a: “Passagem da motivação do julgamento que contém argumentação marginal ou simples opinião, prescindível para o deslinde da controvérsia. O obiter dicta, assim considerado, não se presta para ser invocado como precedente vinculante em caso análogo, mas pode perfeitamente ser referido como argumento de persuasão” (2011, p. 108).
Assim, o obiter dictum é importante elemento do precedente judicial. Não se confunde com a norma dele derivada, mas é o responsável por sua compreensão, pois é o conjunto das motivações que fundamentam a decisão judicial, que é construída por meio de conceitos éticos, filosóficos e culturais, que expressam a convicção do julgador, que não deve ficar adstrito à regra de direito apenas.
Nesse sentido, Thomas da Rosa de Bustamante destaca a necessidade de distinguir esses dois elementos é uma consequência natural do fato de que o juiz não encontra limites ao formular a motivação do seu juízo adjudicativo da lide (característica marcante do positivismo), e assim, faz-se oportuno que essa liberdade da perspectiva da motivação fosse balanceada pela regra segundo a qual nem tudo que ele pode dizer e diz é vinculante para os casos futuros. Será vinculante apenas as considerações que representam indispensavelmente o nexo estrito de causalidade jurídica entre o fato e a decisão. (2012, p. 196)
Procurando distinguir os dois elementos que compõe o precedente, temos a explicação de Marinoni, para quem são consideradas dictum as passagens que não são necessárias ao resultado, as que não conectadas com os fatos dos casos ou as que são dirigidas a um ponto que nenhuma das partes buscou arguir. Contudo, existem questões independentes cuja análise não são necessárias à resolução – que assim são obiter dictum – mas são intimamente ligadas ao caso sob julgamento e abordadas de forma aprofundada pelo juiz ou tribunal, assumindo perfil e textura muito próximos ao da ratio decidendi. Nesses casos observa-se que, apesar de continuarem sem efeitos obrigatórios, essas obiter dictum possuem forte efeito persuasivo. (2013, p. 93)
Assim, tendo em vista tais considerações, podemos dizer que o obiter dictum é extraído do precedente a partir de um critério negativo, vale dizer, será obter dictum tudo aquilo que não compuser a ratio decidendi e o critério distintivo será o caráter vinculante.
1.4 Técnicas de aplicação dos precedentes
Uma vez verificadas as origens históricas e os elementos fundamentais que compõem a ideia do que é um precedente, necessário se faz analisar as técnicas de sua aplicação. Tais técnicas são importantes, já que o uso dos precedentes vai muito além do singelo critério de subsunção, porque, no âmbito da doutrina stare decisis, não há uma regra impositiva detectável de pronto, razão pela qual caberá ao intérprete determinar a ratio decidendi.
Nesse preciso sentido, temos o entendimento de Fernanda Néri Rosa:
Para se utilizar a forma correta o stare decisis é preciso valer-se de ferramentas hábeis para se aplicar um precedente, tais ferramentas nada mais são do que técnicas de confronto e de superação. Caberá ao julgador identificar a ratio decidendi do caso anterior e chegar a uma conclusão sobre sua vinculação ou não à situação em cotejo. (2016, p. 39)
Essas técnica de aplicação dos precedentes são de duas naturezas. Nesse passo, temos as técnicas de confrontação e as técnicas de superação dos precedentes. No âmbito do primeiro grupo (técnica de confrontação), temos os seguintes critérios: distinguishing, restrictive distinguishing e ampliative distinguishing. No âmbito do seguinte grupo (técnica de superação), temos os seguintes critérios: overruling, antecipatory overruling e overriding.
1.4.1 Técnicas de confrontação dos precedentes
As técnicas de confrontação dos precedentes, com os critérios já ditos e a seguir explicitados, serão usadas quando entre vários precedentes firmados houver, entre eles, a identidade da ratio decidendi. Assim, os critérios a seguir serão usados para definir qual dos precedentes será aplicado ao caso.
Tendo isso em vista, temos o distinguishing ou distinção. Trata-se de uma técnica consistente na não aplicação do precedente firmado nos casos em que houver uma dada circunstância particularizada que permita o afastamento da regra criada. A distinção, nesse ponto, é o reconhecimento de circunstância específica que torne o precedente inadequado ao caso.
É, pois, um método de comparação pelo qual o julgador faz a confrontação dos elementos objetivos do caso sub judice com os elementos dos casos anteriores, balizados pelos precedentes. Noutras palavras: o aplicador do Direito verifica se há ou não identidade entre o caso posto e o caso paradigma.
Para ilustrar essa ideia, temos o entendimento de Gustavo Santana Nogueira:
Quando um tribunal reconhece a existência do precedente, mas encontra significativas diferenças que justificam a não adesão ao caso anterior, ele está dizendo que, explícita ou implicitamente, que se não fossem essas diferenças, a solução do caso atual seria a mesma do precedente, posto que é reconhecido algum valor a esse precedente. (2011, p. 200)
Esse critério é importante ao sistema de precedentes, porque, ao conferir dinâmica ao sistema jurídico, garantindo a segurança jurídica, não permite o engessamento do direito.
Nesse sentido, temos o entendimento de Jaldemiro Rodrigues de Ataíde Júnior:
A essa técnica de confronto e diferenciação entre os fatos relevantes de dois casos dá-se o nome de distinguishing. Ela revela a inadequação da aplicação da ratio decidendi do precedente ao caso em julgamento em virtude da diversidade fática entre os mesmos. Assim dá flexibilidade ao sistema não o engessando e faz justiça no caso concreto. (2012, p. 158)
A doutrina, em geral, estabelece que a distinção se apresenta sob duas formas, sendo, à primeira vista, o próprio método de comparação, que já explicitamos. A outra forma está relacionada ao produto desse método, que pode sugerir três resultados: a não aplicação do precedente ou a aplicação, que poderá ser restritiva ou ampliativa.
Sob esse aspecto, Fernanda Néri Rosa explica que essa técnica busca encontrar o fundamento jurídico para o afastamento do precedente firmado anteriormente, pelo fato de que outra tese jurídica deve ser aplicada e não porque os fatos da situação em análise são distintos dos fatos do caso que serve de guia. Ocorre sobretudo quando o juiz ou tribunal estabelecem outra norma para a decisão do caso, excluindo o precedente judicial. Por meio do distinguishing, o operador verifica as circunstâncias de fato (elementos objetivos) do caso que serve de guia e as compara com o caso em apreço. Feita a comparação e, existindo semelhanças, haverá o julgamento com a aplicação do precedente, se houver diferenças, afasta-se o precedente e procede-se ao julgamento sem ele, é o que acontece no Brasil quando esta técnica é utilizada pelos órgãos colegiados dos Tribunais Superiores (STF e STJ), como se verá no capítulo seguinte. (2016, p. 41)
Assim, surge-nos os conceitos de restrictive distinguishing e ampliative distinguishing.
A distinção restritiva ocorre quando o julgador dá ao precedente uma interpretação restritiva pela verificação da existência de diferenças entre o caso paradigma e o caso sub judice. A consequência da aplicação restritiva está no fato de que o juízo poderá julgar o caso concreto de forma independente, ressaltando o postulado do common law de criação pretoriana do Direito, que, no exemplo ora dado, irá confirmar uma nova criação do precedente, mesmo que seja pela renovação da ratio decidendi já reconhecida, porém agora mais restrita.
Entretanto, à luz do sistema brasileiro, tal situação vai de encontro ao paradigma da lei, pois não podemos esquecer que, com o CPC/2015, nosso ordenamento jurídico passou a contemplar um sistema misto, congregando elementos das tradições anglo-saxônica e romana. Assim, o uso de tal técnica não pode servir à arbitrariedade pretoriana, vez que não é dado ao Poder Judiciário empreender atividade legiferante, vez que, conforme já assentamos, o uso dos precedentes, na realidade brasileira, não se presta a suplantar o princípio da legalidade, mas sim à sua afirmação.
No que se refere ao ampliative distinguishing, podemos defini-lo como a modalidade técnica de confronto pela qual o juízo ou Tribunal externa uma interpretação extensiva do precedente pela verificação de diferenças entre o caso paradigma e o caso sub judice.
É nessa linha o entendimento de Haroldo Lourenço: “De igual modo, mesmo percebendo que no caso concreto há peculiaridades em relação aos casos anteriores, pode o magistrado estender à hipótese sub judice a mesma solução conferida aos casos anteriores, por lhe entender aplicável. Há, nessa hipótese, ampliative distinguishing” (2011).
Ao contrário do que ocorre com a distinção restritiva, na ampliativa não há a margem para o juiz decidir livremente, porque esta técnica, no âmbito da doutrina dos precedentes, corresponde à analogia no âmbito da lei, de modo que o juiz não terá possibilidade ampla de criação da norma jurídica, pois terá que atuar nos limites da ratio decidendi, tal qual ocorre quando o julgador faz uso da analogia.
Assim entendemos, porque, como estamos a operar um sistema misto, conforme já assentamos, o julgador estará vinculado sempre ao princípio constitucional da legalidade, devendo usar a doutrina dos precedentes para afirmá-lo a todos os casos, garantindo segurança jurídica.
1.4.2 Técnicas de superação dos precedentes
Por meios das técnicas de superação dos precedentes, o Poder Judiciário reconhece não mais existirem condições fático-jurídicas para a aplicação da ratio decidendi, pondo fim, portanto, à aplicação da norma extraída de um precedente, substituindo-a por outra absolutamente diferente.
Conforme verificamos, temos como técnica de superação o overruling e o overiding, que são importantes instrumentos de oxigenação dos precedentes, pois impede o seu engessamento.
