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CONVERSÃO DO INVENTÁRIO JUDICIAL PARA EXTRAJUDICIAL

CONVERSÃO DO INVENTÁRIO JUDICIAL PARA EXTRAJUDICIAL

Christiane Le Gentil

INTRODUÇÃO

O presente artigo visa abordar a possibilidade de ser feita a conversão do inventário judicial para o extrajudicial, desde que preenchidos os requisitos, visando, dentre outros objetivos, alcançar a celeridade do procedimento.

1. CONCEITO DE INVENTÁRIO

A palavra inventário vem do latim inventarium, de invenire, que significa catalogar, descrever, diligenciar, promover, relacionar, enumerar coisas e, quando empregado no direito sucessório, tem o significado de ato ou efeito de inventariar com a finalidade de ser realizada partilha.

Por força do princípio da saisine, aberta a sucessão, ou seja, com a morte, a herança do de cujus transmite-se de imediato aos herdeiros. Desta forma, o inventário é o procedimento que visa apurar e descrever os bens para fins de ser realizada a partilha (ou adjudicação), além de apurar a existência de dívidas e demais questões pertinentes.

O procedimento de inventário e partilha está previsto nos artigos 610 a 673 do CPC.

2. MODALIDADES DE INVENTÁRIO

O ordenamento jurídico brasileiro prevê duas espécies/modalidades de inventário, a saber:

A) Inventário Judicial: O inventário judicial é aquele que tramita perante o judiciário e pode ser realizado desta forma por mera liberalidade de escolha das partes ou quando não estiverem preenchidos os requisitos para o procedimento pela via extrajudicial (que serão melhor abordados no tópico abaixo).

O inventário judicial pode ocorrer mediante inventário litigioso ou arrolamento (sumário ou sumaríssimo/comum), conforme previsão dos artigos 659 e 664 do CPC.

B) Inventário Extrajudicial: O inventário extrajudicial é um procedimento realizado mediante escritura pública, lavrada em cartório de notas, que constitui documento hábil para realizar partilha, sendo efetuada a transmissão e transferência de bens, e podendo ser levada aos respectivos atos de registro, bem como para levantamento de quantias depositadas em bancos, por exemplo. Os requisitos originários para a realização do inventário extrajudicial são: herdeiros maiores e capazes, consenso quanto à partilha a ser realizada e inexistência de testamento.

Falamos em requisitos originários pois tais requisitos têm sido mitigados e flexibilizados em alguns Estados, especialmente o Estado do Rio de Janeiro (Provimento CGJ/RJ nº 87/2022), permitindo a realização do inventário extrajudicial mesmo quando há testamento (desde que feito o R.A.C) e mesmo quando existirem herdeiros menores ou incapazes, desde que observadas algumas regras.

Importante ressaltar que o inventário extrajudicial é facultativo, não podendo ser imposto às partes.

3. A POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO INVENTÁRIO JUDICIAL PARA O EXTRAJUDICIAL

Após iniciado o inventário judicial, caso as partes interessadas desejem e desde que atendidos os requisitos, poderão converter o procedimento para a via extrajudicial.

Esta possibilidade está claramente autorizada no artigo 2º da Resolução nº 35/2007 do CNJ, que assim dispõe:

Art. 2º É facultada aos interessados a opção pela via judicial ou extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo de 30 dias, ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial.

Em alguns casos, buscando pela celeridade, a conversão pode se mostrar bastante vantajosa. Contudo, caberá ao advogado realizar a análise do caso de forma individual, considerando as peculiaridades do caso concreto e as fases já percorridas no processo judicial para avaliar sobre a vantagem ou não da conversão.

Havendo a opção pela conversão, o (s) advogado (s) das partes, sobretudo da (o) inventariante, deverá apresentar petição nos autos pugnando pela desistência do processo judicial, solicitando a extinção e arquivamento, justificando e fundamentando acerca da alteração do procedimento para a via extrajudicial. Recomenda-se, ainda, que seja apresentada cópia do processo judicial ao tabelionato de notas onde será lavrada a escritura pública de inventário e partilha.

