DIREITOS E OBRIGAÇÕES DOS FALIDOS
Rénan Kfuri Lopes
Sumário:
1. INABILITAÇÃO EMPRESARIAL
2. PERDA DO DIREITO DE ADMINISTRAÇÃO
3. DIREITOS DOS FALIDOS
3.1. FISCALIZAR A ADMINISTRAÇÃO
3.2. REQUERER PROVIDÊNCIAS E CONSERVAÇÃO DOS DIREITOS
3.3. INTERVENÇÃO NOS PROCESSOS
3.4. INTERPOSIÇÃO DE RECURSOS
4. DEVERES DOS FALIDOS
4.1. TERMO DE COMPARECIMENTO
4.2. DECLARAÇÕES OBRIGATÓRIAS
4.3. ENTREGA DOS LIVROS OBRIGATÓRIOS, BENS E DOCUMENTOS
4.4. NÃO SE AUSENTAR
4.5. COMPARECIMENTO E MANIFESTAR NA FALÊNCIA
4.6. PRESTAR INFORMAÇÕES E AUXILIAR O ADMINISTRADOR
4.7. MANIFESTAR NAS HABILITAÇÕES DE CRÉDITO
4.8. APRESENTAR A RELAÇÃO DE CREDORES
5. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA
1. INABILITAÇÃO EMPRESARIAL
A consequência automática do decreto da falência contra os falidos é a “inabilitação” para exercer qualquer atividade empresarial. A expressão legal por ser abrangente, “qualquer” atividade empresarial, implica entender vedada aos falidos exercerem a função de administrador-gerente de outra sociedade, mesmo não sendo sócio quotista, pois esse cargo exige atuação e responsabilidade agudas, próximas do empresário. Fora a prática negocial, o falido pode desenvolver outras ocupações civis como, por exemplo, celebrar contrato de trabalho como empregado[1].
Mister ressaltar que a LREF considera falido o devedor: empresário, a sociedade empresária e os sócios ilimitadamente responsáveis[2].
Se falido o empresário individual, o sujeito da quebra, ou seja, o falido, será a pessoa física do empresário, pois a firma individual que reveste o nome dessa pessoa física é apenas uma categoria de nome empresarial, mas o sujeito passivo é o próprio empresário que se submete a tratamento igualitário às sociedades empresárias em caso de quebra. Assim, a indisponibilidade de bens e direitos do falido, com inclusão dos bens futuros objeto de inventário em que seja beneficiado como herdeiro, recairá sobre os bens da pessoa física e não do “nome empresarial”, que se exige o registro nos órgãos do comércio para fins de cadastros de contribuintes como firma individual. O que não pode é confundir personalização da pessoa física do empresário individual.
Essa inabilitação tem início a partir da data constante na sentença da decretação da falência e só termina na data da sentença transitada em julgado que extinguir as obrigações do falido[3], podendo o falido retomar as atividades empresariais.
Insta destacar que a “inabilitação” pela sentença da quebra é diversa daquela prevista no art.181 § 1º da LREF que cuida da condenação penal por crime falimentar. O efeito do decreto da falência é automático quanto à “inabilitação” do falido (art.102). Enquanto que na hipótese da sentença criminal condenatória por crime falimentar, o efeito de inabilitação para o exercício da atividade empresarial (art.181,I[4]) não é automático, e só exsurge se o juiz motivadamente declarar na sentença, e perdurará até que se complete 05 (cinco) anos após a extinção da punibilidade, podendo cessar antes pela reabilitação penal (art.102 caput).
Responde por crime falimentar, o falido que exercer atividade para a qual foi inabilitado ou incapacitado por decisão judicial nos termos da LREF[5].
