CONSIDERAÇÕES SOBRE A PROVA EMPRESTADA NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
Cirilo Augusto Vargas
SUMÁRIO: Introdução – 1. Instrução processual e contraditório – 2. Processo, justiça e verdade – 3. O livre convencimento motivado foi extinto do processo civil brasileiro? – 4. A prova emprestada no CPC/2015 – Síntese conclusiva – Referências.
INTRODUÇÃO
No atual estágio de desenvolvimento do Direito Processual, o ato de provar consiste em se valer dos meios permitidos pela lei para influir na convicção do juiz, acerca de questão fática que ampara a pretensão. Em um procedimento regido pela dialética (processo),([1]) a utilização da prova remete à participação decisiva das partes na construção das decisões judiciais. Luigi Paolo Comoglio (1998, p. 120), ao tratar do exercício do poder probatório, sob a ótica constitucional, afirmou que as relações entre as partes e o juiz, na instrução da causa, representam o ponto nevrálgico de qualquer modelo processual, constituindo uma relevante fonte de prova de sua eficiência. Elas representam também um terreno de delicada verificação da efetividade das garantias constitucionais inerentes ao processo.
Entende-se que o direito à prova constitui prerrogativa fundamental extraída da Constituição Federal (art. 5º, LV), como meio inerente à ampla defesa. Seu caráter fundamental também decorre da sua finalidade, “que é criar as condições necessárias para uma existência digna e para a efetiva participação na tomada de decisões no seio do Estado (democracia)”. (ALMEIDA, 2011, p. 182).
Sabe-se, contudo, que não existem direitos fundamentais absolutos. O direito à prova não pode ser considerado irrestrito, ilimitado, porque, de um lado, o próprio Texto Constitucional qualifica como inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI)([2]) e, de outro lado, não existe uma verdade absoluta a ser atingida por meio da instrução processual, que cuida da reconstrução fática possível, dentro das balizas procedimentais fixadas pelo legislador.
Quanto à prova emprestada, que consiste no “aproveitamento de atividade probatória anteriormente desenvolvida, mediante traslado dos elementos que a documentaram” (TALAMINI, 1998, p. 146), em nome da economia processual, da celeridade e da difícil (ou impossível) repetição da prova,([3]) sobreleva a necessidade de serem observados requisitos próprios para sua admissibilidade, especialmente no que concerne à preservação do contraditório.
Fato é que o art. 372 do CPC/2015, a despeito da sua redação objetiva (ou em razão dela), não fornece respostas para algumas situações práticas. Estando há muito superado o brocardo in claris cessat interpretatio, é importante que façamos as indagações pertinentes e busquemos respondê-las, nos estreitos limites deste trabalho.
1 INSTRUÇÃO PROCESSUAL E CONTRADITÓRIO
Visando o gozo real e não meramente formal da tutela jurisdicional, a Constituição da República de 1988 prescreve o princípio da inafastabilidade da jurisdição como direito básico (art. 5º, XXXV) e é enfática ao assegurar aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (art. 5º, LV).
A noção de contraditório como “princípio da audiência bilateral”, comumente abordado sob a perspectiva “estática” (THEODORO JR., 2010, p. 69) de que “ao réu terá que ser garantida a oportunidade de defender-se” (SANTOS, 1967, p. 387), passa por releitura doutrinária, jurisprudencial e legislativa. Para José Manuel Lebre de Freitas (1996, p. 96-97), professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, tal garantia se concretiza mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão. O escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de incidir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo.
Precedente da maior relevância foi formado pelo STF em 2004, após julgamento do MS nº 24.268/MG,([4]) no qual se debateu sobre a extensão do devido processo legal e da garantia do contraditório a processos de natureza administrativa. O Ministro Gilmar Ferreira Mendes destacou em seu voto o caráter “tridimensional” da pretensão à tutela jurídica e, com amparo na doutrina alemã, ponderou sobre a feição ampliada do contraditório, a partir da leitura da Constituição Federal de 1988:
Apreciando o chamado Anspruch auf rechtliches Gehör (pretensão à tutela jurídica) no Direito alemão, assinala o Bundesverfassungsgericht que essa pretensão envolve não só o direito de manifestação e o direito de informação sobre o objeto do processo, mas também o direito de ver seus argumentos contemplados pelo órgão incumbido de julgar (Cf. Decisão da Corte Constitucional alemã BVerfGE 70, 288-293; sobre o assunto, ver, também, Pieroth e Schlink, Grundrechte – Staatsrecht II, Heidelberg, 1988, p. 281; Battis, Ulrich, Gusy, Christoph, Einführung in das Staatsrecht, 3. edição, Heidelberg, 1991, p. 363-364).
Nota-se que o Código de Processo Civil de 2015 – voltado para a concretização da efetividade, da boa-fé e da cooperação processual – encampou a teoria do contraditório dinâmico (material), o que é louvável e consentâneo com as normas constitucionais que regem a matéria.([5]) Podemos indicar, sem pretensão exauriente, a superação do contraditório estático (formal) nos arts. 10 (coíbe as denominadas “decisões-surpresa”, nos moldes do art. 3º, § 3º, do Código de Processo Civil Português), 369 (expressa o exercício do contraditório como poder de influência sobre a convicção do juiz, decorrente da atividade instrutória) e 489, § 1º, IV (consagra a ideia de que o provimento jurisdicional deve ser fruto da argumentação produzida pelas partes no curso do procedimento dialético).
Tamanha é a conexão entre o contraditório e a atividade instrutória que o legislador português, nas disposições gerais do CPC referentes à prova (art. 415), faz menção ao princípio da audiência contraditória, com dois dispositivos específicos, sendo eles:
1 – Salvo disposição em contrário, não são admitidas nem produzidas provas sem audiência contraditória da parte a quem hajam de ser opostas.