Nesse passo, o overruling é um método de superação do precedente pelo reconhecimento, por parte do Poder Judiciário, da perda de sua força vinculante, sendo novo precedente criado, de acordo com a nova feição social vigente. A perda dessa força vinculante se dá pela mudança das condições fático-jurídicas aludidas antes, que, no dizer de Ataíde Júnior, se expressa pela perda da congruência social ou pelo surgimento de inconsistência no sistema jurídico.
Em suma, pelo overruling um precedente perde a sua força vinculante e é substituído (overruled) por outro precedente (Rosa, 2016, p. 44).
Tendo isso em vista, Fredie Didier nos explica como o overruling é feito: “Trata-se de método em que os Tribunais, depois da reavaliação dos fundamentos que levaram à formação de um precedente que ordinariamente se aplicaria ao caso em julgamento, decidem cancelar a fórmula anterior e atribuir uma interpretação, total ou parcialmente, diferente da antecedente” (2013, p. 456).
Se podemos comparar o ampliative distinguishing com a analogia, podemos também dizer que o overruling, na doutrina dos precedentes, corresponde à revogação no âmbito das leis. É, pois, espécie de revogação, mas que ocorre por meio de justificações no âmbito processual, conforme as disposições do CPC/2015.
Essas justificações, conforme vimos, devem demonstrar a superação do precedente notadamente em virtude da perda da congruência social. Nesse sentido, destaca-se o entendimento de Luiz Guilherme Marinoni:
Há a perda da congruência social quando um precedente passa a negar as proposições morais, políticas e de experiência. As proposições morais determinam uma conduta como certa e errada a partir do consenso geral da comunidade, as políticas caracterizam uma situação como boa ou má em face do bem-estar geral e as de experiência dizem respeito ao modo como o mundo funciona. (2013, p. 152)
A superação pode ocorrer também por inconsistência no sistema jurídico, que ocorre quando o precedente judicial perde a coerência quando em comparação com outras decisões (jurisprudência), vale dizer, a ratio decidendi deixa de fazer sentido à luz da dogmática jurídica.
Como bem observa a doutrina, em sua generalidade, a superação de um precedente tem que ser absolutamente justificada (fundamentada), sob pena de perverter o compromisso com a estabilidade do sistema jurídico, proposto pela teoria dos precedentes.
Essa cuidadosa fundamentação é importante porque o overruling não promove somente uma “revogação” do precedente, mas impõe um novo entendimento sobre a matéria e tal entendimento deve guardar coerência com o sistema jurídico, pois, mais do que uma superação, o overruling acarretará paradoxos e incoerências no sistema jurídico.
É nesse sentido a advertência de Fernanda Néri Rosa:
Desta monta, analisando os desdobramentos práticos de uma decisão que supera um precedente, é inegável que a mesma deverá ser extremamente motivada e fundamentada a fim de que opere uma justificativa para essa revogação. E essas razões ou circunstâncias condicionam a existência da regra de direito. Se as razões não mais existem, também não existirá a norma. Portanto, para que haja o overruling é preciso, repita-se, maior fundamentação, expondo as razões ainda não combatidas, além da justificativa para esta superação. (2016, p. 45)
A superação do precedente pode ocorrer de forma expressa (express overruling) ou tácita (implied overruling). Será expressa quando, no âmbito de um dado julgamento, o Poder Judiciário faz menção manifesta da superação do paradigma, passando a adotar outra orientação. De outro lado, a superação será implícita quando no julgamento for aplicado posicionamento diferente do determinado pelo precedente, vale dizer, o Poder Judiciário aplica, justificadamente, posição nova em confronto à que foi estabelecida pelo precedente.
Com relação aos efeitos temporais, a superação dos precedentes pode se apresentar pelo aspecto retroativo (ex tunc) ou prospectivo (ex nunc). O aspecto temporal retroativo, conforme demonstração de Priscilla Silva de Jesus, pode se apresentar de dois modos, a saber:
O retrospective overruling ou revogação retrospectiva, pode ser puro ou clássico. No overruling retrospectivo puro, o novo precedente é aplicado aos fatos ocorridos tanto antes quanto depois de sua publicação, inclusive os que já foram objeto de sentença transitada em julgado e também os fatos do caso que os gerou. No overruling retrospectivo clássico, o novo precedente se aplica aos fatos ocorridos antes e depois de sua publicação, excluindo aqueles que já forma objeto de sentença transitada em julgado e também aos fatos dos casos que o gerou. […] Significa que, ocorrendo mudança na valoração das circunstâncias relevantes de casos similares, o julgador está autorizado a adotar entendimento diverso, desde que assumida a devida carga de fundamentação. (2014, p. 16/17)
No âmbito dos efeitos prospectivos (ex nunc ou prospective overruling), a superação se aplica apenas para os casos futuros, isto é, casos advindos após a consolidação do julgado que impôs a superação. Esse é o efeito-regra em matéria de precedente, porque se coaduna com os preceitos de boa-fé e segurança jurídica, pois respeita situações firmadas à luz da norma superada.
Conforme nos lembra Priscilla Silva de Jesus (2014, p. 18), à luz da teoria dos precedentes, o efeito prospectivo da superação do precedente pode ser aplicado tanto a fatos que ocorreram após a publicação do precedente (regra geral), como a fatos que ocorreram antes da publicação do precedente, mas que ainda está pendente de análise do Poder Judiciário.
Entretanto, à luz da sistemática jurídica brasileira, tal orientação deve ser aplicada moderadamente e mediante minuciosa fundamentação, porque é necessário o respeito à regra tempus regit actum para a preservação da segurança jurídica. Dito de outro modo, a modulação de efeito deve ser vista como exceção plenamente justificada.
Convém, nesse ponto, a orientação de Marcelo Alves Dias de Souza: “A escolha pela aplicação retroativa ou prospectiva deve sopesar o fim almejado pela nova regra, qual tipo de aplicação se mostra mais correta e justa, como também o grau de confiança que o Estado e os cidadãos depositaram no precedente a ser superado” (2006, p. 235).
Na doutrina dos precedentes, encontramos uma outra espécie de superação, denominada antecipatory overruling, que é um tipo de não aplicação preventiva de um precedente, realizada por órgão judicial inferior, tendo em vista a constatação de que as Cortes Superiores irá declará-lo superado. Trata-se, portanto, de antecipar um posicionamento certo dos órgãos superiores.
Embora tal prática seja possível em tese, conforme explicado pela doutrina, entendemos que, no modelo instituído pelo CPC/2015, ela não tem aplicabilidade, porque, conforme veremos, os precedentes são instituídos a partir de decisões específicas de órgãos jurisdicionais superiores, não podendo o juízo de instância inferior antecipar uma decisão que não lhe compete.
Por fim, no campo da superação, existe a figura do overriding, que é a técnica de superação parcial do precedente, pela restrição da incidência da ratio decidendi. É, pois, uma limitação da norma jurídica em razão de nova regra de direito que dá novo contorno ao precedente.
No dizer de Fernanda Néri Rosa, o overriding consiste no ato da corte em restringir o âmbito de aplicação de determinada doutrina em decorrência de uma nova regra surgida após o estabelecimento da doutrina no precedente, tratando-se de uma espécie de revogação parcial. […] Trata de uma maneira de verificar, de forma independente, uma questão não tratada pelo precedente. Desta forma, leva-se em conta as condições sociais da doutrina do precedente, ainda que, na prática, às vezes a Corte supere parcialmente uma doutrina pelas mesmas razões que se encontrava o precedente. (2016, p. 49)
São esses os elementos teóricos e doutrinários básicos da matéria “precedente judicial“. Passemos agora ao estudo dos precedentes especificamente à luz do CPC/2015.
2 A DOUTRINA DOS PRECEDENTES NO CPC/2015
No capítulo primeiro deste estudo, verificamos os principais elementos da doutrina dos precedentes. Referidos elementos derivam de longo processo de desenvolvimento no âmbito da common law, razão pela qual advertimos que os conceitos externados nem sempre corresponderão ao que foi positivado no CPC/2015, que, como sabemos, introduziu um sistema de precedentes no âmbito de uma tradição jurídica de matriz romano-germânica, dando contornos mistos ao ordenamento jurídico nacional. Por esse motivo, com a atual codificação é necessário um esforço hermenêutico de compatibilização entre a doutrina dos precedentes e a legislação pátria. Assim, os conceitos da matéria precedente serão aplicados ressalvando-se os imperativos da legislação, em respeito ao princípio da legalidade.
A ressalva é importante, porque consideramos que os precedentes vieram ao sistema para afirmar, de modo uniforme, o princípio constitucional da legalidade e não para construir uma legalidade paralela, oriunda do ativismo do Poder Judiciário, conducente à atividade legislativa. É por essa razão que o art. 926, caput, do CPC impõe aos Tribunais o dever de uniformizar sua jurisprudência, mantendo-a estável, íntegra e coerente.
Dizer que a jurisprudência deve ser coerente é dizer que nela não deve conter contradições, isto é, os Tribunais devem manter uma relação harmônica entre o que se decide e todo o processo (Donizetti, 2017, p. 1466). Além disso, é preciso que a jurisprudência seja estável, vale dizer, a teses jurídicas consagradas pelos Tribunais devem ser duradouras, garantindo a previsibilidade e, por consequência, segurança jurídica nas relações sociais. A estabilização deve impedir a alteração desmedida de teses jurídicas, que descambam ao decisionismo circunstancial e, por isso mesmo, arbitrário. Por fim, a jurisprudência deve ser íntegra, isto é, deve guardar compatibilidade com o Direito, daí porque asseveramos que, em nosso modelo, a doutrina do precedente não cria o direito em abstrato, mas sim o uniformiza. É necessário que haja a convergência entre os modelos anglicano e romano-germânico.
Assim, é para essa finalidade que a doutrina brasileira de precedentes existe. Ela é o instrumento de ordenação de nossa jurisprudência. Essa uniformização é importante para garantir a segurança jurídica nas relações, posto que inconcebível a divergência de decisões judiciais que versem sobre a mesma matéria.
