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COMPROMISSO E SENTENÇA ARBITRAL

COMPROMISSO E SENTENÇA ARBITRAL

Rogério Tadeu Romano

SUMÁRIO: I – O compromisso: natureza jurídica e histórico; II – Decisão arbitral e coisa julgada; III – Considerações sobre o laudo arbitral e não necessidade de homologação judicial; IV – Prazo para que seja proferida a sentença arbitral; V – Compromisso e pressupostos; VI – Causas de nulidade da sentença arbitral e do compromisso; VII – Formalidades da sentença arbitral; VIII – A cláusula compromissória e a obrigação de fazer; IX – A cláusula compromissória e itens do compromisso; X – A renovação e a prorrogação da arbitragem. Sua extinção; XI – Quem pode ser árbitro e a suspeição; XII – As medidas cautelares obtidas em juízo; XIII – A nulidade da sentença arbitral e a ação desconstitutiva; XIV – A sentença arbitral estrangeira.

 

I – O COMPROMISSO: NATUREZA JURÍDICA E HISTÓRICO

O compromisso era o acordo para a decisão por árbitro ou por árbitros. Se se lhe adjectava cláusula penal, a infração gerava a ação pela pena. Estabeleceu que do compromisso não nasce exceção, mas petição da pena.

Chama-se compromisso o contrato pelo qual os figurantes se submetem, a respeito do direito, pretensão, ação ou exceção, sobre que há controvérsia, a decisão de árbitro ou de árbitros (Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, art. 9º).

Na explicação de Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, t. XXVI, Bookseler, § 3.179), também se pode estabelecer, por declaração unilateral de vontade, o compromisso, mas tal figura raramente ocorre.

No Direito romano, as partes podiam renunciar à tutela jurídica estatal a respeito de questão pendente entre elas, e pactar a nomeação de árbitro em que examinasse o caso e proferisse decisão. Mas o direito privado romano teve que enfrentar o problema da não aceitação da função por parte do arbiter. Criaram tribunal arbitral, o iudicium privatum do direito clássico, à base da litiscontestação (negócio jurídico privado ou processual, pelo qual os interessados ou as partes prometiam submeter ao iudex a resolução de litígio). A princípio, havia a solenidade de palavras expressas e taxativas (legis actio), depois admitiu-se o escrito (iudicium).

O iudicium privatorum constava de lista de cidadãos, entre os quais se escolhia o árbitro. Não podia esse recusar, porque fazia parte do iudicium privatum. O Estado assegurava o cumprimento dos julgados, caso não o fizesse o vencido. Mas os árbitros só eram constrangidos a julgar se houvessem aceito a função.

A natureza jurídica do instituto da arbitragem é dividido, basicamente, em duas correntes: (i) a corrente contratualista; (ii) a corrente jurisdicional. De acordo com a primeira corrente, também conhecida como teoria privatista, a arbitragem possui um caráter contratual, privado. Assim, a sentença arbitral seria, na verdade, proveniente de uma transação das partes, desprovida, assim, de caráter jurisdicional.

A referida corrente, defendida por autores como Salvatore Satta, Carnelutti, entre outros, entende que a ausência do caráter jurisdicional na decisão arbitral tem fundamento também no fato de o árbitro não possuir poder para executar a sentença proferida. Assim, haveria em tal sentença plena intervenção estatal, visto que a parte possui a faculdade de requerer a validação de tal decisão ao Estado.

A segunda corrente, por sua vez, atrela à sentença arbitral natureza processual, igualando-a à jurisdição proveniente do Estado. Isso, fundamentando-se no fato de a sentença arbitral não necessitar ser homologada pelo Poder Judiciário, além da existência da cláusula compromissória, pela qual as partes contratantes se submetem à arbitragem. De acordo com tal corrente existe total autonomia na sentença arbitral.

Antes do advento da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, no Brasil adotava-se predominantemente a primeira teoria, contratualista. Isso porque era necessário, de fato, homologar a sentença proferida por árbitro para que tal decisão possuísse força de sentença tal qual a proferida pelo Poder Judiciário.

II – DECISÃO ARBITRAL E COISA JULGADA

Nesta linha, somente ocorreria a qualidade da coisa julgada diante da homologação feita pelo juiz do Estado, não na decisão do árbitro.

Após a Lei supracitada, a decisão arbitral passou a ter força de sentença, fazendo coisa julgada a sentença arbitral, bem como constituindo título executivo judicial, desprovida da necessidade de homologação.

No art. 31 da referida lei, há previsão que “a sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo“.

O art. 18 consigna que, para os fins processuais, o árbitro “é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação do Poder Judiciário“.

III – CONSIDERAÇÕES SOBRE O LAUDO ARBITRAL E NÃO NECESSIDADE DE HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL

Há compromissos em que figuram o Estado e outros em que não figura. O Estado pode figurar como particular. Se se submeteu ao juízo arbitral, o compromisso se rege pelo Código Civil e pela Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, exceto no que concerne a poderes do órgão estatal.

Quanto à eficácia jurídica, o compromisso é negócio jurídico de direito material com eficácia negativa no direito pré-processual (exclusão de juízes estatais) e eficácia positiva no direito processual (art. 31 da Lei nº 9.307).

Mas não podem os árbitros se substituir a tabeliães, ou a oficiais do registro ou a legisladores, podendo se pronunciar sobre a existência, validade ou eficácia de escrituras públicas, ou de registros, averbações ou anotações em registros públicos.

Compromisso é renúncia ao juízo estatal, à processualidade estatal da relação jurídica entre as partes e à pessoa que tem, em virtude do seu estatuto, a cognição. Mas a exceção de compromisso pressupõe menos e mais do que a competência de outro juízo estatal, ou a pendência da lide em outro juízo estatal – pressupõe a renúncia do juízo estatal.

Como observou Lucas Homem de Mello Pereira (Sentença arbitral):

Antigamente, o procedimento arbitral levava a denominação de “laudo arbitral“.

Com o advento da Lei nº 9.307 de 1996, alterou-se a denominação do ato decisório do árbitro para “sentença“, conforme pode-se averiguar no art. 23.

A motivação da referida alteração possui dois fundamentos: (i) a natureza jurídica da arbitragem, eis que, inexiste justificativa para a adoção de divergência entre a decisão proferida pelo juiz togado e do juiz arbitral, em razão da equiparação da eficácia de ambas as decisões pelo legislador pátrio; (ii) a intenção do legislador em concretizar e dar maior força ao resultado da arbitragem.

Uma vez que independe de homologação pelo Poder Judiciário, a decisão arbitral, de per si, gera entre as partes os exatos efeitos da sentença proferida pelo judiciário, valendo, inclusive, como título executivo.

Destaca-se que, se, durante o decurso da arbitragem, as partes chegarem a um acordo quanto à lide, poderão formalizar tal acordo por um contrato simples, pondo fim ao procedimento arbitral, ou poderão requerer sua formalização pelo árbitro, através de uma sentença arbitral.

IV – PRAZO PARA QUE SEJA PROFERIDA A SENTENÇA ARBITRAL

Conforme o art. 23 da Lei de Arbitragem, o prazo para que seja proferida a sentença arbitral deve ser estipulado pelas partes. Caso inexista prazo convencionado pelas partes na cláusula de compromisso, o mesmo artigo prevê que o árbitro proferirá a sentença no prazo de seis meses, a serem contados da instituição da arbitragem.

Ressalta-se que, caso o árbitro seja substituído, o prazo de seis meses conta-se a partir da substituição.

De acordo com o parágrafo único do mesmo art. 23, as partes podem acordar em prorrogar o prazo outrora estipulado. Para tanto, necessária a anuência expressa de ambas as partes e todos os árbitros. Não é possível ocorrer a prorrogação caso ocorra a omissão de uma das partes.

Tal prorrogação ocorre, via de regra, em razão dos incidentes ocorridos no decurso da arbitragem, como, por exemplo, a necessidade de realização de perícia técnica ou a oitiva de testemunhas.

Veja-se, outrossim, que, caso o referido prazo não seja respeitado, pode ocorrer nulidade da sentença arbitral, em atenção ao art. 32 da Lei supracitada.

