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CRX: O FUTURO DA SECURITIZAÇÃO NO BRASIL?

CRX: O FUTURO DA SECURITIZAÇÃO NO BRASIL?

 

Lei 14.430/22 traz nova solução de financiamento corporativo: o certificado de recebíveis lastreado em qualquer tipo de crédito

Em um mundo altamente competitivo, é comum refletirmos sobre as condições necessárias para o sucesso ou não de uma determinada empreitada. E, num ecossistema dominado por novas tecnologias, não raramente tendemos a pensar no êxito de determinadas companhias em termos de inovação e disrupção. Porém, outro elemento é ainda mais essencial – algo que não vem das novas noções de inovação, é tão antigo quanto à humanidade e tão importante para um startup em 2023 quanto o foi para o sucesso de qualquer empreitada na história: recursos (ou, na sua forma mais moderna, dinheiro).

A disponibilidade de recursos financeiros para a estruturação de negócios é essencial para toda e qualquer empreitada. É normal, portanto, que o mercado desenvolva soluções igualmente inovadoras para este tipo de questão.

A doutrina sobre o tema é vasta e amplamente debatida por autores de renome, de forma que não pretendo me estender nas possíveis formas de financiamento corporativo. Pelo contrário, aqui abordaremos apenas uma espécie de financiamento e uma inovação recente que ainda está sendo experimentada pelo mercado: a securitização de recebíveis.

Com o advento da Lei 14.430/22, mais conhecida como o novo marco da securitização, as normas que tratavam o tema mudaram. A nova lei passa a regular o funcionamento do regime fiduciário e cria o conceito de “certificados de recebíveis”, com regramento similar ao dos títulos de securitização emitidos por securitizadoras até então (CRI, CRA e Debêntures Financeiras), mas com um importante diferencial: estes certificados de recebíveis não têm limitações de lastro.

Anteriormente, a CVM e o legislador se limitavam a regular os mercados imobiliário e agropecuário, que têm grande sinergia com a securitização. A retirada dessa limitação traz ao país uma nova e importante solução de financiamento corporativo: o CRX ou o certificado de recebíveis lastreado em qualquer tipo de crédito – a variável “X” muda dependendo do setor da economia financiado.

A importância do CRX vai além do meramente jurídico e aborda as implicações econômicas deste produto. Imaginemos, por exemplo, um mercado de alta incidência de créditos pulverizados, como a assinatura de plataformas de streaming. Com o CRX, a securitização destes recebíveis em longo prazo passa a ser factível, por meio de estruturas de destinação – a plataforma emite um título de dívida, garantida por cessão fiduciária de recebíveis de assinatura. Assim, ao invés de se financiar em curto prazo, com o adiantamento de recursos via FIDC, a plataforma passa a se financiar em longo prazo, seguindo a lógica de estruturas de securitização já consolidadas no mercado.

Outra grande vantagem está na possibilidade de constituição de patrimônio separado para a operação de securitização, o que blinda os recursos e garantias da operação contra credores da securitizadora, conferindo maior segurança jurídica à operação para eventuais investidores. O mesmo valeria para outras indústrias e outros setores com fluxos de recebíveis mais ou menos previsíveis – mas aqui vale ressaltar que o credor toma um risco maior com este tipo de estrutura, dado que passa a apostar no sucesso e viabilidade econômica do devedor em longo prazo.

Contudo, vale ponderar também que o CRX não desfruta do mesmo regime tributário de CRI e CRA, exceto pela incidência de PIS/COFINS, que se equipara a de outros títulos de securitização – fato que o torna menos atraente a casas de investimento que buscam vender esses papéis no mercado secundário. Além disso, muitas indústrias possuem lastros imobiliários viáveis, como aluguel compra de imóveis, reformas, etc, o que faz a saída de financiamento via CRI ser uma opção não só viável como mais cômoda para o investidor e para as partes envolvidas.

Assim, chegamos à seguinte questão: os CRX são, de fato, o futuro da securitização? Sim. Ainda há certa resistência em aceitar o produto – não só pela insegurança que a falta de precedentes traz para uma operação, mas também pela comodidade trazida por um mercado que, por muito tempo, esteve acostumado a poucas estruturas de securitização (CRI, CRA e FIDC, em especial). Além disso, há de se considerar que a norma que os instituiu foi publicada há um ano, o que significa que o produto ainda não teve tempo de amadurecer e que os envolvidos em operações de securitização não tiveram tempo de estruturar e comercializar operações deste tipo em maior escala, e que o mercado não teve tempo para assimilar as possibilidades que este tipo de operação pode trazer para a economia como um todo. Portanto, a chave do sucesso (ou insucesso) deste produto também demanda outro elemento primordial: tempo.

Ainda há muito que ser desenvolvido para que possamos chegar ao nível de mercados mais desenvolvidos, como os Estados Unidos, mas este caminho passa, inevitavelmente, pela expansão do rol de produtos securitizados. É essa a grande importância do CRX: a possibilidade de emitir títulos securitizados com lastro em qualquer tipo de crédito permite acesso a projetos de financiamento de longo prazo, com a segurança de um patrimônio separado constituído somente para tal operação, a empresas que outrora seriam reféns do financiamento bancário de varejo, com juros altos e poucas opções de customização. Talvez não seja a forma final da securitização no Brasil, mas o CRX certamente é um passo na direção correta para o futuro do mercado de capitais no Brasil.