É nesse sentido as razões de Elpídio Donizetti acerca da uniformização da jurisprudência, asseverando que ela contribui para a previsibilidade das decisões:
Essa previsibilidade das decisões no âmbito dos próprios Tribunais tende a evitar a propagação de teses jurídicas distintas sobre situações semelhantes e que, justamente por essa coincidência, mereceriam tratamento igualitário. O dever dos Tribunais de uniformizar a sua jurisprudência indica que eles não poderão ser omissos caso ocorram divergências internas entre seus órgãos fracionários sobre uma mesma questão jurídica. O cumprimento desse dever afastaria, por exemplo, a não rara desarmonia entre as Turmas do Superior Tribunal de Justiça. (2017, p. 1465)
É preciso destacar que a norma contida no art. 926 do CPC é de natureza imperativa, vale dizer, os Tribunais tem o dever inafastável de uniformizar sua jurisprudência, garantindo sua estabilidade, coerência e integridade, sendo-lhe possibilitado (art. 926, § 1º), para tanto, a edição de enunciado sumular designando a tese dominante.
Sobre referida norma, temos os comentários de Streck e Abboud:
O processo civil quando observa a integridade e coerência no seu desenvolvimento, deve ser associado a um verdadeiro jogo limpo. Nessa perspectiva a “integridade quer dizer: tratar a todos do mesmo modo e fazer da aplicação do direito um “jogo limpo” (fairness – que também quer dizer tratar todos os casos equanimemente). Exigir coerência e integridade quer dizer que o aplicador não pode dar o drible da vaca hermenêutico na causa ou no recurso, do tipo “seguindo minha consciência, decido de outro modo“. O julgador não pode tirar da manga do colete um argumento que seja incoerente com aquilo que antes se decidiu. Também o julgador não pode quebrar a cadeia discursiva “porque quer” (ou porque sim). (2015, p. 179)
Entretanto, para exercer, os Tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação (art. 926, § 2º). A norma contida nesse dispositivo traz um princípio de segurança, pois impede a aplicação de súmula a casos impertinentes, daí porque é sempre necessário o reconhecimento da ratio decidendi do precedente veiculado por súmula, v.g., com o caso sub judice.
Comentando o referido dispositivo, Elpídio Donizetti traz o seguinte entendimento:
Ao editar enunciado de súmula correspondente à sua jurisprudência dominante, o Tribunal deve se ater aos detalhes fáticos do precedente que motivou a sua criação. […] Previne-se, desta forma, a aplicação inadequada de súmulas e outros entendimentos a uma série de casos que, apesar de similares em determinadas características, são absolutamente distintos na essência. Em outras palavras, há necessidade de que seja realizada uma comparação entre o que se pretende sumular e a ratio decidendi da decisão que servirá como paradigma. (2017, p. 1466)
Essa uniformização, pela nova sistemática, será estimulada por precedentes obrigatórios, dispostos no art. 927, incisos I a V, do CPC, que passaremos a examinar.
2.1 Precedentes vinculantes
De acordo com a regular compreensão do assunto, a doutrina dos precedentes, na tradição da common law, é o meio pelo qual o sistema jurídico tem para produzir normas gerais e abstratas, a partir do reconhecimento atividades costumeiras uniformes. Neste contexto, a doutrina referida se apresenta como fonte primária do Direito, conforme explicitado no capítulo anterior.
Entretanto, de acordo com o CPC/2015, essa ideia não se aplica integralmente, porque, segundo nos parece, a doutrina dos precedentes não será uma fonte primária do Direito, afinal, ainda vivemos sob o primado da lei. A ideia assumida pelo CPC/2015 é no sentido de cristalizar o Direito de acordo com a decisão uniforme dos Tribunais. Essa cristalização será feita pelo reconhecimento da doutrina stare decisis. É apenas nesse sentido que assumimos a doutrina dos precedentes.
Para cumprir esse intento, o CPC/2015 adotou engenhosa fórmula, contida em seu art. 927. Por ela, os precedentes nascerão para o ordenamento jurídico a partir de seu reconhecimento pelos Tribunais e, ainda assim, se produzimos em determinados instrumentos processuais e sob determinadas condições.
Vejamos as disposições do Código: art. 927. Os juízes e os Tribunais observarão: I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II – os enunciados de súmula vinculante; III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
Com esse dispositivo, que trata do rol dos precedentes obrigatórios ou vinculante, o legislador tentou dar uniformidade à jurisprudência de todos os níveis jurisdicionais.
Entretanto, esse rol não é taxativo, já que, embora não conste de sua enumeração, é preciso ter em conta que os Tribunais locais podem, de acordo com o art. 926 do CPC, cristalizar por súmula o entendimento uniformizado de sua jurisprudência, tornando-a pacífica e dominante, vinculando ao próprio colegiado e aos órgãos a ele vinculados.
Em uma análise sistemática, o art. 955 do CPC corrobora referido entendimento, vez que permite, em conflito de competência, o julgamento monocrático por parte do Relator, desde que a decisão seja baseada em enunciado de súmula do próprio Tribunal no qual ocorreu a divergência.
No mesmo sentido, podemos citar o art. 332 do CPC, que permite, em caráter liminar, a improcedência do pedido que contrariar súmula do Tribunal de Justiça sobre direito local.
Essa previsão, segundo nos parece, reflete a preocupação do legislador com os preceitos de segurança jurídica. Nesse ponto, trazemos ao lume o entendimento de Viviane Lemos da Rosa:
Acredita-se que as novas hipóteses de julgamento liminar de improcedência refletem a preocupação do legislador com valores como a segurança jurídica, a isonomia, a eficiência, a duração razoável do processo e a coerência externa das decisões judiciais – além, é claro, do evidente intuito de diminuir as demandas em trâmite. (2016, p. 2015)
Tendo isso em vista, podemos dizer que os precedentes, em nosso sistema, serão definidos a partir de provimentos judiciais vinculantes, os quais passaremos a analisar em espécie.
2.2 Decisões do STF em controle concentrado e súmulas vinculantes
Esta espécie de controle, também chamada de controle abstrato de normas, processa-se por quatro ações: ação direta de inconstitucionalidade (ADI), ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADI por omissão), ação declaratória de constitucionalidade (Adecon) e arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), que foi introduzida no sistema jurídico pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993. As ADIs e a Adecon são regulamentadas pela Lei nº 9.868/1999. A ADPF está regulamentada pela Lei nº 9.882, de 1999.
O pressuposto básico para o uso desses instrumentos processuais é a existência de uma norma dotada dos atributos da generalidade e da abstração, porque o controle “há que ter como objeto atos de conteúdo normativo, quer sejam eles veiculados por lei ou por outro instrumento, fato que, de logo, afasta do âmbito de incidência do controle concentrado as chamadas leis de efeitos concretos” (Araujo; Nunes Filho, p. 34).
Nessa forma de controle, o que se analisa é o ato normativo em si, isto é, abstratamente e não inserido em alguma situação concreta qualquer. Explicando isso, Marcelo Vicente de Alkimim Pimenta assevera que “o controle abstrato de constitucionalidade é processo de natureza objetiva, em que é questionada a própria constitucionalidade de uma lei, não se admitindo a discussão de situações de interesses meramente individuais” (2007, p. 2017).
Referido autor prossegue trazendo quatro características fundamentais do processo concentrado do controle de normas, que são: 1) é o Supremo Tribunal Federal o único órgão competente para julgar as suas ações, daí advindo a sua denominação, pois as ações se concentram em um único Tribunal; 2) as decisões do STF produzem efeitos erga omnes, isto é, aplicável a todos. Acrescentamos que também possui efeito vinculante; 3) por ser processo objetivo, não há polo passivo nas ações, vedando-se intervenção de terceiros; 4) só podem propor as ações as pessoas e os órgãos expressamente indicados no art. 103 da Constituição Federal (Pimenta, 2007, p. 207-208).
O efeito vinculante das decisões oriundas das ações do controle abstrato de constitucionalidade guarda relação com o papel institucional do Supremo Tribunal Federal, que é o guardião da Constituição. Assim, as suas decisões devem ser observadas compulsoriamente porque é o Tribunal o responsável por dar a última palavra em matéria constitucional, garantindo o efeito normativo do texto. Essa vinculação não é somente sobre o caso analisado (coisa julgada), mas também de sua ratio decidendi, que irá regular casos similares.
Sobre isso, Elpídio Donizetti nos dá o seguinte exemplo:
Na ADI 4261 o STF decidiu que a Lei Complementar nº 500/2009, do Estado de Rondônia, é inconstitucional por violar o art. 132 da CF/1988, que confere aos Procuradores do Estado a representação exclusiva do Estado-membro em matéria de atuação judicial e assessoramento jurídica, sempre mediante investidura fundada em prévia aprovação em concurso público. A coisa julgada que vincula todos os demais órgãos jurisdicionais e a Administração é: a Lei Complementar nº 500, de 10 de março de 2009, é inconstitucional. A ratio decidendi que formará o precedente é: norma estadual que autorize a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo, é inconstitucional. Se outra lei for editada nesse sentido – e o foi, é a Lei nº 8.186/2007, do Estado da Paraíba – o STF decidirá certamente com base no precedente anterior. (2017, p. 1467)
No mesmo sentido atua a súmula vinculante, mas com relação, primordialmente, ao controle difuso de constitucionalidade.
Analisando os termos da Lei nº 11.417, de 2006, que regula o processo de criação, extinção e modificação da súmula vinculante, verificamos que o seu pressuposto de edição é a existência de reiteradas decisões idênticas proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, que verse sobre matéria constitucional apta a produzir controvérsia entre os órgãos do Poder Judiciário ou entre esses e a Administração Pública. É necessário, também, que tal controvérsia produza grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos.