Art. 32. É nula a sentença arbitral se:

I – for nulo o compromisso;

II – emanou de quem não podia ser árbitro;

III – não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei;

IV – for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem;

V – não decidir todo o litígio submetido à arbitragem;

VI – comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva;

VII – proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e

VIII – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2º, desta Lei.

V – COMPROMISSO E PRESSUPOSTOS

O negócio jurídico de compromisso tem de satisfazer os pressupostos comuns aos contratos, como a capacidade dos figurantes. Se o compromisso for estabelecido em declaração unilateral de vontade, em títulos ao portador, negócio abstrato, tem de satisfazer os pressupostos dos negócios jurídicos unilaterais.

O compromisso há de referir-se ao objeto do litígio, pendente ou futuro, sobre o que há de proferir-se a decisão arbitral, bem assim ao lugar que se produza a sentença arbitral (art. 10, III e IV). Assim, tem de mencionar os nomes, as profissões e os domicílios dos árbitros e das partes, qualificáveis, outrossim, por seu estado civil, como ainda a identificação da entidade à qual se delegarem a indicação dos árbitros (art. 10, I e II).

O compromisso impede a constituição da relação jurídica processual, se logo exercida a exceção de compromisso, e faz, ao por si, cessar a relação jurídica processual que já se estabeleceu. Tanto assim que, se extingue o compromisso, ou se lhe é decretada a nulidade, não se prossegue na causa que pendia e pende.

Fala-se na cláusula compromissória, tratada na Lei nº 9.307/1996, arts. 3º, 1ª parte, 4º, 5º, 7º, 8º e 38, V, segunda parte (“as controvérsias que surgirem na interpretação ou na execução deste contrato serão submetidas a juízo arbitral“), que é pacto de compromisso, ou, mesmo, negócio por declaração unilateral de vontade em que ainda não se determinou a demanda ou não se determinaram as demandas que têm de ser decididas por árbitros. O compromisso é o contrato, dificilmente o negócio por declaração unilateral de vontade, em que já se determinava a demanda submetida ao juízo arbitral. A eventualidade é que dilata em cláusula, aplicada a demandas, apenas determináveis, o pacto de compromisso.

Mas a cobrança de dívida fiscal não se submete ao compromisso (Lei nº 6.830/1980, arts. 5º e 38). A convenção das partes nesse sentido é nula, mas a lei especial pode submeter controvérsia fiscal à arbitragem (essa lei será federal, pois há competência privativa da União). Também o art. 32 da Lei de Arbitragem estabelece outras hipóteses de nulidade.

VI – CAUSAS DE NULIDADE DA SENTENÇA ARBITRAL E DO COMPROMISSO

É nula a sentença arbitral se:

I – for nulo o compromisso;

I – for nula a convenção de arbitragem; (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

II – emanou de quem não podia ser árbitro;

III – não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei;

IV – for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem;

V – não decidir todo o litígio submetido à arbitragem; (Revogado pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

VI – comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva;

VII – proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e

VIII – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2º, desta Lei.

É nulo o pacto em que o interessado na decisão é um dos árbitros ou árbitro, pois aí haveria evidente afronta à imparcialidade que deve reger esses julgamentos. Mas a aceitação da função pelos árbitros gera o contrato sui generis, de direito material, parecido com o contrato de serviços entre os figurantes e o árbitro. Aceita a função, não são obrigados, por direito público, a decidir; porém, respondem pela falta, pela recusa, pelo retardamento.

VII – FORMALIDADES DA SENTENÇA ARBITRAL

A sentença arbitral é peça de lógica jurídica, de cognição.

As sentenças arbitrais devem ser expressas em documento escrito, em atenção ao art. 24 da Lei de Arbitragem.

Tal requisito justifica-se pela necessidade de procura do Poder Judiciário caso não seja cumprida a referida sentença, e esta tenha que ser executada.

O mesmo artigo prevê, ainda, em seu § 1º que a decisão será proferida por vários árbitros, por maioria de votos, com mínimo de três árbitros.

Se inexistir acordo majoritário, o voto do presidente do tribunal arbitral prevalecerá.

No art. 24 da mesma lei, há ainda a previsão de que o árbitro que discordar da maioria, sendo seu voto o vencido, portanto, poderá declarar seu voto em apartado, não sendo, contudo, tal prática muito utilizada.

A sentença arbitral deverá também estar amparada por determinadas formalidades impostas pela lei, sob pena de tornar-se ineficaz.

Os principais requisitos a serem respeitados estão previstos no art. 26 da Lei.

O primeiro requisito é o relatório, que possibilita a identificação das partes e o conhecimento do teor da lide em apreço.

O segundo, por sua vez, é a apresentação dos fundamentos nos quais é baseada a decisão, abrangendo as questões de fato e de direito, devendo, ademais, estar expresso, se o árbitro julgou por equidade ou por regras de direito. Em tal parte o árbitro expõe os motivos pelos quais chegou a uma determinada conclusão.

Necessário também que a sentença abranja a parte dispositiva, onde o árbitro decide quanto às questões que lhe foram apresentadas, e estabelece o prazo para que sejam cumpridas tais decisões.

Por fim, a sentença deverá conter a data e o lugar em que foi proferida, além de ser assinada por todos os árbitros que participaram da decisão.

Após a sentença arbitral ser devidamente proferida, deverá o árbitro enviar uma cópia às partes, pelo correio ou qualquer outro meio de comunicação, mediante comprovação de recebimento, ou deverá entregar uma cópia pessoalmente às partes, mediante recibo.

O juízo arbitral é juízo como qualquer outro, quanto à sua função de julgar, posto que ao seu julgamento faltasse a homologação que tornava o laudo arbitral decisão a que se havia de juntar o ingresso estatal, o que hoje não mais se exige (Lei nº 9.307, arts. 18, in fine, e 29). Para que se dê intervenção adesiva, é preciso que o interveniente aceite as consequências do julgado arbitral, como se o pronunciasse o juízo estatal. Também se permitem a denunciação da lide e a nomeação à autoria; porém, não cabem efeitos contra o litisdenunciado ou nomeado se antes não os admitiram ou não os aceitam expressamente.

Quanto aos litisconsortes unitários ou simplesmente necessários, a eficácia da sentença arbitral não os atinge, salvo: a) se se comprometeram também, explicitamente, posto que posteriormente aderindo ao compromisso; b) se admitiram, por atos inequívocos, o compromisso, como se, citados, para a integração da relação jurídica processual, não alegaram a incompetência do juízo arbitral, que em tanto importa dizer-se que não arguiram a falta de compromisso de sua parte.

A força da coisa julgada material da sentença arbitral (art. 31 da Lei nº 9.307) não obriga além dos termos do compromisso, nem, claro, o juiz estatal tem de atender a ela de ofício. Os efeitos quanto a terceiros dependem da situação desses terceiros no compromisso.

A necessidade de comprovação do recebimento da cópia pelas partes justifica-se, pois a partir dela que correrão os prazos para as medidas cabíveis, a serem apresentadas posteriormente.

VIII – A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA E A OBRIGAÇÃO DE FAZER

Dita o art. 7º da Lei de Arbitragem:

Art. 7º Existindo cláusula compromissória e havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, poderá a parte interessada requerer a citação da outra parte para comparecer em juízo a fim de lavrar-se o compromisso, designando o juiz audiência especial para tal fim.

  • 1º O autor indicará, com precisão, o objeto da arbitragem, instruindo o pedido com o documento que contiver a cláusula compromissória.
  • 2º Comparecendo as partes à audiência, o juiz tentará, previamente, a conciliação acerca do litígio. Não obtendo sucesso, tentará o juiz conduzir as partes à celebração, de comum acordo, do compromisso arbitral.
  • 3º Não concordando as partes sobre os termos do compromisso, decidirá o juiz, após ouvir o réu, sobre seu conteúdo, na própria audiência ou no prazo de dez dias, respeitadas as disposições da cláusula compromissória e atendendo ao disposto nos arts. 10 e 21, § 2º, desta Lei.
  • 4º Se a cláusula compromissória nada dispuser sobre a nomeação de árbitros, caberá ao juiz, ouvidas as partes, estatuir a respeito, podendo nomear árbitro único para a solução do litígio.
  • 5º A ausência do autor, sem justo motivo, à audiência designada para a lavratura do compromisso arbitral, importará a extinção do processo sem julgamento de mérito.
  • 6º Não comparecendo o réu à audiência, caberá ao juiz, ouvido o autor, estatuir a respeito do conteúdo do compromisso, nomeando árbitro único. 
  • 7º A sentença que julgar procedente o pedido valerá como compromisso arbitral.