2 – Quanto às provas constituendas, a parte é notificada, quando não for revel, para todos os atos de preparação e produção da prova, e é admitida a intervir nesses atos nos termos da lei; relativamente às provas pré-constituídas, deve facultar-se à parte a impugnação, tanto da respetiva admissão como da sua força probatória.
Há mais de três décadas José Carlos Barbosa Moreira (1984, p. 65) já ponderava sobre a necessidade de permitir às partes “influir no desfecho do processo, tornando-lhes possível […] uma colaboração prestadia no trabalho de esclarecimento dos fatos e na formação do material probatório a cuja luz tratará o juiz de reconstruí-los”. Dessa dinâmica – hoje regida pelo art. 6º do CPC/2015 (princípio da cooperação)([6]) – “avulta o respeito escrupuloso do chamado princípio do contraditório”.
2 PROCESSO, JUSTIÇA E VERDADE
Processo é procedimento discursivo de origem constitucional (regido pelos princípios do contraditório, da ampla defesa e da isonomia) por meio do qual se deve exercer a jurisdição. Por intermédio do processo, adverte Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira (2000, p. 165), garantem-se “direitos de participação e condições procedimentais que possibilitam a geração legítima do provimento jurisdicional”. No Brasil, como não foi adotado o modelo norte-americano de provimento de juízes pelo voto popular, sustentou-se a legitimidade da jurisdição na sua suposta qualidade de ‘função pacificadora’, servindo o processo como “meio efetivo para a realização da justiça” (GRINOVER et al., 2008, p. 43). Reputamos superado tal entendimento, na medida em que, por ser ideológica, a ideia de justiça traduz os interesses dos grupos detentores do poder e é utilizada para a manutenção dessa relação de poder. A noção subjetiva do justo não condiz com a democracia, porque qualifica sociedades, condutas e homens como bons ou ruins, legitimando a repressão e o arbítrio como formas idôneas de manutenção de qualquer ordem política ou econômica. A justiça torna-se o respaldo da segurança, o sinônimo das ações arbitrárias que aparecem para manter uma ordem supostamente justa. Assim, nos defrontamos com o tríptico da justiça do opressor: a justiça, a ordem e a segurança do Estado (AGUIAR, 1995, p. 21).
A racionalidade das decisões jurisdicionais decorre não da sua capacidade de realizar a justiça social e assegurar o bem comum, mas de uma “legitimação procedimental que encontra no irrestrito acesso ao Judiciário, no contraditório, na publicidade e na fundamentação os mais altos desígnios da legitimidade democrática.” (RIBEIRO; SCALABRIN, p. 64). Nas palavras do professor da UFMG Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves (2002, p. 56),
A jurisdição, como função estatal, tem como objetivo a atuação da vontade do direito objetivo, buscada através da técnica, sendo indevido sustentar que, além do escopo jurídico, a jurisdição está dotada de finalidades sociais e políticas. Os aspectos metajurídicos do processo (em consequência, da jurisdição) estão sintonizados na lei material, mas não na lei instrumental.
Dentro da nossa linha de raciocínio, é difícil sustentar, de um lado, que o objetivo maior do processo seja a “efetivação da justiça” (independentemente do sentido que se atribua ao termo, diante da sua enorme carga subjetiva) e, de outro lado, que “não se pode falar em efetiva produção da justiça sem que se descortine a verdade” (BARROS, 2002, p. 22).
Qual é o conceito jurídico de prova? A finalidade precípua da prova é atingir a verdade, seja ela “material” ou “formal”? E ainda, por mais exauriente e bem conduzida que seja uma instrução processual, o resultado dos trabalhos pode revelar a verdade dos fatos ao juiz? Vejamos. Sobre o significado do termo “prova” no Código de Processo Civil de 2015, André Cordeiro Leal e Vinícius Lott Thibau (2016, p. 100) argumentam:
Ao reproduzir os equívocos e indistinções de que padece o Código de Processo Civil de 1973, um dos pontos mais obscuros do Novo CPC talvez esteja no tratamento que dispensa ao instituto da prova. Vê-se que a prova ora é entendida como meio, ora como atividade ou como resultado, a despeito de, em qualquer dessas significações, estar sempre destinada à formação da convicção judicial sobre a verdade dos fatos afirmados e negados no procedimento.([7])
No que concerne à obtenção da verdade via instrução processual, é interessantíssima a colocação de Michele Taruffo, reproduzida por Auri Lopes Jr. (2012, p. 538), pertinente ao Processo Penal, porém útil ao desenvolvimento do nosso raciocínio:
Além da função persuasiva em relação ao julgador, as provas servem para “fazer crer” que o processo penal determina a “verdade” dos fatos, porque é útil que os cidadãos assim o pensem, ainda que na realidade isso não suceda, e quiçá precisamente, porque na realidade essa tal verdade não pode ser obtida, é que precisamos reforçar essa crença.
Na mesma esfera de raciocínio pontifica Hermes Zaneti Jr. (2004, p. 338), ao sustentar que “a verdade absoluta no processo civil não pode ser jamais atingida”. Segundo ele, o que se obtém é, no máximo, um juízo de probabilidade, uma verdade provável. Este juízo de verossimilhança, que aporta ao final do processo com alto grau de probabilidade de ser verdadeiro, é alçado à certeza com o trânsito em julgado da decisão, erigindo-se em um patamar de certeza jurídica. Com efeito, a doutrina é uníssona ao apontar que “[…] como a certeza absoluta é sempre inatingível, precisa o operador do sistema conformar-se com a probabilidade, cabendo-lhe a criteriosa avaliação da probabilidade suficiente”.
