CASAMENTO POR PROCURAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO
Rogério Tadeu Romano
O casamento pode celebrar-se mediante procuração que outorgue poderes especiais para receber, em nome do outorgante, o outro contraente(artigo 201 do Código Civil).
Procuração é o ato em virtude do qual uma pessoa dá a outra o poder de fazer alguma coisa para o outorgante dos poderes e em nome desse. Procuração geral é aquele em que os poderes nela conferidos são de simples administração. Abrange todos os atos de gerência conexos e consequentes, como se vê no artigo 145 do Código Comercial.
Procuração especial é aquela que contém poderes para o ato ou atos que nela se especifiquem. Há certos atos que requerem, por sua natureza, poderes especiais do outorgante, como é o caso do contrato e do matrimônio.
No caso do casamento são concedidos poderes especiais ao mandatário através de procuração. Exige-se que nela conste o nome da pessoa com quem vai casar-se o outorgante. Aliás, disse Pontes de Miranda(Tratado de direito de família, 1ª edição) que “é o domicílio desse alguém”. Mas aduziu Pontes de Miranda(Tratado de direito privado, tomo VII, Bookseller, pág. 344) que não é requisito especial dizer-se o domicílio da pessoa com quem se vai casar o outorgante. É possível que ele dê a procuração exatamente para alguém que se possa locomover com mais facilidade, procure o paradeiro da pessoa com quem se quer casar. E acrescentou Pontes de Miranda: “Nem a letra da lei brasileira, nem a do direito canônico, exigem que se diga o domicílio do outro nubente. O procurador ficará com a liberdade de satisfazer as exigências da lei, no lugar em que se encontrar a noiva ou o noivo do outorgante”.
O casamento poderá ser celebrado por procuração, desde que haja instrumento público com poderes especiais para tanto, e a eficácia do mandato não ultrapassará 90 dias da sua celebração (art. 1.542, § 3.º do Código Civil de 2002). Eventualmente, se o mandante quiser revogar o mandato, a revogação não necessita chegar ao conhecimento do mandatário (art. 1.542, § 1.º, do CC). Ressalte-se que somente é possível revogar o mandato para o casamento por meio de instrumento público (art. 1.542, § 4.º).
No passado, o Decreto nº 181, de 1890, artigo 44, limitava a procuração ao caso urgente e de força maior, em que um dos contraentes não pudesse transportar-se ao lugar da residência do outro, nem demorar o casamento. Os Códigos Civis de 1916 e de 2002 não fizeram tal exigência, admitindo a procuração quaisquer que sejam as circunstâncias.
Tratando-se de pessoa sujeita à legislação brasileira, como lei pessoal, a procuração pode ser do próprio punho do contraente, com reconhecimento da firma, ou por instrumento público.
O substabelecimento da procuração depende da lei pessoal do outorgante. Aliás, a lei brasileira não fez referência ao substabelecimento.
O Código Civil ainda não veda que ambos se representem.
A outorga de direitos das obrigações supõe a ciência do outro, de modo que não eficazes os atos praticados enquanto o outorgado não sabe da revogação. Quanto aos terceiros de boa-fé, ainda que notificada ao outorgado a revogação, nenhuns hão de ser os seus efeitos.
Essa procuração que se fala é suscetível de livre revogação.
A loucura superveniente ineficaciza a procuração. Se efetuado o casamento após a loucura, volta o outorgante à lucidez e ciente da efetuação do casamento, tem relações sexuais com a pessoa com que foi realizado, ou pratica qualquer ato de assentimento, sanada está a invalidade decorrente da ineficácia.
Revogada a procuração fica inválido o casamento. Aliás dá-se o mesmo se cai em demência como se vê no direito canônico(Codex Iuris Canonici, cânon 1.089, § 3º).
A morte importa cessação dos poderes de representação do casamento. Porém, como ensinou Pontes de Miranda(obra citada, pág. 347), enquanto, no direito das obrigações, são válidos, a respeito dos contraentes de boa-fé, os atos ajustados em nome do outorgante pelo outorgado, no tempo em que o mandatário ignora a morte do mandante, não existe o casamento que foi contraído após a morte do mandante, ainda que a ignorem o procurador e o outro nubente, ou a ignore um só deles.
Mas é possível até que a pessoa em iminente risco de vida se case, como já se lia do artigo 199, parágrafo único do Código Civil de 1916, estando representado por procurador especial o outro cônjuge, mas o que está em iminente risco de vida só se casa, por procuração, se, no momento de se celebrar o casamento, na forma ordinária, ou em qualquer outra, que caiba, ainda vivia.
Observa-se então do Código Civil de 2002:
Art. 1.542. O casamento pode celebrar-se mediante procuração, por instrumento público, com poderes especiais.
1o A revogação do mandato não necessita chegar ao conhecimento do mandatário; mas, celebrado o casamento sem que o mandatário ou o outro contraente tivessem ciência da revogação, responderá o mandante por perdas e danos.
2o O nubente que não estiver em iminente risco de vida poderá fazer-se representar no casamento nuncupativo.
3o A eficácia do mandato não ultrapassará noventa dias.
4o Só por instrumento público se poderá revogar o mandato.
Distingue-se o casamento por procuração do chamado casamento por carta, ou por núncio.
Esse último casamento por carta vem do direito romano, que o permitiu ao homem, quando ausente do seu domicílio, mas presente a esse a mulher. Lia-se da L. r, D., di ritu nuptiarum, 23, 2.
O direito canônico não mais admite o casamento por carta, que se reconhecia sob o sistema tridentino. Durante muito tempo se confundiu com o casamento por procuração que foi regulado, mais uma vez, no Codex Iuris Canonici de 1917. Muito diferente era s situação, porque só a aceitação era diante do parochus e das testemunhas, o que quebrava a unidade do ato, razão porque se exigia, na carta, a declaração de fazer a tradição do seu corpo e desde logo aceitar a do corpo de outro. O direito brasileiro não no tem por meio de carta, nem, sequer, por núncio.