BENS SONEGADOS NO DIREITO SUCESSÓRIO
Helen Lemes
O instituto da sonegação tem por finalidade garantir a exatidão do inventário e a igualdade na partilha, assegurando aos herdeiros os seus direitos sucessórios e aos credores o direito de se pagarem com o produto da venda dos bens do espólio.
Durante o procedimento do inventário, com a abertura da sucessão, o inventariante e os herdeiros deverão declarar e enumerar os bens pertencentes ao espólio que estiverem em seu poder.
Iniciado o inventário, cabe ao inventariante prestar declarações preliminares, em que apresentará relação completa dos bens da herança e que oportunamente se partilharão entre os herdeiros. Igualmente, devem estes restituir bens do espólio que porventura se achem em seu poder, assim como indicar terceiras pessoas que se tenham tornado detentoras de efeitos componentes do acervo.
Nesse sentido, pode-se afirmar que sonegar é deixar conscientemente de declarar ou omitir bens que deveriam constar na colação pelo inventariante ou pelos herdeiros do espólio, ou seja, sonegar é o mesmo que ocultar e faz presumir a existência de dolo.
Tendo como objetivo, representado pela omissão de conferir, de declarar ou restituir bens do acervo hereditário e subjetivo a intenção maliciosa.
Porém, para alguns, a prova do dolo é somente mediante prova plena da ocorrência desse elemento ético-jurídico, ou seja, qualquer justificativa plausível do inventariante ou do herdeiro bastará para isentá-lo da pena.
Por outro lado, a maioria defende que o dolo na sonegação existe in re ipsa, no próprio ato de ocultar, desviar, omitir e ainda que, a sonegação por si só, presumi a ocultação dolosa com a intenção de prejudicar os demais interessados.
O capítulo II do Código Civil possui o título de “Sonegados” e regulamenta dos artigos 1.992 a 1.996 as questões inerentes a tal prática.
Para que seja caracterizada a sonegação o herdeiro deve não descrever bens no inventário quando estes estiverem em seu poder ou com seu conhecimento no de outra pessoa, ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou que deixar de restitui-los, perderá o direito que sobre eles lhe caiba.
Nesse sentido, pode-se afirmar que a punição civil para a sonegação é a perda do bem ou dos bens sonegados. Além da punição anterior, em se tratando do próprio inventariante, remover-se-á no caso de provada a sonegação ou negando a existência dos bens, quando indicados.
Entretanto, só se poderá arguir da sonegação por parte do inventariante herdeiro apenas após de encerrada a descrição dos bens com a declaração dele de não existir outros e dos herdeiros quando declarar no inventário que não os possui, sendo assim: “com a declaração, por ele feita, de não existirem outros por inventariar e partir”.
A pena de sonegados só poderá ser requerida e imposta em sentença, sendo que a parte autora deverá ser obrigatoriamente, os herdeiros ou credores da herança.
Porém, a simples destituição poderá ser decretada nos próprios autos do inventário, se houver elementos comprobatórios de sonegação. Sendo assim, a sentença que proferir na ação de sonegados, aproveita aos demais interessados e caso os bens sonegados não sejam restituídos por já o sonegador não os ter em seu poder, pagará o valor correspondente ao bem ocultado mais as perdas e danos.
A ação de sonegados prescreve em 10 (dez) anos e deve ser ajuizada no foro do inventário e pode ser proposta por qualquer herdeiro contra o inventariante; o inventariante ou qualquer herdeiro se por herdeiro for praticada a omissão e ainda, pelo credor, se as ocultações lhe causarem prejuízos.
Em diversas situações podem ocorrer a sonegação de bens, como por exemplo: na falsificação da escrita para diminuir o ativo; na ocultação de crédito, aquisições, etc; disfarçar doação ou divida; encobrir dívida de herdeiro para com o espólio; realizar, até mesmo em vida do inventariante e manter depois de sua morte, alienação fictícia de coisas pertencentes a ele; ou nada declarar sobre compra fraudulenta efetuada por terceiro; extraviar, de proposito, ou ocultar títulos de propriedade ou de dívida; simular ou falsificar aquisição de bens do de cujus por ele, sonegador; utilizar-se, diretamente ou por meio de interposta pessoa, de um crédito inexistente ou falso, contra a sucessão, a fim de baixar o monte-mor ou prejudicar herdeiro ou credor.
Segundo Flávio Tartuce: “cabe pontuar que a remoção da inventariante em decorrência da pena de sonegados deve ser somente admitida em casos excepcionais, desde que o elemento malicioso da sua configuração esteja presente, e devidamente provado. Em outras palavras, não havendo provas efetivas do ato subjetivo de ocultação em sede de inventário, e sendo tal fato dependente de provas complexas, não poderá ser admitida a drástica medida. O que quase sempre querem as partes de um inventário é o seu encerramento e não a existência de disputas intermináveis, aumentando-se gravemente a litigiosidade se a remoção da inventariante for feita sem critérios, o que muitas vezes se vê na prática, infelizmente”.
Como pode se ver no Recurso Especial ao STJ:
“Direito civil. Direito processual civil. 1) Ação ordinária de colação e sonegados. Depósito expressivo em caderneta de poupança conjunta do de cujus com herdeiros. Apropriação pelos herdeiros mediante a saída do de cujus da titularidade da conta. Valor não levado pelos herdeiros à partilha no inventário. Ação de colação de sonegados procedente. 2) Julgamento por vara cível, a que remetidos os autos pelo juízo do inventário, por decisão irrecorrida. Questão de alta indagação ou dependente de provas. Inexistência de nulidade no julgamento pela vara cível. Ausência de prejuízo. 3) Ação ordinária de colação adequada. 4) Preclusão de homologação inexistente. Partilha amigável que não impede de colação de bens sonegados. 5) Recurso especial improvido. 1. Devem ser relacionados no inventário valores vultosos de caderneta de poupança conjunta, mantida por herdeiros com o de cujus, ante a retirada deste da titularidade da conta, permanecendo o valor, não trazido ao inventário, em poder dos herdeiros. 2. Válido o julgamento da matéria obrigacional, antecedente do direito à colação, de alta indagação e dependente de provas, por Juízo de Vara Cível, para o qual declinada, sem recurso, a competência, pelo Juízo do Inventário. Matéria, ademais, não cognoscível por esta Corte (Súmula 280/STF). 3. Ação de colação adequada, não se exigindo a propositura, em seu lugar, de ação de sobrepartilha, consequência do direito de colação de sonegados cujo reconhecimento é antecedente necessário da sobrepartilha. 4. O direito à colação de bens do de cujus em proveito de herdeiros necessários subsiste diante da partilha amigável no processo de inventário, em que omitida a declaração dos bens doados inoficiosamente e que, por isso, devem ser colacionados. 5. Recurso especial improvido” (STJ, REsp 1.343.263/CE, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 4/4/2013, DJe11/4/2013).
Por fim, o instituto da sonegação tem por finalidade garantir a exatidão do inventário e a igualdade na partilha, assegurando aos herdeiros os seus direitos sucessórios e aos credores o direito de se pagarem com o produto da venda dos bens do espólio.
Referência Bibliográficas
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro – Direito das Sucessões, São Paulo: Editora Saraiva. 2015
DINIZ. Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Sucessões. São Paulo: Editora Saraiva. 2015.
MONTEIRO, Washington de Barros. PINTO. Ana Cristina de Barros Monteiro. Curso de Direito Civil – Direito das Sucessões: São Paulo. Editora Saraiva. 2011.