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A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Aldem Johnston Barbosa Araújo

SUMÁRIO: Introdução; 1 A desconsideração da personalidade jurídica no direito material; 1.1 Artigo 135 do Código Tributário Nacional (CTN); 1.2 Artigo 28, § 5º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC); 1.3 Artigo 34 da Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC); 1.4 Artigo 18, § 3º, da Lei nº 9.847/1999; 1.5 Artigo 4º da Lei de Crimes Ambientais; 1.6 Artigo 50 do Código Civil; 1.7 Artigo 14 da Lei Anticorrupção; 1.8 Artigo 2º da CLT; 2 Quem está sujeito a desconsideração da personalidade jurídica?; 3 O procedimento para desconsideração da personalidade jurídica estabelecido no novo Código de Processo Civil; 4 Considerações de ordem prática; Conclusão; Referências.

 

INTRODUÇÃO

É inegável que, a partir da criação da figura da pessoa jurídica, deixou de ser viável se concentrar a prática de atos empresariais unicamente na figura do empresário. A sofisticação da economia, carecendo do emprego de mão de obra e tecnologia e demandando investimentos, restou por inviabilizar que as atividades desenvolvidas pela indústria, comércio e serviços ficassem adstritas à esfera das pessoas físicas.

Se antes o artesão manufaturava o seu produto e o comercializava numa feira para dali obter o lucro necessário para o seu sustento e para a perpetuação da sua atividade, na medida em que as relações comerciais passaram a ser mais complexas, o artesão teve de contratar empregados para auxiliar na produção, passando a comercializar sua mercadoria para um intermediário ao invés de diretamente ao consumidor, restando clara a necessidade de se criar algum instrumento que não só descentralizasse a administração da atividade empresarial, como também a fomentasse.

Com a criação da pessoa jurídica, permitiu-se que fosse ela a captar recursos e a assumir os riscos patrimoniais da atividade empresarial, possibilitando que diversos investidores passassem a integrar a economia por meio de participações em sociedades empresárias.

A partir de sua personificação, as empresas passaram a ter direito a nome, domicílio, capacidade contratual, capacidade processual, existência distinta e autonomia patrimonial [1].

A importância da separação patrimonial entre a empresa e o empresário para o fomento da economia foi devidamente destacada pelo STJ no EREsp 1.306.553/SC relatado pela Ministra Maria Isabel Gallotti: “A criação teórica da pessoa jurídica foi avanço que permitiu o desenvolvimento da atividade econômica, ensejando a limitação dos riscos do empreendedor ao patrimônio destacado para tal fim“.

Diante das dificuldades impostas pela complexidade de determinadas atividades econômicas, o compartilhamento de bens e serviços por parte de pessoas físicas no âmbito de uma sociedade empresária permite que seja obtido um êxito que seria muito difícil de ser alcançado caso os sócios resolvessem empreender atividades empresariais em caráter individual, já que seu desforço coletivo (exercido por meio da pessoa jurídica) torna-se ferramenta para fazer frente aos riscos do negócio [2].

Entretanto, da mesma forma que se celebra a criação de pessoas jurídicas em razão dos diversos benefícios que a separação do seu patrimônio com relação ao patrimônio pessoal dos sócios que a compõem, há de atentar que se coíbe, com veemência, a utilização de tal separação patrimonial para fins que não se revelem consentâneos com a função social da atividade econômica, com a boa-fé nas relações negociais e com a segurança jurídica [3].

Criada no direito anglo-saxão em 1897 [4], o instituto da disregard of the legal entitty, disregard doctrine ou lifting the corporate veil recebeu entre nós o nome de teoria da desconsideração, superação ou penetração da(na) personalidade jurídica.

A desconsideração permite “levantar o véu” da personalidade jurídica da sociedade, removendo-se a barreira que separa o seu patrimônio do patrimônio das pessoas físicas que a integram, propiciando que determinadas relações jurídicas havidas pelos sócios passem a ser de responsabilidade da empresa e vice-versa, sempre que, a grosso modo, a separação patrimonial entre as pessoas naturais e a pessoa jurídica esteja violando o interesse público [5].

O interesse público (manifestado na letra da lei) restará violado pela separação patrimonial entre a pessoa jurídica e seus sócios sempre que esta se verificar um óbice à boa-fé contratual, à segurança jurídica nas relações empresariais, à proteção ao meio ambiente, à ordem econômica, ao Erário e ao consumidor.

Não raro, as pessoas jurídicas são utilizadas para fins atentatórios à função social da propriedade, já que, ao invés de gerar emprego, renda e desenvolver a economia, tornam-se instrumentos para ocultar bens dos sócios, frustrar credores e até mesmo sonegar tributos.

Em tais casos, há um evidente abuso de direito e um flagrante desvio das finalidades lícitas que devem pautar todas as empresas, fazendo a separação patrimonial entre os bens da sociedade e os bens individuais dos sócios se tornar um inconveniente, de modo que a lei autoriza o Estado a promover a desconsideração da personalidade jurídica [6][7][8][9].

Assim, restará desconsiderada a personalidade jurídica da empresa para possibilitar que os bens pessoais dos sócios sejam atingidos em virtude de responsabilização que, a princípio, só deveria afetar os bens da sociedade empresária, admitindo-se ainda o inverso, ou seja, que bens da pessoa jurídica tornem-se objeto de eventual constrição em virtude de atos praticados pelos seus sócios (o que caracteriza a chamada desconsideração inversa da personalidade jurídica [10]).

Estando disciplinada em diversos diplomas legais no Brasil, a desconsideração da personalidade jurídica sempre careceu de uma disciplina que regulamentasse o seu procedimento, o que gerava muitas dúvidas [11] na doutrina e jurisprudência acerca de como aplicar tal instituto.

A partir da edição do Novo Código de Processo Civil (Lei  nº 13.105, de 16 de março de 2015), foi instituído um procedimento (nos arts. 133 a 137 da lei) que confere segurança jurídica [12] à aplicação do instituto, garantindo previsibilidade e afastando o casuísmo.

Nas linhas a seguir, traçaremos um panorama sobre o regramento processual conferido à desconsideração da personalidade jurídica.

 

1 A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO DIREITO MATERIAL

Como já dito, no âmbito do direito material, o ordenamento jurídico brasileiro prevê, em diplomas e regimes legais distintos, diversas situações que ensejam a desconsideração da personalidade jurídica.

Antes da análise acerca dos dispositivos que preveem hipóteses autorizadoras da desconsideração, há de se esclarecer que em nenhuma delas acolhe-se a possibilidade de despersonificação [13] da pessoa jurídica. Desta feita, esclareça-se: nas hipóteses que serão debatidas a seguir, não há casos em que a lei autorize a extinção da sociedade empresária, e sim tão somente o afastamento momentâneo [14] e específico [15] da sua personalidade jurídica.

1.1 Artigo 135 do Código Tributário Nacional (CTN)

Talvez a primeira das hipóteses legais de aplicação da disregard  doctrine previstas no ordenamento jurídico brasileiro, o art. 135 [16] do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966) adotou a teoria maior [17][18] da desconsideração da personalidade jurídica, já que, para se levantar o véu do ente coletivo e assim desconsiderar a autonomia patrimonial que há entre os sócios e a empresa, é necessário que os responsáveis tributários atuem com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

As pessoas referidas no art. 134 do CTN, em regra, respondem de modo subsidiário, em relação aos atos em que intervierem e pelas omissões de que forem responsáveis, e apenas se o contribuinte não tiver condições de cumprir a obrigação tributária. Entretanto, quando agirem dolosamente, em contrariedade à lei, ao contrato ou aos estatutos, em prejuízo não só do Fisco, mas também do contribuinte, sua responsabilidade passa a ser pessoal. Essa é a razão da remissão “às pessoas referidas no artigo anterior“, que mostra, ainda, que o mero inadimplemento não pode ser condição para a incidência do art. 135 do CTN, pois, do contrário, o inciso I do art. 135 tornaria inócuo todo o art. 134. O art. 135, III, do CTN cuida da responsabilidade de terceiros que tenham administrado a pessoa jurídica contribuinte, representando-a (ou presenteando-a, para usar a linguagem de Pontes de Miranda), como diretores, administradores ou gerentes. Não é necessário, nem suficiente, que sejam sócios. Um sócio poderá responder se for sócio-gerente, sendo juridicamente impossível responsabilizar o sócio meramente quotista, a menos que se configure situação que autorize a aplicação conjunta dos arts. 135, I, e 134, VII, do CTN (dissolução irregular da sociedade). Em outros termos, se se tratar de aplicação do art. 135, III, do CTN, o sócio meramente quotista não é responsável, e o “sócio-gerente responde por ser gerente, não por ser sócio” […]. Pode ocorrer de o terceiro, mesmo ostentando a denominação de “diretor“, não haver praticado atos de gestão. Naturalmente, o ônus de provar essa peculiaridade será dele, mas, de qualquer sorte, em tais hipóteses não haverá responsabilidade nos termos do art. 135, III, do CTN. […] O inadimplemento de um débito tributário até pode configurar infração de lei, mas essa infração, em condições ordinárias, é praticada pelo contribuinte, ou seja, no caso do art. 135, III, do CTN, pela pessoa jurídica, e não pelo seu representante, não sendo, portanto, causa para a sua responsabilização. Apenas quando este atua fora de sua competência, com excesso de poderes, em prejuízo do Fisco e da própria pessoa jurídica, pode-se falar em infração de lei. E nem poderia ser mesmo diferente, sob pena de a responsabilidade das pessoas indicadas no  art. 135 do CTN deixar de ser uma exceção à regra de que o tributo é devido pela sociedade, e passar a ser uma regra sem exceções. Por isso, “a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, circunstância que acarrete a responsabilidade solidária dos terceiros, nomeadamente dos sócios-gerentes, pelos débitos tributários da empresa (art. 135 do CTN)“. (SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Código Tributário Nacional: anotações à Constituição, ao Código Tributário Nacional e às Leis Complementares nºs 87/1996 e 116/2003. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 260)

Registre-se o caráter excepcional de tal responsabilização prevista no CTN, já que, ao responsabilizar diretores, gerentes ou representantes em caráter pessoal pelo pagamento dos créditos da pessoa jurídica contribuinte quando estes forem correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes, infração de lei, contrato social ou estatutos, está o diploma legal instituindo verdadeira responsabilidade subjetiva (já que vai se aferir a atuação ilegal ou com excesso de poderes do responsável tributário [19]) para a incidência da obrigação tributária quando em regra a responsabilidade é objetiva [20].

1.2 Artigo 28, § 5º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC)

Por seu turno, consagrando a chamada teoria menor [21][22] da desconsideração da personalidade jurídica, o caput e principalmente o § 5º do  art. 28 [23] do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) permitem ao juiz aplicar o instituto sempre que a personalidade jurídica do ente coletivo se mostre um empecilho para o ressarcimento do consumidor.

Assim, nos termos do CDC, mesmo que não haja fraude ou abuso de direito na relação da empresa e os seus sócios para com os seus credores, a mera existência de uma dívida proveniente de uma relação de consumo pode ser capaz de ensejar a penetração na personalidade jurídica da sociedade para fins de possibilitar o atendimento do interesse do consumidor lesado:

A respeito da desconsideração da personalidade jurídica no CDC, é importante registrar que tal instituto se encontra regulamentado justamente no Capítulo IV, que cuida da qualidade dos produtos e serviços e da reparação de danos ao consumidor. Isto demonstra a intenção clara do legislador em dar efetividade aos direitos do consumidor, quando tenha seus direitos violados por conta de um acidente de consumo ou de um vício do produto. Não basta dar-lhe uma sentença de mérito favorável, reconhecendo seus direitos; o importante é que o consumidor tenha seu eventual crédito totalmente recebido, seja da pessoa jurídica ou da pessoa física do sócio. O art. 28 fala expressamente em desconsideração da pessoa jurídica. Entretanto, das hipóteses enumeradas pelo legislador para a aplicação do instituto, pode-se dizer que foram criadas outras situações permissivas da desconsideração, além da fraude e do abuso de direito, que não eram tratadas pela doutrina, anteriormente […]. Parece que as situações indicadas no caput do art. 28 são meramente exemplificativas. É que a disposição contida no § 5º autoriza o Magistrado a desconsiderar a personalidade jurídica e obrigar pessoalmente os sócios pelo ressarcimento dos prejuízos causados, toda vez que a personalidade for obstáculo para tanto. É como se a disposição do § 5º atuasse como caput e as situações listadas no caput do art. 28 atuassem como incisos meramente exemplificativos. […] E qual poderá ser este obstáculo de que fala o § 5º do art. 28? Parece-me que aqui a simples ausência de bens penhoráveis na pessoa jurídica, ainda que seus sócios não tenham procedido com fraude ou abuso de direito, é suficiente para que se proceda à desconsideração. […] Entretanto, o entendimento anteriormente exposto deve cingir-se às hipóteses de acidente de consumo, previstas nos arts. 12 e 14 do CDC para dar efetividade à reparação dos danos, seja de ordem material ou moral, causados pelos produtos e serviços. […] Ou seja, a desconsideração, nos termos em que está disciplinada no CDC, encontra também respaldo no risco da atividade econômica, que deve ser suportado pelo capitalista e não pelo consumidor. E o ressarcimento de que fala o  § 5º do art. 26 é exatamente a indenização a que faz jus o consumidor em decorrência do acidente de consumo. Se a pessoa jurídica, a sua autonomia patrimonial, constitui o obstáculo ao recebimento da indenização, seja pela ocorrência de fraude, abuso de direito, falência, ou até mesmo pela simples falta de bens penhoráveis no seu patrimônio, deve esta ser desconsiderada para atingir os bens particulares dos sócios.” (KHOURI, Paulo Roberto Roque Antonio. Direito do consumidor: contratos, responsabilidade civil e defesa do consumidor em juízo. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 203/205)

1.3 Artigo 34 da Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC)

Em sede de direito regulatório econômico, o revogado art. 18 [24] da Lei nº 8.884/1994 (Lei de criação do Cade) e o art. 34 [25] da Lei nº 12.529/2011 (Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência) dão azo ao debate se, na seara administrativa, seria admissível ao Estado desconsiderar a personalidade jurídica de empresas por meio de ato administrativo.

