CONTRATO DE NAMORO E A DIFERENÇA PARA A UNIÃO ESTÁVEL
Geisilene Aparecida de Amorim Caldas
É de ciência de todos que já se passaram mais de um ano desde que fomos levados a convivência diária na maioria das residências brasileiras por até 24 horas por dia dentre familiares. Estamos, assim, diante do chamado confinamento ou quarentena trazido com o momento em que vivemos no mundo. E é nesse contexto, então, que o contrato de namoro surge como uma opção a diversos casais.
Muitos casais, na tentativa de não se exporem em demasiado a uma possível contaminação do novo coronavírus, decidiram passar mais tempo juntos e se unir também em forças e objetivos de atravessar o momento. Para tal, foram morar juntos. Contudo, com isso vieram outras implicações, como a possível constituição de uma união estável.
Por essa razão, explico mais a fundo que é o contrato de namoro e por que tanto se fala nele.
Antes de entendermos o que é o contrato de namoro, no entanto, faz-se necessário assinalar o significado da palavra namoro. Vejamos, então:
Ato ou efeito de namorar; namoração.
Relação amorosa, geralmente estável, entre duas pessoas; rabicho: “[…] o namoro é essa encantadora primeira fase do eclipse do casamento, essa meia ação da simpatia que se funde em desejo […]” (JR).
Aquele ou aquela que uma pessoa namora; namorada(o): Sonhava com um namoro bonito e de bom caráter, com quem pudesse casar-se.
1 O QUE É O CONTRATO DE NAMORO: POR QUE E COMO FAZER?
Na última década as relações interpessoais mudaram bastante. Isto se deve, também, à facilidade com que se pode encontrar um par em aplicativos. Assim, as relações se estreitaram, e um simples encontro pode se transformar rapidamente em uso compartilhado de cartões de crédito, uma conta digital conjunta, semanas na casa de um e outro, pagamento de contas pessoais de um para outro e o dormir e acordar juntos dias seguidos, bem como é claro a usual mudança de status nas redes sociais, sem falar nos milhares de selfies e fotos contando o dia a dia do casal.
MAS O QUE É O CONTRATO DE NAMORO?
O contrato de namoro é um documento que resguarda o casal dos efeitos da união estável, como partilha de bens, pensão, direitos sucessórios em caso de falecimento entre outros. Isso significa que esse documento declara que o relacionamento não é uma união estável, protegendo os bens de cada um dos contratantes (fonte: Cartório Antonio do Prado).
Como explica Marília Xavier, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM:
O contrato de namoro pode ser entabulado pelas partes justamente para aclarar que, apesar do casal viver um relacionamento público, contínuo e duradouro, não reconhecem ali a existência de uma família, de uma união estável. Felizmente, o Poder Judiciário brasileiro tem reconhecido que namoros longos, assim chamado ‘namoros qualificados’, não se confundem com união estável
Depreende-se das explicações acima que é uma busca de duas pessoas adultas em aclarar para a sociedade que não pretendem constituir família, na tentativa de não se enquadrar no artigo 1.723 do Código Civil Brasileiro, mesmo vivendo em público juntos de forma contínua e duradoura.
CONTRATO DE NAMORO E UNIÃO ESTÁVEL
2 QUEM PODE ASSINAR UM CONTATO DE NAMORO
Para a confecção desta declaração mútua de vontades, por óbvio, quem tem a intenção é maior de 18 anos e precisará se expressar perante um tabelião ou tabeliã de posse cada um de seus RG e CPF. Tendo em vista a restrição de pessoas em cartórios para este fim na maioria do país, tal ato pode ser feito virtualmente. Conforme orienta o presidente do Colégio Notarial do Brasil – Seção Bahia, Giovani Gianellini.
Para recorrer a qualquer ato eletrônico, a pessoa interessada deve procurar uma tabeliã ou tabelião da sua confiança, que vai orientar como acessar o sistema e providenciar a documentação.