Assim, a súmula vinculante busca extinguir a controvérsia para o fim de restabelecer a segurança jurídica, abstrativizando o controle difuso de constitucionalidade.
Para compreender melhor, tomemos o seguinte exemplo: tramitam no Poder Judiciário diversas ações questionando a constitucionalidade de uma dada situação qualquer; sobre referida matéria os órgãos do Poder Judiciário adotam posições divergentes, havendo juízos e Tribunais que entendem que o dita situação é constitucional e outros tantos órgãos entendendo o contrário; em sede de recurso extraordinário já houve manifestações pela inconstitucionalidade; vislumbrando tal situação, o Supremo Tribunal Federal edita súmula vinculante, que, dada a sua natureza jurídica, abstrativiza o controle difuso de constitucionalidade exercido pela Suprema Corte.
A súmula vinculante, nesse sentido, encontra seu fundamento na teoria da transcendência dos motivos determinantes da decisão do controle difuso de constitucionalidade.
Sabemos que, como regra geral, a coisa julgada tem como limite objetivo o dispositivo da sentença. Logo, por exclusão, não se submetem ao império da coisa julgada as soluções (motivos) dadas para as questões prejudiciais necessariamente analisadas para se chegar ao resultado da lide.
Nesse sentido, temos o entendimento de Cintra, Grinover e Dinamarco:
Resulta do texto que apenas o dispositivo da sentença, entendendo-o como a parte que contém a norma concreta, ou preceito enunciado pelo juiz, é apto a revestir-se da autoridade da coisa julgada material. Excluem-se os motivos, ou seja, a solução dada às questões lógicas ou prejudiciais necessariamente enfrentadas para chegar à definição do resultado da causa. (1996, p. 312)
Dessa feita, à primeira vista, a decisão que resolve um incidente de constitucionalidade havido em um processo qualquer não se submete à coisa julgada material, pois tal incidente, à luz do que foi exposto, é mera questão prejudicial necessariamente enfrentada para se chegar ao resultado da causa.
Nesse ponto, é bastante ilustrativo o entendimento de Luís Roberto Barroso: “[…] Por dicção legal expressa, nem os fundamentos da decisão nem a questão prejudicial integram os limites objetivos da coisa julgada, de modo que não há falar em auctoritas rei iudicata em relação à questão constitucional” (2009, p. 124).
Esse é o entendimento clássico, que começa a ser combatido por novo formato, que tem por substrato a teoria que ora se analisa. Tal teoria propõe, nos casos de apreciação do controle de constitucionalidade difuso exercida pelo Supremo Tribunal Federal, a ampliação do aspecto objetivo da coisa julgada. Assim, a questão constitucional passa a fazer parte da coisa julgada objetiva, de modo que a orientação expressa pelo STF deve ser observada em outros processos de igual ou semelhante conteúdo.
Essa teoria, portanto, faz transcender, obrigatoriamente, para outros processos os motivos que determinaram a apreciação do incidente de constitucionalidade do primeiro processo (leading case). Assim, em casos similares, outros juízos e/ou Tribunais estarão vinculados à decisão do STF expressa no leading case.
Nesse particular, eis a doutrina de Luís Roberto Barroso:
Por essa linha de entendimento, tem sido reconhecida eficácia vinculante não apenas à parte dispositiva do julgado, mas também aos próprios fundamentos que embasaram a decisão. Em outras palavras: juízes e Tribunais devem acatamento não apenas à conclusão do acórdão, mas igualmente às razões de decidir. (2009, p. 184)
Conforme assevera Pedro Lenza, o que embasa essa teoria são as ideias de força normativa da Constituição, o princípio da supremacia da Constituição e o fato de o STF ser o guardião da Constituição (2009, p. 187). Por tudo isso, a decisão da Suprema Corte tem que ser uniforme para todos.
Tais ideias conduzem à reformulação do sistema jurídico, o que legitima a abstrativização do controle difuso sem a necessidade da resolução senatorial, disposta no art. 52, X, da Constituição Federal, que cede espaço à súmula vinculante, conforme assevera Gilmar Mendes:
É possível, sem qualquer exagero, falar-se aqui de uma autêntica mutação constitucional em razão da completa reformulação do sistema jurídico e, por conseguinte, de nova compreensão que se conferiu à regra do art. 52, X, da Constituição de 1988. Valendo-nos dos subsídios da doutrina constitucional a propósito da mutação constitucional, poder-se-ia cogitar aqui de autêntica reforma da Constituição sem expressa modificação do texto. (2004, p. 161)
Passemos agora à análise das súmulas persuasivas de acordo com a sistemática instituída pelo CPC/2015.
2.3 Súmulas persuasivas
Nesse particular, o CPC/2015 trouxe importante inovação conceitual, pois adaptou as chamadas súmulas persuasivas à teoria dos precedentes. Dizemos isso porque, à luz art. 927, IV, do CPC, as súmulas ditas persuasivas até o advento da nova codificação, passam a ter efeito vinculante, embora formalmente não o sejam, porque não criadas pela autorização constitucional do art. 103-A.
Assim, sendo o STF o guardião da matéria constitucional e o STJ o guardião da lei federal, os órgãos do Poder Judiciário não poderão, por critério hierárquico, desrespeitar os preceitos sumulares que versem sobre tais matérias, vale dizer, somente nos casos elencados no CPC é que haverá vinculação, não havendo falar em tal efeito se o STF editasse súmula relativa à matéria infraconstitucional, por exemplo.
Em comentários ao art. 927, IV, do CPC, Elpídio Donizetti traz o seguinte entendimento:
Isso quer dizer que, apesar de não serem enunciados de súmula vinculante, deverão ser respeitados por juízes e tribunais. Essa força normativa cogencial encontra a sua racionalidade no fato de que cabe ao STJ interpretar a legislação infraconstitucional e ao STF dar a última palavra sobre as controvérsias constitucionais. Assim, por mais que o julgador tenha outra compreensão sobre a matéria sub judice, a contrariedade só terá o condão de protelar o processo por meio de sucessivos recursos e, consequentemente, de adiar a resolução da controvérsia. (2017, p. 1468)
Essa inovação é mais um passo em direção à sonhada harmonia da jurisprudência brasileira. A harmonização da jurisprudência é, pois, a condição para a segurança jurídica, finalidade importantíssima do Direito, pois atende aos reclamos sociais, vez inadmissível decisões conflitantes sob as mesmas circunstâncias de fato e de direito.
Sistematicamente falando, essa inovação legislativa somente foi possível porque também houve alteração na principiologia processual. O CPC/2015, ao construir um modelo híbrido ou misto, com componentes da common law e da civil law, promoveu, conforme demonstramos, um sistema de vinculação de decisões, considerando o critério hierárquico como principal vetor.
Referidas decisões são veiculadas pelos instrumentos processuais do art. 927, I a V, e art. 332, IV, todos do CPC, dos quais são extraídas as razões de decidir (ratio decidendi), que regerão os casos similares que futuramente serão postos à análise do Poder Judiciário. E tudo isso foi possível porquanto, atualmente, não mais vige o princípio do livre convencimento motivado, que muitas vezes foi empregado para a fundamentação de decisões não coerentes com a jurisprudência, o que conduzia, não raras, a situação de arbítrio judicial.
Nesse sentido, trazemos ao lume o entendimento de Paulo Henrique Ledo Peixoto:
Argumento plausível também é fato de que o CPC/2015 retirou a regra do livre-convencimento motivado como pregava o art. 131 do CPC/1973. Hoje, há apenas o convencimento motivado (art. 371, CPC[4]), ou seja, o magistrado deve-se pautar nas provas do processo e também na observância da jurisprudência dos Tribunais, sobretudo do STJ e do STF, pois a tais órgãos cabe a última palavra em matéria infraconstitucional e constitucional, respectivamente. (2017, p. 1)
O mesmo se diga em relação às sumulas dos Tribunais locais. Conforme vimos, embora não conste no rol do art. 927 (numerus apertus), pela sistemática e ideologia do atual Código de Processo Civil e pela disposição do seu art. 332, IV, temos que os referidos Tribunais terão competência para editar suas súmulas, que vincularão os órgãos jurisdicionais de sua jurisdição.
A súmula, nesse preciso aspecto, torna-se importante instrumento de uniformização de jurisprudência e, portanto, vetor de segurança jurídica, pois, em poucas palavras, condensa toda uma orientação do Tribunal acerca de determina matéria. Para exemplificar, é nesse sentido as disposições regimentais do Tribunal de Justiça de São Paulo – art. 190.
No âmbito do Tribunal paulista, as súmulas serão aprovadas pelo seu Órgão Especial, que as editará, com exclusividade, e, nos termos do art. 190, § 3º, do Regimento Interno, as súmulas indicarão a tese de direito aprovada, a situação a que se aplicam e as circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua edição, os fundamentos determinantes e os dispositivos normativos relacionados com ela, cristalizando uma interpretação da corte que servirá aos casos futuros, de acordo com a doutrina dos precedentes.
2.4 Orientação do plenário ou do órgão especial dos Tribunais
Conforme o art. 927, V, do CPC, a orientação do plenário ou do órgão especial também terá efeito vinculante relacionado aos demais órgãos que lhes são subordinados. Assim, não é somente a súmula, seja vinculante ou persuasiva, que terá esse feito, mas também as decisões por aqueles órgãos emitidas que ainda não têm o condão de possibilitar a edição de súmula. Noutras palavras, parece-nos que basta ao Tribunal, via pleno ou órgão especial, dar decisão sobre dado assunto que automaticamente os juízes e órgãos subordinados deverão guardar respeito e observância.