Analisando a questão num caso concreto que envolvia um certame licitatório, o STJ admitiu, em precedente isolado, a possibilidade de a Administração Pública, com base no princípio da moralidade, desconsiderar a personalidade jurídica de uma sociedade empresária:

A Administração Pública pode, em observância ao princípio da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos tutelados, desconsiderar a personalidade jurídica de sociedade constituída com abuso de forma e fraude à lei, desde que facultado ao administrado o contraditório e a ampla defesa em processo administrativo regular. (STJ, RMS 15166/BA,  2002/0094265-7, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJ 07.08.2003,  DJ 08.09.2003, p. 262; RDR, v. 27, p. 378; RSTJ, v. 172, p. 247)

Também considerando válida a atuação administrativa neste particular, o Tribunal de Contas da União proferiu decisões na qual ele próprio promovia a superação da personalidade jurídica, citando-se, como exemplo, o Acórdão nº 1.327/2012-Plenário:

Em caso de fraude comprovada, é possível a responsabilização não só da empresa, mas também dos sócios, de fato ou de direito, a partir da desconsideração da personalidade jurídica da instituição empresarial. (TCU, Acórdão nº 1.327/2012-Plenário, TC 008.267/2010-3, Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, 30.05.2012)

Contudo, registre-se que o STF concedeu, em caráter liminar, medida que suspendeu um acórdão do TCU onde se decidiu pela desconsideração da personalidade jurídica, destacando-se, entre outros argumentos, a existência de posicionamentos da doutrina [26] no sentido de considerar que a aplicação da disregard doctrine está adstrita à reserva jurisdicional, sendo, portanto, defeso ao Estado aplicá-la:

Ocorre, no entanto, que razões de prudência e o reconhecimento da plausibilidade jurídica da pretensão deduzida pela parte impetrante impõem que se outorgue, na espécie, a pretendida tutela cautelar, seja porque esta Suprema Corte ainda não se pronunciou sobre a validade da aplicação da  disregard doctrine no âmbito dos procedimentos administrativos, seja porque há eminentes doutrinadores, apoiados na cláusula constitucional da reserva de jurisdição, que entendem imprescindível a existência de ato jurisdicional para legitimar a desconsideração da personalidade jurídica (o que tornaria inadmissível a utilização dessa técnica por órgãos e Tribunais administrativos), seja porque se mostra relevante examinar o tema da desconsideração expansiva da personalidade civil em face do princípio da intranscendência das sanções administrativas e das medidas restritivas de direitos, seja, ainda, porque assume significativa importância o debate em torno da possibilidade de utilização da disregard doctrine, pela própria Administração Pública, agindo pro domo sua, examinada essa específica questão na perspectiva do princípio da legalidade. (STF, MS 32.494-MC/DF, Rel. Min. Celso de Mello)

Como não há posicionamento definitivo da nossa Suprema Corte acerca da possibilidade de a desconsideração da personalidade jurídica ser efetuada pela Administração Pública, a presunção de constitucionalidade do art. 34 da Lei nº 12.529/2011 autorizaria concluir que seria lícito ao Estado (no caso, os integrantes do SBDC – Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência: o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade e a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda) desconsiderar a personalidade jurídica de empresas por meio de ato administrativo.

Em razão do disposto no art. 15 [27][28][29][30] do NCPC, é possível defender que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade e a Secretaria de       Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda quando da aplicação do art. 34 da Lei nº 12.529/2011, ou seja, quando forem promover em sede administrativa a desconsideração da personalidade jurídica, deverão observar, fazendo-se as adequações necessárias, o procedimento previsto nos arts. 133 a 137 do Novo Código de Processo Civil.

1.4 Artigo 18, § 3º, da Lei nº 9.847/1999

Finalizando as considerações acerca da superação da personalidade jurídica no direito regulatório econômico e fazendo-se as mesmas ressalvas já feitas com relação ao art. 34 da Lei nº 12.529/2011, registre-se que o  § 3º do art. 18 [31] da Lei nº 9.847/1999 concede à ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) o poder de promover, em sede administrativa, a desconsideração da personalidade jurídica de empresas que infrinjam as normas pertinentes ao exercício de atividades relativas à indústria do petróleo, à indústria de biocombustíveis, ao abastecimento nacional de combustíveis, ao Sistema Nacional de Estoques de Combustíveis e ao Plano Anual de Estoques Estratégicos de Combustíveis.

1.5 Artigo 4º da Lei de Crimes Ambientais

Estranhamente deslocado em um diploma que dispõe sobre sanções penais e administrativas em face de infrações contra o meio ambiente, o  art. 4º [32] da Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais) permite a superação da personalidade jurídica para fins de reparação civil:

Embora seja instituto importante, transferindo a responsabilidade da pessoa jurídica aos sócios, caso aquela se torne insolvente, diz respeito à área civil e não penal. Outra não poderia ser a interpretação em face do disposto no art. 5º, XLV, da CF: “Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido“. Portanto, qualquer pena de caráter pecuniário aplicada à pessoa jurídica, caso ela torne insolvente, não poderá ser executada – o mesmo se dá quando a pessoa física é, criminalmente, condenada ao pagamento de multa. A pena não passará da pessoa do delinquente. Logo, não se poderia desconsiderar a pessoa jurídica, buscando ressarcimento penal diretamente dos sócios. Estes, aliás, somente seriam obrigados a cumprir pena – ainda que pecuniária – se forem condenados como coautores, mas cada um cumpre sua parte da sentença, não sendo responsável pela do corréu. Se a pessoa jurídica, no entanto, em razão do ilícito penal, ficar obrigada a repará-lo civilmente, há possibilidade de se desconsiderar a pessoa jurídica, voltando-se a cobrança aos sócios, conforme o caso. (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 881/882)

Entretanto, esclareça-se que a dicção do art. 4º da Lei de Crimes Ambientais só autoriza a superação da personalidade jurídica para alcançar os bens dos sócios apenas e tão somente nos casos em que a indenização devida pela pessoa jurídica pela prática de infrações às normas penais e administrativas contra o meio ambiente também redunde de responsabilidade civil.

Destarte, quando as infrações às normas penais e administrativas contra o meio ambiente derem azo apenas a sanções de natureza pecuniária e não ao ressarcimento decorrente de responsabilidade civil, não há de se cogitar em levantar o véu corporativo da pessoa jurídica.

1.6 Artigo 50 do Código Civil

Diferentemente do § 5º do art. 28 do CDC, do art. 34 da Lei do SBDC e do art. 4º da Lei de Crimes Ambientais, o art. 50 [33] do Código Civil (Lei nº 10.406/2002) adotou, a exemplo do art. 135 do CTN, a chamada teoria maior [34] da desconsideração da personalidade jurídica.

As hipóteses [35] para que ocorra uma determinação judicial autorizando a penetração na personalidade jurídica previstas no art. 50 do Código Civil são o desvio de finalidade [36] e a confusão patrimonial [37], o que denota a coexistência no nosso ordenamento tanto da teoria maior subjetiva [38] como da teoria maior objetiva da desconsideração da personalidade jurídica:

O art. 50 representa um nítido avanço na sistematização e consagração de soluções reconhecidas pela jurisprudência, especialmente quanto à desconsideração da personalidade jurídica (Nichtbeachtung der juristischen Personen), cuja atenção se volta especialmente para o regime das sociedades (Medicus, Allgemeiner Teil des BGB, p. 455: “weil sie für Verein und Stifung kaum Bedeutung hat”). Apesar da complexidade do tema proposto pelo art. 50, a finalidade da desconsideração é simples, como informa Menezes Cordeiro: “O levantamento destina-se, precisamente, a evitar que, a coberto da personalidade coletiva, os agentes possam, contra o sistema, contornar situações de responsabilidade que lhes seriam imputáveis” (O levantamento da personalidade colectiva, p. 164). Várias são as hipóteses práticas que podem levar à aplicação da desconsideração, as quais são enquadráveis em sua generalidade: a) no abuso de direito; b) abuso específico da personalidade; c) no desvio da finalidade da empresa; c) infração à lei ou do contrato social que vise a prejudicar as relações constituídas e amparadas pela boa-fé; d) e a confusão patrimonial, especialmente na sociedade unipessoal. Esta última situação merece exame cuidadoso, especialmente pela possibilidade expressa de limitação da responsabilidade, pelo sistema atual (art. 980-A). As construções do quadro probatório para fins de aplicação da desconsideração dependerão do caso concreto, embora algumas sejam mais simples quanto à sua constatação, como na hipótese de subcapitalização da empresa com o objetivo de contratar e limitar a futura responsabilidade da pessoa jurídica. (MEDINA, José Miguel. Código Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 101)

A pessoa jurídica é uma realidade autônoma, capaz de direitos e obrigações, independentemente de seus membros, pois efetua negócios sem qualquer ligação com a vontade deles, e, além disso, se a pessoa jurídica não se confunde com as pessoas naturais que a compõem, se o patrimônio da sociedade não se identifica com o dos sócios, fácil será lesar credores, mediante abuso de direito, caracterizado por desvio de finalidade, tendo-se em vista que os bens particulares dos sócios não podem ser executados antes dos bens sociais, havendo dívida da sociedade. Por isso o Código Civil pretende que, quando a pessoa jurídica se desviar dos fins determinantes de sua constituição, ou quando houver confusão patrimonial, em razão do abuso da personalidade jurídica, o órgão judicante, a requerimento da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo, está autorizado, com base na prova material do dano, a desconsiderar, episodicamente, a personalidade jurídica, para coibir fraudes de sócios que dela se valeram como escudo, sem importar essa medida numa dissolução da pessoa jurídica. Com isso subsiste o princípio da autonomia subjetiva da pessoa jurídica, distinta da pessoa de seus sócios, mas tal distinção é afastada, provisoriamente, para dado caso concreto, estendendo a responsabilidade negocial aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica […]. Ter-se-á a ineficácia temporária da personalidade jurídica para determinados efeitos, afastando a fraude perpetrada contra terceiro mediante a utilização da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, prosseguindo incólume para atender suas finalidades sociais. (DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 100/101)

Para o STJ, o art. 50 do Código Civil (e consequentemente a teoria maior da desconsideração) caracteriza-se como uma regra geral para a superação da personalidade jurídica, devendo os efeitos decorrentes da suspensão momentânea e episódica da separação patrimonial entre a empresa e seus sócios alcançar apenas as pessoas físicas que agiram de forma ilícita ou se beneficiaram da ilicitude:

  1. A regra geral adotada no ordenamento jurídico brasileiro, prevista no art. 50 do CC/2002, consagra a teoria maior da desconsideração, tanto na sua vertente subjetiva quanto na objetiva. 4. Salvo em situações excepcionais previstas em leis especiais, somente é possível a desconsideração da personalidade jurídica quando verificado o desvio de finalidade (teoria maior subjetiva da desconsideração), caracterizado pelo ato intencional dos sócios de fraudar terceiros com o uso abusivo da personalidade jurídica, ou quando evidenciada a confusão patrimonial (teoria maior objetiva da desconsideração), demonstrada pela inexistência, no campo dos fatos, de separação entre o patrimônio da pessoa jurídica e os de seus sócios. 5. Os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica somente alcançam os sócios participantes da conduta ilícita ou que dela se beneficiaram, ainda que se trate de sócio majoritário ou controlador. (STJ, REsp 1325663/SP,  2012/0024374-2, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, DJ 11.06.2013,  DJe 24.06.2013)

1.7 Artigo 14 da Lei Anticorrupção

No direito administrativo, a Lei nº 12.846/2013 (a chamada Lei Anticorrupção), ao dispor sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira, previu, em seu art. 14, a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica das empresas que sejam utilizadas para praticar os atos coibidos pelo art. 5º [39] do aludido diploma legal:

Art. 14. A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta lei ou para provocar confusão patrimonial, sendo estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de administração, observados o contraditório e a ampla defesa.

Sobre a possibilidade de a Administração Pública promover sponte propria, ou seja, sem recorrer ao Judiciário, a desconsideração da personalidade jurídica, cabem aqui as mesmas considerações feitas quando da análise do art. 34 da Lei nº 12.529/2011 e do § 3º do art. 18 da Lei  nº 9.847/1999.

 

1.8 Artigo 2º da CLT

Por fim, diga-se que, muito embora já tenha sido considerado um exemplo de positivação da disregard doctrine no ordenamento jurídico brasileiro [40], entendemos que o § 2º [41] do art. 2º da CLT não configura uma hipótese de desconsideração da pessoa jurídica como as demais aqui analisadas, já que aqui não se desconsidera a autonomia patrimonial da empresa para alcançar os bens dos sócios ou vice-versa, pois o que ocorre na hipótese prevista na norma juslaboral é a possibilidade de se penetrar na personalidade jurídica para considerar que ela integra um grupo econômico [42][43] em que existe uma natureza da relação de dominação [44] entre as empresas participantes (com unicidade de controle [45] e direção [46]), podendo tal natureza ser de: a) de direção, quando há efetivo controle, por meio do exercício do poder diretivo (diretivo, de fiscalização e disciplinar); b) de controle, quando se verifica a possibilidade do exercício de uma influência dominante, de uma empresa sobre a outra, a fim de subordinar a sua atuação à consecução de suas finalidades; ou c) de administração, quando há uma organização destinada a um fim comum.

2 QUEM ESTÁ SUJEITO A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA?

Como bem esclarece a doutrina, só podem ser objeto de medidas (administrativas ou judiciais) visando a desconsiderar a personalidade jurídica as sociedades personificadas e em que haja responsabilidade limitada dos sócios:

A própria terminologia usada deixa claro que a desconsideração só tem cabimento quando estivermos diante de uma pessoa jurídica, isto é, de uma sociedade personificada. Sem a existência de personalidade, não há o que desconsiderar. (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 229/230)

A disregard doctrine tem um papel importantíssimo, mas deve ser aplicada com cautela para conter os casos efetivos de desvio de propósito da pessoa jurídica. Trata-se de uma forma de correção. Os pressupostos para a sua aplicação são: a) existência da pessoa jurídica distinta dos seus sócios. Logo, deverá ter situação de registro e existência, pois quando for uma sociedade de fato, a responsabilidade será automaticamente voltada para os seus membros; b) a sociedade deve ter responsabilidade limitada, pois, se fosse ilimitada, a desconsideração seria desnecessária […]. (MEDINA, José Miguel. Código Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.  p. 101/102)

Assim, não estão sujeitas à desconsideração as chamadas sociedades despersonificadas, como: a) a sociedade em comum (também conhecida como sociedade de fato ou sociedade irregular), caracterizada por não ter seus atos constitutivos registrados na Junta Comercial, uma vez que nelas os sócios assumem responsabilidade solidária e ilimitada pelos atos praticados pela sociedade; e b) a sociedade em conta de participação, em que apenas o sócio ostensivo responde perante terceiros em face das obrigações contraídas [47].

Registre-se ainda que Amador Paes de Almeida entende que as empresas submetidas à recuperação judicial não estão sujeitas à desconsideração da personalidade jurídica [48] (pelo menos não a que for fundamentada no art. 50 do Código Civil):

No período de recuperação judicial, o devedor é mantido na condução da atividade empresarial, podendo, porém, ser destituído, entre outros fatos, se agir com dolo, simulação ou fraude contra os interesses de seus credores. Assim, deferido o pedido de recuperação judicial, estando suspensas as ações contra o devedor (exceto quanto ao processo do trabalho – até a fixação do crédito trabalhista para posterior habilitação no juízo cível da recuperação), não há fundamento legal para a invocação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, mesmo porque ausentes os seus pressupostos fundamentais, a saber: desvio de finalidade ou confusão patrimonial (art. 50 do CC). (ALMEIDA, Amador Paes de. Execução dos bens dos sócios: obrigações mercantis, tributárias, trabalhistas: da desconsideração da personalidade jurídica (doutrina e jurisprudência). 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 210)

Por outro lado, estão sujeitas à desconsideração da personalidade jurídica: a) as sociedades empresárias, b) as sociedades simples, c) as sociedades anônimas, d) as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos ou de fins não econômicos (conforme entendimento contido no Enunciado nº 284 [49] da Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal e e) as sociedades de economia mista [50] e empresas públicas [51] que explorem atividade econômica, já que, por mandamento constitucional, se submetem ao mesmo regime jurídico das demais empresas privadas que integram o mercado [52][53].