O que está ao alcance do juiz é apenas a reprodução dos fatos pretéritos transcritos nas alegações das partes (naturalmente tendenciosas) e depurados pelo contraditório. Não obstante, o novo CPC (ainda) trabalha com o modelo de julgador “descobridor da verdade”, figura consagrada expressamente no art. 378, segundo o qual “Ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade”.
Esbarra-se em um ponto criticado pela doutrina: o mito da “verdade real”. Felipe Martins Pinto, em sua obra Introdução crítica ao Processo Penal (2012, p. 155), faz digressão histórica sobre o tema e ensina o seguinte:
A verdade real assumiu na Inquisição a condição de finalidade da atividade processual e se sedimentou como um dos eixos estruturantes do processo inquisitório, uma vez que fornecia o estofo para fundamentar todos e quaisquer abusos e violações praticados para a aferição do fato ocorrido.
O julgador que busca a verdade real corre o risco de divagar ao infinito e romper sua posição de terceiro, invadindo o território dos verdadeiros contraditores. Sob a justificativa de alcançá-la, o juiz se legitima a suprir, por si mesmo, a atividade probatória de uma das partes, em favor da tese que lhe pareça mais “verdadeira”. Trata-se de anomalia decisória já reconhecida pela doutrina, denominada confirmation bias (NUNES; DELFINO, 2015).
Luigi Ferrajoli, no prólogo da obra clássica de Nicolás Guzmán intitulada La verdad en el proceso penal (2006), afirma que a verdade absoluta somente é passível de ser alcançada nas ciências analíticas (Matemática e Lógica, por exemplo). O conhecimento empírico (no qual se enquadra aquele adquirido pelo juiz na condução do procedimento em contraditório) consiste em um processo ininterrupto de aproximação da verdade por meio do erro e do acerto, em condições de produzir verdades aproximativas, relativas, probabilísticas, provisórias, destinadas a serem aperfeiçoadas (ou refutadas) por meio do progresso investigativo.
Com isso, a expressão “verdade real” deve ser substituída por outra mais adequada à realidade democrática. As expressões “verdade aproximada”, “verdade provável” ou “juízo de probabilidade” são terminologicamente compatíveis com o diálogo jurídico estabelecido pela via do processo.
3 O LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO FOI EXTINTO DO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO?
O “Código Buzaid” de 1973 dispunha, em capítulo pertinente ao magistrado, que “O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento” (art. 131). A norma versava expressamente sobre o princípio do livre convencimento motivado (ou princípio da persuasão racional). O CPC/2015 assim regulamentou o tema, dentro do capítulo das provas: “O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento” (art. 371). Para José Eduardo de Melo Vilar Filho (2006, p. 46), a alteração do sistema da prova legal para o sistema do livre convencimento motivado fez com que a questão da prova saísse de uma dimensão estritamente jurídica, na medida em que atribuiu ao juiz, e não mais ao legislador, a função de valorar a prova.
Durante longo período, o livre convencimento viabilizou a prolatação de decisões de duvidosa constitucionalidade,([8]) em detrimento da lógica participativa de construção de provimentos, encampada abertamente pelo legislador do atual CPC (que, conforme salientamos, optou por atribuir especial valor aos princípios do contraditório, da cooperação([9]) e da boa-fé processual).
Passemos, então, à indagação que serve como título para este tópico: a Lei Federal nº 13.105/2015 expurgou o princípio do livre convencimento motivado do sistema processual civil brasileiro ou a norma vigente permite a aplicação do postulado, independentemente da alteração textual? A leitura da Exposição de Motivos do Código (2010, p. 19) não fornece resposta segura. Vejamos:
Se, por um lado, o princípio do livre convencimento motivado é garantia de julgamentos independentes e justos, e neste sentido mereceu ser prestigiado pelo novo Código, por outro, compreendido em seu mais estendido alcance, acaba por conduzir a distorções do princípio da legalidade e à própria ideia, antes mencionada, de Estado Democrático de Direito.
Lenio Streck (2015, p. 34) é categórico ao defender a ocorrência de extinção do princípio no CPC/2015. Vejamos os argumentos por ele invocados:
Travei uma batalha contra o poder discricionário, travestido de livre convencimento, que infestava o Projeto em sua redação original. Dizia eu que de nada adiantará exigir do juiz que enfrente todos os argumentos deduzidos na ação (vejam-se os artigos 499 e seguintes do Projeto) se ele tiver a liberdade de invocar a “jurisprudência do Supremo”, que afirma que o juiz não está obrigado a enfrentar todas as questões arguidas pelas partes. Dá-se com uma mão e tira-se com a outra (STRECK, 2013).
De há muito venho alertando a comunidade jurídica para esse problema do protagonismo judicial, que deita raízes em uma questão paradigmática e não meramente “técnica”. […].
Depois de muita discussão, o relator do Projeto, Dep. Paulo Teixeira, obtendo a concordância de um dos protagonistas do Projeto, Fredie Didier, aceitou minha sugestão de retirada do livre convencimento. Considero isso uma conquista hermenêutica sem precedentes no campo da teoria do direito de terrae brasilis. O Projeto, até então, adotava um modelo solipsista stricto sensu, corolário do paradigma epistemológico da filosofia da consciência […].