Sobre isso, temos o entendimento de Elpídio Donizetti:
Assim, a decisão do Plenário do STF vinculará todos os juízes e tribunais, sem exceção; a decisão do Plenário do STJ e do Órgão Especial, em matéria de legislação federal, terá que ser observada pelo próprio STJ, pelos Tribunais Regionais Federais, pelos Tribunais de Justiça dos Estados e pelos juízes a eles vinculados; as decisões do Plenário ou Órgão Especial dos Tribunais Regionais Federais vincularão os seus próprios membros e os juízes federais; e as decisões do Plenário e do Órgão Especial serão obrigatoriamente observadas pelos seus membros e pelos juízes estaduais. (2017, p. 1469)
O dispositivo aqui analisado está em consonância com a ideologia consagrada no CPC/2015, que quer evitar absolutamente a existência de decisões conflitantes entre si e, para tanto, está a usar o critério hierárquico, razão pela qual, havendo pronunciamento do Tribunal sobre dado assunto, seus órgãos subordinados têm o dever de aplicar a ratio decidendi do julgado aos casos análogos. Evidentemente, não se trata de uma aplicação cega e desmedida, mas uma aplicação justificada pelas circunstâncias do caso concreto. É para isso que existem os instrumentos de confrontação e superação dos precedentes.
Vista dessa forma, essa disposição processual existe para deixar claro que não é somente o formalismo da súmula que possibilitará a formação de precedentes e, por consequência, o devido respeito a eles. Nesse passo, convém lembrar que as súmulas são extraídas somente após reiteradas decisões iguais em processos análogos, o que não impede a fixação de um precedente em virtude de uma decisão extraída de um único caso julgado pelo órgão especial de Tribunal.
Em que pese a existência de vozes discordantes, a doutrina, de um modo geral, entende que a possibilidade aqui versada não fere o princípio da independência do juiz. Essa independência está preservada, até porque ela é necessária para a constitucionalidade do sistema jurídico. Contudo, ela se refere à possibilidade de o juiz compreender o Direito à luz do fato analisado, o que não quer dizer que ele pode criar direito diverso do que existe, considerando as leis e os precedentes.
Assim, no universo do Direito brasileiro existem os paradigmas das leis e dos precedentes e estes devem ser aplicados quanto ao caso, cabendo ao juiz determinar a relação entre as normas do direito e os fatos. Noutras palavras: o juiz não cria os parâmetros de direito. Ele os aplica de acordo com as suas justificações ou fundamentações. É nesse preciso sentido que está a sua independência, que não se choca com a sua vinculação funcional.
Para ilustrar esse posicionamento, temos o entendimento de Geruza Ribeiro do Espírito Santo, que bem demonstra o verdadeiro alcance e sentido do princípio da independência do juiz:
Na realidade o julgador não é livre para decidir de forma contrária a um Tribunal Superior, na medida em que a sua decisão não é definitiva, pois sempre poderá ser reformada ao ser submetida ao crivo do Tribunal Superior. Há uma contradição no duplo grau no sistema jurídico brasileiro, conforme o doutrinador, pois ao mesmo tempo em que o juiz é “livre” para decidir, a última palavra será dada pelo Tribunal. O Judiciário deve ser visto como um todo, um só poder, que deve dar uma interpretação uniforme para determinada questão. Se o sistema é estruturado em níveis, é contraditório que uma causa seja decidida por um juiz ou Tribunal sem observância das decisões do STJ e STF. A interpretação de modo uniforme das leis faz com que exista uma ordem jurídica mais coerente, mais uniforme, dando maior previsibilidade aos administrados quanto à interpretação adotada pelo Judiciário. Uma ordem jurídica instável, onde cada juiz pode decidir como bem entender, sem uma visão ampla de como está sendo interpretada a norma no seu próprio Tribunal e nos Tribunais Superiores, causa insatisfação dos jurisdicionados e até injustiças sociais. Não se pode negar que os juízes possuem autonomia para decidir, mas estes também devem respeito às decisões dos Tribunais Superiores e tal não viola a sua independência funcional, pois se deve atentar para o fato de que o juiz faz parte de um sistema, que é visto como um só Poder pela sociedade. (2014, p. 1)
Assim, é perceptível que a vinculação à orientação do plenário ou do órgão especial dos Tribunais está em compasso com a necessidade de garantir segurança jurídica nas relações, visto que impede a proliferação de decisões divergentes sobre um mesmo assunto, garantindo a posição hierárquica dos órgãos jurisdicionais de cúpula.
2.5 Acórdãos em incidentes de assunção de competência
Os acórdãos extraídos dos incidentes de assunção de competência são vinculantes no seu mérito e são provedores de precedentes pelo reconhecimento de sua ratio decidendi. Por isso, é importante conhecer esse instrumento processual.
Assim pensam Becker e Trigueiro:
Esta técnica de julgamento, revelada na forma de incidente, expõe uma das facetas do novo CPC, consubstanciada na formação de precedentes. Ainda que não seja o método histórico de se criar um precedente, originado no Direito anglo-saxão, certo é que o Código pretendeu que assim fosse ao dispor que “o acórdão proferido em assunção de competência vinculará todos os juízes e órgãos fracionários, exceto se houver revisão de tese“. Exsurge, assim, que o incidente de assunção de competência é uma técnica que visa criar um “precedente”, com efeito vinculante, que certamente terá reflexos importantes, na medida em que possibilitará a redução de demandas e objetivação dos julgamentos posteriores que tratarem de tema idêntico. (2016, p. 1)
Assim, podemos dizer que esse incidente, também chamado de afetação do julgamento, é destinado exclusivamente a uniformizar a jurisprudência de um Tribunal a partir de sua simplificação. Ele não é criação nova do Código vigente, já que constava na codificação anterior. Desse modo, o CPC/2015 empreendeu um aperfeiçoamento do incidente pela sua vinculação com a teoria dos precedentes.
Nesse ponto, destacamos o entendimento de Renato Montans de Sá:
Não se trata de criação do novo CPC, mas um aperfeiçoamento do mecanismo (subaproveitado) do regime anterior que estava previsto no art. 555, § 1º (com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 10.352/2001), do CPC/1973. Lá se estabelecia no referido artigo que no julgamento de apelação ou de agravo, a decisão será tomada, na câmara ou turma, pelo voto de 3 (três) juízes. § 1º Ocorrendo relevante questão de direito, que faça conveniente prevenir ou compor divergência entre câmaras ou turmas do Tribunal, poderá o Relator propor seja o recurso julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar; reconhecendo o interesse público na assunção de competência, esse órgão colegiado julgará o recurso. O novo CPC trouxe melhorias e a esperança de que, dadas as novas técnicas de uniformidade do direito previstas no atual diploma, possa a assunção assumir a importância devida dentre os mecanismos de uniformização. (2016, p. 960)
O incidente está disciplinado no CPC, no art. 947, que dispõe: “É admissível a assunção de competência quando o julgamento de recurso, de remessa necessária ou de processo de competência originária envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem repetição em múltiplos processos“.
Tendo isso em vista, podemos dizer que o incidente de assunção de competência é uma técnica de deslocamento interno da competência de um processo, no âmbito de um Tribunal, para que ele seja analisado por seu órgão colegiado. Desse modo, esse instrumento processual se constitui em uma exceção à regra geral da perpetuatio jurisdictionis.
À vista disso, Becker e Trigueiro lecionam que cabe observar que o CPC utiliza o termo “assunção” no sentido de elevar a competência, remetendo o processo a um órgão de composição mais recheada, permitindo, assim, um debate mais amplo sobre a matéria, notadamente em razão da relevância social e do interesse público que envolvem o julgamento. Há, portanto, deslocamento que se dá no campo da competência funcional, que é de natureza absoluta. (2016, p. 1)
O incidente ocorrerá quando o julgamento do processo se relacionar à questão de direito com grande repercussão social e sem repetição em múltiplos processos, o que demandará uma análise do Tribunal para, conformando o caso com o Direito, unificar o entendimento da matéria no âmbito de sua competência jurisdicional.
Portanto, a sua finalidade é a prevenção ou a repressão diante de possíveis controvérsias oriundas dos casos em análise a partir da vinculação da decisão aos juízes e órgãos fracionários do respectivo Tribunal.
Dito de outro: toda vez que uma causa puder produzir controvérsia judicial grave, tendente a promover decisões conflitantes entre si, ela poderá ser submetida ao Tribunal para determinar uniformemente o de que direito.
Nesse sentido, podemos ilustrar com o entendimento de Montans de Sá:
Trata-se de técnica de deslocamento de competência interna corporis de um caso (recurso, remessa necessária ou causa de competência originária) a um órgão colegiado, de mais envergadura, para seu julgamento quando envolver questão de direito com grande repercussão social e sem repetição em múltiplos processos. Constitui uma exceção à regra da perpetuatio jurisdictionis. Tem por finalidade prevenir ou reprimir controvérsia sobre determinada matéria de direito para que essa decisão seja vinculante aos juízes e órgãos fracionários do respectivo tribunal nas decisões futuras. (2016, p. 961)
Para apresentação do IAC, é necessário o cumprimento dos seguintes requisitos: i) que o caso concreto verse sobre questão de direito relevante; ii) que a matéria envolva repercussão social; iii) que a matéria do caso não esteja posta em processos múltiplos; iv) que a causa esteja em grau de recurso, ou que tenha havido remessa necessário, bem como nos casos de competência originária, noutra palavras: o processo tem de estar no Tribunal.
O CPC/2015 não determina o que vem a ser questão de direito relevante. Trata-se, portanto, de conceito vago, que deverá ser implementado à luz do caso concreto. Assim, segundo a doutrina, o requisito estará cumprido sempre o caso envolver tese jurídica que tenha o potencial para gerar infindáveis recursos repetitivos, haja vista o interesse público do tema. É para evitar essa funesta consequência que existe o IAC.