3 O PROCEDIMENTO PARA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA ESTABELECIDO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O novo Código de Processo Civil instituiu – nos seus arts. 133 a 137 – o procedimento judicial (obrigatório e aplicável também à Justiça do Trabalho [54] e aos juizados especiais, conforme dicção dos arts. 15 [55], 795,  § 4º [56] e 1.062 [57] do referido diploma) para se promover a desconsideração da personalidade jurídica.

Em linhas gerais, a desconsideração da personalidade jurídica no NCPC é uma intervenção de terceiros [58] que provoca necessariamente uma mudança no polo passivo da demanda, já que, num primeiro momento, haverá sua ampliação [59] (com a formação de litisconsórcio passivo [60]), em razão da inclusão do sócio (ou da pessoa jurídica, no caso da desconsideração inversa e da desconsideração fundada na CLT) e, num segundo momento, poderá ocorrer sua substituição, com a exclusão do réu/executado original:

O Código de Processo Civil inclui, entre as modalidades de intervenção de terceiro, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Trata-se, na verdade, de um incidente processual que provoca uma intervenção forçada de terceiro (já que alguém estranho ao processo – o sócio ou a sociedade, conforme o caso -, será citado e passará a ser parte no processo, ao menos até que seja resolvido o incidente). Caso se decida por não ser caso de desconsideração, aquele que foi citado por força do incidente será excluído do processo, encerrando-se assim sua participação. De outro lado, caso se decida pela desconsideração, o sujeito que ingressou no processo passará a ocupar a posição de demandado, em litisconsórcio com o demandado original. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica, então, pode acarretar uma ampliação subjetiva da demanda, formando-se, por força do resultado nele produzido, um litisconsórcio passivo facultativo. (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 513)

Nos termos do NCPC, tal procedimento de ampliação subjetiva da demanda (verdadeiro incidente cognitivo [61]), por acarretar o risco de constrição judicial do patrimônio daquele que passa a integrar a lide, necessariamente estará submetido ao crivo do contraditório:

Importante, ainda, é registrar que este incidente – que não estava previsto expressamente na legislação processual anterior – vem assegurar o pleno respeito ao contraditório e ao devido processo legal no que diz respeito à desconsideração da personalidade jurídica. É que sem a realização desse incidente, o que se via era a apreensão de bens de sócios (ou da sociedade, no caso de desconsideração inversa) sem que fossem eles chamados a participar, em contraditório, do processo de formação da decisão que define sua responsabilidade patrimonial. O Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, ao tempo da legislação processual anterior, admitia a desconsideração da personalidade jurídica sem prévia citação daqueles que seriam atingidos pelos efeitos da decisão, diferindo-se o contraditório. (STJ, REsp  1266666/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, J. 09.08.2011). Este entendimento, porém, contraria frontalmente o modelo constitucional de processo brasileiro, já que admite a produção de uma decisão que afeta diretamente os interesses de alguém sem que lhe seja assegurada a possibilidade de participar com influência na formação do aludido pronunciamento judicial (o que só seria admitido, em caráter absolutamente excepcional, nas hipóteses em que se profere decisão concessiva de tutela de urgência, e mesmo assim somente nos casos nos quais não se pode aguardar pelo pronunciamento prévio do demandado). Ora, se ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal, então é absolutamente essencial que se permita àquele que está na iminência de ser privado de um bem que seja chamado a debater no processo se é ou não legítimo que seu patrimônio seja alcançado por força da desconsideração da personalidade jurídica. (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 514)

Desta forma, ao instrumentalizar a desconsideração da personalidade jurídica, o NCPC criou procedimentos para alterar não só o polo passivo da demanda como também a responsabilidade patrimonial (art. 789 [62] do NCPC), sem, contudo, descurar do contraditório e da ampla defesa.

Tecidas essas considerações gerais, passemos a analisar um a um os artigos do NCPC que regulam a desconsideração da personalidade jurídica.

No art. 133 e seus respectivos parágrafos, o NCPC começa apresentando a desconsideração da personalidade em sua forma incidental:

Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.

  • 1º O pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei.
  • 2º Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.

O dispositivo deixa evidente que o juiz só atua mediante provocação das partes, de modo que, não havendo expresso pedido da parte ou do Ministério Público, é vedado ao julgador sequer cogitar [63] em promover o afastamento da personalidade do ente coletivo:

De acordo com o NCPC, não há possibilidade de atuação jurisdicional sem o requerimento da parte ou do Ministério Público; ou seja, é vedado ao juiz, de ofício, determinar a inclusão do sócio ou do administrador no polo passivo da demanda, para fins de desconsideração da personalidade jurídica. O art. 133 do NCPC está em consonância com o art. 50 do Código Civil, que também prevê o expresso requerimento do interessado ou do Ministério Público, não se podendo cogitar de atuação ex officio. (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 112)

O pedido de desconsideração da pessoa jurídica deve ser necessariamente formulado pela parte ou pelo Ministério Público, este quando estiver no processo atuando como custos legis (fiscal da lei). Não é possível atuação do juiz sem provocação da parte. O art. 133, § 1º, deixa claro que os pressupostos de aplicação desta teoria que leva à alteração da responsabilidade patrimonial estão previstos na lei material, já que o conflito entre as partes pode ter fundamento no direito civil, no direito do consumidor etc. […] Os pressupostos para a incidência deste mecanismo são diferentes em diversos ramos do direito material, mas a disciplina processual é uma só: em caso algum pode haver a instauração de ofício deste incidente. (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 252)

Entretanto, a vedação à atuação ex officio do juiz em sede de penetração da personalidade jurídica repousa no sistema previsto no NCPC, uma vez que o § 2º [64] do art. 82 da Lei de Recuperação Judicial e Falências alberga-se tal possibilidade:

Há casos especiais em que a legislação permite adoção de medidas de ofício pelo juiz em decorrência da desconsideração da personalidade jurídica, como ocorre no art. 82, § 2º, da Lei nº 11.101 (regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária). Trata-se, contudo, de exceção à regra geral estabelecida no CPC. (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 362)

Entre outras determinações, o art. 134 do NCPC disciplina o momento processual [65][66] em que pode ser formulado o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, bem como a possibilidade de ele integrar o bojo da peça vestibular [67] e assim dispensar [68] a sua apresentação por meio de incidente:

Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.

  • 1º A instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor para as anotações devidas.
  • 2º Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica.
  • 3º A instauração do incidente suspenderá o processo, salvo na hipótese do § 2º.
  • 4º O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica.

O art. 134 também deixa claro que o incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo [69], quer no processo de conhecimento, na fase recursal (à exceção óbvia das instâncias extraordinárias) ou quando da fase executiva:

O incidente de desconsideração da personalidade jurídica pode instaurar-se em qualquer tipo de processo, cognitivo ou executivo, seja qual for o procedimento observado, comum ou especial. Pode, ainda, instaurar-se em qualquer fase do desenvolvimento processual, inclusive na fase executiva que o processo civil brasileiro designa por “cumprimento de sentença“. É possível, inclusive, que o incidente se instaure perante os tribunais, seja nos processos de competência originária, seja em grau de recurso, como se extrai do disposto no parágrafo único do art. 136, que prevê a possibilidade de decisão do incidente por relator. Caso o incidente se instaure no curso de um processo cognitivo (ou na fase de conhecimento de um processo “sincrético“), e vindo a ser proferida decisão que desconsidere a personalidade jurídica, o sócio (ou a sociedade, no caso de desconsideração inversa) passará a integrar o processo como demandado. Consequência disso é que a sentença poderá afirmar sua condição de responsável pela obrigação, o que tornará possível fazer com que a execução atinja seu patrimônio, nos termos do art. 790, II. De outro lado, não tendo sido instaurado o incidente durante o processo de conhecimento, sempre será possível postular a desconsideração da personalidade jurídica na fase de cumprimento da sentença. Neste caso, assim como ocorrerá quando o incidente for instaurado no curso de execução fundada em título extrajudicial, sendo proferida a decisão que desconsidera a personalidade jurídica, o sócio (ou a sociedade, no caso de desconsideração inversa) assumirá a posição de executado, de modo que sobre seu patrimônio passará a ser possível incidir a atividade executiva. (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 519)

Sendo a desconsideração da personalidade jurídica requerida de forma incidental, o § 3º do art. 134 prevê a suspensão [70] do feito. O que é passível de discussão é a abrangência de tal suspensão, conforme leciona José Miguel Medina:

De acordo com o § 3º do art. 134, a instauração do incidente suspenderá o processo. Não nos parece acertado suspender-se todo o processo, em razão da instauração do incidente. Mais adequado cingir-se eventual suspensão à questão da desconsideração – nada impedindo a prática de outros atos executivos, por exemplo, no curso do procedimento. (MEDINA, José Miguel. Novo Código de Processo Civil comentado: com remissões e notas comparativas ao CPC/1973. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 227)

Sobre a suspensão da marcha processual prevista § 3º do art. 134, veja-se também o entendimento de Ruy Zoch Rodrigues:

A suspensão do processo prevista no art. 134, § 3º, faz sentido para a generalidade dos casos, que ocorrem ao tempo da penhora na execução/cumprimento de sentença para cobrança de valor pecuniário, quando se revela a falta de patrimônio penhorável. A decisão do tema incidental se torna, aí, condição para o ato seguinte do processo – a penhora -, com o que não há como prosseguir a execução, que fatalmente ficará suspensa. Entretanto, a desconsideração não se limita àquelas hipóteses. Por isso, e porque a lógica do NCPC prestigia a celeridade com menos destaque à formalidade, parece que a melhor exegese do § 3º do art. 134 deva ser a de que o processo em que tem curso a questão principal só se suspende em vista do incidente se o tema incidental constituir condição para o prosseguimento. Fora disso, não. E tudo remete à possibilidade de autuação apartada, a fim de se garantir celeridade e melhor organização procedimental. Ainda sobre suspensão, a parte final do § 3º do art. 134, que remete ao § 2º, não significa que o mero posicionamento topográfico do incidente (na inicial) seja o elemento-chave para definir se o processo deve ser suspenso ou não. Até porque o § 2º sequer trata de tema propriamente incidente, mas de hipóteses menos frequentes em que a desconsideração compõe a lide principal, ainda que acessoriamente. Inclusive ações reais ou reipersecutórias, nas quais, ao tempo da propositura, tendo-se já claro qual é o bem (ou conjunto de bens) apto à satisfação da parte autora, esse patrimônio se encontra desviado (ao sócio ou à sociedade). Nessas hipóteses, a desconsideração da personalidade jurídica é proposta na inicial e não suspende o andamento do processo, porque está ligada ao objeto principal. (RODRIGUES, Ruy Zoch. Novo Código de Processo Civil anotado/OAB. Porto Alegre: OAB RS, 2015. p. 145)

Ainda sobre o pedido de desconsideração feito em caráter incidental, há de se atentar que nele deverá se demonstrar (e não alegar, em que pese o entendimento de Daniel Amorim Assumpção Neves [71]) que houve o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica (ou seja, os requisitos previstos no direito material):

O incidente tem cabimento em todas as fases do processo, assim na fase de conhecimento e na de cumprimento de sentença. Também cabe nas execuções fundadas em título extrajudicial. Trata-se, em qualquer caso, de incidente predestinado à criação (ou à ampliação) do título executivo (judicial ou extrajudicial) para permitir a prática de atos executivos em face de quem, até então, não consta, como devedor, do título que embasa o cumprimento de sentença ou a execução. O pedido de sua instauração, com a demonstração da presença dos pressupostos materiais, será comunicado imediatamente ao distribuidor, que fará as anotações cabíveis, suspendendo o processo, salvo se o requerimento for feito com a petição inicial, hipótese que, em rigor, nenhuma relação tem com o instituto ora anotado. Neste caso, que está previsto no § 2º, a situação parece se amoldar melhor à ocorrência de um litisconsórcio, ainda que formulado a título eventual e provavelmente fundado em diversa causa de pedir, isto é, na hipótese de a pessoa jurídica não ter condições de arcar com sua responsabilização. (BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 133)

O que nos parece sensato é que essa demonstração do preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica exigida pelo § 4º do art. 134 deve se dar à luz da verossimilhança das alegações do requerente e não num juízo de cognição exauriente, conforme bem esclarece Guilherme Rizzo Amaral:

Ao requerer a instauração do incidente, deve a parte ou o Ministério Público demonstrar os preenchimentos legais específicos para a desconsideração. Note-se que, aqui, o juízo de admissibilidade do incidente não será um juízo de certeza nem mesmo de preponderância de provas, mas, sim, de verossimilhança das alegações do requerente. É o que basta para a instauração do incidente, sendo que a efetiva comprovação dos pressupostos legais da desconsideração é exigida apenas para a desconsideração propriamente dita da personalidade jurídica, a ser determinada em decisão final do incidente após sua devida instrução. (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 364)

Diferentemente do que ocorre quando o pedido de desconsideração é formulado por meio de incidente, quando ele se dá na exordial, não há necessidade de suspensão do processo e, como bem apontam Luiz Guilherme  Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, não é necessário se demonstrar, de imediato, que houve o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica, permitindo-se que as provas de tal demonstração sejam carreadas durante o trâmite do processo:

O incidente de desconsideração é cabível em qualquer tipo de processo e em qualquer momento do processo. Na instância recursal, a atribuição é do relator, embora de sua decisão caiba recurso de agravo interno para o colegiado (art. 136, parágrafo único, do CPC). Se a desconsideração é requerida na petição inicial, o contraditório se faz na própria contestação, dispensando a realização de incidente autônomo. Nesse caso, para o processo, devem também ser citados o sócio ou a pessoa jurídica que poderão ser atingidos pela desconsideração. Não haverá suspensão do processo e a prova dos requisitos para a desconsideração devem ser trazidos no curso do processo. Se requerida em outro momento, o incidente suspende o curso do processo até sua decisão. Será objeto de petição própria, em que o requerente demonstrará a satisfação dos pressupostos materiais para a desconsideração. Além da oitiva da parte contrária, também deverão ser citados para o contraditório o sócio ou a sociedade que poderão ser atingidos pela desconsideração. (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 208/209)

Demonstrando uma grande preocupação em manter a superação da personalidade jurídica como uma medida excepcional, o legislador garantiu, no art. 135 do NCPC, que a autonomia patrimonial entre a empresa e os seus sócios só será afastada após o inevitável oferecimento do contraditório para aquele que poderá a vir sofrer com os efeitos da decisão (de modo que não haverá constrição judicial de patrimônio [72] sem a possibilidade de defesa): “Art. 135. Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias“.