Findo o período de inabilitação, por quaisquer dos motivos acima (art.102 caput ou 181), o falido requererá ao juiz da falência que proceda à respectiva anotação em seu registro comercial, afastando esse impedimento judicial. Essa petição deverá ser dirigida ao juízo falencial e não ao juízo criminal pelo qual tramitou a ação penal[6], instruída com os documentos e certidões que demonstrem a satisfação aos requisitos legais, que gerem ao falido o direito de readquirir a aptidão do exercício de atividade empresarial.
Como provavelmente a falência já se encerrou por sentença, desaparecendo as figuras processuais do administrador judicial e dos credores, necessário seja ouvido o Ministério Público na condição de fiscal da lei. A decisão que indeferir esse pedido do falido é interlocutória, desafiando agravo de instrumento, pois evidente o risco de causar grave lesão e de difícil reparação para o falido[7]. Poderá também recorrer o Ministério Público, acaso não se conforme com a decisão deferindo a anotação no registro, por descumprir o regramento legal (art.102 parágrafo único).
2. PERDA DO DIREITO DE ADMINISTRAÇÃO
O falido perde automaticamente o direito de administrar seus bens ou deles dispor desde a data da decretação da falência ou da ordem judicial do sequestro[8] por decisão judicial (art.103 caput). Consideram-se como bens do falido, o complexo patrimonial de seus direitos e obrigações.
No dizer dos incisos I, II e II do art.75, a falência, ao promover o afastamento do devedor visa preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos, inclusive os intangíveis da empresa; permitir a liquidação célere das empresas inviáveis, com vistas à realocação eficiente de recursos na economia; e fomentar o empreendedorismo, inclusive por meio da viabilização do retorno célere do empreendedor falido à atividade econômica.
A falência traz em si a presunção objetiva de que a empresa não obteve êxito nas suas atividades quando teve à sua frente o falido. Portanto, consequência lógica e instantânea da decretação da falência é o falido perder o direito de administrar a própria sociedade quebrada como qualquer outra[9] e dos bens que integram seu ativo ou deles dispor[10].
Os bens atingidos pelo desapossamento como pronto efeito da falência, são aqueles presentes e futuros (adquiridos no transcurso da quebra), incluindo-se os seus frutos, que estejam na posse do falido ou de terceiros, pois todos serão objeto da arrecadação; que serão vendidos e o produto apurado reverterá para o pagamento dos credores[11].
A regência dos destinos do patrimônio a partir da quebra será de responsabilidade do administrador judicial, coadjuvado pelo Comitê de Credores, se tiver[12].
3. DIREITOS DOS FALIDOS
3.1. FISCALIZAR A ADMINISTRAÇÃO
É direito inarredável dos falidos fiscalizarem a administração da falência, apontando eventuais irregularidades porventura surgidas durante o processo de quebra, impugnando as habilitações de créditos e as contas prestadas pelo administrador judicial (art.103, parágrafo único).
Muito embora a falência não signifique obrigatoriamente a dissolução total judicial da sociedade empresária, pois possível a declaração judicial de extinção das obrigações antes da sentença de encerramento ou havendo sobra para os falidos ao final —situações raríssimas—, a visão moderna legal traduz a presença dos falidos como cointeressados no sucesso do resultado final da falência. Isso porque quanto menor o saldo devedor ou mesmo inexistente, além de revelar uma participação saudável durante o processo falencial, pode lhe possibilitar, satisfeitas as normas legais, o pedido de extinção das obrigações.
3.2. REQUERER PROVIDÊNCIAS E CONSERVAÇÃO DOS DIREITOS
Os falidos poderão requerer sejam tomadas providências para a conservação de seus direitos ou dos bens arrecadados, desde que essa manifestação se faça com um propósito sério, sem a pretensão espúria de atrapalhar o processo da falência ou seus incidentes. Por ser o patrimônio arrecadado de propriedade dos falidos, a lei permite que solicite medidas para bem preservá-lo, o que redundará numa maior valorização. Com isso, a venda judicial desse patrimônio ao atingir maior o resultado, representará para o falido, a possibilidade do pagamento parcial ou até integral do passivo da massa falida (art.103, parágrafo único).