Trata-se de ação objetivando o cumprimento da obrigação de fazer de natureza executiva lato sensu.

IX – A CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA E ITENS DO COMPROMISSO

A teor do art. 8º da Lei, a cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em que estiver inserta, de tal sorte que a nulidade deste não implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromissória.

Tem-se do art. 9º que o compromisso arbitral é a convenção por meio da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial. O negócio jurídico bilateral de compromisso é regido pelo direito material, como ainda o negócio jurídico plurilateral, inclusive estatutário. Mas o compromisso pode ser feito em testamento, como explicou Pontes de Miranda (ob. cit., p. 376). Se já pende o litígio e o compromisso tem de ser judicial, o testamento, com o cumpra-se, é tido como se fora por termo nos autos, o que abre exceção necessária à regra jurídica do art. 9º da Lei nº 9.307/1996.

Ainda determina a lei nos parágrafos do art. 9º:

  • 1º O compromisso arbitral judicial celebrar-se-á por termo nos autos, perante o juízo ou tribunal, onde tem curso a demanda.
  • 2º O compromisso arbitral extrajudicial será celebrado por escrito particular, assinado por duas testemunhas, ou por instrumento público.

Mas o compromisso não se confunde com o pacto de arbitramento, pelo qual se encarrega a alguém ou a duas, ou mais pessoas (arbitradores), a solução de questões de fato.

A Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, art. 10, II, diz que o compromisso há de conter o nome, a profissão e o domicílio dos árbitros ou dos árbitros, ou, se for a hipótese, a identificação da entidade à qual as partes delegarem a indicação de árbitros, como, por exemplo, a Ordem dos Advogados do Brasil, por meio de seus membros.

Se os compromitentes declararam que na ocasião em que algum deles verificar a instalação do juízo arbitral cada um designará o seu árbitro, valendo a clausura.

O art. 11 determina, de forma exemplificativa, itens que podem constar do compromisso:

Art. 11. Poderá, ainda, o compromisso arbitral conter:

I – local, ou locais, onde se desenvolverá a arbitragem;

II – a autorização para que o árbitro ou os árbitros julguem por eqüidade, se assim for convencionado pelas partes;

III – o prazo para apresentação da sentença arbitral;

IV – a indicação da lei nacional ou das regras corporativas aplicáveis à arbitragem, quando assim convencionarem as partes;

V – a declaração da responsabilidade pelo pagamento dos honorários e das despesas com a arbitragem; e

VI – a fixação dos honorários do árbitro, ou dos árbitros.

Parágrafo único. Fixando as partes os honorários do árbitro, ou dos árbitros, no compromisso arbitral, este constituirá título executivo extrajudicial; não havendo tal estipulação, o árbitro requererá ao órgão do Poder Judiciário que seria competente para julgar, originariamente, a causa que os fixe por sentença.

X – A RENOVAÇÃO E A PRORROGAÇÃO DA ARBITRAGEM. SUA EXTINÇÃO

Aqui, fala-se no prazo de forma a fazer a diferença entre renovação e prorrogação da arbitragem. Explicou Pontes de Miranda (ob. cit., p. 389) que os árbitros não podem renovar; os árbitros podem ter o direito, que se lhes atribua de prorrogar o prazo (art. 23, parágrafo único, da Lei nº 9.307/1996). Renovar só o podem os compromitentes. Se o prazo expirou sem que se ultimasse a função dos árbitros, o direito de prorrogação extinguiu-se. Porque se prorroga o prazo que ainda está a correr. E renová-lo não o podem os árbitros, pois seria renovar o compromisso em que não foram figurantes ou o negócio jurídico entre os compromitentes e os árbitros, em que foram figurantes, bilateralmente e perdeu toda a sua eficácia.

Mas, observe-se que, algumas vezes, os juízes árbitros, para ganhar tempo, ou por simples comodismo, como revela Pontes de Miranda (ob. cit., p. 389), convertem o julgamento em diligência, a fim de escapar à expiração do prazo para a sentença ou ao prazo legal. Aqui, não se está diante de sentença, pois não decidem. Não interrompem nem suspendem o prazo a que se referem o art. 11, III, e 12, III, da Lei nº 9.307, qualquer que ele seja (faltou à resolução conteúdo de sentença).

O art. 12 da Lei de Arbitragem fala de extinção de compromisso, não de nulidade. A nulidade do compromisso é, de ordinário, assunto de direito material, e não de direito processual.

Art. 12. Extingue-se o compromisso arbitral:

I – escusando-se qualquer dos árbitros, antes de aceitar a nomeação, desde que as partes tenham declarado, expressamente, não aceitar substituto;

II – falecendo ou ficando impossibilitado de dar seu voto algum dos árbitros, desde que as partes declarem, expressamente, não aceitar substituto; e

III – tendo expirado o prazo a que se refere o art. 11, inciso III, desde que a parte interessada tenha notificado o árbitro, ou o presidente do tribunal arbitral, concedendo-lhe o prazo de dez dias para a prolação e apresentação da sentença arbitral.

XI – QUEM PODE SER ÁRBITRO E A SUSPEIÇÃO

É muito comum as partes recusarem um árbitro que venha sofrendo indagações sobre sua honestidade, imparcialidade ou que, até, venha a responder processos criminais.

Em sendo vários, deverá haver número ímpar de árbitros com a possibilidade de voto de minerva.

Determinam os arts. 13 a 16 da Lei de Arbitragem:

Art. 13. Pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes.

  • 1º As partes nomearão um ou mais árbitros, sempre em número ímpar, podendo nomear, também, os respectivos suplentes.
  • 2º Quando as partes nomearem árbitros em número par, estes estão autorizados, desde logo, a nomear mais um árbitro. Não havendo acordo, requererão as partes ao órgão do Poder Judiciário a que tocaria, originariamente, o julgamento da causa a nomeação do árbitro, aplicável, no que couber, o procedimento previsto no art. 7º desta Lei.
  • 3º As partes poderão, de comum acordo, estabelecer o processo de escolha dos árbitros, ou adotar as regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada.
  • 4º Sendo nomeados vários árbitros, estes, por maioria, elegerão o presidente do tribunal arbitral. Não havendo consenso, será designado presidente o mais idoso.
  • 4º As partes, de comum acordo, poderão afastar a aplicação de dispositivo do regulamento do órgão arbitral institucional ou entidade especializada que limite a escolha do árbitro único, coárbitro ou presidente do tribunal à respectiva lista de árbitros, autorizado o controle da escolha pelos órgãos competentes da instituição, sendo que, nos casos de impasse e arbitragem multiparte, deverá ser observado o que dispuser o regulamento aplicável. (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)
  • 5º O árbitro ou o presidente do tribunal designará, se julgar conveniente, um secretário, que poderá ser um dos árbitros.
  • 6º No desempenho de sua função, o árbitro deverá proceder com imparcialidade, independência, competência, diligência e discrição.
  • 7º Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral determinar às partes o adiantamento de verbas para despesas e diligências que julgar necessárias.

Art. 14. Estão impedidos de funcionar como árbitros as pessoas que tenham, com as partes ou com o litígio que lhes for submetido, algumas das relações que caracterizam os casos de impedimento ou suspeição de juízes, aplicando-se-lhes, no que couber, os mesmos deveres e responsabilidades, conforme previsto no Código de Processo Civil.

  • 1º As pessoas indicadas para funcionar como árbitro têm o dever de revelar, antes da aceitação da função, qualquer fato que denote dúvida justificada quanto à sua imparcialidade e independência.
  • 2º O árbitro somente poderá ser recusado por motivo ocorrido após sua nomeação. Poderá, entretanto, ser recusado por motivo anterior à sua nomeação, quando:
  1. a) não for nomeado, diretamente, pela parte; ou
  2. b) o motivo para a recusa do árbitro for conhecido posteriormente à sua nomeação. 

Art. 15. A parte interessada em arguir a recusa do árbitro apresentará, nos termos do art. 20, a respectiva exceção, diretamente ao árbitro ou ao presidente do tribunal arbitral, deduzindo suas razões e apresentando as provas pertinentes.