Ao fazer referência à citação (e não intimação, como bem ressalta Cassio Scarpinella Bueno [73][74]), o art. 135 do NCPC deixa bem patente um cenário no qual há uma ampliação subjetiva momentânea da demanda, já que haverá um réu no incidente de desconsideração de personalidade jurídica que poderá a vir se tornar o réu da ação principal em substituição ao réu originário:

Em atenção à garantia do contraditório e da ampla defesa, uma vez instaurado o incidente, a pessoa jurídica ou o sócio – conforme o caso – será citada para apresentar defesa e, se necessário, requerer as provas cabíveis, no prazo de 15 dias. A regra vale quando o requerimento se der de forma incidental. (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 116)

Bem, como dito acima, o réu, no incidente, terá 15 dias para se manifestar (e a terminologia do Código impõe que o nome da peça seja manifestação, não defesa ou muito menos contestação, muito embora o conteúdo da petição, por óbvio, assemelhe-se àquela última [75][76]). Ao contrário de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero [77], entendemos que não há motivos para, estando presentes as condições estabelecidas no art. 229 [78] do NCPC, não se dobrar o prazo para os réus no incidente apresentarem suas manifestações (basta, por exemplo, que a desconsideração alcance mais de um sócio da empresa e que cada um deles tenha seu próprio advogado). Por fim, caso o réu no incidente não se manifeste, há de se aplicar os efeitos da revelia:

Citado o sócio ou a pessoa jurídica, terá 15 (quinze) dias para se manifestar e requerer provas que pretende produzir. O fato de a lei exigir que haja citação do requerido indica: 1) que se trata, realmente, do réu do incidente; 2) e que, se acolhido no mérito o requerimento de desconsideração, este passará a ser réu no processo em que o incidente foi suscitado. Silente o requerido, incidem, a nosso ver, os efeitos da revelia (art. 319 do CPC/1973). Se este, ao contrário, “se defender, o juiz deferirá as provas para depois, decidir.” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 254)

Embora discordemos de tal opinião, por a considerarmos equivocada (por atentar contra expressa previsão legal), há de se registrar o entendimento de Daniel Amorim Assumpção Neves e André Pagani de Souza no sentido de que seria possível um contraditório diferido no qual a desconsideração da personalidade jurídica poderia anteceder a manifestação do réu:

Ao prever que, instaurado o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, o sócio ou a pessoa jurídica será citada para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de quinze dias, o art. 135 do novo CPC consagrou a exigência do contraditório tradicional para a desconsideração da personalidade jurídica, exigindo a intimação e a oportunidade de manifestação dos sócios e da sociedade antes de ser proferida a decisão. […] É preciso registrar que a previsão legal que exige o contraditório tradicional não afasta peremptoriamente o contraditório diferido na desconsideração da personalidade jurídica, apenas tornando-o excepcional. Dessa forma, sendo preenchidos os requisitos típicos da tutela de urgência e do pedido de antecipação dos efeitos da desconsideração da personalidade jurídica, entendo admissível a prolação de decisão antes da intimação dos sócios e da sociedade. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.  p. 144/145)

Na hipótese de haver risco ao resultado útil do processo se for determinada a citação do sócio, do administrador ou da própria pessoa jurídica para se manifestar no incidente de desconsideração da personalidade jurídica, pode-se primeiro pleitear uma tutela de urgência de natureza cautelar (CPC/2015, art. 301), para depois ser realizada a citação a que se refere o art. 135 do CPC/2015 e a prática dos demais atos processuais previstos nos arts. 133 a 137 do CPC/2015, sob pena de se violar o art. 5º, XXXV, da CF. (SOUZA, André Pagani de. Código de Processo Civil anotado. Sob a coordenação de José Rogério Cruz e Tucci, Manoel Caetano Ferreira Filho, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Sandro Gilbert Martins, Rogéria Fagundes Dotti. Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 234)

Finalizando a análise do art. 135 do NCPC, que preconiza a obrigatoriedade do contraditório antes de acolher o pedido incidental de desconsideração da personalidade jurídica, há de se esclarecer que, quando tal pedido se dá na petição inicial, cabe ao réu impugnar na sua contestação não só o pedido de superação da personalidade do ente coletivo, como também todos os demais:

Enunciado nº 248 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: Quando a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, incumbe ao sócio ou à pessoa jurídica, na contestação, impugnar não somente a própria desconsideração, mas também os demais pontos da causa.

Em seu art. 136, o NCPC categorizou a decisão que resolve o incidente de desconsideração da personalidade como interlocutória, passível, portanto, de questionamento mediante a interposição de agravo de instrumento (art. 1.015, IV [79], do NCPC), agravo interno (caso o incidente tenha sido ajuizado e decidido na segunda instância) ou agravo de petição (no caso do processo do trabalho [80]):

Art. 136. Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória.

Parágrafo único. Se a decisão for proferida pelo relator, cabe agravo interno.

Coerente a decisão do legislador em classificar a decisão que resolve o incidente de desconsideração de personalidade jurídica como interlocutória, uma vez que, nos termos do § 1º do art. 203 [81] do NCPC, considera-se sentença “o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução“. Como a decisão que resolve o incidente não encerra a fase cognitiva ou executiva do processo (já que o incidente é um processo assessório), enquadra-se como decisão interlocutória nos termos § 2º [82] do art. 203 do NCPC. O art. 136 deve ser interpretado em conjunto com o art. 1.015, IV, do NCPC (que prevê a possibilidade de a decisão que resolve o incidente ser questionada por meio de agravo de instrumento), já que, a princípio, as decisões interlocutórias são irrecorríveis:

A decisão de mérito proferida no incidente (assim entendida a decisão que resolve o mérito próprio do incidente, isto é, que acolhe ou rejeita a pretensão de desconsideração da personalidade jurídica) é apta a alcançar a autoridade de coisa julgada material, tornando-se imutável e indiscutível. Após seu trânsito em julgado, só será possível desconstituí-la por meio de ação rescisória, nos casos previstos no art. 966 do CPC. O pronunciamento judicial que resolve o incidente tem natureza de decisão interlocutória, já que não põe termo ao processo ou a qualquer de suas fases (cognitiva ou executiva).

Assim, não sendo este provimento judicial capaz de enquadrar-se no disposto no art. 203, § 1º, deve ser ele classificado como decisão interlocutória, nos precisos termos do § 2º desse mesmo art. 203. E sendo este ato uma decisão interlocutória, o recurso admissível só pode ser o agravo de instrumento. Vale ressaltar, porém, a importância de a lei expressamente afirmar o cabimento do agravo de instrumento, já que pelo sistema recursal inaugurado pelo Código de Processo Civil só são agraváveis as decisões interlocutórias expressamente indicadas por lei (art. 1.015).  Pois o cabimento de agravo de instrumento contra a decisão que resolve o incidente de desconsideração da personalidade jurídica vem expressamente afirmado no art. 1.015, IV. É agravável não só a decisão de meritis proferida no incidente, mas também a que o declara inadmissível (liminarmente ou após a manifestação do requerido). Eventuais outras decisões interlocutórias proferidas no curso do incidente, porém (como seria o caso de alguma decisão que indeferisse a produção de certa prova), serão irrecorríveis, só podendo ser impugnadas juntamente com a decisão final do incidente (aplicando-se, por analogia, o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 1.009 do CPC). (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.  p. 527/528)

Decidirá o juiz por decisão que a lei qualifica de interlocutória e considera recorrível por agravo de instrumento (art. 1.015, IV). No entanto, trata-se de decisão que resolve o mérito do incidente: a desconsideração. Portanto, é equiparável a uma sentença, tendo, pois, o condão de transitar em julgado.

Trata-se, também, de pronunciamento rescindível. Está-se, aqui, diante de mais uma exceção criada pelo NCPC, quanto à regra geral sobre a irrecorribilidade das interlocutórias. É que, na verdade, esta interlocutória é a “sentença” do incidente. Tanto é assim que as demais interlocutórias proferidas no curso deste incidente não são objeto de recurso autônomo: serão impugnadas, se for o caso, no agravo de instrumento interponível da decisão “final” (de mérito) do incidente. Por coerência, criou a nova lei outra possibilidade de recurso: a decisão sobre a desconsideração proferida pelo relator, caso o incidente seja instaurado em 2º grau. O relator admitirá, conduzirá e julgará o incidente como se fosse o juiz de 1º grau. Só é recorrível, indubitavelmente, a decisão final, porque é necessário haver simetria entre os dois procedimentos: o de 1º e o de 2º grau. Só poderá haver pedido de desconsideração no Tribunal se o processo já estiver no Tribunal, em razão de já ter sido interposta apelação. O agravo de instrumento que pode ter sido antes interposto da decisão que resolveu o pedido de desconsideração, segundo pensamos, não tem o condão de “transferir o feito” para a segunda instância. Da decisão do relator, como diz o parágrafo único, caberá agravo interno. (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim;  CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 254/255)

Encerrando o tratamento acerca dos procedimentos processuais para desconsiderar a personalidade jurídica, o NCPC prevê, em seu art. 137, efeitos materiais decorrentes do acolhimento do pedido, no caso a equiparar as alienações de bens havidas durante a desconsideração da personalidade jurídica à fraude à execução [83][84]: “Art. 137. Acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente“.

Só se promove a desconsideração da personalidade jurídica quando se pretende alcançar o patrimônio de alguém (pessoa física ou jurídica, no caso da desconsideração inversa) que a princípio, pelo princípio da autonomia patrimonial entre a empresa e seus sócios, não seria alcançado na relação processual original. Em tal cenário, o art. 137 torna ineficazes as alienações e onerações de bens que ocorrerem em fraude à execução, uma vez que, do contrário, correr-se-ia o risco de ser inócua a desconsideração da personalidade jurídica:

O principal efeito da decisão que desconsidera a personalidade jurídica da sociedade, para atingir o patrimônio dos sócios (ou o contrário, no caso da teoria da desconsideração inversa que desconsidera a personalidade da pessoa física, para atingir a sociedade), é o de tornar possível que atos da execução atinjam o patrimônio dos sócios (ou, no caso da teoria da desconsideração inversa, da empresa), estendendo a responsabilidade patrimonial a um terceiro, que passa a ser réu. A alienação dos bens realizada por aqueles (ou aquela) a quem a responsabilidade for estendida por causa da decisão que desconsiderou a personalidade jurídica será tida como ineficaz (ou seja, serão desconsiderados seus efeitos) em relação ao requerente, se ocorrida em fraude à execução, i.e., se preenchidos os pressupostos do art. 593 do CPC/1973. Assim como será ineficaz alienação de um réu qualquer, em relação ao autor, se realizada em fraude à execução. A lei menciona requerente, mas quer referir-se àquele em favor de quem for decretada a desconsideração, uma vez que, como já vimos, a desconsideração pode ser requerida pelo Ministério Público – e, neste caso, o Ministério Público será o requerente! Por fim, a decisão que declara a desconsideração, por ser declaratória, retroage pelo menos à data do requerimento. Deve-se ter em mente a necessidade de se verificar, pela análise dos elementos produzidos pela instrução, em que momento ocorreu o fato gerador da desconsideração (o ato praticado com excesso de poder, a confusão patrimonial etc.). (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 255/256)

Este dispositivo remete-nos aos preceitos contidos no art. 792 do NCPC, que prevê as hipóteses caracterizadoras da fraude à execução. Se, acolhido o pedido de desconsideração, algumas daquelas hipóteses ocorrerem após a instauração do incidente, a respectiva alienação ou oneração de bens da pessoa jurídica ou do sócio não gerará efeitos perante o que requereu a desconsideração. Assim, por exemplo, se o credor propuser demanda para cobrar uma dívida e, ao mesmo tempo, requerer e for concedida a desconsideração da pessoa jurídica da qual o devedor é sócio, serão considerados nulos todos os atos realizados por este, na pendência do processo, que visem ao desfazimento de seus bens. A norma prevê efeito retroativo (ou ex tunc), impossibilitando que os direitos do requerente (credor) sejam atingidos pelos atos cometidos em fraude à execução. Quanto ao terceiro adquirente de boa-fé, nada impede que pleiteie, em ação de regresso contra o sócio, o ressarcimento dos valores pagos para aquisição do bem. Nesse caso, o terceiro adquirente ainda poderá requerer a desconsideração inversa da personalidade jurídica, a fim de atingir o patrimônio da sociedade caso se torne insolvente o sócio fraudador. (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 117)

O art. 137 do NCPC deverá ser interpretado levando em consideração o art. 792, § 3º [85], do mesmo diploma, já que há claramente dúvidas na doutrina [86][87] acerca de qual interpretação harmonizará as regras contidas nos dois dispositivos. Debate-se a partir de que momento se considera ocorrida a fraude à execução: se quando a alienação ou oneração de bens se der após o acolhimento do pedido de desconsideração da personalidade jurídica ou se quando a alienação ou oneração de bens se der a partir da citação [88] da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar. Neste cenário, nos parecem acertadas as lições de Nelson Nery Junior e Guilherme Rizzo Amaral:

A intenção do dispositivo é punir a conduta do sócio ou administrador que aliena bens no curso do incidente de desconsideração. Todavia, parece mais correto considerar que a ineficácia da alienação ou oneração de bens ocorrida nessa situação incida apenas caso ocorram após a citação do sócio ou administrador para responder aos termos do incidente, ou após algum fato que dê a entender que tais pessoas tinham ciência da instauração. (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil (livro eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1203)

O art. 137 deve ser interpretado à luz do art. 792 do CPC, que prevê as hipóteses de fraude à execução e que estatui, em seu § 3º, que, “nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar“. Assim, o simples fato de se desconsiderar a personalidade jurídica não gera presunção de que os bens alienados pela pessoa jurídica ou pelo sócio (na desconsideração inversa) o tenham sido em fraude, sendo necessário o reconhecimento de uma das hipóteses do art. 792. Além disso, a alienação havida antes da citação do sócio ou da pessoa jurídica no incidente de desconsideração ou na ação principal (art. 134, § 2º) não será considerada fraude à execução, podendo, contudo, ser configurada como fraude a credores e vir a ser objeto da competente ação pauliana (CC, art. 161).  (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 369)

Ainda sobre o momento em que se configura a fraude à execução na desconsideração da personalidade jurídica, veja-se a lição de André Pagani de Souza:

Questão de difícil solução será estabelecer o momento a partir do qual a alienação ou oneração de um bem particular do sócio ou do administrador – ou da própria pessoa jurídica, no caso de desconsideração inversa -pode ser considerada fraude de execução em relação ao requerente da desconsideração da personalidade jurídica. Como se sabe, a fraude de execução independe de ação própria para seu reconhecimento, sendo permitido ao juiz que a reconheça incidentalmente no processo. Dentre as hipóteses mais comuns de fraude de execução, há a do inciso IV do art. 792 do CPC/2015, que repete a norma do art. 593, II, do CPC/1973, ou seja, a de se considerar a alienação ou oneração de bens fraudulenta quando “ao tempo da alienação ou oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência”. Se assim é, a questão a ser respondida será indicar qual o momento a partir do qual se deve considerar que contra o devedor tramitava ação capaz de reduzi-lo à insolvência: (i) o momento que houve a citação válida da pessoa jurídica no processo em que posteriormente foi instaurado o incidente de desconsideração da personalidade jurídica ou (ii) o momento em que o sócio ou administrador foi citado nos termos do art. 135 do CPC/2015 para se manifestar sobre o requerimento de desconsideração. Sob pena de se instaurar grave insegurança jurídica para todos os adquirentes de boa-fé, a solução mais adequada para o problema que se apresenta seria considerar fraude de execução a alienação ou oneração de bens por parte do sócio ou administrador da pessoa jurídica somente após eles terem sido validamente citados para se manifestarem no incidente de desconsideração da personalidade jurídica (CPC/2015, art. 135), pois, nesse caso, o distribuidor já teria sido informado da instauração do incidente e realizado as anotações cabíveis (CPC/2015, art. 134, § 1º), tornando possível ao adquirente tomar conhecimento da existência de “ação capaz de reduzi-lo à insolvência” (CPC/2015, art. 792, IV). Solução diversa da ora sugerida prejudicaria o adquirente de boa-fé que comprou um bem do sócio ou administrador da pessoa jurídica, fez todas as pesquisas no distribuidor em nome dessas pessoas e não encontrou qualquer demanda capaz de reduzi-los à insolvência. Nem se diga que seria possível ao adquirente consultar algum órgão para saber se o alienante de determinado bem é sócio ou administrador de pessoas jurídicas, pois teria que se fazer uma consulta em todas as juntas comerciais de todos os Estados da nação, depois em todos os cartórios de registro civil das pessoas jurídicas de todas as comarcas do país, além de verificar nos órgãos de classe, como a Ordem dos Advogados do Brasil, que também são responsáveis pelo registro de pessoas jurídicas em todo o território nacional para saber se o alienante integra alguma pessoa jurídica em vias de se tornar insolvente. Entretanto, parece que o CPC/2015 adotou esta última solução anteriormente indicada como parâmetro para estabelecer o momento a partir do qual determinada alienação ou oneração de bem por parte do sócio deve ser considerada fraude de execução. Isso porque a redação do § 3º do art. 792 é a seguinte: “Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar” (grifos nossos). Assim, pela interpretação literal, se o sócio ou o administrador de determinada pessoa jurídica alienarem ou onerarem um bem particular deles, no curso de um processo movido exclusivamente contra a pessoa jurídica, pode haver risco de tal alienação ou oneração serem consideradas fraude de execução caso no futuro seja formulado um pedido de desconsideração da personalidade jurídica e ele seja acolhido (CPC/2015, art. 137). Esta interpretação literal do art. 792, § 3º, do CPC/2015, ao que tudo indica, prejudica os terceiros de boa-fé que não têm como verificar se aquele que aliena ou onera um bem é ou não é sócio ou administrador de uma pessoa jurídica, à míngua de um cadastro unificado das pessoas jurídicas em território nacional. Uma solução interpretativa para o § 3º do  art. 792 do CPC/2015 é considerar que tal dispositivo se refere à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica (CPC/2015, art. 133, § 2º). Nesse caso, a “citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar” acontece após a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica e a comunicação ao distribuidor para as anotações devidas (CPC/2015, art. 134, § 1º). Assim, o adquirente de um bem da pessoa jurídica não pode alegar desconhecimento de que havia uma demanda capaz de reduzi-la a insolvência (CPC/2015, art. 792, IV). Caso contrário, é inútil a determinação constante no § 1º do art. 134 do CPC/2015 para que o distribuidor realize as anotações devidas após a instauração do incidente, se for considerada fraude de execução a alienação ou oneração de bens por parte de alguém que nem sequer constava dos registros do distribuidor na época em que tal alienação ou oneração fora praticada. Nesse caso, seria melhor então que se determinasse a todos os cartórios distribuidores que mantivessem um registro de todos os sócios e administradores de todas as pessoas jurídicas que figurassem como parte nos processos sob os seus cuidados. Assim, mediante uma pesquisa no distribuidor, seria possível saber todas as pessoas jurídicas, todos os sócios e todos os administradores que podem ser atingidos por uma decisão de desconsideração da personalidade jurídica, mesmo que não tenham sido ainda instaurados os incidentes de desconsideração. Portanto, para proteger terceiros de boa-fé e garantir a segurança jurídica, o mais adequado seria considerar que a ineficácia da alienação do bem somente deve ser reconhecida se ela for realizada a partir da citação do sócio, administrador ou pessoa jurídica para manifestar-se no incidente. (SOUZA, André Pagani de. Código de Processo Civil anotado. Sob a coordenação de José Rogério Cruz e Tucci, Manoel Caetano Ferreira Filho, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Sandro Gilbert Martins, Rogéria Fagundes Dotti. Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 236/237)

Por fim, a citação referida no art. 792, § 3º, do NCPC é a que ocorre no processo originário, e não a que ocorre para apresentação de manifestação no incidente de desconsideração de personalidade jurídica [89].

 

4 CONSIDERAÇÕES DE ORDEM PRÁTICA

Os arts. 133 a 137 do NCPC se detiveram mais em regulamentar o pedido de desconsideração da personalidade jurídica formulado de forma incidental, tratando de forma residual ou reflexa quando ele é formulado entre os demais pedidos da petição inicial.

Para não descaracterizar o tratamento processual conferido pelo legislador ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica, será necessário adaptar o procedimento da desconsideração intentada junto à petição inicial ao procedimento da desconsideração incidental.

Por exemplo, a decisão que resolve o incidente de desconsideração de personalidade jurídica é passível de reforma pelo tribunal ante a interposição de agravo de instrumento (art. 1.015, IV, do NCPC), ao passo que, via de regra, o pedido de desconsideração formulado na petição inicial será julgado na sentença e será passível de discussão por meio de apelação (art. 1.009 [90] do NCPC). Pois bem, mantendo-se o espírito do microssistema da desconsideração da personalidade jurídica constante dos arts. 133 a 137 do NCPC, nada impede que, em alguns casos, o pedido de desconsideração formulado na petição inicial enseje a prolação de decisões passíveis de questionamento por meio de agravo de instrumento.

Ora, nos casos em que o pedido de desconsideração formulado na petição inicial se fundamente em elementos enquadráveis nas tutelas provisórias previstas no art. 294 [91] do NCPC, o deferimento ou indeferimento de tal pedido ensejará a possibilidade de manejo de agravo de instrumento  (art. 1.015, I [92], do NCPC).

Ainda em observância ao espírito que inspira o microssistema da desconsideração da personalidade jurídica constante dos arts. 133 a 137 do NCPC, há de se atentar para o fato de que, mesmo quando o pedido de desconsideração formulado na petição inicial seja enquadrável como uma hipótese de tutela provisória, não se autoriza a concessão de tal pleito em sede inaudita altera pars, já que a obrigatoriedade de realização do contraditório, antes de quaisquer atos que promovam o afastamento da personalidade do ente coletivo, é uma das marcas mais acentuadas deste novo tratamento processual dado aos procedimentos para desconsiderar a personalidade jurídica.

 

CONCLUSÃO

Instrumento valiosíssimo para coibir condutas abusivas que deturpam o objetivo e a utilidade social das empresas, a desconsideração da personalidade jurídica, em face do seu caráter excepcional, não pode ser utilizada indiscriminadamente, sob pena de tornar inócua a garantia da separação patrimonial e transformar aquilo que deveria ser exceção em regra.

Alguns abusos praticados na aplicação da desconsideração da personalidade jurídica geravam uma grande incerteza jurídica nas partes que se viam arrastadas para um processo que poderia redundar na constrição dos seus bens. Incerteza essa que, com a entrada em vigor do NCPC, espera-se tenha fim.

Ao estabelecer um procedimento com contraditório, ampla defesa e acesso a um duplo grau de jurisdição, o NCPC torna a desconsideração da personalidade jurídica racional, sem desnaturar o instituto ou enfraquecê-lo.

Ainda sujeitos a diversas interpretações (e eventuais críticas), os  arts. 133 a 137 do Novo Código de Processo Civil inequivocamente constituem um grande avanço, permitindo que a desconsideração da personalidade jurídica seja aplicada em estrita observância a garantias constitucionais que se manifestam no ambiente processual.

 

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[1] “A última e mais importante consequência da personificação de uma sociedade é a autonomia patrimonial, isto é, a existência de um patrimônio próprio, o qual responde por suas obrigações. Disso decorre que, a princípio, é o patrimônio da pessoa jurídica a garantia única dos seus credores e, por conseguinte, os credores, a princípio, não possuem pretensão sobre os bens dos sócios. Do mesmo modo, o patrimônio social é imune às dívidas particulares dos sócios. A autonomia significa que as obrigações (créditos e débitos) da pessoa jurídica não se confundem com as obrigações (créditos e débitos) dos sócios, não havendo que se falar em compensação. […] como corolário da personalidade jurídica, a sociedade assegura aos sócios uma distinção entre seu patrimônio pessoal e o patrimônio para o exercício da atividade.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 229/230)

[2] “Para a realização de alguns empreendimentos, por vezes é imprescindível a união de várias pessoas, as quais, todavia, não querem simplesmente entregar recursos para que outra pessoa os administre, mas querem assumir responsabilidades e atuar diretamente na condução do empreendimento. De outro lado, as mesmas pessoas têm medo de comprometer todo o seu patrimônio, preferem não assumir o risco e investem seus recursos em atividades não produtivas.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 231)

[3] “Embora a pessoa jurídica também possa atuar no mercado como fornecedor, os bens e serviços no mercado são fornecidos maciçamente por intermédio de pessoas jurídicas. Como se sabe, vigem no Direito brasileiro, acerca da pessoa jurídica, os princípios da autonomia e da separação. O princípio da autonomia atribui personalidade própria à pessoa jurídica, distinta da dos seus membros, sendo ela, e não seus sócios, que pratica condutas, podendo ser sujeito passivo ou ativo em qualquer relação obrigacional. De acordo com o princípio da separação, há uma perfeita distinção entre o patrimônio da pessoa jurídica e o patrimônio dos sócios, que não se confundem. Atribuir a personalidade jurídica a uma pessoa, diferente do ser humano, dando-lhe a capacidade de ser sujeito ativo ou passivo de qualquer relação obrigacional, como uma pessoa comum, interessa não apenas às próprias pessoas que se associam, mas também à coletividade. Entretanto, é evidente que a personalização jurídica desses entes só pode vir para beneficiar a sociedade, desburocratizando as transações, a circulação de bens, enfim, o progresso social. […] Mas, se à sociedade interessa a constituição de uma pessoa jurídica, esta deixa de considerá-la, enquanto tal, a partir do momento em que ela se vale dos princípios da autonomia da e da separação para prejudicar e lesar terceiros que com ela contratam. Não entende, algumas vezes, o empresário que a empresa não está a serviço apenas de seus interesses. Tanto que ele não pode retirar da pessoa jurídica o numerário que bem entender ou todo o seu patrimônio e transferi-lo para o da pessoa física. O único patrimônio que legalmente pode retirar da empresa habitualmente, sem desconstituí-la, é o lucro apurado. Se, mesmo sem obtenção de lucro, ele retira patrimônio da pessoa jurídica e transfere para o seu nome particular, os credores, que contratam com a pessoa jurídica, ficarão desprotegidos na hora de exigir judicialmente seus créditos. A partir desse momento, a personalidade jurídica deixa de ser um benefício para a coletividade, motivo pelo qual, em determinadas situações, se passou a admitir a sua desconsideração, como que suspendendo o princípio da separação, para fazer com que o patrimônio individual do sócio se confunda com o da própria pessoa jurídica.” (KHOURI, Paulo Roberto Roque Antonio. Direito do consumidor: contratos, responsabilidade civil e defesa do consumidor em juízo. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 200/201)

[4] “O leading case para aplicação desta teoria ocorreu na jurisprudência inglesa, em 1897, e foi o Caso Salomon vs. Salomon & Co., envolvendo o comerciante Aaron Salomon e a sua empresa Salomon & Co. O comerciante Aaron Salomon havia constituído uma company, em conjunto com outros seis membros de sua família, e cedido o seu fundo de comércio à sociedade assim formada, recebendo 20.000 ações representativas de sua contribuição ao capital, enquanto para cada um dos outros membros foi distribuída uma ação apenas. Para a integralização do valor do aporte efetuado, Salomon recebeu ainda obrigações garantidas de dez mil libras esterlinas. A companhia, um ano após, entrou em liquidação, verificando-se que seus bens eram insuficientes para satisfazer as obrigações garantidas, sem que nada sobrasse para os credores quirografários. O liquidante sustentou que a atividade da company era ainda a atividade pessoal de Salomon para limitar a própria responsabilidade, e, em consequência, Aaron Salomon devia ser condenado ao pagamento dos débitos da company, vindo o pagamento de seu crédito após a satisfação dos demais credores quirografários. O Magistrado que conheceu do caso em primeira instância, secundado depois pela Corte de Apelação, acolheu esta solicitação, julgando que a company era exatamente apenas uma fiduciária de Salomon, ou melhor, um seu agent ou trustie, que permanecera na verdade o efetivo proprietário do fundo de comércio. A House of Lords acolheu o recurso de Aaron Salomon, para reformar aquele entendimento das instâncias inferiores, na consideração de que a company tinha sido validamente constituída, pois a lei simplesmente requeria a participação de sete pessoas, que no caso não havia perseguido nenhum intuito fraudulento. Esses acionistas, segundo os Lords, haviam dado vida a um sujeito diverso de si mesmos, e, em última análise, não se podiam julgar-se que a company fosse um agent, de Salomon. Em consequência não existia responsabilidade de Salomon para a company e seus credores e era, consequentemente, válido o seu crédito privilegiado.” (FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Lições de direito econômico. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 272)

[5] “Diante de sua concepção como realidade técnica e orgânica, a pessoa jurídica é capaz de direitos e deveres na ordem civil, independentemente dos membros que a compõem, com os quais não tem vínculo. Tal realidade pode ser retirada do art. 45 do Código Civil de 2002, ao dispor que começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro. Fala-se em autonomia da pessoa jurídica quanto aos seus membros, o que constava expressamente no art. 20 do Código Civil de 1916, dispositivo que não foi reproduzido pela atual codificação, sem que isso traga qualquer conclusão diferente. Como decorrência lógica desse enquadramento, em regra, os componentes da pessoa jurídica somente responderão por débitos dentro dos limites do capital social, ficando a salvo o patrimônio individual dependendo do tipo societário adotado (responsabilidade in vires). A regra é de que a responsabilidade dos sócios em relação às dívidas sociais seja sempre subsidiária, ou seja, primeiro se exaure o patrimônio da pessoa jurídica, para depois, e desde que o tipo societário adotado permita, os bens particulares dos sócios ou componentes da pessoa jurídica sejam executados. Devido a essa possibilidade de exclusão da responsabilidade dos sócios ou administradores, a pessoa jurídica, por vezes, desviou-se de seus princípios e fins, cometendo fraudes e lesando sociedade ou terceiros, provocando reações na doutrina e na jurisprudência. Visando a coibir tais abusos, surgiu no Direito Comparado a figura da teoria da desconsideração da personalidade jurídica ou teoria da penetração (disregard of the legal entity). Com isso, alcançam-se pessoas e bens que se escondem dentro de uma pessoa jurídica para fins ilícitos ou abuso, além dos limites do capital social (responsabilidade ultra vires).” (TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito do consumidor: direito material e processual. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 348)