Por repercussão social, entenda-se o “efeito colateral” da questão relevante de direito (Sá, 2016, p. 961). Explicamos: a matéria é relevante do ponto de vista do Direito se possibilitar infindáveis discussões e soluções para o mesmo caso e isso é relevante socialmente porque, por sua vez, provoca ou tem potencial de provocar a dispersão da jurisprudência, pois, se a matéria é passível de discussão, ela é suscetível a infindáveis recursos processuais, o que ocasiona decisões conflitantes. O IAC quer, exatamente, o coibir essa situação, isto é, a dispersão da jurisprudência.
Deve-se considerar, também, que a matéria a ser submetida ao IAC não pode estar dispersa em processos múltiplos, pois, ocorrendo, isso haverá o incidente específico (incidente de resolução de demandas repetitivas).
Explicando os requisitos do IAC, Elpídio Donizetti faz o seguinte o comentário:
Não é necessário que haja repetição de processos, como se passa com o incidente de resolução de demandas repetitivas, mas sim a relevância para a sociedade do que restar decidido. Por exemplo, uma questão previdenciária que interessa a uma significativa parcela da população é relevante e tem repercussão social. Deve-se entender a expressão “sem repetição em múltiplos processos“, contida no caput do art. 947,8 como a prescindibilidade da efetiva repetição de processos que contenham idêntica questão de direito (requisito para a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas), e não como uma exigência. Aliás, a repetição da questão em recursos ou causas de competência originária diversas é que vai ensejar a prevenção ou a composição de divergência entre Câmara ou turmas do tribunal (art. 947, § 4º). […] Essa conveniência é apreciada em dois momentos: por órgão originariamente competente para conhecer do feito, ou seja, por câmara ou turma do tribunal e por órgão com competência definida no regimento interno para assumir a competência para julgar o feito. A prevenção de divergência ocorrerá porque esse julgamento irá impor-se como precedente de aplicação obrigatória por todos os juízes e órgãos fracionários do Tribunal. (2017, p. 1497-1498)
Com relação ao procedimento do IAC, é preciso destacar que o CPC traz regramento mínimo, porque a matéria deve ser disposta nos regimentos internos dos Tribunais onde tramitarão os incidentes propostos.
Assim, à luz do Código, podemos destacar que possuem legitimidade para propor o incidente qualquer das partes, a Defensoria Pública e o Ministério Público. Além disso, o Relator do processo no Tribunal tem o poder de instaurá-lo de ofício.
Por tudo o visto, podemos concluir que o objeto do IAC é a requisição para que o recurso, a remessa necessária ou a causa originária sejam julgados pelo órgão colegiado do Tribunal, na forma do regimento interno, dado o interesse público da matéria, caso em que a decisão proferida vinculará a todos os órgãos fracionários e juízes da competência territorial do Tribunal.
Traduzindo os requisitos legais, Donizetti assenta o seguinte:
De acordo com os parágrafos do art. 947, o Relator do feito – de ofício ou a pedido das partes, do Ministério Público ou da Defensoria Pública – propõe à câmara ou turma que se desloque a competência para o órgão colegiado que o regimento interno do Tribunal indicar. Esse órgão poderá constituir-se num grupo de câmaras, ser o órgão especial ou o pleno do Tribunal; o certo é que terá uma composição que numericamente, levando-se em conta a natureza da matéria, represente a maioria do Tribunal. A câmara ou turma, acatando a proposição, lavra acórdão e remete o feito ao órgão designado no Regimento. Em seguida, o processo é submetido a nova distribuição, com sorteio do Relator. O Relator do incidente, no exercício do juízo de admissibilidade, procede à análise dos pressupostos para a assunção da competência. Admitindo-o, lança relatório nos autos, elabora voto e procede na forma do regimento interno que, por certo, contemplará a revisão. Da decisão monocrática que inadmite o incidente cabe agravo interno para o colegiado. Da decisão do órgão fracionário, admitindo ou inadmitindo o incidente, não há previsão de recurso. O mesmo se passa com relação à decisão do órgão competente para julgar o incidente quanto ao juízo de admissibilidade (exemplo: se o colegiado inadmite o incidente e determina o retorno dos autos à câmara ou turma, essa decisão é irrecorrível. Havendo decisão sobre o mérito, cabíveis serão os recursos previstos no CPC). (2017, p. 1498-1499)
Passemos à análise do incidente de demandas repetitivas para verificarmos como é produzida a vinculação da decisão no incidente.
2.6 Acórdãos de incidente de resolução de demandas repetitivas
De acordo com a doutrina, o IRDR é uma das maiores inovações trazidas pelo CPC/2015. Trata-se de incidente instaurado, tal qual no IAC, em julgamento de recurso, remessa necessária ou processo de competência originária dos Tribunais de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais para a identificação de processos que contenham a mesma questão de direito para julgamento conjunto, visando estabelecer a tese jurídica da causa, o que vinculará os juízes e Tribunais de graus inferiores.
Explicando o incidente, Renato Montans de Sá faz o seguinte comentário:
O incidente de resolução de demandas repetitivas constitui, talvez, a maior novidade do novo Código para fomentar a isonomia e a efetividade das decisões judiciais. O CPC brasileiro já conhecia (e manteve) as regras sobre recursos especial e extraordinário repetitivo e a repercussão geral. Mas era necessário ir além. O que se estabeleceu foi uma ampliação do instituto dos recursos especial e extraordinário repetitivos. Dada a similaridade dos institutos ambos possuem diversas regras análogas e artigos que se correspondem. Era, portanto, necessário estabelecer regra semelhante para as demandas, até mesmo porque o microssistema das tutelas coletivas no Brasil, como dito, máxime para a proteção de direitos individuais homogêneos, era ineficaz para resolver todas as possíveis situações das denominadas macrolides. Com bem observam Marinoni, Arenhart e Mitidiero, demandas repetitivas constituem uma anomalia no sistema processual. De fato, nada justifica que uma mesma questão deva ser examinada várias vezes pelo Judiciário, apenas porque se refere a partes diferentes. (2016, p. 942)
Tendo isso em vista, podemos dizer que o incidente visa evitar a eternização de discussão sobre teses jurídicas, bem como a existência de decisões discrepantes, o que provoca a quebra da igualdade dos litigantes, gerando insegurança jurídica.
Sobre esse aspecto, Elpídio Donizetti assevera que identificada a repetição de causas fundadas na mesma questão de direito, circunstância que pode provocar insegurança jurídica e ofensa à isonomia, perante a possibilidade de coexistirem decisões conflitantes sobre a mesma questão jurídica. […] O procedimento-padrão tem por fim evitar (i) a eternização de discussões sobre teses jurídicas, o que gera ganhos em termos de celeridade; (ii) discrepâncias, o que provoca quebra da isonomia dos litigantes e, por conseguinte, insegurança jurídica. O novel instituto foi inspirado no procedimento-modelo (Musterverfahren) do sistema processual alemão. A rigor não é correto falar em pretensões isomórficas, uma vez que o isomorfismo recai tão somente sobre a questão de direito e, como sabido, também os fatos constituem substrato da pretensão. (2017, p. 1554)
Assim, o IRDR se constitui em instrumento que visa conferir solução uniforme às causas repetitivas por meio de julgamento de causa que terá efeito vinculante para ser aplicado a todos os casos futuros, garantido aplicação isonômica da questão de direito discutida.
Nesse ponto, podemos citar, a título ilustrativo, o entendimento de Donizetti:
A decisão proferida no IRDR, tal como ocorre com a tese definida em julgamento de recursos repetitivos, servirá de parâmetro para o julgamento de todos os processos – presentes e futuros, individuais ou coletivos – que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem ou venham a tramitar na área de jurisdição do respectivo Tribunal, ou seja, vinculará os órgãos de primeiro grau e o próprio Tribunal. O acórdão passará a ser a “lei” que regerá os processos em trâmite e que venham a ser instaurados sobre a mesma questão jurídica. Ao julgador caberá fazer a subsunção dos fatos a essa norma jurídica editada pelo Tribunal. (2017, p. 1555)
Segundo a tradução doutrinária das disposições legais da matéria, três podem ser os órgãos responsáveis pela análise do IRDR, conforme nos mostra Montans de Sá:
O incidente terá sua análise: a) aos processos afetados (escolhidos parra julgamento) pelo órgão responsável pela análise do incidente que também julgará o caso concreto; b) aos processos pendentes e futuros não afetados, haverá desmembramento da cognição da causa para dois diferentes órgãos: i) pelo juízo (juiz/câmara natural) que procederá ao julgamento da demanda no caso concreto e ii) pelo órgão colegiado competente do Tribunal (art. 981) que decidirá as questões comuns pertinentes aos casos similares objeto de instauração do incidente (art. 976, CPC) por meio do procedimento padrão. (2016, p. 942)
Por tudo que se vê, o IRDR terá incidência nas demandas cuja pretensão de direito seja comum ou no tocante ao direito processual, conforme expresso no art. 928, parágrafo único, do CPC. Assim, o incidente pode ser aplicado tanto aos casos de demandas individuais homogêneas, mas também em situações de inúmeros direitos ou relações jurídicas com estruturas heterogêneas, mas que no fundo congregue situação comum.
Contudo, não se pode confundir o incidente com ações coletivas. Na ação coletiva, tutela-se direito coletivo. No IRDR, apenas se define uma tese jurídica a ser aplicada a futuros casos.
Conforme disciplina o CPC, o incidente será instaurado pelos Tribunais dos Estados ou Tribunais Regionais e a necessária repetição de processos com idêntica questão de direito poderá ocorrer no Tribunal ou na primeira instância, mas com a questão já posta no Tribunal por meio de recurso, remessa necessária ou processo de competência originária.