Parágrafo único. Acolhida a exceção, será afastado o árbitro suspeito ou impedido, que será substituído, na forma do art. 16 desta Lei. 

Art. 16. Se o árbitro escusar-se antes da aceitação da nomeação, ou, após a aceitação, vier a falecer, tornar-se impossibilitado para o exercício da função, ou for recusado, assumirá seu lugar o substituto indicado no compromisso, se houver.

  • 1º Não havendo substituto indicado para o árbitro, aplicar-se-ão as regras do órgão arbitral institucional ou entidade especializada, se as partes as tiverem invocado na convenção de arbitragem.
  • 2º Nada dispondo a convenção de arbitragem e não chegando as partes a um acordo sobre a nomeação do árbitro a ser substituído, procederá a parte interessada da forma prevista no art. 7º desta Lei, a menos que as partes tenham declarado, expressamente, na convenção de arbitragem, não aceitar substituto.

Art. 17. Os árbitros, quando no exercício de suas funções ou em razão delas, ficam equiparados aos funcionários públicos, para os efeitos da legislação penal. 

Art. 18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário.

O procedimento arbitral traçado na Lei nº 9.307, arts. 19 a 22, não é processo estatal, mas procedimento estatalmente disciplinado ordenado. O Estado traça regras fundamentais dentro do qual se exerce a vontade das partes.

Considera-se instituída a arbitragem quando aceita a nomeação pelo árbitro, se for único, ou por todos, se forem vários (art. 19).

Fala-se em interrupção da prescrição: a instituição da arbitragem interrompe a prescrição, retroagindo à data do requerimento de sua instauração, ainda que extinta a arbitragem por ausência de jurisdição (art. 19).

O negócio jurídico entre os compromitentes e o árbitro é o receptum (L. 13, § 2, D).

Para Pontes de Miranda (ob. cit., p. 394), “em todo o caso, a aceitação pelo árbitro, hoje, é mais do que era o receptum romano“.

A aceitação pelo árbitro pode ser expressa ou tácita. Não basta o silêncio do árbitro.

Os árbitros, desde que aceitam a função, ou desde que estão ligados a dever de exercê-la. Cabe uma ação condenatória, com a cominação e ainda perdas e danos.

Se não foi fixado prazo para a decisão, ou a contra da data do compromisso, ou a aceitação, pelo árbitro ou pelos árbitros, ou a dia certo ad quem, pode qualquer dos compromitentes pedir ou a dia certo ad quem, pode qualquer dos compromitentes pedir ao juiz que fixe prazo razoável.

Os árbitros hão de atender aos limites do compromisso e decidir todos os pontos que lhe foram deixados para a decisão. Todavia, pode ter havido pluralidade de compromissos no mesmo instrumento (união meramente externa), caso em que cada decisão é sentença à parte.

O compromisso pode ser judicial ou extrajudicial (Lei nº 9.307, art. 9º, § 1º). Aquele é feito por termo nos autos, seguido de homologação, pois que se exclui o juiz da causa (art. 9º, § 1º). Esse, por escritura pública, ou instrumento particular, assinado por duas testemunhas (art. 9º, § 2º).

O acordo compromissal, ainda que não homologado, não determina, só por si, a extinção da relação jurídica processual estatal.

O árbitro tem a sua escolha disciplinada e regulada pelo Estado no direito material.

De importância são as normas de procedimento arbitral:

Art. 20. A parte que pretender argüir questões relativas à competência, suspeição ou impedimento do árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que tiver de se manifestar, após a instituição da arbitragem.

  • 1º Acolhida a argüição de suspeição ou impedimento, será o árbitro substituído nos termos do art. 16 desta Lei, reconhecida a incompetência do árbitro ou do tribunal arbitral, bem como a nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, serão as partes remetidas ao órgão do Poder Judiciário competente para julgar a causa.
  • 2º Não sendo acolhida a argüição, terá normal prosseguimento a arbitragem, sem prejuízo de vir a ser examinada a decisão pelo órgão do Poder Judiciário competente, quando da eventual propositura da demanda de que trata o art. 33 desta Lei.

Art. 21. A arbitragem obedecerá ao procedimento estabelecido pelas partes na convenção de arbitragem, que poderá reportar-se às regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada, facultando-se, ainda, às partes delegar ao próprio árbitro, ou ao tribunal arbitral, regular o procedimento.

  • 1º Não havendo estipulação acerca do procedimento, caberá ao árbitro ou ao tribunal arbitral discipliná-lo.
  • 2º Serão, sempre, respeitados no procedimento arbitral os princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento.
  • 3º As partes poderão postular por intermédio de advogado, respeitada, sempre, a faculdade de designar quem as represente ou assista no procedimento arbitral.
  • 4º Competirá ao árbitro ou ao tribunal arbitral, no início do procedimento, tentar a conciliação das partes, aplicando-se, no que couber, o art. 28 desta Lei.

Art. 22. Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral tomar o depoimento das partes, ouvir testemunhas e determinar a realização de perícias ou outras provas que julgar necessárias, mediante requerimento das partes ou de ofício.

  • 1º O depoimento das partes e das testemunhas será tomado em local, dia e hora previamente comunicados, por escrito, e reduzido a termo, assinado pelo depoente, ou a seu rogo, e pelos árbitros.
  • 2º Em caso de desatendimento, sem justa causa, da convocação para prestar depoimento pessoal, o árbitro ou o tribunal arbitral levará em consideração o comportamento da parte faltosa, ao proferir sua sentença; se a ausência for de testemunha, nas mesmas circunstâncias, poderá o árbitro ou o presidente do tribunal arbitral requerer à autoridade judiciária que conduza a testemunha renitente, comprovando a existência da convenção de arbitragem.
  • 3º A revelia da parte não impedirá que seja proferida a sentença arbitral.
  • 4º Ressalvado o disposto no § 2º, havendo necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário que seria, originariamente, competente para julgar a causa. (Revogado pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)
  • 5º Se, durante o procedimento arbitral, um árbitro vier a ser substituído fica a critério do substituto repetir as provas já produzidas.

A deliberação arbitral há de ser em conferência, por maioria dos votos (Lei nº 9.307, art. 24, § 1º); e reduzida a escrito por um dos árbitros, que é o relator, ou o vencedor, se aquele foi vencido. O art. 23 da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, mostra que a deliberação não é na audiência de instrução qual ocorre nos juízos estatais. A sentença arbitral será emitida no prazo previsto pelos compromitentes (art. 11, III), ou no prazo de seis meses contado da instrução da arbitragem, ou da substituição de árbitro, se nada constou no compromisso arbitral a esse respeito, como determina o art. 23 da Lei de Arbitragem.

De qualquer forma, é dentro desses prazos que há de estar a audiência de instrução (art. 22). Se, porém, surge controvérsia acerca de direitos sobre os quais a lei não permite transação e se verifica que de sua existência dependerá, ou não, o julgamento, o próprio juízo arbitral suspende o procedimento arbitral para que as partem remetam a questão ou as questões ao juízo estatal competente para julgamento ou tais julgamentos. Estar-se-á diante de uma questão prejudicial, à luz do art. 25, § 5º, da Lei nº 9.307.

XII – AS MEDIDAS CAUTELARES OBTIDAS EM JUÍZO

Há normas eminentemente processuais, como se lê dos arts. 22-A e 22-B da Lei de Arbitragem:

Art. 22-A. Antes de instituída a arbitragem, as partes poderão recorrer ao Poder Judiciário para a concessão de medida cautelar ou de urgência. (Incluído pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

Parágrafo único. Cessa a eficácia da medida cautelar ou de urgência se a parte interessada não requerer a instituição da arbitragem no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data de efetivação da respectiva decisão. (Incluído pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

Art. 22-B. Instituída a arbitragem, caberá aos árbitros manter, modificar ou revogar a medida cautelar ou de urgência concedida pelo Poder Judiciário. (Incluído pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

Parágrafo único. Estando já instituída a arbitragem, a medida cautelar ou de urgência será requerida diretamente aos árbitros.

O prazo para requerimento de instituição de arbitragem é de 30 (trinta) dias, um prazo peremptório, que não pode ser aumentado pela vontade dos interessados, mas apenas do árbitro.