[6] “Desconsideração da pessoa jurídica (disregard of legal entity). Consiste na possibilidade de se ignorar a personalidade jurídica autônoma da entidade moral sempre que esta venha a ser utilizada para fins fraudulentos ou diversos daqueles para os quais foi constituída, permitindo que o credor de obrigação assumida pela pessoa jurídica alcance o patrimônio particular de seus sócios o administradores para satisfação de seu crédito.” (NERY JUNIOR, Nelson. Código Civil comentado. 7. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 261)

[7] “A regra é de que a responsabilidade dos sócios em relação às dívidas sociais seja sempre subsidiária, ou seja, primeiro se exaure o patrimônio da pessoa jurídica para depois, e desde que o tipo societário adotado permita, os bens particulares dos sócios ou componentes da pessoa jurídica serem executados. Devido a essa possibilidade de exclusão da responsabilidade dos sócios ou administradores, a pessoa jurídica, por vezes, desviou-se de seus princípios e fins, cometendo fraudes e lesando sociedade ou terceiros, provocando reações na doutrina e na jurisprudência. Visando a coibir tais abusos, surgiu a figura da teoria da desconsideração da personalidade jurídica ou teoria da penetração na pessoa física (disregard of the legal entity). Com isso se alcançam pessoas e bens que se escondem dentro de uma pessoa jurídica para fins ilícitos ou abusivos. Tal instituto permite ao juiz não mais considerar os efeitos da personificação da sociedade para atingir e vincular responsabilidades dos sócios, com intuito de impedir a consumação de fraudes e abusos por eles cometidos, desde que causem prejuízos e danos a terceiros, principalmente a credores da empresa. Dessa forma, os bens particulares dos sócios podem responder pelos danos causados a terceiros. Em suma, o escudo, no caso da pessoa jurídica, é retirado para atingir quem está atrás dele, o sócio ou administrador. Bens da empresa também poderão responder por dívidas dos sócios, por meio do que se denomina como desconsideração inversa ou invertida.” (TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 4. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 137)

[8] “Por personalidade jurídica entende-se a situação fictícia que a lei confere a uma determinada universalidade de pessoas, bens, ou então de pessoas e bens tornando-as assemelhadas às pessoas físicas, no que diz respeito a serem sujeitos ativos e passivos de relações jurídicas. Assim, por exemplo, são pessoas jurídicas as associações civis sem fins lucrativos, as sociedades comerciais, as fundações etc. Ora, sendo assemelhadas às pessoas físicas, no que concerne à capacidade de agir no mundo jurídico, a lei civil parte do pressuposto de que o objetivo social constante dos estatutos ou contratos sociais e suas alterações é o almejado por todos os associados, o que exige deles lealdade, em primeiro lugar, boa-fé e firme propósito de agirem em prol do atingimento dos fins sociais. O Estado, desta forma, ao conceber a criação da pessoa jurídica, partiu exatamente da premissa de que seria utilizada para alcançar fins sociais previamente concebidos. Ao desviar-se de suas finalidades, entretanto, a pessoa jurídica perde sua razão de ser, cabendo ao próprio Estado, mediante o Poder Judiciário, desconsiderá-la. Desconsiderar essa personalidade jurídica, portanto, significa que os sócios passam a responder, com seu patrimônio individual, pelas obrigações sociais, ainda que se revista a sociedade, por exemplo, de responsabilidade limitada ao montante do capital social. E isto em decorrência de alguns abusos e outras circunstâncias, reputadas lesivas à própria sociedade, e a terceiros […].” (FILOMENO, José Geraldo Brito. Curso fundamental de direito do consumidor. São Paulo: Atlas, 2007. p. 189)

[9] “A personalidade da pessoa jurídica não se confunde com a de seus integrantes nem com a de seus administradores, e isso era norma expressa no art. 20 do Código Civil de 1916. O princípio se sustenta na medida em que a lei atribui personalidade a entidades que especifica (art. 44). Sucede, porém, que, muitas vezes, os sócios ou administradores, agindo contrariamente às finalidades estatutárias ou abusando da personalidade jurídica da pessoa jurídica, acarretam prejuízos a terceiros, quase sempre pela promiscuidade dos negócios próprios com os da entidade que administram. A fim de pôr cobro a esses desvios é que se formou a doutrina conhecida como disregard of legal entity, também chamada doutrina da penetração, para vincular e atingir o patrimônio dos sócios. Adverte, porém, Rubens Requião que ‘não se trata, é bom esclarecer, de considerar ou declarar nula a personificação, mas de torná-la ineficaz para determinados atos’, e prossegue delimitando ‘que a personalidade jurídica não constitui um direito absoluto, mas está sujeita e contida pela teoria da fraude contra credores e pela teoria do abuso de direito’ (Curso de direito comercial. 22. ed. São Paulo: Saraiva, v. I, 1995. p. 277).” (DUARTE, Nestor. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Sob a coordenação de Cezar Peluso. 3. ed. rev. e atual. Barueri: Manole, 2009. p. 60)

[10] “Ao invés de desconsiderar a personalidade jurídica para que eventual constrição de bens atinja o patrimônio dos sócios, a desconsideração inversa objetiva atingir os bens da própria sociedade em razão das obrigações contraídas pelo sócio, desde que, da mesma forma que a desconsideração tradicional, sejam preenchidos os requisitos legais.” (DONIZETTI, Elpídio. Novo código de processo civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 112)

[11] “Muito se discute na doutrina a forma procedimental para a desconsideração da personalidade jurídica. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a desconsideração pode ocorrer em qualquer fase do processo, não havendo que se falar em decadência de um direito potestativo. Existe dúvida, entretanto, de como deve ser conduzido procedimentalmente para se efetivar a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresarial. A desconsideração tem natureza constitutiva, considerando-se que por meio dela tem-se a criação de uma nova situação jurídica. Seria possível a criação dessa nova situação jurídica de forma incidental no processo/fase de execução ou caberia ao interessado a propositura de uma ação incidental com esse propósito? Há corrente doutrinária que defende a existência de um processo de conhecimento com os pretensos responsáveis patrimoniais secundários compondo o polo passivo para se discutir os requisitos indispensáveis à desconsideração da personalidade jurídica. Cândido Rangel Dinamarco, ao elaborar parecer a respeito do tema, afirma que ‘seria indispensável colocar esses fatos supostamente caracterizadores da fraude ou da sucessão em algum processo de conhecimento, no qual em sentença o juiz declarasse que a consulente é, ou não é, cotitular da obrigação ou mesmo de responsabilidade por obrigação alheia’. Na realidade, para a corrente doutrinária que defende a existência de um processo para a desconsideração da personalidade jurídica, a maior parte dos doutrinadores afirma que, havendo processo de conhecimento contra a sociedade patrimonial, basta a formação de um litisconsórcio passivo com os sócios. Não seria, portanto, necessário um processo autônomo com o objetivo exclusivo de se determinar a desconsideração, bastando o aproveitamento em contraditório do processo já existente contra a sociedade empresarial devedora. Durante a execução, para uns seria necessário um incidente processual, enquanto para outros uma ação própria para a desconsideração. Por outro lado, há doutrina que afirma que, estando presentes os pressupostos para a desconsideração da personalidade jurídica, ‘e o credor consiga prová-los ou ao menos trazer fortes indícios desses fatos, conhecíveis de plano, deverá o juiz determinar a desconsideração, acatando o requerimento do exequente, tornando passíveis de penhora os bens dos terceiros que compõem o quadro societário da executada’.” (TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito do consumidor: direito material e processual. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 552)

[12] “A jurisprudência já vinha reconhecendo, sob a égide do CPC revogado, a possibilidade de a desconsideração da personalidade jurídica dar-se incidentalmente no processo, prescindindo, assim, de ação autônoma para sua efetivação. Contudo, a ausência de procedimento específico previsto em lei gerava insegurança jurídica, na medida em que nem sempre se observava a também reconhecida necessidade de citação do sócio para se efetivar a desconsideração. Não raro, a desconsideração da personalidade jurídica e a penhora de bens dos sócios davam-se em decisão interlocutória não precedida do contraditório, obrigando o terceiro atingido em sua esfera jurídica pela decisão a voltar-se contra ela por meio de agravo de instrumento, que não substitui, em hipótese alguma, a defesa que poderia e deveria ser apresentada em primeiro grau de jurisdição. Os arts. 133 a 137 do atual CPC vieram, assim, trazer segurança jurídica ao tema da desconsideração, transformando em lei o procedimento que já vinha sendo aplicado pela jurisprudência do STJ em diversos julgados.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 357)

[13] “Na verdade, não se pode confundir a desconsideração com a despersonificação da empresa. No primeiro instituto, apenas se desconsidera a regra pela qual a pessoa jurídica tem existência distinta de seus membros. Na despersonificação, a pessoa jurídica é dissolvida. Sendo assim, no caso de ser deferida a desconsideração da personalidade jurídica pelo juiz da causa, deve-se manter a pessoa jurídica no polo passivo da demanda e incluir os sócios e administradores.” (TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 4. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 139)

[14] “Claro está que a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade que serviu como escudo para a prática de atos fraudulentos, abusivos, ou em desvio de função não pode significar, ressalvadas hipóteses excepcionais, a sua aniquilação. A empresa é um polo de produção e de empregos. O afastamento da personalidade deve ser temporário e tópico, perdurando apenas no caso concreto, até que os credores se satisfaçam no patrimônio pessoal dos sócios infratores, verdadeiros responsáveis pelos ilícitos praticados. Ressarcidos os prejuízos, sem prejuízo de simultânea responsabilização administrativa e criminal dos envolvidos, a empresa, por força do próprio princípio da continuidade,poderá, desde que apresente condições jurídicas e estruturais, voltar a funcionar. Entretanto, reconhecemos que, em situações de excepcional gravidade, poderá justificar-se a despersonalização,em caráter definitivo, da pessoa jurídica, entendido tal fenômeno como a extinção compulsória, pela via judicial, da personalidade jurídica.” (GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil. parte geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, v. I, 2011. p. 269)

[15] “A desconsideração da pessoa jurídica não atinge a validade do ato constitutivo, mas a sua eficácia episódica. Uma sociedade que tenha a autonomia patrimonial desconsiderada continua válida, assim como válidos são todos os demais atos que praticou. A separação patrimonial em relação aos seus sócios é que não produzirá nenhum efeito na decisão judicial referente àquele específico ato objeto da fraude. Esta é, inclusive, a grande vantagem da desconsideração em relação a outros mecanismos de coibição da fraude, como a anulação ou dissolução da sociedade. Por apenas suspender a eficácia do ato constitutivo, no episódio sobre o qual recai o julgamento, sem invalidá-lo, a teoria da desconsideração preserva a empresa, que não será necessariamente atingida por ato fraudulento de um de seus sócios, resguardando-se, desta forma, os demais interesses que gravitam ao seu redor, como o dos empregados, dos demais sócios, da comunidade etc.” (COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial: direito de empresa. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 154)

[16] “Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”

[17] “A importância do princípio da autonomia patrimonial nos leva, todavia, a aplicar a desconsideração com cautela, apenas em casos excepcionais, atendidos determinados requisitos, vale dizer, a regra é que prevaleça o princípio da autonomia patrimonial. Apenas em situações excepcionais é que se pode cogitar da aplicação da desconsideração. Essas situações excepcionais representam os requisitos fundamentais de aplicação da desconsideração. Para a chamada teoria maior da desconsideração, não basta o descumprimento de uma obrigação por parte da pessoa jurídica; é necessário que tal descumprimento decorra do desvirtuamento de sua função. A personificação é um instrumento legítimo de destaque patrimonial e, eventualmente, de limitação de responsabilidade, que só pode ser descartado caso o uso da pessoa afaste-se dos fins para os quais o direito a criou.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 239/240)

[18] “Em virtude da adoção da teoria maior da desconsideração, é necessário comprovar, para fins de desconsideração da personalidade jurídica, a prática de ato abusivo ou fraudulento por gerente ou administrador.” (STJ, REsp 1315110/SE, 2011/0274399-2, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, DJ 28.05.2013, DJe 07.06.2013)

[19] “A responsabilidade tributária prevista no art. 135 do CTN é subjetiva e refere-se às infrações à lei comercial, civil, trabalhista etc., e não ao mero inadimplemento da obrigação tributária.” (STJ, REsp 923909/RS, 2007/0007785-2, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJ 24.06.2008, DJe 14.08.2008)

[20] “A responsabilidade tributária é, em regra, objetiva, e tem por causa a mora, fato objetivo caracterizado pela impontualidade no pagamento do crédito tributário.” (STJ, REsp 1161661/AL, 2009/0199963-8, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJ 17.06.2010, DJe 28.06.2010)

[21] “A respeito da desconsideração da personalidade jurídica, a melhor doutrina aponta a existência de duas grandes teorias, a saber: a) teoria maior – a desconsideração, para ser deferida, exige a presença de dois requisitos: o abuso da personalidade jurídica + o prejuízo ao credor. Essa teoria foi adotada pelo art. 50 do CC/2002; b) teoria menor – a desconsideração da personalidade jurídica exige um único elemento, qual seja, o prejuízo ao credor. Essa teoria foi adotada pela Lei nº 9.605/1998 – para os danos ambientais – e, supostamente, pelo art. 28 do Código de Defesa do Consumidor.” (TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 4. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 138)

[22] “Fábio Ulhoa Coelho ressalta a existência de uma linha de entendimento, que afirma que não há requisitos específicos para a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. Essa teoria, chamada de teoria menor, afirma que basta o não pagamento de um crédito para se aplicar a desconsideração da personalidade jurídica. Se a sociedade não tiver patrimônio para honrar suas obrigações, mas os sócios forem solventes, deve-se aplicar a desconsideração da personalidade jurídica.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 241/242)

[23] “Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. […]  § 5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.”

[24] “Art. 18. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.”

[25] “Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. Parágrafo único. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.”

[26] “A desconsideração da pessoa jurídica é ato privativo do juiz, que, também, não agirá de ofício, dependendo de iniciativa da parte ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo. A decisão fixará quais relações ou obrigações serão estendidas aos sócios ou administradores, de modo que a pessoa jurídica não se extingue, mas é apenas afastado o véu protetor, para que os bens particulares daqueles respondam pelos atos abusivos ou fraudulentos.” (DUARTE, Nestor. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Sob a coordenação de Cezar Peluso. 3. ed. rev. e atual. Barueri: Manole, 2009. p. 60)

[27] “Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.”