São legitimadas a propor o IRDR, nos termos do art. 977 do CPC, as seguintes figuras: a) o juiz, por ofício direito ao presidente de seu Tribunal, no qual demonstrará a repetição dos processos em sua vara; b) pelo Relator de ofício. Deverá demonstrar a repetição em seu Tribunal, sendo necessário que esteja relatando ao menos um feito; c) pelas partes processuais, por petição na qual demonstre a repetição; d) pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição. A legitimidade desses órgãos decorre do interesse público em assentar uma tese jurídica.
Ressalte-se que, no IRDR, a intervenção do MP é obrigatória. Assim, não sendo o requerente, ele atuará como fiscal da lei, nos termos do art. 976, § 2º, do CPC.
O pedido para a instauração do incidente deve ser dirigido ao Presidente do Tribunal, que deverá distribuir a um Relator, a quem incumbirá todas as providências até o julgamento, na forma do regimento interno.
Na petição, o requerente deverá demonstrar os pressupostos do IRDR, quais sejam: a efetiva repetição de processos que contenham a mesma questão de direito e o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. É o que dispõe o art. 977, parágrafo único, do CPC.
Sobre esse ponto, Elpídio Donizetti nos explica como tais pressupostos devem ser demonstrados:
O primeiro requisito pode ser demonstrado com cópias de petições iniciais ou de petições de recursos dos quais ressaia a repetição. O segundo pode ser comprovado com sentenças ou acórdãos do Tribunal ou, se for o caso, do TRF ou TRT, com decisões divergentes sobre a controvérsia objeto do incidente. A divergência pode ocorrer no primeiro grau e no Tribunal ou somente num desses órgãos. (2017, p. 1557)
Nos termos do art. 978 do CPC, a competência para o julgamento recairá em algum dos órgãos responsáveis pela uniformização da jurisprudência, de acordo com a especificação do regimento interno. Ao receber o incidente, o órgão julgador irá fazer o juízo de admissibilidade, verificando a existência dos requisitos do art. 976 do CPC. A admissão do IRDR acarretará os efeitos previstos no art. 982 do CPC, sendo o mais frisante a suspensão dos processos que versem sobre a matéria, com a devida comunicação aos órgãos vinculados ao Tribunal.
O art. 980 do CPC prevê o prazo de um ano para o julgamento do incidente, tendo ele preferência sobre os demais processos, ressalvados os casos que envolvam o status libertatis, notadamente o habeas corpus. Referido prazo, entretanto, é impróprio, porque, embora haja a previsão de, que findo o prazo, cessará a suspensão dos processos pendentes, esta pode ser mantida por decisão fundamentada do Relator.
Essa suspensão de processos pode ocorrer em nível nacional. Nesse sentido, trazemos a explicação de Elpídio Donizetti:
Conforme visto, admitido o incidente o Relator suspenderá os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região, conforme o caso (art. 982, I). 84 Pode haver interesse em que essa suspensão se estenda por todo o território nacional (art. 982, §§ 3º e 4º). Por exemplo, uma empresa de telefonia que presta serviços em todos os Estados da Federação, figurando como parte em um processo que tem por fundamento a questão jurídica debatida num incidente a resolução de demandas repetitivas em curso no TJMG, poderá requerer ao Tribunal competente para conhecer de recurso extraordinário ou recurso especial (STF ou STJ) a suspensão de todos os processos que versem sobre questão idêntica, em curso em órgãos judiciários de todo o país. 85 A segurança jurídica e principalmente a isonomia entre os usuários de Minas Gerais e da Bahia, por exemplo, recomenda a suspensão. O interesse é reconhecido às partes, ao Ministério Público e à Defensoria Pública. Mesmo não figurando como representantes da parte ou fiscal da ordem jurídica, deve-se reconhecer legitimidade a esses dois órgãos para requerer a ampliação dos limites territoriais da suspensão, desde que observado o interesse. Pode ocorrer de o interesse público (coletivo, por exemplo) recomendar a suspensão de todos os processos individuais ou coletivos em curso no território nacional que tratem da mesma questão objeto do incidente já instaurado. A suspensão pode ser requerida perante o STF ou STJ, antes ou depois de interposto o recurso extraordinário ou recurso especial. O cabimento do recurso e, por conseguinte, a competência serão definidos pela matéria em debate no incidente, se constitucional ou infraconstitucional. Cessa a suspensão se acaso o recurso especial ou extraordinário não for interposto (art. 982, § 5º). Em atenção ao princípio da proteção judicial efetiva, a suspensão não obstará a concessão de medidas de urgência pelos respectivos juízos onde tramitam os processos suspensos (art. 982, § 2º). (2017, p. 1558)
A instauração do incidente, sua admissão e seu julgamento demandam ampla publicidade, que ocorrerá por registro no Conselho Nacional de Justiça, bem como por comunicação aos órgãos jurisdicionais, conforme determinação dos arts. 979 e 982, § 1º, do CPC.
Tendo em vista que julgamento do incidente produzirá decisão que ultrapassará o interesse das partes, o Relator tem o dever de ouvir outros interessados na controvérsia, conforme regência do art. 983 do CPC: “O Relator ouvirá as partes e os demais interessados, inclusive pessoas, órgãos e entidades com interesse na controvérsia, que, no prazo comum de 15 (quinze) dias, poderão requerer a juntada de documentos, bem como as diligências necessárias para a elucidação da questão de direito controvertida, e, em seguida, manifestar-se-á o Ministério Público, no mesmo prazo“.
Dada a natureza objetiva do IRDR, o seu julgamento não ficará adstrito aos fundamentos do pedido de instauração. O acórdão, nesse ponto, deverá abranger todos os fundamentos relativos à tese jurídica definida.
A decisão do incidente desafiará os recursos especial ou extraordinário, conforme existir violação à lei federal ou à Constituição, conforme o art. 987 do CPC. Tais recursos podem ser interpostos pela parte requerente do incidente, pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública, sejam estes partes ou não no incidente. O interesse recursal do Ministério Público decorre de sua missão constitucional de fiscal da ordem jurídica. Já o interesse recursal da Defensoria Pública decorre da proteção do interesse público na fixação da tese jurídica.
Nos termos do art. 987, § 1º, do CPC, referidos recursos terão efeito suspensivo e a análise do mérito dará à tese jurídica firmada abrangência nacional, passando a ser aplicada a todos os processos, individuais ou coletivos, que versem sobre idêntica questão de direito.
Assim, após o julgamento do incidente, será extraída a tese jurídica (ratio decidendi) que será aplicada aos processos de idêntica questão de direito.
Para que não haja o engessamento do Direito, o art. 986 do CPC prevê instrumento de revisão da tese jurídica pelo mesmo Tribunal ou sua superação em razão de julgamentos do STJ e STF.
A força vinculante da tese firmada no incidente é tamanha que o CPC prevê, nas causas que dispensam instrução probatória, que o juiz, independente da citação do réu, julgue liminarmente improcedente o pedido que contrariar a tese firmada. É o que prevê o art. 332, III, do CPC.
No âmbito do Tribunal de Justiça de São Paulo, quatorze temas já foram submetidos à disciplina do IRDR.
CONCLUSÃO
Conforme já dissemos, o vigente Código de Processo Civil introduziu no ordenamento jurídico um sistema de precedentes, em que pese a existência de manifestações doutrinárias em contrário. Entendemos haver esse sistema porque a compreensão das decisões vinculantes dispostas no art. 927 do CPC perpassa pela compreensão dos institutos típicos da tradição jurídica denominada common law. Assim, não poderemos compreender a norma posta sem compreender os elementos da stare decisis doctrine.
Portanto, nos parece que a nova codificação implementou um sistema misto, congregando os elementos da civil law e da common law. Esse sistema foi fórmula encontrada pelo legislador para fazer frente aos desafios impostos ao Poder Judiciário, notadamente os problemas da morosidade da máquina de justiça, advindos do excesso de processos e da falta de recursos humanos.
Com os precedentes espera-se evitar as aventuras processuais, porque eles promoverão uma padronização da entrega da prestação jurisdicional, facilitando a compreensão da sociedade acerca dos direitos. Isso, evidentemente, tornará o processo mais eficaz, na medida em que questões cristalinas de direitos não precisarão mais ser abordadas ao longo de todo o transcurso processual, vez que, havendo precedentes, a decisão será mais célere, além de promover o estancamento das lides temerárias. Nesse preciso sentido, o CPC/2015 tem uma forte carga pedagógica implícita.
Tais efeitos são possíveis, porque os precedentes são fontes de afirmação da legalidade. Por meio deles será possível a revelação de direitos e deveres, que se constituem em regras extraídas através da ratio decidendi, conforme verificamos.
Nesse sentido, podemos ilustrar com o ensinamento de Fernanda Néri Rosa:
Antes de mais nada, é preciso que se tenha em mente que o precedente pode ser encarado como fonte do Direito. Sim, fonte, pois dá origem a outros direitos e garantias em casos presentes a partir da sua equivalência em casos pretéritos. Explica-se: se uma determinada decisão serviu de referência ou mesmo passou a ser obrigatória na aplicação de casos futuros semelhantes, isso nada mais é do que a descrição de uma fonte do Direito, assim como o é a lei, a doutrina, a jurisprudência e os costumes. Considerando que o precedente é fonte, e portanto, cria uma norma, não é demais afirmar que, conforme dizer de Bustamante a norma em que se constitui um precedente é uma regra. Assim, a ratio decidendi é o fundamento normativo para solver uma questão, o que se leva a crer tratar-se de regra. (2016, p. 51-52)
Nesse ponto, portanto, podemos concluir que o precedente criado será aplicado pelo método de subsunção.
É importante registrar que, embora o precedente seja fonte do Direito, para nós essa força criativa deve se coadunar com o princípio da legalidade, conforme dispõe o art. 8º do CPC/2015: “Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência“.