3.3. INTERVENÇÃO NOS PROCESSOS
Também terão os falidos o direito de intervir nos processos em que a massa falida seja parte ou interessada — verbi gratia, apresentando impugnação a crédito habilitado—, requerendo o que for de direito (art.103, parágrafo único).
Os falidos como terceiros juridicamente interessados em que a sentença poderá lhe ser favorável poderá requerer sua admissão, em qualquer procedimento e grau de jurisdição, sua admissão nos autos como assistente simples e assistente litisconsorcial (CPC, arts. 119 usque 124).
3.4. INTERPOSIÇÃO DE RECURSOS
Permite a LREF que os falidos interponham os recursos adequados pela lei especial e aqueles previstos na legislação processual civil. Os prazos e as condições de conhecimento serão aquelas previstas no CPC, inclusive o preparo recursal, caso os falidos não estejam guarnecidos pela assistência judiciária.[13]
4. DEVERES DOS FALIDOS
4.1. TERMO DE COMPARECIMENTO
Os falidos são intimados da decisão que decretou a falência através da sua publicação no Diário Oficial Eletrônico. Essa intimação se concretiza na pessoa dos seus advogados, sendo desnecessária outra forma de intimação. As publicações conterão a epígrafe “FALÊNCIA DE”[14].
A decretação da falência impõe aos representantes legais do falido a obrigação de comparecer nos autos no prazo de 15 dias após a intimação da sentença de quebra, formalizar o “Termo de Comparecimento” e esclarecer as informações e documentos exigidos no art. 104,I, alíneas ´a´ usque ´g´.
O “Termo de Comparecimento” é um dever pessoal impositivo aos falidos por expressa determinação legal, não podendo ser satisfeito por representação. Ademais, são os falidos que melhor podem satisfazer prestar as informações relacionadas nos incisos do art.104: declinarão seus nomes, nacionalidades, estados civis, endereços completos dos domicílios, declarando, ainda, as informações previstas nas alíneas a a g do inciso I, entregarão ao administrador judiciais os livros obrigatórios e documentos de escrituração encerrados (inciso II), tomando conhecimento das suas obrigações, direitos (incisos III a XII) e a possibilidade de responderem por crime de desobediência se faltarem com o cumprimento de quaisquer de suas obrigações (parágrafo único).
O “Termo de Comparecimento” será lavrado pelo escrivão, subscrito pelo juiz, escrivão, falidos depoentes e seus procuradores.
4.2. DECLARAÇÕES OBRIGATÓRIAS
No “termo de comparecimento”, os falidos terão obrigatoriamente de responder ao juízo os questionamentos das alíneas a a g do inciso I do art.104, in verbis:
a) as causas determinantes da sua falência, quando requerida pelos credores;
b) tratando-se de sociedade, os nomes e endereços de todos os sócios, acionistas controladores, diretores ou administradores, apresentando o contrato ou estatuto social e a prova do respectivo registro, bem como suas alterações;
c) o nome do contador encarregado da escrituração dos livros obrigatórios;
d) os mandatos que porventura tenha outorgado, indicando seu objeto, nome e endereço do mandatário;
e) seus bens imóveis e os móveis que não se encontram no estabelecimento;
f) se faz parte de outras sociedades, exibindo respectivo contrato;
g) suas contas bancárias, aplicações, títulos em cobrança e processos em andamento em que for autor ou réu.
As causas determinantes da falência informadas pelos falidos possibilitarão ao administrador judicial ter uma noção primária do grau de comprometimento dos falidos e de terceiros, identificando com maior segurança os responsáveis nas esferas civil e penal pela quebra, quando da apresentação do primeiro relatório, previsto no art. 22, III, e.