A provisoriedade é uma das notas da cautelaridade, que soma a verossimilhança da medida e da comprovação do grave risco de dano.

Bem explicou Marinoni (Da tutela cautelar à tutela antecipatória) ao dizer:

A tutela cautelar tem por fim assegurar a viabilidade da realização de um direito, não podendo realizá-lo. A tutela que satisfaz um direito, ainda que fundada em juízo de aparência, é “satisfativa sumária“. A prestação jurisdicional satisfativa sumária, pois, nada tem a ver com a tutela cautelar. A tutela que satisfaz, por estar além do assegurar, realiza missão que é completamente distinta da cautelar. Na tutela cautelar há sempre referibilidade a um direito acautelado. O direito referido é que é protegido (assegurado) cautelarmente.

Se inexiste referibilidade, ou referência a direito, não há direito acautelado.

Assim, não há arresto sem penhora. Na tutela cautelar, há uma verdadeira busca de proteção do processo. Surge um instrumento do próprio instrumento, que é o processo. Mas, veja-se: há decisões chamadas de cautelares, dentro de um juízo de aparência, que não são verdadeiramente cautelares. É o exemplo da medida de atentado, que é tipicamente satisfativa, não cautelar. As providências destinadas a protesto, notificação e interpelação têm, precipuamente, a natureza conservativa, não propriamente cautelar.

Mas a tutela que concede liminar de natureza cautelar é tipicamente mandamental, pois representa uma verdadeira ordem emanada da autoridade judicial. Aliás, a sentença, na tutela cautelar, é ainda mandamental, sem eficácia declaratória suficiente para produzir a coisa julgada material. Como bem ensinou Ovídio Baptista (Curso de processo civil, v. III, 2. ed., p. 64), a sentença que impõe uma medida cautelar não chega a declarar a existência de um direito assegurado, limitando-se, fundamentalmente, a ordenar que ela se efetive. O prazo do art. 22-A, parágrafo único, é peremptório, não dilatório, pois as partes não podem aumentá-lo, mas apenas o juiz.

XIII – A NULIDADE DA SENTENÇA ARBITRAL E A AÇÃO DESCONSTITUTIVA

De acordo com o art. 33 da Lei nº 9.307/1996, há a possibilidade de anulação da sentença arbitral, devendo está ser requerida pela parte interessada, por meio de órgão judiciário competente, caso esta esteja viciada por alguma das formas previstas nos incisos do art. 32 da mesma Lei.

Outrossim, importante ressaltar que, nos termos do § 2º, I, do art. 33 da Lei nº 9.307/1996, o órgão judiciário determinará a nulidade da sentença arbitral nos casos previstos nos incisos I, II, VI, VII e VIII do art. 32. Nos casos previstos nos demais incisos (III, IV e V), o órgão determinará que o árbitro, ou tribunal arbitral, profira novo laudo (art. 33, § 2º, II).

Mais importante do que discutir as possibilidades de nulidade da sentença arbitral, é demonstrar que tal nulidade só é possível nas possibilidades previstas nos referidos artigos. Muito se debate acerca da eficácia da sentença arbitral, em especial nesse momento acadêmico, quando pouco se tem contato com tal instituto do direito e que causa uma certa reticência sobre o real alcance das decisões proferidas pelos árbitros ou pelo tribunal arbitral.

Entretanto, temos que a própria jurisprudência dos Tribunais é clara sobre as possibilidades de anulação dessas decisões, o que corrobora com o entendimento exposto durante o curso sobre a eficácia do instituto da arbitragem e sua enorme relevância para a solução de litígios.

Vejamos.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – NULIDADE DE SENTENÇA ARBITRAL – CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA “CHEIA” – COMPROMISSO ARBITRAL – PRESCINDIBILIDADE – ATA DE MISSÃO – DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA E DAS REGRAS APLICÁVEIS – CONSENTIMENTO EXPRESSO – ARTIGOS ANALISADOS: 5º, 6º E 19 DA LEI Nº 9.307/1996 – 1. Agravo de instrumento interposto na origem em 10.07.2007, do qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 31.07.2013. 2. Exceção de pré-executividade oposta com o fim de declarar a nulidade de sentença arbitral, ante a ausência de assinatura de compromisso arbitral. 3. A convenção de arbitragem, tanto na modalidade do compromisso arbitral quanto na modalidade de cláusula compromissória, é suficiente e vinculante, afastando definitivamente a jurisdição estatal. 4. A contratação de cláusula compromissória “cheia”, espécie admitida pelo art. 5º da Lei de Arbitragem, na qual se convenciona a forma de nomeação dos árbitros ou adoção de regras institucionais, prescinde de complementação por meio de compromisso arbitral. 5. A “ata de missão” ou “termo de arbitragem” não se confunde com a convenção arbitral. Trata-se de instrumento processual próprio, pelo qual se delimita a controvérsia posta e a missão dos árbitros. 6. Diante da liberdade ampla vigente no procedimento arbitral, a manifestação das partes e dos árbitros na Ata de Missão possibilita a revisão e adequação das regras que serão utilizadas no desenrolar do processo, ainda que resulte em alterações quanto ao anteriormente convencionado, desde que respeitada a igualdade entre as partes e o contraditório. 7. Negado provimento ao recurso especial. (STJ, REsp 1389763/PR, 2013/0186578-8, 3ª Turma, Relª Min. Nancy Andrighi, J. 12.11.2013, DJe 20.11.2013) (g.n.)

PROCESSO CIVIL – AÇÃO DECLARATÓRIA – NULIDADE – PROCEDIMENTO ARBITRAL – NÃO OCORRÊNCIA – SENTENÇA MANTIDA – 1. Não se verificando a ocorrência de qualquer das causas de nulidade da sentença arbitral dispostas no art. 32 da Lei nº 9.307/1996, correta a sentença monocrática que rejeitou os embargos do devedor. 2. Conforme ensinamentos do Professor Nelson Nery Jr., a exemplo do que se dá em relação ao processo jurisdicionalizado, não se deve declarar a invalidade do juízo arbitral quando ele alcança seu objetivo, não obstante a ocorrência de irregularidades formais. 3. Apelação não provida.

Acrescentamos que no negócio jurídico de compromisso, como no negócio jurídico entre o comitente e o árbitro, pode ser inserta cláusula penal para o caso de insubmissão ao laudo arbitral, estabelecendo-se alternativa ou submissão ao laudo arbitral ou prestação do quantum da pena. Essa doutrina vem do direito romano (L. 2, L. 34, § 1º e L. 38, D).

Por sua vez, os arts. 33 e seguintes da Lei de Arbitragem falam da sentença arbitral:

Art. 23. A sentença arbitral será proferida no prazo estipulado pelas partes. Nada tendo sido convencionado, o prazo para a apresentação da sentença é de seis meses, contado da instituição da arbitragem ou da substituição do árbitro.

Parágrafo único. As partes e os árbitros, de comum acordo, poderão prorrogar o prazo estipulado.

  • 1º Os árbitros poderão proferir sentenças parciais. (Incluído pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)
  • 2º As partes e os árbitros, de comum acordo, poderão prorrogar o prazo para proferir a sentença final. (Incluído pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

Art. 24. A decisão do árbitro ou dos árbitros será expressa em documento escrito.

  • 1º Quando forem vários os árbitros, a decisão será tomada por maioria. Se não houver acordo majoritário, prevalecerá o voto do presidente do tribunal arbitral.
  • 2º O árbitro que divergir da maioria poderá, querendo, declarar seu voto em separado.

Art. 25. Sobrevindo no curso da arbitragem controvérsia acerca de direitos indisponíveis e verificando-se que de sua existência, ou não, dependerá o julgamento, o árbitro ou o tribunal arbitral remeterá as partes à autoridade competente do Poder Judiciário, suspendendo o procedimento arbitral. (Revogado pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

Parágrafo único. Resolvida a questão prejudicial e juntada aos autos a sentença ou acórdão transitados em julgado, terá normal seguimento a arbitragem. (Revogado pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência) 

Art. 26. São requisitos obrigatórios da sentença arbitral:

I – o relatório, que conterá os nomes das partes e um resumo do litígio;

II – os fundamentos da decisão, onde serão analisadas as questões de fato e de direito, mencionando-se, expressamente, se os árbitros julgaram por eqüidade;

III – o dispositivo, em que os árbitros resolverão as questões que lhes forem submetidas e estabelecerão o prazo para o cumprimento da decisão, se for o caso; e

IV – a data e o lugar em que foi proferida.