No atual cenário jurídico, a legalidade não mais pode ser considerada em sentido estrito, vale dizer, conceito ligado estritamente à lei. Hoje, com a teoria dos precedentes instalada no ordenamento jurídico, o princípio da legalidade tem de ser visto de modo amplo, abrangendo várias expressões do Direito, tal qual a jurisprudência, segundo as disposições do art. 926 do CPC/2015, que traz os deveres de estabilidade, integralidade e coerência. Entretanto, a lei continua como expressão maior do princípio, daí porque os precedentes têm que afirmar o princípio da legalidade.
Nesse sentido, podemos trazer ao lume o seguinte entendimento: “Não obstante, no atual contexto do ordenamento jurídico brasileiro, é inegável que este princípio impõe ao juiz que decida em consonância com o Direito, ou seja, com todo o sistema jurídico e não apenas com base na lei, que é somente uma de suas fontes” (Rosa, 2016, p. 65).
Desse modo, com os precedentes, a compreensão do princípio da legalidade evoluiu, deixando de se ligar estritamente à lei para abranger todo o conteúdo de direito, sistematicamente compreendido e, neste novo contexto, a jurisprudência terá cada vez mais importância, porque ela será a expressão concreta do referido princípio. Por isso temos dito que, nesse particular, o novo CPC fortalece o princípio, porque não se pode conceber regras jurídicas díspares aplicáveis a situações análogas. Quando isso ocorre (e ocorreu muito na realidade brasileira), verifica-se a quebra da segurança jurídica e abre-se a possibilidade do decisionismo judicial, o que vai de encontro aos preceitos democráticos e republicanos dispostos no texto constitucional.
Para garantir esses pilares constitucionais, precisamos fortalecer o princípio da isonomia, afinal, ele é o elemento nuclear do Estado Democrático de Direito, razão pela qual é de observância obrigatória por todos, notadamente os poderes constituídos.
Nesse sentido, podemos citar o seguinte entendimento:
A igualdade é elemento inafastável do Estado Democrático de Direito, considerado como núcleo da cidadania, de observância obrigatória pelo Executivo, pelo Legislativo e pelo Judiciário, sendo imposto ao administrador que regule sua atuação pela igualdade, aos legislador que não edite leis que estabeleçam distinções infundadas e ao Judiciário para que dê tratamento de forma igualitária as partes nos interior do processo, devendo também a igualdade ao tempo de proferir suas decisões. (Rosa, 2016, p. 65)
O princípio pode ser encarado pelo seu aspecto formal e pelo seu aspecto material. Formalmente visto, o princípio afirma que todos são iguais perante a lei. Já, no campo material, temos a ideia de justiça social. Assim, o princípio impede que pessoas sejam tratadas de forma desigual pela lei, mas também impõe o respeito à diversidade.
Nesse sentido, temos o entendimento de José Rogério Cruz e Tucci: “Em paridade de situações, ninguém deve ser tratado excecionalmente. Todavia, evidenciada a desigualdade entre as pessoas – sejam físicas, sejam jurídicas ou formais, deverão ser consideradas as situações desiguais, para que possa haver igualdade” (2004, p. 126).
Tendo em vista tais conceitos, podemos dizer que o princípio da isonomia também abarca o dever estatal de aplicação igualitária do Direito, conforme extração finalística do preceito contido no art. 5º, I, da Constituição Federal, pelo qual há verdadeira imposição aos poderes constituídos, notadamente o Poder Judiciário.
Sobre o princípio da igualdade aplicado ao processo, podemos lembrar o entendimento de Amilcar Carneiro Júnior:
A desigualdade profunda e persistente verificada na sociedade brasileira esgarça laços sociais, causa invisibilidade, demonização e imunidade, prejudicando o respeito aos parâmetros do Estado de Direito. Estará potencializada se for levada para o processo, oferecendo decisões desiguais para situações iguais. (2012, p. 334)
Portanto, o princípio da igualdade deve ser entendido como o ideal de isonomia aplicado ao Direito (Rosa, 2016, p. 66), devendo-se fazer sentir também nas relações processuais, já que é uma obrigação de todos cumprir com o compromisso estatal de igualdade. Logo, inconcebível que haja decisões diferentes para casos jurídicos iguais.
À vista dessa constatação, Marinoni faz a seguinte afirmação:
A igualdade não pode limitar-se no âmbito do exercício da função jurisdicional, ao tratamento isonômico das partes, com garantia de participação em igualdade de armas, ou à igualdade de acesso à jurisdição e igualdade de acesso a determinados procedimentos e técnicas processuais; é necessário pensar também no princípio isonômico visto sob o viés da igualdade perante as decisões judiciais. (2014, p. 228)
Na mesma linha, temos o entendimento de Fredie Didier: “Não se pode admitir como isonômica a postura de órgão do Estado que, diante de uma situação concreto, chega a um determinado resultado e, diante de outra situação concreto, em tudo semelhante à primeira, chega à conclusão distinta” (2016, p. 468).
É, pois, inquestionável a relevância dos meios de uniformização de jurisprudência trazidos pelo CPC/2015 e orientado pelos preceitos da common law. Nesse sentido, a reforma promovida pela vigente codificação está sobremaneira alinhada com os ideais de igualdade e justiça.
Portanto, a doutrina brasileira dos precedentes quer, pelo fortalecimento do princípio da legalidade, cumprir com o ideal de igualdade, que, por sua vez, imprimirá segurança jurídica às relações sociais.
A segurança jurídica disposta na Constituição Federal afirma que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (art. 5º, inciso XXXVI).
Segundo a doutrina, o princípio está ligado ao conceito maior de Estado de Direito, correspondendo à necessária estabilidade e continuidade da ordem jurídica, com a previsibilidade das consequências jurídicas de determinadas condutas, o que abarca a previsibilidade dos resultados dos processos.
É nesse sentido o entendimento de Fredie Didier: “É exatamente nesse contexto que a segurança jurídica precisa ser repensada. Trata-se de princípio que assegura o respeito não apenas a situações consolidadas, mas também às legítimas expectativas surgidas e às condutas adotadas a partir de um comportamento presente” (2013, p. 470).
Esse princípio, tão importante ao Estado de Direito, busca a proteção da confiança, que, no âmbito processual, acarreta para os Tribunais a obrigação de uniformização da jurisprudência e a obrigação de todos de guardarem os devido respeito a ela, conforme disciplina do art. 926 do CPC/2015.
A mesma conclusão se extrai do entendimento de Fernanda Néri Rosa: “Neste sentido, o princípio da segurança jurídica obriga não só o dever de respeito aos precedentes judiciais e a seus vários efeitos, mas também o dever de o Tribunal uniformizar a jurisprudência, evitando a multiplicação de teses jurídicas diversas mesmo em se tratando de fatos similares” (2016, p. 70).
Da obrigação de zelo pela segurança jurídica decorre a obrigação de respeito ao princípio da motivação das decisões jurídicas. Esse princípio, embora constitucional, com o novo CPC, está muito mais fortalecido, já que a doutrina dos precedentes dele necessita, pois somente com a devida fundamentação é que será possível a aplicação dos precedentes, demonstrando a confrontação e a superação.
Para ilustrar, trazemos a lição de Fredie Didier:
Não há mais como reputar suficiente a fundamentação de um ato decisório que se limita a repetir os termos postos na lei ou de ementas e excertos jurisprudenciais e doutrinários. É preciso (e exigível) que a decisão judicial identifique exatamente as questões de fato que se reputarem como essenciais ao deslinde da causa e delineie, também de forma explícita, a tese jurídica adotada para a sua análise e para se chegar à conclusão exposta na parte dispositiva. É também preciso (e igualmente exigível) que ao aplicar ou deixar de aplicar um precedente, o órgão jurisdicional avalie, de modo explícito, a pertinência da sua aplicação, ou não, ao caso concreto, contrapondo as circunstâncias de fato envolvidas aqui e ali e verifique se a tese jurídica adotada outrora é adequada, ou não, para o caso em julgamento. (2013, p. 470)
É, nesse sentido, a disciplina do CPC/2015, precisamente as dispostas nos art. 489, § 1º e seus incisos, e art. 927, § 1º.
Por tudo isso, com o presente trabalho procuramos demonstrar que o CPC/2015 introduziu um sistema de precedentes criados por decisões vinculantes. Referido sistema, conforme vimos, se sustenta pelos conceitos do common law, o que nos faz concluir que o ordenamento jurídico brasileiro passa a ser híbrido, porquanto ainda estamos vinculados à lei (civil law).
GERAL – DOUTRINA
Dada essa natureza híbrida, entendemos que o princípio da legalidade deve ser interpretado de modo ampliado, sendo coerente dizer que os precedentes não criam um novo direito, mas o reafirma a partir da compreensão de sistema jurídico.
Entendemos que esse modo de entender o princípio calha com os ideais democráticos e republicanos, pilares constitucionais, porque possibilitam a incidência do princípio da isonomia no âmbito processual, razão pela qual não mais se permite a existência de decisões diversas aplicáveis a casos análogos.
Os efeitos dessa correta aplicação desses princípios produz segurança jurídicas às relações processuais, porque permite a calculabilidade dos atos praticados, o que confere coerência ao sistema jurídico, já que os Tribunais padronizarão as respostas jurídicas.
Por fim, com os precedentes, o princípio da motivação das decisões ganha precisão e especificidade, já que é necessário explicitar os critérios e as razões que justificam a aplicação da ratio decidendi de um determinado precedente a determinados casos.
Desse modo, com o CPC/2015, espera-se resolver as contradições havidas no Poder Judiciário, extraídas da existência de variadas decisões, bem como o seu decorrente problema da crescente judicialização da vida, que será obstado pelos efeitos do princípio da segurança jurídica, haja vista a possibilidade de cálculos das consequências dos atos praticados.
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