Com o advento desta modalidade, sim, é possível buscar deixar cristalino qual é o propósito da união através do namoro e na situação pandêmica atual, pode se contrair estando em casa na segurança sanitária e seguindo os protocolos de saúde.
3 QUAL A DIFERENÇA ENTRE NAMORO E UNIÃO ESTÁVEL?
O contrato de namoro é uma ferramenta para tentar ilidir o compromisso de ser a união equiparada a um casamento civil, proteger o patrimônio com fito de não haver direitos sucessórios em caso de falecimento de uma das partes e assinalar a dependência financeira dos então namorados que apenas resolveram viver sob o mesmo teto sem intenção de constituir família.
A união estável por sua vez e a união pública, notória, duradoura com a intenção de constituir família, conforme reza o artigo 1.723 do CC:
TÍTULO III
DA UNIÃO ESTÁVEL
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
A intenção de constituir família não precisa estar registrada: é uma situação informal. O estado civil das partes, portanto, não se altera. Ou seja, cada um segue casado, solteiro ou viúvo, mas vivem sob o mesmo teto, tem em comum um ser beneficiário no plano de saúde do outro, conta conjunta, o patrimônio é partilhado, existe esforço comum e gera direito de herança, pensão e partilha de bens.
4 O CONTRATO DE NAMORO E A FIGURA DO “NAMORO QUALIFICADO”
A união estável se equipara a um casamento civil. E pode ser provada, dessa forma, através de prova documental, a existência de um filho ou mais e prova testemunhal. E isto a difere, assim, do que a jurisprudência entende, atualmente, do chamado “namoro qualificado”, conforme a seguir:
Sobre o tema, a Terceira Turma do STJ, no REsp 1454643/RJ, confirmou essa diferenciação entre união estável e “namoro qualificado”, apontando as características da união estável, onde “há, necessariamente, o compartilhamento de vidas e de esforços, com integral e irrestrito apoio moral e material entre os conviventes”.
Resta salientar que, existe muita polêmica em torno do contrato de namoro, haja vista ser uma prática recente dos últimos cinco anos. Este mecanismo não pode ser usado para simular uma situação que não existe na realidade, e se a vida comum do casal for comprovadamente uma união estável, este documento não pode sobrepor à realidade fática. Desse modo, anula-se o contrato.
5 “SERÁ QUE SOMOS UM CASAL TÃO MODERNO ASSIM”: O CONTRATO DE NAMORO EVITA TODOS OS PROBLEMAS?
Nos dias atuais fica um pouco complicado afirmar o que é um casal moderno, modesto, tradicional ou antigo. As pessoas se doam em um grau de intimidade aproveitando o advento da tecnologia com trocas de fotos, mensagens de diversa natureza dentre outras exposições na internet.
É importante dizer ainda que a vida virtual costuma ser representação da vida real, o que pode ser tido como forma de prova de que estiveram em um período juntos o casal e partilharam uma vida comum.
O contrato de namoro, apesar de ser polêmico, pode ajudar a fazer prova de que existiu um “namoro qualificado” e conseguinte afastar a equiparação a união estável e a partilha de bens.
Não existe segurança blindada para nenhum ato na vida, viver é se arriscar, se emocionar, buscar felicidade, viver momentos de tristeza, ter ganhos, ter perdas, viver é arriscar, amar e se entregar a um relacionamento é algo genuíno e que vale a pena enquanto dure.
O que se espera que dure por muitos anos e se consolide, não é o contrato um ato de desconfiança, muitas vezes pode ser buscado por pessoas que já são divorciadas e não pretendem ter o compromisso de casamento ou equiparação a este.
Vamos, portanto, buscar o principal com ou sem contrato, ter relacionamentos saudáveis que nos transborde alegrias na maior parte e não seja abusiva nem tóxica. Afinal, a situação pandêmica atual nos remete a olhar a vida com mais leveza e busca dar valor e amor ao que realmente interessa, ou seja, estar junto de quem se ama e quer bem.