Parágrafo único. A sentença arbitral será assinada pelo árbitro ou por todos os árbitros. Caberá ao presidente do tribunal arbitral, na hipótese de um ou alguns dos árbitros não poder ou não querer assinar a sentença, certificar tal fato. 

Art. 27. A sentença arbitral decidirá sobre a responsabilidade das partes acerca das custas e despesas com a arbitragem, bem como sobre verba decorrente de litigância de má-fé, se for o caso, respeitadas as disposições da convenção de arbitragem, se houver. 

Art. 28. Se, no decurso da arbitragem, as partes chegarem a acordo quanto ao litígio, o árbitro ou o tribunal arbitral poderá, a pedido das partes, declarar tal fato mediante sentença arbitral, que conterá os requisitos do art. 26 desta Lei.

Art. 29. Proferida a sentença arbitral, dá-se por finda a arbitragem, devendo o árbitro, ou o presidente do tribunal arbitral, enviar cópia da decisão às partes, por via postal ou por outro meio qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento, ou, ainda, entregando-a diretamente às partes, mediante recibo. 

Art. 30. No prazo de cinco dias, a contar do recebimento da notificação ou da ciência pessoal da sentença arbitral, a parte interessada, mediante comunicação à outra parte, poderá solicitar ao árbitro ou ao tribunal arbitral que:

Art. 30. No prazo de 5 (cinco) dias, a contar do recebimento da notificação ou da ciência pessoal da sentença arbitral, salvo se outro prazo for acordado entre as partes, a parte interessada, mediante comunicação à outra parte, poderá solicitar ao árbitro ou ao tribunal arbitral que: (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

I – corrija qualquer erro material da sentença arbitral;

II – esclareça alguma obscuridade, dúvida ou contradição da sentença arbitral, ou se pronuncie sobre ponto omitido a respeito do qual devia manifestar-se a decisão.

Parágrafo único. O árbitro ou o tribunal arbitral decidirá, no prazo de dez dias, aditando a sentença arbitral e notificando as partes na forma do art. 29.

Parágrafo único. O árbitro ou o tribunal arbitral decidirá no prazo de 10 (dez) dias ou em prazo acordado com as partes, aditará a sentença arbitral e notificará as partes na forma do art. 29. (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

Art. 31. A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo. 

Art. 32. É nula a sentença arbitral se:

I – for nulo o compromisso;

I – for nula a convenção de arbitragem; (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

II – emanou de quem não podia ser árbitro;

III – não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei;

IV – for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem;

V – não decidir todo o litígio submetido à arbitragem; (Revogado pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

VI – comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva;

VII – proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e

VIII – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2º, desta Lei. 

Art. 33. A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a decretação da nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei. 

Art. 33. A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a declaração de nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei. (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

  • 1º A demanda para a decretação de nulidade da sentença arbitral seguirá o procedimento comum, previsto no Código de Processo Civil, e deverá ser proposta no prazo de até noventa dias após o recebimento da notificação da sentença arbitral ou de seu aditamento.
  • 1º A demanda para a declaração de nulidade da sentença arbitral, parcial ou final, seguirá as regras do procedimento comum, previstas na Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), e deverá ser proposta no prazo de até 90 (noventa) dias após o recebimento da notificação da respectiva sentença, parcial ou final, ou da decisão do pedido de esclarecimentos. (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)
  • 2º A sentença que julgar procedente o pedido:

I – decretará a nulidade da sentença arbitral, nos casos do art. 32, incisos I, II, VI, VII e VIII;

II – determinará que o árbitro ou o tribunal arbitral profira novo laudo, nas demais hipóteses.

  • 2º A sentença que julgar procedente o pedido declarará a nulidade da sentença arbitral, nos casos do art. 32, e determinará, se for o caso, que o árbitro ou o tribunal profira nova sentença arbitral. (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)
  • 3º A decretação da nulidade da sentença arbitral também poderá ser argüida mediante ação de embargos do devedor, conforme o art. 741 e seguintes do Código de Processo Civil, se houver execução judicial. (Vide Lei nº 13.105, de 2015) (Vigência)
  • 3º A declaração de nulidade da sentença arbitral também poderá ser arguida mediante impugnação, conforme o art. 475-L e seguintes da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), se houver execução judicial. (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)
  • 3º A decretação da nulidade da sentença arbitral também poderá ser requerida na impugnação ao cumprimento da sentença, nos termos dos arts. 525 e seguintes do Código de Processo Civil, se houver execução judicial. (Redação dada pela Lei nº 13.105, de 2015) (Vigência)
  • 4º A parte interessada poderá ingressar em juízo para requerer a prolação de sentença arbitral complementar, se o árbitro não decidir todos os pedidos submetidos à arbitragem. (Incluído pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)

Dessa forma, no que concerne à nulidade da sentença arbitral, sempre imprescindível nos debruçarmos sobre os termos dos arts. 32 e 33 da Lei nº 9.307/1996, que enumeram as possibilidades e condições para a anulação da decisão.

Quanto aos errores in iudicando, não cabe falar em anulação. Essa anulação acontecerá se houver error in procedendo, quando será o caso de cassação da sentença arbitral.

Daí porque será fundamental a aplicação do art. 32, § 1º, onde se diz:

  • 1º A demanda para a declaração de nulidade da sentença arbitral, parcial ou final, seguirá as regras do procedimento comum, previstas na Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), e deverá ser proposta no prazo de até 90 (noventa) dias após o recebimento da notificação da respectiva sentença, parcial ou final, ou da decisão do pedido de esclarecimentos.

O prazo de 90 dias é decadencial, de forma que é fatal, não se podendo falar em suspensão ou interrupção do prazo. Em havendo nulidade da sentença, há de se falar por efeito expansivo em nulidade do cumprimento da sentença.

As matérias como competência e impedimento, por exemplo, envolvem nulidade absoluta e podem ser conhecidas de oficio.

De outro lado, a decisão citra petita, extra petita ou ultra petita ao negócio jurídico de compromisso é sentença nula.

A nulidade da convenção de arbitragem leva à nulidade da sentença arbitral.

Observe-se o que se fala no art. 33: “A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a declaração de nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei. (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) (Vigência)“.

Na verdade, trata-se de ação constitutiva negativa e não ação meramente declaratória. Poderia falar o legislador em ação de rescisão, e não de anulação, pois aí não estão envolvidos vícios aos negócios jurídicos em geral.

De outra parte, quando o árbitro age prevaricando (tipo penal contra a Administração Pública), concussão (crime contra a Administração) e corrupção passiva (crime contra a Administração), conceitos diversos que devem ser objeto do crivo criminal, em ação penal própria, será um caso evidente de rescisão.

Os errores in procedendo produziam, no Direito romano, a inexistência do julgado: eram, pois, razão para se declarar a nullitas; não para decretar a sua desconstituição. Como ensinou Pontes de Miranda (Tratado da ação rescisória, 1976, p. 63), a impugnação da sentença para a desconstituir foi criação do século XII. O direito visigótico já transformara em nulidade a inexistência, surgindo a ordem do juízo rescidente para emendare.

No século VII, com a Lex Visigothorum, teve a península hispânica, além da querela por denegação de justiça, a ação contra o juiz suspeito, com restituição integral, e remédio jurídico contra a sentença injusta, em caso de corrupção, o que dava ensejo à sanção de nulidade.

Como explicou Pontes de Miranda (Tratado da ação rescisória, p. 65), a sentença que existe, e não é nula ipso iure, ou é inatacável ou rescindível, ou é desfazível com a relação jurídica processual em que se proferiu. A relação jurídica que se constituiu é nula de pleno direito.

Essa ação de rescisão não se passa dentro do processo em que se proferiu a decisão rescindenda. Nasce fora, em plano pré-processual, desenvolve-se em torno da decisão rescindenda, e, somente ao desconstituí-la, cortá-la, é que abre. Se trata de decisão terminativa de feito.

Rescindibilidade não é anulabilidade, nem nulidade.