Importante salientar que no Estado do Rio de Janeiro vigora a Lei nº 9.091/2020 que prevê o afastamento da aplicação da multa referente ao ITD nos casos em que houver a conversão do inventário judicial – aberto dentro do prazo de 02 (dois) meses a contar da data da abertura da sucessão – para o extrajudicial. Vejamos:

Art. 1º Altera a Lei nº 7.174, de 28 de dezembro de 2015, modificando o Inciso I do artigo 37 e acrescentando os §§ 5º e 6º, que passam a vigorar com as seguintes redações:

“Art. 37 O descumprimento das obrigações previstas nesta Lei (…)

5º O contribuinte que, após realizar a abertura do processo judicial de inventário e partilha – dentro do prazo regulamentar de 2 (dois) meses a contar da data de abertura da sucessão –, optar pela substituição da via judicial pela extrajudicial, fica isento da Multa prevista no inciso I, bem como de qualquer multa decorrente da substituição desta.

Outra questão que se apresenta ainda duvidosa, é acerca de eventual condenação ao pagamento das custas judiciais finais em caso de pedido de desistência do processo judicial, questão essa que ainda não encontra previsão em lei e nem mesmo está pacificada nos Tribunais, havendo entendimentos diversos. Pelo raciocínio lógico, não se mostraria adequada a cobrança de custas judiciais nesse caso. Neste sentido, segue decisão do TJRS:

“TJRS. 70059463588/RS. J. em: 05/06/2014. APELAÇÃO. INVENTÁRIO. DESISTÊNCIA. CUSTAS FINAIS. É direito de pessoas maiores e capazes OPTAR por fazer inventário na VIA EXTRAJUDICIAL, e desistir do inventário judicial. Nesse contexto, NÃO FAZ NENHUM SENTIDO condenar ao pagamento de custas finais aqueles que desistem da via judicial para buscar a via extrajudicial. Tal condenação acabaria por ONERAR EM DOBRO AS PARTES, o que fatalmente seria desestímulo ao desafogamento do Poder Judiciário, justamente o que a Lei pretendia obter com a criação e a abertura da possibilidade de fazer partilha de forma extrajudicial. De resto, manifestada a opção pela via extrajudicial, e pedida a desistência da ação de inventário depois de apenas ter havido nomeação de inventariante, tem-se por rigor a conclusão de que NÃO CABE CONDENAÇÃO EM CUSTAS finais pela homologação da desistência. DERAM PROVIMENTO”.

CONCLUSÃO

Através da abordagem do presente artigo, é possível concluir pela possibilidade de conversão do inventário judicial em extrajudicial, devendo o operador do Direito analisar o caso em concreto para verificar o atendimento dos requisitos, bem como se essa modificação seria vantajosa às partes interessadas. Ressalta-se que é obrigatória a condução do procedimento extrajudicial com a assistência de advogado (a).

REFERÊNCIAS

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Provimento nº 35 de 24/04/2007. Disponível em https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/179. Acesso em 26 set. 2023.

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Provimento nº 87/2022. Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro – Parte Extrajudicial. Disponível em: http://www1.tjrj.jus.br/gedcacheweb/default.aspx?GEDID=00038F49138D2A951732394F2DA8142EA3EF11C407183…. Acesso em 26 set. 2023.

ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Lei nº 9.091/2020. Disponível em http://www.fazenda.rj.gov.br/sefaz/faces/oracle/webcenter/portalapp/pages/navigation-renderer.jspx?_…. Acesso em 27 set. 2023.

ROSA, CONRADO PAULINO DA. Inventário e Partilha / Conrado Paulino da Rosa, Marco Antonio Rodrigues – Salvador: Editora JusPodivm, 2019.

CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Inventário e Partilha: judicial e extrajudicial – Rio de Janeiro: Editora Forensa, 2019.

MINICURRÍCULO

Texto de autoria de Christiane da Luz Le Gentil. Advogada especialista e atuante na área do Direito das Famílias e Sucessões e Direito Imobiliário. Membro da Comissão de Direito das Famílias e Sucessões da ABA/RJ e coordenadora do grupo de estudos de Atuação Extrajudicial na referida Comissão. Coordenadora Especial de Expansão da ABA RJ Estadual. Membro da Comissão de Alienação Parental da AFACC. Membro da Comissão Nacional de Advocacia Extrajudicial da ABA. Membro da Comissão de Advocacia Extrajudicial em Cartório da OAB/RJ. Pós-graduada em Direito de Família e Sucessões pela UCAM. Associada ao IBDFAM. Cofundadora no NitJur.