[28] “[…] na ausência de norma específica, a disciplina do processo civil tem caráter geral – isto é, transetorial.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado (livro eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 55)

[29] “A despeito da inexistência de dispositivo semelhante no CPC revogado, a introdução do art. 15 no CPC atual em nada altera o estado de coisas anterior, em que se reconhecia a aplicação subsidiária do CPC, como norma fundamental, a todo o ordenamento jurídico, inclusive aos processos regidos por leis especiais.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 79)

[30] “O legislador disse menos do que queria. Não se trata somente de aplicar as normas processuais aos processos administrativos, trabalhistas e eleitorais quando não houver normas, nestes ramos do direito, que resolvam a situação. A aplicação subsidiária ocorre também em situações nas quais não há omissão. Trata-se, como sugere a expressão ‘subsidiária’, de uma possibilidade de enriquecimento, de leitura de um dispositivo sob um outro viés, de extrair-se da norma processual eleitoral, trabalhista ou administrativa um sentido diferente, iluminado pelos princípios fundamentais do processo civil. A aplicação supletiva é que supõe omissão. Aliás, o legislador, deixando de lado a preocupação com a própria expressão, precisão da linguagem, serve-se das duas expressões. Não deve ter suposto que significam a mesma coisa, se não, não teria usado as duas. Mas como empregou também a mais rica, mais abrangente, deve o intérprete entender que é disso que se trata.” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo (livro eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 45)

[31] “Art. 18. Os fornecedores e transportadores de petróleo, gás natural, seus derivados e biocombustíveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade, inclusive aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes do recipiente, da embalagem ou rotulagem, que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor. (Redação dada pela Lei nº 11.097, de 2005) […] § 3º Poderá ser desconsiderada a personalidade jurídica da sociedade sempre que esta constituir obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados ao abastecimento nacional de combustíveis ou ao Sistema Nacional de Estoques de Combustíveis.”

[32] “Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.”

[33] “Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.”

[34] “Para analisar o cabimento da desconsideração, o Magistrado deverá verificar se foram preenchidos os requisitos estabelecidos em lei (art. 134, § 4º). O art. 50 do Código Civil, por exemplo, que consagra a chamada teoria maior da desconsideração, prevê a necessidade do preenchimento dos seguintes requisitos: (i) o requisito objetivo, que consiste na insuficiência patrimonial do devedor; e (ii) o requisito subjetivo, consistente no desvio de finalidade ou confusão patrimonial através da fraude ou abuso de direito. Para a aplicação da teoria da desconsideração, não basta estar presente apenas o primeiro requisito. Deve, pois, também estar demonstrada, no caso concreto, a existência de uma conduta culposa do sócio ou a sua intervenção abusiva ou fraudulenta de utilizar os bens da sociedade para fins diversos daqueles permitidos em lei (requisito subjetivo).” (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 115)

[35] “A desconsideração será possível, a requerimento da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir, se o abuso consistir em: a) desvio de finalidade; b) confusão patrimonial. No primeiro caso, desvirtuou-se o objetivo social, para se perseguirem fins não previstos contratualmente ou proibidos por lei. No segundo, a atuação do sócio ou administrador confundiu-se com o funcionamento da própria sociedade, utilizada como verdadeiro escudo, não se podendo identificar a separação patrimonial entre ambos. Nas duas situações, faz- -se imprescindível a ocorrência de prejuízo – individual ou social -, justificador da suspensão temporária da personalidade jurídica da sociedade.” (GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: parte geral.  13. ed. São Paulo: Saraiva, v. I, 2011. p. 272)

[36] “Desvio de finalidade. A identificação do desvio de finalidade nas atividades da pessoa jurídica deve partir da constatação da efetiva desenvoltura com que a pessoa jurídica produz a circulação de serviços ou de mercadorias por atividade lícita, cumprindo ou não o seu papel social, nos termos dos traços de sua personalidade jurídica. Se a pessoa jurídica se põe a praticar atos ilícitos ou incompatíveis com sua atividade autorizada, bem como se com sua atividade favorece o enriquecimento de seus sócios e sua derrocada administrativa e econômica, dá-se ocasião de o sistema de direito desconsiderar sua personalidade e alcançar o patrimônio das pessoas que se ocultam por detrás de sua existência jurídica.” (NERY JUNIOR, Nelson. Código civil comentado. 7. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 261/262)

[37] “Confusão patrimonial. Também é aplicada a desconsideração nos casos em que houver confusão entre o patrimônio dos sócios e da pessoa jurídica. Essa situação decorre da não separação do patrimônio do sócio e da pessoa jurídica por conveniência da entidade moral. Neste caso, o sócio responde com seu patrimônio para evitar prejuízos aos credores, ressalvada a impenhorabilidade do bem de família e os limites do patrimônio da família.” (NERY JUNIOR, Nelson. Código Civil comentado. 7. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 262)

[38] “Uma primeira vertente pode ser chamada de teoria subjetiva, na qual o pressuposto fundamental da desconsideração é o desvio da função da pessoa jurídica, que se constata na fraude e no abuso de direito relativos à autonomia patrimonial, pois a desconsideração nada mais é do que uma forma de limitar o uso da pessoa jurídica aos fins para os quais ela é destinada. A autonomia patrimonial da pessoa jurídica só subsiste quando ela é usada para seus devidos fins, isto é, quando ela não se confunde com os sócios e quando não é utilizada para fins não merecedores de tutela de acordo com o ordenamento jurídico.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 240/241)

[39] “Art. 5º Constituem atos lesivos à Administração Pública, nacional ou estrangeira, para os fins desta lei, todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1º, que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, assim definidos: I – prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada; II – com­provadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos previstos nesta lei; III – comprovadamente, utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados; IV – no tocante a licitações e contratos: a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público; b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público; c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo; d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente;  e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo; f) obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; ou g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a Administração Pública; V – dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação, inclusive no âmbito das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do sistema financeiro nacional.”

[40] “A teoria da desconsideração da personalidade jurídica – disregard doctrine -, conquanto encontre amparo no direito positivo brasileiro (art. 2º da Consolidação das Leis Trabalhistas, art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, art. 4º da Lei nº 9.605/1998, art. 50 do CC/2002, entre outros), deve ser aplicada com cautela, diante da previsão de autonomia e existência de patrimônios distintos entre as pessoas físicas e jurídicas.” (STJ, REsp 693235/MT, 2004/0140247-0, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJ 17.11.2009, DJe 30.11.2009)

[41] “Art. 2º Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. […] § 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.”

[42] “Grupo econômico é um conglomerado de empresas que, embora tenham personalidade jurídica própria, estão sob o controle administrativo ou acionário de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de outra atividade econômica.” (BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 385)

[43] “Preferimos definir o grupo econômico como um conjunto de empresas no qual uma das integrantes pode exercer o domínio sobre as demais.” (MEIRELES, Edilton. Grupo econômico trabalhista. São Paulo: LTr, 2002. p. 80 apud CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho. 6. ed. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2011. p. 320)

[44] “A relação que deve haver entre as empresas do grupo econômico é uma relação de dominação, mostrando a existência de uma empresa principal, que é a controladora, e as empresas controladas. A dominação exterioriza-se pela direção, controle ou administração. O requisito principal é o controle de uma empresa sobre outra, que consiste na possibilidade de uma empresa exercer influência dominante sobre outra, mesmo não tendo a maioria das ações, mas sim o número suficiente para controlá-la. A administração decorre da organização do grupo, do poder de uma empresa se investe em relação a outra, quanto à orientação e ingerência de seus órgãos.” (MARTINS, Sergio Pinto. Curso de direito do trabalho. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2009. p. 78)

[45] “O controle, segundo Octavio Bueno Magano, é a ‘possibilidade do exercício de uma influência dominante de uma empresa sobre a outra, subordinando os bens a ela atribuídos à consecução de suas finalidades’. Ele poderá ser administrativo ou acionário. Já a direção é a efetivação do controle. Consiste, como assevera o mesmo autor, ‘no poder de subordinar pessoas e coisas à realização dos objetivos da empresa’, enquanto a administração é a submissão de uma empresa à orientação e à interferência de órgãos administrativos de outra.” (BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 385)

[46] “[…] sempre que houver uma gestão única de todas elas, haverá um grupo de empresas.” (CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho. 6. ed. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2011. p. 320)

[47] “‘Na sociedade em conta de participação, o sócio ostensivo é quem se obriga para com terceiros pelos resultados das transações e das obrigações sociais, realizadas ou empreendidas em decorrência da sociedade, nunca o sócio participante ou oculto que nem é conhecido dos terceiros nem com estes nada trata’ (REsp 168.028/SP). Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.” (STJ, REsp 192.603/SP,  4ª T., Rel. Min. Barros Monteiro, J. 15.04.2004, DJ 01.07.2004, p. 197)

[48] Todavia, é bom pontuar que o STJ não vislumbra tal óbice: “1. Nos termos da Súmula nº 480/STJ: ‘O juízo da recuperação judicial não é competente para decidir sobre a constrição de bens não abrangidos pelo plano de recuperação da empresa’. 2. Desse modo, não configura conflito positivo de competência a apreensão, pela Justiça Especializada, por eventual aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine), de bens de sócios ou dos diretores da sociedade em recuperação, porquanto tais medidas não implicam a constrição de bens vinculados ao cumprimento do plano de reorganização da sociedade empresária, tampouco interferem em atos de competência do juízo da recuperação. 3. Os bens dos sócios ou dos diretores da devedora não estão sob a tutela do juízo da recuperação judicial, a menos que haja decisão deste em tal sentido. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg-EDcl-CC 130436/MT,  2013/0333637-8, 2ª S., Rel. Min. Raul Araújo, DJ 27.11.2013, DJe 19.12.2013)

[49] “284. As pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos ou de fins não econômicos estão abrangidas no conceito de abuso da personalidade jurídica.”

[50] “Agravo de instrumento. Recurso de revista. Execução. Legitimidade passiva. Estado. Responsabilidade subsidiária. 1. Não importa em violação direta e literal dos arts. 5º, II e LV, e 173 da Constituição Federal a decisão proferida em execução em que, não obstante o silêncio do título exequendo, declara a responsabilidade subsidiária da unidade da federação ao pagamento de verbas trabalhista devidas por sociedade de economia mista integrante da Administração Pública estadual, da qual o Estado é sócio majoritário e controlador. A desconsideração da personalidade jurídica do ente público (Companhia Alagoana de Recursos Humanos e Patrimoniais – CARHP), justificada ante a inexistência de patrimônio próprio para cumprir o débito trabalhista, remete a questão ao plano infraconstitucional, insuscetível de reexame em recurso de revista interposto em fase de execução. 2. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento.” (TST, AI-RR 1853007020005190005, 185300-70.2000.5.19.0005, 4ª T., Rel. João Oreste Dalazen, DJ 13.11.2013, DEJT 22.11.2013)

[51] “Agravo de instrumento. Execução. Desconsideração da personalidade jurídica. Execução direcionada contra o Estado. Acionista majoritário. Não viola a Constituição da República a desconsideração da personalidade jurídica de empresa pública, com o consequente direcionamento da execução ao ente federado instituidor. Juros de mora. Recurso desfundamentado a teor da Súmula nº 266 do TST e do art. 896, § 2º, da CLT. Agravo de instrumento a que se nega provimento.” (TST, AI-RR 1630000920025010050, 8ª T., Relª Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJ 03.06.2015, DEJT 08.06.2015)

[52] “Quanto às relações com terceiros, fornecedores e empreiteiros, estas estão submetidas, no Brasil, em face do art. 173, § 1º, II, ao direito privado, na sua pureza.” (MUKAI, Toshio. O direito administrativo e os regimes jurídicos das empresas estatais. 2. ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2004. p. 303)

[53] “De início, observemos o já anteriormente referido art. 173, § 1º, da CF. Como já salientado anteriormente, seja no seu texto original, seja no texto hoje vigente, nossa Lei Maior firma a diretiva de que as empresas públicas e as sociedades de economia mista que exploram atividade econômica deverão sujeitar-se sempre ‘ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários’. A intenção do legislador parece ser clara. Seu desejo é o de equiparar as empresas estatais a empresas privadas comuns para que, no exercício de suas atividades privadas, atuem em condição igualitária, ou ao menos a mais equivalente possível. Devem ter os mesmos direitos e os mesmos deveres. Sendo assim, parece-nos rigorosamente correto afirmar que as empresas públicas, as sociedades de economia mista que explorem atividade econômica e suas subsidiárias jamais poderão receber da legislação infraconstitucional qualquer tipo de tratamento privilegiado que as coloque em patamar jurídico diferenciado daquele em que estão situadas as empresas comuns, de modo a que possam vir a receber qualquer favorecimento especial na sua atuação.” (CARDOZO, José Eduardo Martins. O dever de licitar e os contratos das empresas estatais que exercem atividade econômica. In: Curso de direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, v. III, 2006. p. 784/785)

[54] Enunciado nº 124 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “A desconsideração da personalidade jurídica no processo do trabalho deve ser processada na forma dos arts. 133 a 137, podendo o incidente ser resolvido em decisão interlocutória ou na sentença”.

[55] “Etimologicamente, existe uma diferença entre aplicação supletiva e aplicação subsidiária. A primeira se destina a suprir algo que não existe em uma determinada legislação, enquanto a segunda serve de ajuda ou de subsídio para a interpretação de alguma norma ou mesmo um instituto. Todavia, na prática, tem-se confundido a etimologia destas palavras, aplicando, uma ou outra, nos dois sentidos. A propósito, o  art. 769 da CLT afirma que, ‘nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, e assim tem ocorrido com aplicação de inúmeros institutos previstos no CPC ou em leis específicas. É o caso, por exemplo, e respectivamente, das regras que dispõem sobre a tutela antecipada e da lei que regulamenta o mandado de segurança (Lei nº 12.016/2009). É justamente no processo do trabalho que o novo Código de Processo Civil terá grande utilidade. Isto porque a CLT, que contém reduzido número de artigos que regulamentam os conflitos trabalhistas (um título com oito capítulos), foi elaborada em 1940, e, apesar do grande avanço para a época, encontra-se, hoje, longe da realidade e desatualizada. Nesta linha, algumas inovações processuais do novo Código de Processo Civil terão importante papel no processo trabalho, como o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (arts. 133 a 137) e o incidente de resolução de demandas repetitivas (arts. 976 a 987) etc. No que se refere ao incidente de desconsideração da personalidade jurídica, é comum na justiça do trabalho a aplicação indiscriminada do instituto, com a imediata determinação da penhora online nas contas dos sócios, sem que a eles seja sequer dada oportunidade de defesa, isto porque dificilmente os sócios participaram da relação jurídica processual. Ora, os eventuais abusos cometidos pelos sócios de algumas empresas, que não cumprem as suas obrigações trabalhistas, não justificam, por si só, a generalização que hoje ocorre, sem que sejam observados, minimamente, os princípios do contraditório e da ampla defesa. Assim, a partir da vigência do novo Código de Processo Civil, a Justiça do Trabalho só poderá desconsiderar a personalidade jurídica da empresa depois de assegurar o procedimento previsto nos arts. 133 a 137 do novo CPC.” (CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 69/70)

[56] “Art. 795. […] § 4º Para a desconsideração da personalidade jurídica é obrigatória a observância do incidente previsto neste Código.”

[57] “Art. 1.062. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processo de competência dos juizados especiais.”