Fernando da Fonseca Gajardoni (2015) adota tese contrária. Para o professor da USP, a ausência, no NCPC, de dispositivo correspondente ao art. 131 do CPC/1973, não pode levar à conclusão de que no Brasil não mais vigora o princípio do livre convencimento motivado. Ele afirma que:
O fato de não mais haver no sistema uma norma expressa indicativa de ser livre o juiz para, mediante fundamentação idônea, apreciar a prova, não significa que o princípio secular do direito brasileiro deixou de existir. E não deixou por uma razão absolutamente simples: o princípio do livre convencimento motivado jamais foi concebido como método de (não) aplicação da lei; como alforria para o juiz julgar o processo como bem entendesse; como se o ordenamento jurídico não fosse o limite. Foi concebido, sim, como antídoto eficaz e necessário para combater os sistemas da prova legal e do livre convencimento puro, suprimidos do ordenamento jurídico brasileiro, como regra geral, desde os tempos coloniais.([10])
Não paira dúvida de que a crescente preocupação com a adequação constitucional das decisões judiciais pôs em xeque a validade do sistema. E as razões são nítidas. Se o sentido atual de contraditório passou a ser, conforme ressaltou Lebre de Freitas (1996, p. 96-97), a influência das partes na construção do provimento, o princípio da livre persuasão racional pode gerar problemas. O ato judicial de ‘indicar os motivos’ não coíbe, por si só, a arbitrariedade. Isso porque a decisão pode ser prolatada com base em fato ou circunstância extraída dos autos, porém alheia ao debate entre as partes (como ocorre na “decisão-surpresa”, vedada pelo art. 10 do CPC). Sobre o tema trazemos a lição do professor Humberto Theodoro Júnior (2015, p. 869), dada sua particular clareza e precisão:
De fato, na constitucionalização do processo democrático, no Estado contemporâneo, não cabe mais pensar-se num comando processual apoiado no “livre convencimento” e na “livre apreciação da prova” a cargo do juiz, pelo risco que tais critérios trazem de gerar “decisões conforme a consciência do julgador”, quando se sabe que toda evolução do Estado Constitucional contemporâneo se deu no sentido de que, no processo, as decisões judiciais não devem ser tomadas a partir de critérios pessoais, isto é, a partir da consciência psicologista […] A justiça e o Judiciário não podem depender da opinião pessoal que juízes e promotores tenham sobre as leis ou fenômenos sociais, até porque os sentidos sobre as leis (e os fenômenos) são produto de uma intersubjetividade, e não de um indivíduo isolado.
A nosso ver, o livre convencimento motivado assumiu um novo significado, em prol da segurança jurídica. Há duas razões que sustentam tal assertiva.
De um lado, o próprio CPC/2015 fornece instrumentos para que o magistrado tenha liberdade na trajetória intelectual de formação da sua convicção. Um exemplo está no art. 375, segundo o qual “o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece”. Tais noções (ou máximas), derivadas diretas da intuição, do saber tácito e do senso comum, são dotadas de enorme fluidez espacial e sociocultural. Seu uso desvirtuado pode, não há dúvida, comprometer a imparcialidade.
De outro lado, a nova lei processual, além de realçar o princípio do contraditório e da publicidade das decisões judiciais, prescreveu, em seu art. 489, “elementos essenciais da sentença” e requisitos específicos para caracterização da fundamentação idônea. Logo, se persiste a liberdade na valoração da prova pelo magistrado (etapa decisória imune à fiscalização), não será legítima a conclusão, lançada no provimento, divorciada das teses e antíteses sustentadas pelas partes no curso do procedimento (art. 489, § 1º, IV).
Resumindo: se o que importa, para fins de controle público (justificação) é o argumento técnico-jurídico materializado no corpo do decisum e ele está submetido a balizas claras definidas pelo legislador, é de se questionar se a expressão “livre convencimento motivado” não constitui, na verdade, uma contradição em termos: se é motivado o convencimento exposto, ele não pode ser livre.
4 A PROVA EMPRESTADA NO CPC/2015
Do ponto de vista estritamente normativo, o art. 372 do CPC/2015 representa inovação. Contudo, segundo adverte Humberto Theodoro Júnior (2015, p. 904), doutrina e jurisprudência já admitiam, independentemente do silêncio do CPC/73,
a utilização da prova emprestada, fosse porque a lei permitia o emprego de “todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos” para provar a verdade dos fatos em que se funda a ação ou a defesa (art. 332, CPC/1973), fosse por força dos princípios da economia processual e celeridade nos julgamentos.
Ante o laconismo do citado dispositivo legal,([11]) emergem as seguintes questões práticas:
1) Sob qual forma a prova emprestada ingressa no segundo processo?
2) Admite-se o empréstimo de provas produzidas em procedimentos administrativos não sujeitos ao contraditório?
3) O uso da prova emprestada está restrito a processos em que figurem partes idênticas?
4) Há necessidade de se preservar o contraditório no processo de origem e também no processo para o qual a prova se destina?
5) O empréstimo da prova pode ocorrer mediante iniciativa do juiz?
De antemão convém sublinhar que a prova emprestada não configura uma espécie de prova. Ela não se inclui entre as provas típicas ou atípicas do Processo. Trata-se da forma ou do modo pelo qual uma prova ingressa nos autos (HUNGRIA, 2012, p. 72).
Passando à análise das questões propostas, independentemente da forma assumida pela prova constituída no feito originário – oral, pericial ou de inspeção judicial – “a prova emprestada ingressa no segundo processo sob a forma de documento”. (TALAMINI, 1998, p. 146 e THEODORO JR., 2015, p. 905).
Há que se atentar, contudo, para a diferença existente entre forma assumida pela prova emprestada e valor do documento trasladado, este variável em decorrência da análise judicial.([12]) Eis a lição de Talamini a respeito desta nuance (1998, p. 147):
O juiz, ao apreciar as provas, poderá conferir à emprestada precisamente o mesmo peso que esta teria se houvesse sido originariamente produzida no segundo processo. Eis o aspecto essencial da prova trasladada: apresentar-se sob a forma documental, mas poder manter seu valor originário. É tal diversidade que confere à prova emprestada regime jurídico específico – o qual não se identifica com o da prova documental nem com o da prova que se emprestou, em sua essência de origem. Bem por isso, o traslado de prova documental já apresentada em outro processo não constitui “prova emprestada”. Não há, nesse caso, o contraste entre forma e valor potencial.