Os falidos indicarão os nomes e endereços de todos os sócios, ostensivos e ocultos, acionistas controladores, diretores ou administradores. Essas informações serão corroboradas pelo contrato ou estatuto social e suas alterações registradas nos órgãos de comércio que os falidos terão a obrigação de apresentar quando do comparecimento em juízo. Se não as souberem com precisão naquele momento, ou não disporem da documentação comprobatória, podendo pedir prazo para satisfazer a exigência legal. Necessário que o juízo da falência tenha a certeza absoluta dos nomes dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e dos administradores da sociedade falida, para a hipótese de se necessário, o administrador judicial promover a ação de responsabilidade conjeturada no art.82.
É vedada a extensão da falência ou de seus sócios, no todo ou em parte, aos sócios de responsabilidade limitada, aos controladores e aos administradores da sociedade falia. Admitida, contudo, promover o Incidente de Desconsideração de Personalidade Jurídica, disregard doctrine, art.82-A.
O art.82-A tornou fácil a compreensão da diferença entre a extensão dos efeitos da falência, cabível apenas nos casos de sócios de responsabilidade ilimitada — reiterando o entendimento da inaplicabilidade desse instituto a sócios de responsabilidade limitada —, e a desconsideração da personalidade jurídica, a qual pode ser aplicada no âmbito do processo falimentar, desde que respeitados os pressupostos para tanto, entre os quais está exatamente a necessidade de que a espécie de pessoa jurídica preveja a responsabilidade limitada dos sócios.
A informação do nome e endereço do contador encarregado da escrituração dos livros obrigatórios é essencial, para se verificar a hipótese de lançamentos contábeis fraudulentos, o que caracteriza o crime falimentar previsto no art.168 § 3º. Importante ressaltar que em caso de vários contadores atuantes nessa função, os falidos terão de informar, individualmente, o período que cada um dos contabilistas atuaram profissionalmente na escrituração dos livros obrigatórios, para não se cometer injustiças e acusações precipitadas sobre o último ou outro contador, pela prática de crime falimentar fora da época de suas atuações na frente da escrita da empresa falida.
Os falidos cientificarão ao juízo falencial quais foram os mandatos que porventura tenham outorgado, indicando seu objeto, nome e endereço do mandatário. Essa informação é preciso, pois os mandatos conferidos pelo devedor, antes da falência, para a realização de negócios, cessarão seus efeitos automaticamente com a decretação da falência, cabendo ao mandatário prestar contas de sua gestão (art.120 caput). Já o mandato conferido pela empresa devedora a advogado antes da falência, continua em vigor até que seja expressamente revogado pelo administrador judicial (art.120 § 1º). Cessam automaticamente para os falidos todos os mandatos que lhe tiverem sido outorgados ou comissões que houver recebido antes da falência que versarem matéria relativa a atividade empresarial (art.120 § 2º).
Necessário que os falidos informem quais seus bens imóveis e móveis que não se encontram no estabelecimento, para possibilitar ao administrador judicial arrecadar a totalidade dos bens que integram o patrimônio da empresa falida.
Nesse rol patrimonial, se o falido for o empresário em nome individual, apontará o bem que seja beneficiário como herdeiro em inventário. Essas informações facilitarão a lavratura definitiva do auto de arrecadação pelo administrador judicial[15], e afastará dos falidos a pecha de responderem civil por prejuízos causados aos credores ou criminalmente, pelo ato ilícito de apropriar, desviar, ocultar, receber, usar bens que sabem pertencer à massa falida (arts. 173 e 174).
Os falidos informarão se fazem parte de outras sociedades, exibindo os respectivos contratos sociais. Essas participações societárias em outras sociedades por se constituírem bens dos falidos, são passíveis de arrecadação. Para liquidar esse patrimônio arrecadado, o administrador judicial poderá requerer a liquidação da cota do devedor, revertendo esse produto em favor da massa falida[16]. Se as ações arrecadadas forem de companhia aberta, a liquidação seguirá às normas particulares do mercado de acordo com as cotações apuradas na época da alienação.