[58] “O incidente de desconsideração da personalidade jurídica é uma novidade trazida pelo CPC/2015. Trata-se de uma espécie de intervenção de terceiros que não era encontrada no CPC/1973 e que recebeu disciplina processual expressa pelo novo diploma legal com o objetivo de harmonizar a desconsideração da personalidade jurídica com o princípio do contraditório (CF, art. 5º, LV, e CPC/2015, arts. 7º, 9º e 10).” (SOUZA, André Pagani de. Código de Processo Civil anotado. Sob a coordenação de José Rogério Cruz e Tucci, Manoel Caetano Ferreira Filho, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Sandro Gilbert Martins, Rogéria Fagundes Dotti. Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 227)

[59] “Importante notar que o conceito de parte na demanda ou no processo não se confunde com o conceito de parte material, que é o sujeito que participa da relação de direito material que constitui o objeto do processo. Dessa forma, mesmo que não seja o titular dessa relação de direito material, mas participe do processo, o sujeito será considerado parte processual, independentemente da legalidade de sua presença no processo. É por isso que, mesmo sendo parte ilegítima, o sujeito é considerado parte processual pelo simples fato de participar do processo. Significa que o sócio será parte, querendo ou não, tendo ou não legitimidade para participar da execução.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil – Lei  nº 13.105/2015. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. p. 148)

[60] Enunciado nº 125 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “Há litisconsórcio passivo facultativo quando requerida a desconsideração da personalidade jurídica, juntamente com outro pedido formulado na petição inicial ou incidentemente no processo em curso”.

[61] “A utilização de um incidente cognitivo para desconsiderar a personalidade jurídica é prescrita pelos arts. 133 a 137 do CPC/2015 como forma de garantir que o princípio do contraditório seja observado sempre que, por determinação judicial, os efeitos de certas e determinadas obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou dos sócios da pessoa jurídica. Com a instauração deste incidente, permite-se que seja estabelecido o contraditório entre aquele que pede a desconsideração da personalidade jurídica e aquele que poderá sofrer os seus efeitos, de maneira que o juiz realize a sua cognição e profira a sua decisão no curso de um processo pendente, sem prejudicar o direito de defesa do integrante da pessoa jurídica.” (SOUZA, André Pagani de. Código de Processo Civil anotado. Sob a coordenação de José Rogério Cruz e Tucci, Manoel Caetano Ferreira Filho, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Sandro Gilbert Martins, Rogéria Fagundes Dotti. Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 227)

[62] “Art. 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.”

[63] “O incidente de desconsideração da personalidade jurídica não pode ser instaurado de ofício, dependendo sempre de provocação da parte interessada ou, quando atue no processo, do Ministério Público. O dispositivo está em plena consonância com o que dispõe o art. 50 do CC/2002, que expressamente exige provocação da parte (ou do Ministério Público) para a desconsideração da personalidade jurídica, mas vem eliminar o risco de que, nas causas regidas pela legislação consumerista, se desse ao art. 28 do CDC (que é silente sobre o ponto) interpretação no sentido de que ali seria possível desconsiderar-se ex officio a personalidade jurídica. Fica claro, então, que a desconsideração da personalidade jurídica jamais poderá ser decretada de ofício, dependendo, sempre, de provocação.” (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 515/516)

[64] “Art. 82. A responsabilidade pessoal dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e dos administradores da sociedade falida, estabelecida nas respectivas leis, será apurada no próprio juízo da falência, independentemente da realização do ativo e da prova da sua insuficiência para cobrir o passivo, observado o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil. § 1º Prescreverá em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência, a ação de responsabilização prevista no caput deste artigo. § 2º O juiz poderá, de ofício ou mediante requerimento das partes interessadas, ordenar a indisponibilidade de bens particulares dos réus, em quantidade compatível com o dano provocado, até o julgamento da ação de responsabilização.”

[65] “Pode-se suscitar o incidente de desconsideração da pessoa jurídica em qualquer fase do processo e em qualquer tipo de processo, seja qual for o procedimento. É indiferente que o processo esteja em 1º ou em 2º grau de jurisdição. Já na fase de recurso especial ou extraordinário, não é possível a suscitação do incidente, já que é a Constituição Federal que disciplina a competência dos Tribunais Superiores e, ademais, por causa dos estreitos limites do efeito devolutivo destes recursos, que estão adstritos à questão federal ou à questão constitucional, revestida esta última de repercussão geral, seria despropositado admitir-se um incidente cujos limites pudessem extrapolar o da questão discutida nestes recursos.” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 253/254)

[66] “É claro que poderá o órgão julgador julgar inconveniente a instauração do incidente em determinados casos e, com isso, indeferi-la, sem prejuízo de renovação do requerimento em momento posterior. Isto porque se a desconsideração da personalidade jurídica serve para que ‘os efeitos de certas e determinadas obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou dos sócios da pessoa jurídica ou aos bens de empresa do mesmo grupo econômico’, não haveria interesse processual em se instaurar o incidente, por exemplo, em grau de apelação contra sentença que julgou improcedente a demanda, na medida em que nem sequer o reconhecimento da obrigação do réu verificar-se-ia na hipótese.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.  p. 364)

[67] “Há casos em que o demandante, já na petição inicial (de processo cognitivo ou executivo), postula a desconsideração da personalidade jurídica. Nesse caso, a citação do sócio ou da sociedade (esta no caso de desconsideração inversa) já será requerida originariamente. Ocorrendo esse requerimento originário, a demanda terá sido proposta em face do indigitado devedor da obrigação (seja a sociedade, seja o sócio) e, também, em face de terceiro (o sócio ou a sociedade, conforme o caso) que, não obstante estranho à relação obrigacional deduzida no processo, pode ser considerado também responsável pelo pagamento. Formar-se-á, aí, então, um litisconsórcio passivo originário entre a sociedade e o sócio. E em razão desse litisconsórcio originário não haverá qualquer motivo para a instauração do incidente. Afinal, nesse feito a pretensão à desconsideração integrará o próprio objeto do processo, cabendo ao juiz, ao proferir decisão sobre o ponto, acolher ou rejeitar tal pretensão. Sendo originário o litisconsórcio entre sociedade e sócio, não haveria como tratar o indigitado responsável (não devedor), seja ele o sócio, seja a sociedade (no caso de desconsideração inversa), como terceiro, motivo pelo qual não haveria qualquer sentido em instaurar-se um incidente que tem por fim promover uma intervenção de terceiro. Ressalvado esse caso, porém, a instauração do incidente é obrigatória para que se possa ampliar subjetivamente o processo e, com isso, legitimar-se a decisão que determina que a execução contra a sociedade atinja o patrimônio do sócio (ou vice-versa).” (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 521)

[68] “Não será necessária a instauração do incidente, logicamente, quando o pedido de desconsideração da personalidade jurídica for realizado na própria petição inicial, hipótese em que o sócio (ou a pessoa jurídica, na desconsideração inversa) será citado como parte já de início. Neste caso, tampouco há falar em suspensão do processo, uma vez que a desconsideração da personalidade jurídica já integra seu objeto original.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 364/365)

[69] “De acordo com a redação do art. 134, o incidente é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento da sentença e na execução fundada em título extrajudicial. Logo, quem pretender a desconsideração não precisará aguardar a sentença ou acórdão para pleitear a medida. Prova disso é que o  § 2º possibilita à parte requerer a desconsideração ainda na petição inicial, hipótese em que será desnecessária a instauração do incidente. Ressalte-se que a medida também é aplicável no âmbito dos processos que tramitam perante os Juizados Especiais Cíveis, nos termos do novo art. 1.062.” (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 114/115)

[70] “A instauração do incidente de desconsideração implica suspensão do processo, salvo quando requerida na petição inicial, hipótese em que o sócio ou sociedade serão citados para responder ao incidente no prazo para a defesa. Suspenso o processo, fica resguardada ao juiz a prerrogativa de determinar atos urgentes (art. 314). Frise-se, ainda, que independentemente da suspensão, o incidente deve ser decidido antes do mérito, uma vez que o seu resultado pode inserir novos réus no processo, os quais terão suas garantias processuais violadas se contra eles incidir decisão prolatada anteriormente.” (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 115)

[71] “Como toda petição postulatória, a petição que veicula o pedido para a instauração do incidente processual de desconsideração da personalidade jurídica deve conter fundamentação (pressupostos legais para a desconsideração) e pedido (desconsideração e penhora sobre o bem dos sócios). Nesse sentido, deve-se compreender o § 4º do art. 134 do Novo CPC, que não foi feliz em prever que no requerimento cabe à parte demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais para a desconsideração, o que pode passar a equivocada impressão de que o requerente terá que apresentar prova pré-constituída e liminarmente demonstrar o cabimento da desconsideração. Na realidade, o requerente não deve demonstrar, mas apenas alegar o preenchimento dos requisitos legais para a desconsideração, tendo o direito à produção de prova para convencer o juízo de sua alegação, inclusive conforme expressamente previsto nos arts. 135 e 136 do novo CPC, ao preverem expressamente a possibilidade de instrução probatória no incidente ora analisado.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. p. 143/144)

[72] “Apesar da ampliação do instituto, o NCPC condicionou o deferimento da medida – pleiteada na petição inicial ou em caráter incidental – à prévia citação do sócio ou da pessoa jurídica (art. 134, § 2º, parte final, e  art. 135). O que a nova legislação pretende é evitar a constrição judicial dos bens do sócio (ou da pessoa jurídica, na hipótese da desconsideração inversa) sem qualquer possibilidade de defesa.” (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 115)

[73] “A citação (e não mera intimação) dos sócios ou terceiros é indispensável, estabelecendo-se, de maneira incidental ao processo em curso, independentemente da fase que ele se encontre, o cabível contraditório sobre a existência, ou não, de fundamento para a desconsideração da personalidade jurídica pretendida. O prazo para defesa é de quinze dias.” (BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 134)

[74] Como contraponto, registre-se a posição de Guilherme Rizzo Amaral, que pugna pela possibilidade de intimação para apresentação da manifestação, muito embora ele não esclareça como alguém possa fazer já parte do processo principal e ainda assim dar azo à instauração do incidente de desconsideração de personalidade jurídica: “Embora o dispositivo faça menção à citação, caso uma dessas pessoas já seja parte no processo principal, poderá ela ser intimada na pessoa de seu advogado constituído nos autos, sendo desnecessária a adoção da forma de citação para o ato. Isto porque, sendo a citação ‘o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual’ (art. 238), não há sentido na sua realização caso o destinatário já integre a relação processual originária” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.  p. 365/366).

[75] “O sócio ou a pessoa jurídica, citados para integrar a relação processual, têm em suas manifestações todos os contornos de verdadeira contestação, submetendo-se inclusive, na hipótese de não apresentação da defesa, aos efeitos da revelia, entre os quais a presunção de veracidade dos fatos afirmados por quem requereu a desconsideração da personalidade jurídica, desde que as alegações deste sejam verossímeis (arts. 344 e 345, IV).” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 366)

[76] “O CPC 135 apenas fala em ‘manifestação’ do sócio ou da pessoa jurídica. Pressupõe-se, então, que essa manifestação se dará por meio de petição. Mas nessa petição deverão ser apresentadas todas as alegações e argumentos pelos quais não seria possível o reconhecimento de confusão patrimonial ou desvio de finalidade, bem como requeridas as provas necessárias. É praticamente uma contestação àquele pedido incidente.” (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil (livro eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1.201/1.202)

[77] “Os interessados (a parte contrária e o sócio ou a sociedade que poderão ser atingidos pela desconsideração) deverão ouvidos no prazo comum de quinze dias. Não se aplica aqui a causa de aumento de prazo prevista no art. 229 do CPC. Os terceiros, que não compõem os polos da relação processual (sócio ou sociedade que podem ser atingidos pela decisão), deverão ser citados para o incidente, podendo oferecer defesa no prazo de quinze dias.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 209)

[78] “Art. 229. Os litisconsortes que tiverem diferentes procuradores, de escritórios de advocacia distintos, terão prazos contados em dobro para todas as suas manifestações, em qualquer juízo ou tribunal, independentemente de requerimento. § 1º Cessa a contagem do prazo em dobro se, havendo apenas 2 (dois) réus, é oferecida defesa por apenas um deles. § 2º Não se aplica o disposto no caput aos processos em autos eletrônicos.”

[79] “Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: […] IV – in­cidente de desconsideração da personalidade jurídica; […]”

[80] Enunciado nº 126 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “No processo do trabalho, da decisão que resolve o incidente de desconsideração da personalidade jurídica na fase de execução cabe agravo de petição, dispensado o preparo”.

[81] “Art. 203. Os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos.”

[82] “Art. 203. […] § 2º Decisão interlocutória é todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no § 1º.”

[83] “A alienação de bens realizada em fraude à execução é considerada ineficaz, em relação àquele que pediu a desconsideração.” (MEDINA, José Miguel. Novo Código de Processo Civil comentado: com remissões e notas comparativas ao CPC/1973. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 228)

[84] “Embora, em regra geral, a fraude à execução só se caracterize quando o devedor aliena bens na pendência da demanda, porque na desconsideração de personalidade jurídica bens de terceiros (sócios ou sociedade) são atingidos, responsabilizando-os pela dívida do devedor original, a fraude de execução também pode atingir esses terceiros.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 209)

[85] “Art. 792. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução: […] § 3º Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar.”

[86] “O art. 137 do Novo CPC prevê que, sendo acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente. Como se pode notar do dispositivo legal, somente após o acolhimento do pedido de desconsideração haverá fraude à execução, em previsão que contraria o disposto no art. 792, § 3º, do Novo CPC, que estabelece haver fraude à execução nos casos de desconsideração da personalidade jurídica a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil – Lei  nº 13.105/2015. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. p. 149)

[87] “O art. 137 quer evidenciar que a alienação de bens nas condições que especifica é considerada fraude à execução e, como tal, ineficaz em relação àquele que pediu a instauração do incidente. O inciso VII do art. 790 preceitua que fica sujeito à execução os bens do responsável, nos casos de desconsideração da personalidade jurídica. Cabe destacar que a instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor (art. 134, § 1º), o que dará ensejo, certamente, a interessantes questões sobre o instante em que cessa a boa-fé de eventual terceiro adquirente, máxime diante do § 3º do art. 792, segundo o qual a fraude à execução considera-se ‘a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar’. O sócio (ou a sociedade) que teve bem seu penhorado independentemente da instauração do incidente aqui anotado tem legitimidade para opor embargos de terceiro, como expressamente prevê o inciso III do § 2º do art. 674.” (BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 134)

[88] Enunciado nº 52 da Enfam – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados: “A citação a que se refere o art. 792, § 3º, do CPC/2015 (fraude à execução) é a do executado originário, e não aquela prevista para o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 135 do CPC/2015)”.

[89] Enunciado nº 52 da Enfam – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados: “A citação a que se refere o art. 792, § 3º, do CPC/2015 (fraude à execução) é a do executado originário, e não aquela prevista para o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 135 do CPC/2015)”.

[90] “Art. 1.009. Da sentença cabe apelação.”

[91] “Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.”

[92] “Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I – tutelas provisórias; […]”