O CPC Português dispõe de forma bastante esclarecedora sobre o valor da prova emprestada. Ele associa a confiabilidade do documento ao grau de respeito pelo contraditório na produção da prova no feito originário. Nos termos da norma lusitana, é possível que o material transposto nem chegue a ser qualificado como prova, mas sim como “princípio de prova” (trata-se, portanto, de uma prova em potencial ou mero indício). Vejamos:
Artigo 421º
Valor extraprocessual das provas
1 – Os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no nº 3 do artigo 355º do Código Civil; se, porém, o regime de produção da prova do primeiro processo oferecer às partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos e perícias produzidos no primeiro só valem no segundo como princípio de prova.
2 – O disposto no número anterior não tem aplicação quando o primeiro processo tiver sido anulado, na parte relativa à produção da prova que se pretende invocar.
Quanto à admissão como prova emprestada de elementos produzidos em procedimentos administrativos não dialéticos, a jurisprudência tem se mostrado permissiva, em contrariedade ao texto expresso do CPC (que faz remissão a “outro processo”) e a parcela da doutrina (TALAMINI, 1998, p. 152; GRINOVER, 1996, p. 57).
Em 2008, o STF permitiu que dados obtidos em interceptação telefônica, judicialmente autorizada em investigação criminal, bem como documentos colhidos na mesma investigação, possam ser usados em procedimento administrativo disciplinar, contra a mesma ou as mesmas pessoas em relação às quais foram colhidos, “ou contra outros servidores cujos supostos ilícitos teriam despontado à colheita dessas provas”.([13]) O Superior Tribunal de Justiça, a partir do citado precedente, decidiu que “inexiste ilegalidade na propositura da Ação de Improbidade com base nas apurações feitas em inquérito policial, as quais deverão ser submetidas ao contraditório durante a fase instrutória”.([14])
Daniel Amorim Assumpção Neves (2016, p. 672) entende que “não sendo o inquérito civil ou policial um processo, mas um mero procedimento investigativo, uma previsão expressa que condiciona o empréstimo da prova a sua produção em outro processo é promessa certa de polêmica”. E mais:
Particularmente, entendo que a novidade legislativa não será suficiente para alterar a atual jurisprudência. O caminho mais simples, ainda que tecnicamente incorreto, será afirmar que a prova não está sendo tecnicamente emprestada, mas somente aproveitada na ação judicial, de forma a ser inaplicável o art. 372.
Tal assertiva comporta três observações. Em primeiro lugar, a jurisprudência contrária à lei não deve ser tolerada no sistema de Civil Law. Sua prevalência viola os princípios da legalidade e da separação dos Poderes.
Em segundo lugar, se a prova extraída de um procedimento é “aproveitada” em um processo judicial, mas não na qualidade de prova emprestada (pela ausência de contraditório na sua obtenção), ela só pode ser considerada conhecimento privado do juiz (GRINOVER, 1996, p. 59), ou seja, informação adquirida fora do processo por via distinta da regular atividade instrutória. (BARBOSA MOREIRA, 1980, p. 61). Talamini (1998, p. 159) observa que ausentes os requisitos constitucionais para a admissão da prova emprestada, não é concebível nem mesmo sua permanência nos autos do segundo processo. Ele não reputa acertada a afirmativa de que, em tais situações, poderia ser aproveitada como “simples indício” ou “argumento de prova”.
Por último, a busca pela celeridade e pela economia processual não pode se sobrepor ao respeito pelo devido processo legal, que engloba o contraditório e a ampla defesa. Nos casos excepcionais em que a prova produzida originariamente se revela de impossível repetição (em razão da morte de uma testemunha, por exemplo) – haveria conflito entre valores igualmente relevantes (respeito ao contraditório versus direito à prova) – a doutrina defende a aplicação do princípio da proporcionalidade, na medida em que os valores referidos “terão de ser ponderados de modo a se verificar quais entre eles são os mais urgentes e fundamentais no caso concreto”. (TALAMINI, 1998, p. 160; NEVES, 2016, p. 671).
Passemos à terceira e à quarta questões formuladas, inerentes à identidade de partes no processo originário e no feito para o qual o documento é transportado, bem como ao exercício do contraditório em ambos os processos. Recentemente a Corte Especial do STJ abordou a matéria nos seguintes termos:
Em vista das reconhecidas vantagens da prova emprestada no processo civil, é recomendável que essa seja utilizada sempre que possível, desde que se mantenha hígida a garantia do contraditório. No entanto, a prova emprestada não pode se restringir a processos em que figurem partes idênticas, sob pena de se reduzir excessivamente sua aplicabilidade, sem justificativa razoável para tanto. Independentemente de haver identidade de partes, o contraditório é o requisito primordial para o aproveitamento da prova emprestada, de maneira que, assegurado às partes o contraditório sobre a prova, isto é, o direito de se insurgir contra a prova e de refutá-la adequadamente, afigura-se válido o empréstimo.([15])
Fredie Didier Jr. et al. (2015, p. 131) comungam de ponto de vista oposto:
O contraditório deve ter sido observado no processo de onde se importa a prova e deve ser observado no processo para onde a prova é trasladada. Somente é lícita a importação de uma prova para ser utilizada contra quem tenha participado do processo em que foi produzida – a prova não pode ser usada contra quem não participou da sua produção.([16])
Colacionamos também, por oportuna, a lição de Talamini (1998, p. 149), baseada na ideia de que o contraditório somente é exercido quando a parte possui poder de influência sobre a atividade instrutória:
Não basta a mera participação no processo anterior daquele a quem a prova transportada desfavorecerá. É preciso que o grau de contraditório e de cognição do processo anterior tenha sido, no mínimo, tão intenso quanto o que haveria no segundo processo. Por exemplo, pode ser inadmissível o empréstimo de elementos probatórios produzidos em procedimento de jurisdição voluntária que dispense o exame mais profundo das questões fáticas (v.g., inventário) para outro de jurisdição contenciosa.