A notícia prestada pelos falidos, quanto aos dados de suas contas bancárias, aplicações, títulos em cobrança e processos em andamento em que for autor e réu, possibilitará ao administrador judicial arrecadar o ativo, examinar os contratos em curso para verificar suas conveniências de continuidade, além de ingressar nos feitos de interesse da massa falida como substituto processual, como é de seu mister[17].
4.3. ENTREGA DOS LIVROS OBRIGATÓRIOS, BENS E DOCUMENTOS
No ato da assinatura do “termo de comparecimento” os falidos depositarão em cartório contra a entrega de recibo e certificação nos autos da falência, os livros contábeis que a legislação considera como obrigatórios. Após as últimas anotações constantes nesses livros, o administrador judicial lavrará em cada um, o “termo de encerramento”. Baseado nesses livros e em todo arcabouço documental que envolve o processo de falência, o administrador judicial, auxiliado por perito contador, verificará a ocorrência de crime falimentar e sua responsabilização civil e criminal. Outra importância da análise desses livros é também para localizar eventuais desvios de bens dos falidos registrados em suas escritas e que após a quebra não foram informados para fins de arrecadação (art.104,II). Também não se pode olvidar a verificação da ocorrência de adulteração ou omissão de lançamentos, que caracterizam crimes falimentares.
4.4. NÃO SE AUSENTAR
Os falidos não poderão ausentar do lugar onde se processa a falência sem motivo justo e comunicação expressa ao juiz, e sem deixar procurador, sob pena de lhe ser decretada a prisão preventiva por atentar contra a regular instrução do processo. Claro que as viagens do falido por curto prazo, para fins de seu trabalho ou lazer, não necessitam de qualquer comunicação, sob pena de se criarem despropositados incidentes dentro do processo, sem o menor proveito, e em sentido contrário à apregoada celeridade processual. Na falência os atos processuais têm de ser úteis e objetivos (art.104,III).
4.5. COMPARECER E MANIFESTAR NA FALÊNCIA
Os falidos têm a obrigação de comparecer e manifestar em todos os atos da falência sempre que lei assim prever ou determinado pelo juiz. E quando não for indispensável a presença pessoal, poderão ser representados por procurador (art.104,incisos IV e X).
4.6. PRESTEZA, AUXÍLIO, ENTREGA DE BENS, LIVROS, PAPÉIS E DOCUMENTOS AO ADMINISTRADOR JUDICIAL
Dentro do enredo maior que preconiza as obrigações dos falidos se encontram as seguintes atribuições legais:
– prestar as informações reclamadas pelo juiz, administrador judicial, credor ou Ministério Público, sobre as circunstâncias e fatos que interessam à falência (art.104,VI);
– auxiliar o administrador judicial com zelo e presteza (art.104,VII);
– entregarão ao administrador judicial, para arrecadação, todos os bens, papéis, documentos e senhas de acesso a sistemas contábeis, financeiros e bancários, bem como indicar aqueles que porventura estejam em poder de terceiros (art.104,V).
4.7. EXAMINAR AS HABILITAÇÕES DE CRÉDITO
Os falidos por terem contato direto com os habilitantes na formação de seus créditos, são obrigados a examinar as habilitações, não podendo omitir ou prestar manifestações falsas. Se os falidos se apresentarem contrários à legitimidade, importância ou classificação dos créditos, o procedimento se transforma em impugnação, sendo processado na forma do art.8º (art.104,VIII).
4.8. APRESENTAR A RELAÇÃO DE CREDORES
Encargo relevante dos falidos é a apresentação no prazo de 05 (cinco) dias, estabelecidos por antecipação, desde a sentença da falência (art.99,III), a relação dos credores, indicando endereço, importância, natureza e classificação dos respectivos créditos, sob pena de desobediência. A norma é reprisada no inciso XI do art.104, constando que a apresentação se dará no prazo fixado pelo juiz. Como o prazo do art.99 III é peremptório, não poderá o juiz o alterar.