Mas Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, t. XXIV, Bookseller, § 3.191, p. 405) expõe que a ação de nulidade tem por fito evitar que se decida sem observância de pressupostos necessários (Lei nº 9.307, art. 33). A ação de rescisão de sentença ou de permitir o reexame da matéria em circunstâncias especiais, que se hão de atender a despeito do trânsito em julgado. A homologação do laudo arbitral era apreciação limitada do laudo; o recurso, exame de homologação, com eventual descida à matéria julgada.

Marcos Vinícius T. da Costa Fernandes (Anulação da sentença arbitral), em Carta Forense, assim se pronunciou sobre os casos de nulidade da sentença arbitral, em casos taxativamente arrolados:

A Lei nº 9.307/1996 fala em nulidade da sentença arbitral ao tratar das oito situações listadas no art. 32, quando na verdade deveria falar em anulabilidade ou inexistência, devendo ser aplicada à arbitragem os conceitos e princípios utilizados no estudo dos vícios da sentença judicial.

Vale destacar que a suspeição poderá resultar em nulidade e poderá ser fundamento para a impugnação da sentença arbitral se a parte a suscitou na primeira oportunidade em que lhe foi dada oportunidade de se manifestar no transcorrer do procedimento. Já nos casos de impedimento, o próprio árbitro tem o dever de se abster do julgamento.

Entretanto, não deverá ser anulada a sentença arbitral se for breve o relatório; a anulação ocorre de ausência de relatório e não da sua brevidade – desde que dessa brevidade possam ser extraídas as razões utilizadas pelos árbitros. Já a sentença desprovida de dispositivo ou de assinatura será inexistente, muito embora a lei classifique tais atos como nulos. A inexistência, ao contrário da nulidade, faz com que a invalidade tenha um grau tão elevado que possa ser alegada a qualquer momento em que se pretenda atribuir eficácia à sentença.

O poder jurisdicional do árbitro decorre de uma conjunção entre a possibilidade legal de se submeter uma determinada matéria ao juízo arbitral somada à autonomia da vontade das partes em permitir que os árbitros solucionem um conflito específico. Por essa razão, a sentença arbitral que ultrapasse os limites concedidos ao árbitro por meio do compromisso arbitral será inexistente.

Isso não quer dizer que o árbitro não teria poder para decidir outras questões além da questão principal. Poderá o árbitro decidir, por exemplo, sobre questões atinentes a honorários advocatícios e atribuição de responsabilidade sobre as despesas processuais, ainda que tais questões tenham sido objeto da convenção de arbitragem.

Ademais, é anulável a sentença arbitral proferida por prevaricação, concussão ou corrupção do árbitro (CPC, art. 485, I c/ c LA, art. 32, inciso VI), pois se trata, nas três hipóteses que a lei enumera, de condutas penalmente ilícitas, perfeitamente tipificadas em normas do Código Penal vigente (art. 319, prevaricação; art. 316, concussão e arts. 317 e 333, corrupção).

Os possíveis meios de impugnação de sentença arbitral são os de embargos de declaração dotados de efeito modificativo (LA, art. 30), que se prestam à correção de erro material ou para que seja sanada dúvida, obscuridade ou contradição da sentença arbitral, a ação anulatória e a impugnação do devedor, ambas previstas no art. 33 da Lei nº 9.307/1996.

A ação anulatória prevista no art. 33 da Lei de Arbitragem deverá ser proposta diante do órgão competente do Poder Judiciário no prazo decadencial de 90 dias, contados da intimação da sentença arbitral. Essa ação dá suporte à natureza jurisdicional da arbitragem e à sua constitucionalidade, já que prestigia o princípio da inafastabilidade da jurisdição estatal, e poderá ter por fundamento um dos oito incisos do art. 32 da Lei nº 9.307/1996; a sentença proferida na ação anulatória tem natureza constitutiva.

Caso anule a sentença arbitral, o juiz estatal não poderá proferir nova decisão de mérito, restringindo-se sua atividade à averiguação ou não de qualquer invalidade e, se possível, devolvendo o conflito ao conhecimento do árbitro. Se não for mais viável a arbitragem, anula-se a sentença e aguarda-se que as partes tragam o conflito ao Poder Judiciário.

Por força no disposto no art. 475-N, inciso IV, do Código de Processo Civil, as sentenças arbitrais condenatórias são qualificadas como título executivo judicial. Isso faz com que se vislumbre a impugnação do devedor como um terceiro meio de ataque à sentença arbitral, visando à respectiva anulação.

Estas considerações apresentam uma breve síntese sobre as hipóteses de anulação da sentença arbitral e os meios previstos pelo ordenamento jurídico para se decretar a invalidade de tal ato.

XIV – A SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA

A sentença arbitral estrangeira será reconhecida ou executada no Brasil de conformidade com os tratados internacionais com eficácia no ordenamento interno e, na sua ausência, estritamente de acordo com os termos desta lei.

De acordo com o art. 961 do novo Código de Processo Civil (CPC), a decisão estrangeira somente terá eficácia no Brasil após a homologação.

A sentença arbitral estrangeira, para ser executada ou reconhecida no Brasil, depende de procedimento de homologação junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). No âmbito de tal procedimento, devem ser apreciados não só os requisitos formais da sentença arbitral estrangeira, que normalmente não geram muitas dúvidas e, portanto, não serão objeto do presente artigo, mas também algumas vedações relativas ao mérito da sentença, como não abordar matéria insuscetível de arbitragem pela lei brasileira, a exemplo do casamento e dos alimentos, além de não ofender a ordem pública ou a soberania nacional. Entre tais limites, o respeito à ordem pública e à soberania nacional são os que mais demandam discussões, por serem conceitos certas vezes abstratos e estão em constante debate jurisprudencial.

Em decisão recente do STJ, foi ampliado o rol de fatos considerados como ofensa à ordem pública nacional. Ficou reconhecido que a inobservância da garantia constitucional da imparcialidade e independência do julgador (árbitro) também atenta à ordem pública e, portanto, se afigura como um limite à efetividade da sentença arbitral estrangeira no Brasil. Essa decisão atinge em cheio uma das principais vantagens da arbitragem, que é a escolha de um julgador expert na área do litígio, o que não ocorre perante a jurisdição estatal.

Veja-se que isso não extingue a escolha dos árbitros, mas apenas a restringe aos limites da imparcialidade exigidos pela Lei da Arbitragem nº 9.307/1996 e pela Convenção de Nova York – Convenção sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro em 2002. Sendo assim, decidiu o STJ que a afastabilidade da jurisdição estatal e a homologação da sentença arbitral estrangeira só se justificam se o julgador eleito (árbitro) não mantiver interesse na causa, nem se sujeitar às causas de impedimento e suspeição previstas no Código de Processo Civil de 2015. Tal decisão se deu na Sentença Estrangeira Contestada nº 9.412/US.

O controle judicial da homologação da sentença arbitral estrangeira está limitado aos aspectos apontados na Lei de Arbitragem. As disposições desta lei descrevem um campo mais amplo de situações jurídicas que podem ser apresentadas na contestação da homologação de laudo arbitral, em relação àquelas estabelecidas no art. 221 do RISTF para homologação de sentenças estrangeiras; porém, isso não permite a análise do mérito da relação de direito material ligada à sentença arbitral objeto da homologação.

Para efeito de homologação, não se reconhece como violação ao contraditório e à ampla defesa se a parte requerida aderiu livremente aos contratos que estampavam expressamente a cláusula compromissória e que teve amplo conhecimento do procedimento arbitral, inclusive apresentando defesa.

Deve, sim, restar inequívoca a manifestação de vontade da parte em instituir a arbitragem, sob pena de ofender a ordem pública, porquanto a inexistência de declaração de vontade afronta princípio previsto no ordenamento jurídico que exige a aceitação expressa das partes de se submeterem à arbitragem. Entretanto, mesmo não havendo contrato assinado elegendo a arbitragem para a solução da controvérsia e constatando que a parte requerida (no procedimento de homologação) se defendeu no Juízo arbitral sem impugnar a existência da cláusula compromissória, é possível a homologação da sentença arbitral estrangeira.