Questão interessante e que merece abordagem é a seguinte: ocorrendo revelia – no primeiro processo – da parte contra quem a prova emprestada for anexada no segundo processo, é correta a admissão do documento? Entendemos que não. Isso porque houve, na hipótese, mero contraditório potencial no primeiro feito, sem exercício efetivo do poder de influência na atividade instrutória.
Decorrência lógica do raciocínio é que não pode o juiz deixar de abrir vista à parte depois do traslado do documento para o segundo processo, sob o argumento de que o contraditório já foi exercido por ocasião da produção originária da prova. É prerrogativa sua manifestar-se não apenas sobre a admissibilidade do empréstimo. Cabe a ela fiscalizar o valor que a prova trasladada merecerá no segundo processo. (TALAMINI, 1998, p. 153). Afinal de contas, o CPC, a despeito do seu laconismo, parece condicionar a admissibilidade da prova documental ao respeito pelo contraditório no primeiro feito (“processo”).
Além disso, a credibilidade outorgada à prova pelo magistrado também dependerá das garantias de participação oferecidas às partes no regime instrutório do primeiro processo, comparadas às do segundo.
A última indagação formulada é a seguinte: é cabível o empréstimo ex officio da prova? Pela dicção da lei, a resposta é positiva. Prescreve o art. 370 do CPC que “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito”. Na hipótese mostra-se ainda mais relevante a observância do contraditório, no processo originário, para obtenção do documento, sob pena de reforçar o caráter de conhecimento privado da prova emprestada. E, no que concerne a possível quebra da imparcialidade do juiz, na situação hipotética aventada, vejamos a lição de Talamini (1998, p. 156):
Nem se diga que, por conhecer de antemão o resultado probatório, sabendo a qual parte o empréstimo favorecerá, o juiz estaria violando seu dever de imparcialidade. Basta inverter a questão para demonstrar o erro desse argumento: deixando de determinar o empréstimo, o juiz estará sendo parcial em favor daquele que seria prejudicado pela prova.
Ao fim e ao cabo, observa-se que, independentemente de o legislador ter sido excessivamente espartano na redação do art. 372, fica fora de dúvida que só pode ser admitida como prova emprestada aquela produzida em um “processo” antecedente, logo, um procedimento regido pelo contraditório. Isso sem prejuízo da ampla liberdade valorativa, franqueada ao juiz, referente ao documento transladado.
Permanece acesa a polêmica, todavia, no que tange à necessária identidade de partes em ambos os processos e também quanto à necessidade de a prova emprestada ser produzida originariamente na presença de uma autoridade judicial.
SÍNTESE CONCLUSIVA
Da análise antecedente podem ser extraídas as seguintes conclusões:
1) A incorporação ao atual Código de Processo Civil do princípio do contraditório como direito das partes de incidir ativamente no desenvolvimento e no êxito do processo (poder de influência) – em especial no âmbito da instrução – acarreta três consequências diretas: a) evita o monólogo judicial e a tomada de “decisões-surpresa”; b) aumenta a qualidade das decisões judiciais, fato que pode contribuir para a diminuição de recursos interpostos; c) sobreleva a responsabilidade do magistrado nas tarefas decisória e de condução processual;
2) Justiça e verdade são vocábulos que guardam em si elevado grau de subjetivismo. Seu emprego não se adéqua aos parâmetros constitucionais que regem a processualística moderna, especialmente no que diz respeito à atividade instrutória. A prova, nesses termos, não se presta à descoberta da verdade, mas à influência pelas partes sobre o posicionamento judicial acerca de questão de fato;
3) O juiz que busca, por meio do processo, obter verdade “real”, distinta do juízo de probabilidade viabilizado pela participação em simétrica paridade das partes, assume o risco de arvorar-se em contraditor, com consequente rompimento da imparcialidade;
4) O CPC/2015 manteve o livre convencimento motivado. Todavia, lhe outorgou um significado novo, preservando, de um lado, a liberdade do juiz de valorar a prova e, de outro, fixando parâmetros objetivos para a fundamentação, de forma a preservar a legitimidade decisória;
5) O princípio do contraditório desempenha dupla função em relação à prova emprestada: ele justifica, de um lado, a sua própria existência, como meio de influência da convicção judicial (art. 369) e, de outro lado, desempenha papel de requisito de admissibilidade, na medida em que o contraditório deve ter sido observado no processo do qual se importa a prova e também no processo para o qual ela é trasladada, sob a forma documental (art. 372);
6) A única hipótese em que a prova a ser emprestada, a despeito de colhida sem contraditório na origem, pode ser admitida no segundo processo, ocorre quando se constata, simultaneamente, sua irrepetibilidade e sua imprescindibilidade para demonstração da questão de fato. Do contrário haverá denegação de acesso efetivo à justiça;
7) A busca pela economia e pela celeridade processual não pode justificar a relativização do devido processo legal, franqueando a admissão de informação adquirida fora do processo por via da atividade instrutória irregular, independentemente da liberdade judicial de valorar o documento emprestado e da possibilidade de sua impugnação no processo ao qual ele é destinado;
8) Caberá ao STF e ao STJ adequarem sua jurisprudência aos ditames do CPC/2015, coibindo a admissão de material probatório colhido em procedimentos não sujeitos ao contraditório como prova emprestada, pois, segundo o art. 372, o juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro “processo”;
9) A tendência é a superação da necessidade de a prova emprestada ser produzida originariamente na presença de uma autoridade judicial, já que o CPC/2015 (e não apenas ele), ao estimular o emprego de métodos alternativos de resolução de conflitos, fomenta o acesso à justiça por intermédio de um modelo não adjudicatório.