Entretanto, se a falência for de uma empresa com grande número de credores, sem condições da apresentação imediata, os falidos poderão requerer a dilação dentro de um prazo razoável para a apresentação da relação de credores.
4.9. EXAMINAR AS CONTAS DO ADMINISTRADOR JUDICIAL
Dentro do exercício da fiscalização dos atos de gestão regrado pelo art.103, parágrafo único, após apresentadas as contas pelo administrador judicial, os falidos terão o direito de examiná-las e emitir parecer favorável ou contrário[18], mas sempre com clareza e fundamentação (art.104,XII).
5. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA
Se os falidos faltarem ao cumprimento de quaisquer dos deveres previstos pela LREF, principalmente o de colaboração ao administrador e demais auxiliares, o juiz intimará para fazê-lo. Se não atendida a ordem judicial, permanecendo omisso, ou a justificativa apresentada não satisfizer aos interesses da massa, os falidos serão processados por crime de desobediência (art.104, parágrafo único).
Caracteriza-se a desobediência no âmbito do cotidiano forense, uma vez descumprida, injustificadamente, determinação judicial, proferida nos autos de processo de natureza cível. A única providência ao alcance do juiz condutor do processo, para fins de responsabilização penal do descumpridor, será noticiar o fato ao Representante do Ministério Público para que este adote as providências cabíveis à imposição da reprimenda penal respectiva, por infração ao artigo 330 do CPB — desobedecer à ordem legal de funcionário público —, eis que lhe falece à autoridade judicial competência para decretar prisão em face do delito cometido. A pena imposta é de 15 (quinze) dias a 06 (seis) meses de detenção e multa. Portanto, a competência para julgamento e execução é do Juizado Especial Criminal, obedecendo ao rito dos arts.76 e seguintes da Lei n. 9.099/95, por se tratar de crime de ação penal pública incondicionada.
Inadmissível o decreto de prisão administrativa pelo juízo falencial, pois não inclusa essa possibilidade na Constituição Federal[19], ratificado pelo enunciado na Súmula 280 do STJ[20], com plena aplicação na LREF[21].
[1] LREF, art. 102.
[2] LREF, arts.81 e 190.
[3] LREF, art.159 § 3º.
[4] LREF, art.181. São efeitos da condenação por crime previsto nesta Lei: I. a inabilitação para o exercício de atividade empresarial; § 1º. Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença, e perdurarão até 5 (cinco) anos após a extinção da punibilidade, podendo, contudo, cessar antes pela reabilitação penal.
[5] LREF, art.176.
[6] LREF, art.183.
[7] CPC, art. 1.015, par. único e Tema Repetitivo 1.022/STJ: “É cabível agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias proferidas nos processos de recuperação judicial e nos proferidos de falência, por força do art. 1.015, parágrafo único do CPC”.
[8] CPC, arts.822 a 825.
[9] LREF, art.102 caput.
[10] LREF, art.103 caput.
[11] LREF, art.139.
[12] LREF, art.99 IX c.c. art.22, I e III, j.
[13] O benefício da gratuidade pode ser concedido às massas falidas apenas se comprovarem que dele necessitam, pois não se presume a sua hipossuficiência [REsp 1.648.861/SP].
[14] LREF, art.191.
[15] LREF, art.22,III,f.
[16] Código Civil, art. 1.026.
[17] LREF, art.22,III,n c.c. CPC, arts.12,III e 41.
[18] LREF, art.154 § 2º.
[19] CF, art.5º, LXVII: “não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”.
[20] STJ, súmula 280: O art.35 do Decreto-Lei n. 7.661, de 1.945, que estabelece a prisão administrativa, foi revogado pelos incisos LXI e LXVII do art.5o da Constituição Federal de 1.988.
[21] A prisão preventiva é possível ser decretada pelo juízo falencial, se presentes provas robustas da prática de crime falimentar (LREF, art.99,VII).