A autenticação consular referida no art. 5º, inciso IV, da Resolução nº 9/2005 do STJ interpreta-se de acordo com as Normas do Serviço Consular e Jurídico do Ministério das Relações Exteriores, as quais estabelecem que o ato de fé pública, representativo da autenticação consular oficial de documentos produzidos no exterior, é denominado genericamente de “legalização” e se opera (i) mediante o reconhecimento da assinatura da autoridade expedidora (que desempenha funções no âmbito da jurisdição consular), quando o documento a ser legalizado estiver assinado, ou (ii) mediante autenticação em sentido estrito, relativamente a documentos não assinados ou em que conste assinatura impressa ou selos secos.

As disposições da Lei nº 9.307/1996 têm incidência imediata nos contratos avençados anteriormente à vigência da Lei de Arbitragem, se em tais pactos estiver inserida a cláusula arbitral.

Problema a ser enfrentado diz respeito à homologação de sentença estrangeira anulada.

O Superior Tribunal de Justiça analisou, no dia 2 de dezembro de 2015, pela primeira vez na história, pedido de homologação de sentença arbitral estrangeira anulada pelas cortes do país de origem.

O caso (Sentença Estrangeira Contestada SEC nº 5.782/EX) foi deflagrado pela companhia EDFI S/A, que requereu perante o STJ a homologação de sentença arbitral proferida em desfavor de Endesa Latinoamérica S/A e YPF S/A. O procedimento arbitral foi conduzido sob os auspícios da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI), em Buenos Aires, Argentina. A segunda requerida arguiu a inviabilidade da homologação em virtude da anulação da sentença arbitral pelas cortes argentinas, fato não impugnado pela requerente.

Em acórdão da lavra do Ministro Jorge Mussi, a Corte Especial do STJ rejeitou, por unanimidade, o pedido. Interpretando a Convenção de Nova York (art. V, I, “e”), a Lei de Arbitragem (art. 38, VI), a Convenção do Panamá (art. 5, I, “e”), o Protocolo de Las Leñas (art. 20, “e”), a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB – arts. 15 e 17) e seu Regimento Interno (art. 216-D, III), o STJ concluiu pelo “não cabimento de homologação de sentença estrangeira arbitral suspensa ou anulada por órgão judicial do país onde a sentença arbitral foi prolatada“.

Uma das principais contribuições da Convenção de Nova York foi a eliminação da necessidade de ratificação da sentença arbitral pelas cortes do Estado de origem para a execução no estrangeiro. Em outras palavras, a Convenção de Nova York instituiu uma presunção de validade da sentença arbitral lavrada em qualquer dos Estados-partes e, assim, contribuiu decisivamente para a afirmação da arbitragem como um mecanismo viável para a solução de disputas comerciais transnacionais.

Essa presunção, entretanto, não é absoluta. O art. V da Convenção de Nova York lista circunstâncias sob as quais qualquer dos Estados-partes poderá rejeitar a homologação de sentença estrangeira. A forma “poderá” (“may“, na versão original em língua inglesa) foi cuidadosamente escolhida pelos redatores da Convenção para que os Estados-partes tivessem sua autonomia preservada e não fossem obrigados a homologar todo e qualquer laudo arbitral estrangeiro.

É verdade que sentenças arbitrais anuladas na origem apenas excepcionalmente são homologadas e executadas em outra jurisdição. A habitual deferência ao julgamento que anula a sentença arbitral é fruto da cortesia entre os países e, principalmente, do reconhecimento de que as cortes da origem dispõem de melhores condições para aferir a validade da sentença arbitral à luz de suas próprias leis, que em regra balizam o procedimento arbitral. Entretanto, a experiência estrangeira revela que, à luz da Convenção de Nova York, essa deferência não é obrigatória.

Nos Estados Unidos da América, o caso Chromalloy (1996) é o ponto de partida para a análise da questão. Ao analisar pedido de homologação de sentença arbitral estrangeira anulada pelas cortes do país de origem (Egito), a Corte do Distrito de Columbia identificou que as partes haviam renunciado contratualmente ao direito de impugnar na justiça egípcia a sentença arbitral. Por corolário, concluiu que a decretação judicial da nulidade desta operou-se em desrespeito ao acordo entre as partes. Em prestígio ao caráter vinculante do contrato e da arbitragem, a Corte norte-americana ignorou a decisão anulatória e reconheceu válida a sentença arbitral anulada na origem.

Em Baker Marine v. Chevron (1999), a Corte de Apelações do Segundo Circuito rejeitou pedido de homologação de sentença arbitral proferida na Nigéria e anulada pelas cortes daquele país. Embora o resultado tenha sido o mesmo alcançado pelo STJ na SEC 5.782/EX, a fundamentação foi distinta: a Corte norte-americana considerou que a requerente, que evocara o permissivo “poderá” do art. V, 1, “e”, da Convenção de Nova York, não apresentou “fundamento razoável” para que a decisão das Cortes nigerianas fosse desconsiderada. Ou seja, mesmo tendo rejeitado o pedido, a Corte norte-americana reconheceu que o art. V, I, “e”, da Convenção de Nova York garantia-lhe margem de discricionariedade para homologar sentença arbitral anulada na origem.

Mais recentemente, no caso Pemex (2013), a Corte do Southern District de Nova York acolheu pedido de homologação de sentença arbitral prolatada no México e anulada pelas cortes daquele país. A Corte norte-americana considerou que a decisão judicial anulatória, proferida sem fundamento legal, violava noções básicas de justiça material e, portanto, não poderia servir como óbice ao cumprimento da sentença arbitral nos Estados Unidos.

Em homologação da sentença estrangeira anulada na origem, Gustavo Henrique Carvalho Schiefle e, ainda, Bernardo Rohden Pires concluíram o que segue para o caso:

Considerando que a Convenção de Nova York faculta aos Estados-partes a homologação de sentenças arbitrais estrangeiras anuladas na origem, não parece haver óbice para que qualquer dos Estados-partes renuncie a essa faculdade. No caso brasileiro, a renúncia dar-se-ia pelo art. 15, “c”, da

LINDB, que condiciona a homologação da sentença estrangeira à presença dos requisitos necessários para a execução na origem – os quais, por evidente, não estão presentes em sentenças arbitrais cuja nulidade houver sido decretada pelas cortes da origem.

Há ainda um outro fator a ser considerado: o país de origem da sentença arbitral. Os países do Mercosul, a Bolívia e o Chile assinaram o Protocolo de Las Leñas, ratificado no Brasil pelo Decreto nº 6.891/2009 e que estabelece regime diferenciado para a homologação de sentenças judiciais e arbitrais lavradas nos países signatários. Ressalte-se, por oportuno, que a sentença arbitral em exame na SEC 5.782/EX foi lavrada e anulada na Argentina, razão pela qual o STJ aplicou à hipótese dos autos o disposto no art. 20, “e”, do Protocolo de Las Leñas: “As sentenças e os laudos arbitrais a que se referem o artigo anterior terão eficácia extraterritorial nos Estados Partes quando reunirem as seguintes condições: […] e) que a decisão tenha força de coisa julgada e/ou executória no Estado em que foi ditada”.

Verifica-se que a redação do Protocolo de Las Leñas é muito similar à da LINDB. A principal diferença entre ambas é a previsão expressa, no Protocolo de Las Leñas, de “laudos arbitrais“. Na discussão sobre as possíveis antinomias entre os dispositivos que tratam da homologação de sentenças arbitrais estrangeiras, é possível argumentar-se que o Protocolo de Las Leñas, mais recente, sobrepõe-se em relação à Convenção de Nova York, à Convenção do Panamá e à Lei de Arbitragem e, portanto, deve reger pedidos de homologação de sentenças arbitrais lavradas nos países do Mercosul, no Chile e na Bolívia.

Em resumo, a homologação de sentenças arbitrais estrangeiras anuladas na origem é matéria complexa e repleta de nuances, principalmente diante da miríade de dispositivos a tratar do tema no ordenamento jurídico brasileiro. Por tratar-se da primeira decisão sobre a matéria, o precedente na SEC 5.782/EX inequivocamente servirá de referência para próximos julgamentos, mas ainda há questões jurídicas a serem esclarecidas.

A principal delas é a possível antinomia entre, de um lado, a LINDB, o Regimento do STJ, o Protocolo de Las Leñas e a Convenção Interamericana sobre Eficácia Extraterritorial das Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros; e, de outro, a Convenção de Nova York, a Convenção do Panamá e a Lei de Arbitragem.