10) O art. 421 do CPC português poderia ter sido utilizado como parâmetro de técnica para o legislador brasileiro, uma vez que esclarece sobre a necessária identidade de partes no processo em que a prova é produzida e no feito para o qual ela é transportada.
REFERÊNCIAS
AGUIAR, Roberto Armando Ramos de. O que é justiça: uma abordagem dialética. 4. ed. São Paulo: Alfa-ômega, 1995.
ALMEIDA, Cleber Lúcio de. A prova como direito humano e direito fundamental das partes do processo judicial. 2011. 209 f. Tese (Doutorado) – Curso de Direito, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2011.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A garantia do contraditório na atividade de instrução. In: Temas de direito processual: terceira série. São Paulo: Saraiva, 1984.
______. Regras de experiência e conceitos jurídicos indeterminados. In: Temas de direito processual: segunda série. São Paulo: Saraiva, 1980.
BARROS, Marco Antônio de. A busca da verdade no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
BRASIL. Código de Processo Civil: anteprojeto. Comissão de Juristas Responsável pela Elaboração de Anteprojeto de Código de Processo Civil. Brasília: Senado Federal, Presidência, 2010.
COMOGLIO, Luigi Paolo. Garanzie costituzionali e “giusto processo” (modelli a confronto). In: Revista de Processo, São Paulo, v. 23, n. 90, abr./jun. 1998.
DELFINO, Lucio; LOPES, Ziel Ferreira. A expulsão do livre convencimento motivado do novo CPC e os motivos pelos quais a razão está com os hermeneutas. Abr. 2015. Disponível em: <http://justificando.com/2015/04/13/a-expulsao-do-livre-convencimento-motivado-do-novo-cpc-e-os-motivos-pelos-quais-a-razao-esta-com-os-hermeneutas/>. Acesso em: 25 jul. 2016.
DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. 10. ed. Salvador: JusPodivm, v. 2, 2015.
VILAR FILHO, José Eduardo de Melo. Prova indiciária e verdade: enfoque constitucional. 2006. 183 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Direito, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2006.
GAJARDONI, Fernando da Fonseca. O livre convencimento motivado não acabou no novo CPC. Abr. 2015. Disponível em: <https://jota.info/colunas/novo-cpc/o-livre-convencimento-motivado-nao-acabou-no-novo-cpc-06042015>. Acesso em: 02 jul. 2017.
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 1992.
GONÇALVES, Gláucio Ferreira Maciel. Acesso à Justiça e reforma do Judiciário. In: Cadernos ADENAUER, São Paulo, v. 6, 2002.
GRINOVER, Ada Pellegrini O Processo em evolução. São Paulo: Forense Universitária, 1996.
GUZMÁN, Nicolás. La verdad en el proceso penal: una contribución a la epistemología jurídica. Buenos Aires: Editores del Puerto, 2006.
HUNGRIA, Denise Ferragi. Análise da prova emprestada no processo civil. 2012. 156 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.
LEAL, André Cordeiro; THIBAU, Vinícius Lott. Prova e jurisdicionalismo no novo CPC brasileiro. In: Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva, Belo Horizonte, n. 28, jan./abr. 2016.
LEBRE DE FREITAS, José. Introdução ao processo civil: conceito e princípios gerais à luz do código revisto. Coimbra: Coimbra, 1996.
LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 8. ed. Salvador: JusPodivm, v. único, 2016.
NUNES, Dierle; DELFINO, Lúcio. Enunciado da Enfam mostra juízes contra o contraditório do novo CPC. Consultor Jurídico. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-set-03/enunciado-enfam-mostra-juizes-contraditorio-cpc>. Acesso em: 03 jul. 2017.
OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de. O processo constitucional como instrumento da jurisdição constitucional. In: Revista da Faculdade Mineira de Direito, Belo Horizonte, v. 3, n. 5 e 6, 1º e 2º sem. 2000.
PINTO, Felipe Martins. Introdução crítica ao processo penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.
RIBEIRO, Darci Guimarães; SCALABRIN, Felipe. O papel do processo na construção da democracia: para uma nova definição de democracia participativa. In: Revista Brasileira de Direito Processual, Belo Horizonte, v. 17, n. 65, jan./mar. 2009. p. 53.
SANTOS, Moacir Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, v. 1, 1967.
STRECK, Lenio Luiz. O novo Código de Processo Civil (CPC) e as inovações hermenêuticas: o fim do livre convencimento e a adoção do integracionismo dworkiniano. In: Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 52, n. 206, abr./jun. 2015.
TALAMINI, Eduardo. Prova emprestada no processo civil e penal. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 35, n. 140, out./dez. 1998.
THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. 56. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, 2015.
______. Processo justo e contraditório dinâmico. In: Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito (RECHTD), São Leopoldo, v. 2, n. 1, p. 64-71, jan./jun. 2010.
ZANETI JR., Hermes. O problema da verdade no processo civil: modelos de prova e de procedimento probatório. In: Revista de Processo, São Paulo, v. 116, jul./ago. 2004.
[1] Conforme célebre lição do professor Aroldo Plínio Gonçalves (1992, p. 115), “há processo sempre onde houver o procedimento realizando-se em contraditório entre os interessados, e a essência deste está na “simétrica paridade” da participação, nos atos que preparam o provimento, daqueles que nele são interessados porque, como seus destinatários, sofrerão seus efeitos”.
[2] Pondera José Eduardo de Melo Vilar Filho (2006, p. 43) que “a proibição da prova ilícita visa a tutelar os elementos integrantes da dignidade humana, funcionando como um desestímulo à violação das regras disciplinadoras da vida em sociedade, na medida em que às provas assim obtidas não será atribuído valor”.
[3] Importantíssima é a observação de Eduardo Talamini (1998, p. 160) acerca da função da prova emprestada. Para ele, “o empréstimo de prova não se destina apenas à economia processual. Há casos em que a prova é irrepetível ou, quando menos, sua repetição só se faria a um custo bastante alto e despropositado. A prova emprestada, então, assume função diversa e especial: evitar a perda da prova irrepetível ou de difícil repetição. Seu fundamento passa a ser o próprio direito à prova – radicalmente ligado à ampla defesa e ao acesso à jurisdição: ou permite-se o traslado ou priva-se a parte de provar sua razão”.
[4] Mandado de segurança nº 24.268/MG, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie (Rel. p. acórdão Min. Gilmar Mendes), j. 05.02.2004, DJ 17.09.2004.
[5] Consta na Exposição de Motivos do CPC/2015 que: “A necessidade de que fique evidente a harmonia da lei ordinária em relação à Constituição Federal da República fez com que se incluíssem no Código, expressamente, princípios constitucionais, na sua versão processual. Por outro lado, muitas regras foram concebidas, dando concreção a princípios constitucionais, como, por exemplo, as que preveem um procedimento, com contraditório e produção de provas, prévio à decisão que desconsidera da pessoa jurídica, em sua versão tradicional, ou ‘às avessas’ ” (2010, p. 11).
[6] Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.
[7] Informam Leal e Thibau (2016, p. 101-102) que o conceito de prova como atividade destinada à formação da convicção do juiz sobre a verdade dos fatos é identificado nos artigos 373, 374, 376 e 379. Prescrevem os artigos 369, 370 e 372, entretanto, que o CPC/2015 acolhe o conceito de prova como meio de convencimento do julgador. Finalmente, a lei também adota o conceito de prova como o resultado que convence o magistrado a respeito da verdade dos fatos. É o que se extrai da norma prevista no artigo 371.
[8] Exemplo extraído da jurisprudência do TJMG: “Não está o julgador obrigado a atacar todas as questões suscitadas pelas partes, podendo, de forma discricionária (não arbitrária), decidir a lide de acordo com seu livre convencimento. É o chamado princípio da persuasão racional do Magistrado, que vigora em nosso ordenamento jurídico-processual. Inteligência dos artigos 130 e 131 do Código de Processo Civil.” (Embargos de declaração nº 1.0134.05.054584-4/002, 16ª Câmara Cível, Rel. Des. Sebastião Pereira de Souza, j. 17.10.2007).
[9] Vale salientar que, muito antes da entrada em vigor do CPC de 2015, era possível encontrar na jurisprudência julgados consagradores do princípio da cooperação. Conferir: TJMG, Apelação cível nº 1.0024.08.993716-3/001, 1ª Câmara Cível, Rel. Des. Eduardo Andrade, j. 02.09.2008.
[10] O posicionamento de Gajardoni foi refutado por Lucio Delfino e Ziel Ferreira Lopes (2015) nos seguintes termos: “Sentimo-nos estimulados a rebater a tese desenvolvida pelo inteligente articulista, sobretudo por estarmos entre aqueles filiados ao entendimento antagônico. Em escritos mais recentes, a ênfase atribuída por nós a essa novidade é nada menos que notória – um dos pontos altos do novo CPC: representa passo fundamental para a superação de resquícios do velho positivismo fático (realismo jurídico) que ainda tem lugar de relevo na mente de muitos profissionais que militam no foro. Algo, aliás, sempre e desde há muito elucidado por Lenio Streck, o mentor da emenda supressiva do livre convencimento. […] Acertou o legislador ao proscrever do sistema processual esse rastro autoritário ainda sustentado pelo CPC/1973 e que mantém escancarada, em pleno século XXI, uma janela para emanações concretas da ideologia socialista no palco processual (Menger, Klein, Bulow), confiando aos julgadores liberdade para decidirem conforme pensam e segundo a prova que melhor se amolde ao seu pensamento, desde que depois se justifiquem, como se o dever de fundamentação (por mais oneroso que se apresente) impermeabilizasse sozinho o livre atribuir de sentidos”.
[11] Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.
[12] “É importante, outrossim, ter em mente que o que se importa é a prova e não a valoração que lhe deu o juiz da causa primitiva. Esta não vincula o juiz do novo processo, que a recebe como prova e aprecia com liberdade o valor probante para julgamento da causa que preside, no cotejo com os demais meios de convencimento constantes dos autos. Em outras palavras, não é o convencimento do juiz originário que se transporta: apenas a prova fisicamente concretizada” (THEODORO JR., 2015, p. 905).
[13] STF, Pet. 3.683 QO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cézar Peluso, j. 13.08.2008, DJ 19.02.2009.
[14] STJ, REsp. nº 1.122.177/MT, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamim, j. 03.08.2010, DJ 27.04.2011. Em sentido oposto, conferir a lição de Talamini (1998, p. 152), para quem “a prova tem de haver sido originariamente colhida em processo frente a órgão jurisdicional. Trata-se de decorrência direta da inafastabilidade da jurisdição e do devido processo legal (CF, art. 5º, XXXV e LIV). Não há apenas o direito de ser ouvido e receber uma resposta do órgão jurisdicional. Mais ainda, existe o direito de, perante esse – e com o completo sistema de garantias que peculiariza o processo jurisdicional -, desenvolverem-se as atividades destinadas a ‘far valere sul piano probatorio le proprie ragione e di influire sullo svolgimento della controversia’ ”.
[15] STJ, EREsp. 617.428/SP, Corte Especial, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04.06.2014, DJ 17.06.2014.
[16] Nesse sentido prescreve o Código de Processo Civil português, em seu art. 421, in verbis: “Os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no nº 3 do artigo 355º do Código Civil”.