AS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA E A GRATUIDADE DA JUSTIÇA NO NOVO CPC
Clovis Brasil Pereira
SUMÁRIO: Introdução – Das despesas do processo – Dos honorários advocatícios – A natureza alimentar dos honorários advocatícios – A gratuidade da justiça e as verbas de sucumbência – Conclusão.
INTRODUÇÃO
No processo judicial se constitui em ônus das partes, prover todas as despesas necessárias para realização dos atos processuais, antecipando-lhes o pagamento, desde o início até sentença final ou na execução, até a plena satisfação do direito reconhecido no título judicial (art. 82).
Ao final do processo, além das despesas e multas processuais que der causa, caberá à parte vencida, pagar também os honorários advocatícios que forem fixados na sentença judicial, em benefício do advogado do vencedor (art. 85), constituindo-se esses encargos nas verbas de sucumbência.
DAS DESPESAS DO PROCESSO
Segundo o art. 84, as despesas abrangem as custas dos atos do processo, a indenização de viagem, a remuneração do assistente técnico e a diária de testemunha.
Quanto ao pagamento das despesas com a perícia, que são geralmente de valor significativo, cada parte adiantará a remuneração do assistente técnico que houver indicado, sendo a do perito adiantada pela parte que houver requerido a perícia, rateada quando a perícia for determinada de ofício ou requerida por ambas as partes, conforme a previsão do art. 95.
Quanto ao compartilhamento das despesas processuais, o Novo CPC estatui que se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas (art. 86), e se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos honorários (parágrafo único).
Na hipótese de litisconsórcio ativo ou passivo, os vencidos respondem proporcionalmente pelas despesas e pelos honorários (art. 87), devendo o juiz, na sentença distribuir entre eles, de forma expressa, a responsabilidade proporcional pelo pagamento das verbas processuais devidas, respondendo todos solidariamente pelo pagamento de tais despesas bem como dos honorários advocatícios fixados pelo juiz.
Nos procedimentos de jurisdição voluntária, onde não há litigiosidade e sim interessados, as despesas serão adiantadas pelo requerente e rateadas entre os interessados, conforme art. 88, o mesmo ocorrendo nos juízos divisórios, tais como ação de divisão e demarcação de terras particulares, em que não havendo litígio, os interessados pagarão as despesas proporcionalmente a seus quinhões (art. 89).
DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
O Novo CPC traz destaque para a previsão dos honorários advocatícios, que guardam relação direta com as verbas de sucumbência e que tem regulamento expresso no artigo 85, incisos e parágrafos.
O estatuto processual prevê a incidência de honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente, sendo esta uma inovação que veio eliminar eventuais dúvidas na interpretação legal e na construção da jurisprudência, e serão fixados no patamar entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.
O percentual dos honorários, conforme a previsão do artigo 85, § 2º, será fixado pelo juiz, levando em conta:
I – o grau de zelo do profissional;
II – o lugar de prestação do serviço;
III – a natureza e a importância da causa;
IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
Outra importante conquista dos advogados foi alcançada no Novo CPC, com a previsão, de forma clara, da incidência dos honorários nas causas em que a Fazenda Pública for parte, cabendo ao juiz, levando em conta os critérios estabelecidos nos incisos I a V do § 2º, fixá-los nos seguintes percentuais.
I – mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários mínimos;
II – mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários mínimos até 2.000 (dois mil) salários mínimos;
III – mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários mínimos até 20.000 (vinte mil) salários mínimos;
IV – mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários mínimos até 100.000 (cem mil) salários mínimos;
V – mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários mínimos.
Será considerado o valor do salário mínimo vigente, a data da prolação da sentença líquida ou a que estiver em vigor na data da decisão da liquidação, conforme § 4º, inc. IV, sendo que não havendo condenação principal ou não sendo possível mensurar o proveito econômico obtido, a condenação em honorários dar-se-á sobre o valor atualizado da causa conforme previsto no § 3º.
No cálculo dos honorários devidos quando da condenação contra a Fazenda Pública, o benefício econômico obtido pelo vencedor ou o valor da causa for superior ao valor previsto no inciso I do § 3º, a fixação do percentual de honorários deve observar a faixa inicial e, naquilo que a exceder, a faixa subsequente, e assim sucessivamente, aplicando-se tais limites e critérios, independentemente de qual seja o conteúdo da decisão, inclusive aos casos de improcedência ou de sentença sem resolução de mérito.
Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, conforme prevê o § 8º.
Outras previsões no Novo CPC quanto aos honorários advocatícios merecem destaque, a saber:
- a) Na ação de indenização por ato ilícito contra pessoa, o percentual de honorários incidirá sobre a soma das prestações vencidas acrescida de 12 (doze) prestações vincendas (§ 9º);
- b) Nos casos de perda do objeto da ação, os honorários serão devidos por quem deu causa ao processo (§ 10);
- c) O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento do processo (§ 11), observando-se que os honorários advocatícios são cumuláveis com multas e outras sanções processuais, previstas expressamente no Novo CPC;
- d) As verbas de sucumbência arbitradas em embargos à execução rejeitados ou julgados improcedentes e em fase de cumprimento de sentença serão acrescidas no valor do débito principal, para todos os efeitos legais (§ 13).
A NATUREZA ALIMENTAR DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Clareando entendimento dúbio da doutrina e jurisprudência pátria, que ora decidiam num, ora noutro sentido, pelo novo estatuto processual, os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial, conforme a previsão expressa no § 14 do artigo 85.
Os honorários serão devidos quando o advogado atuar em causa própria (§ 17), e na hipótese de que a sentença transitada em julgado seja omissa quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor, será cabível ação autônoma para sua definição e cobrança (§ 18).
O Novo CPC traz ainda, a previsão de honorários de sucumbência para os advogados públicos, nos termos da lei, necessitando neste caso, de legislação complementar, quando inexistente, para regulamentar sua distribuição.
Por fim, conforme previsto no art. 96, o valor das sanções impostas ao litigante de má-fé, que compõe as verbas de sucumbência, reverterá em benefício da parte contrária e o valor das sanções impostas aos serventuários pertencerá ao Estado ou à União.
A GRATUIDADE DA JUSTIÇA E AS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA
Para dar efetividade ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, que proíbe a lei de excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, a Carta Constitucional garante a todos o acesso à justiça, para postular e defender os seus interesses, assegurando a gratuidade da justiça a todos os destinatários da norma constitucional que não tenham condições de arcar com o pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, sem prejuízo do sustento próprio e de sua família.
Tal garantia vem esculpida na Lei Maior, que assevera:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…]
LXXIV – o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.
Tal possibilidade já está sedimentada desde a edição da Lei 1.060/1950, que disciplina a forma procedimental para sua concessão.
A assistência judiciária gratuita converte-se em um dos principais instrumentos para se garantir o acesso igualitário à justiça àqueles que comprovem insuficiência de recursos.
José Afonso da Silva, em seu livro Curso de direito constitucional positivo. Malheiros, 1998. p. 222-223, assevera que:
[…] formalmente, a igualdade perante a Justiça está assegurada pela Constituição, desde a garantia de acessibilidade a ela (art. 5º, XXXV). Mas realmente, essa igualdade não existe, pois está bem claro hoje, que tratar como igual a sujeitos que econômica e socialmente estão em desvantagem, não é outra coisa senão uma ulterior forma de desigualdade e de injustiça. Os pobres têm acesso muito precário à Justiça. Carecem de recursos para contratar bons advogados. O patrocínio gratuito se revelou de alarmante deficiência. A Constituição tomou, a esse propósito, providência que pode concorrer para a eficácia do dispositivo, segundo o qual o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos (art. 5º, LXXIV).
O Novo CPC, no art. 98, por sua vez, assegura à pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, direito à gratuidade da justiça, na forma da lei, compreendendo conforme seu parágrafo § 1º, o rol de despesas e custas processuais elencadas nos incisos I a IX, tais como: taxas ou as custas judiciais, os selos postais, indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse, as despesas com a realização de exame de código genético – DNA e de outros exames considerados essenciais, os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira.
Prevê, inclusive, despesas extrajudiciais com os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido, dentre outras despesas.
Por sua vez, concedida a gratuidade, esta não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência, ficando tal responsabilidade em condição suspensiva de exigibilidade, podendo ser executadas até os 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, desde que o credor demonstre que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade. Passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário se extinguem, conforme a previsão dos parágrafos 2º e 3º do art. 98.
É importante ressaltar quanto a gratuidade da justiça, que se presume verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural, e que a assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça, conduta que alguns juízes, sob a égide do CPC vigente, insistem em negar, sob a singela argumentação, que se tem advogado patrocinando o jurisdicionado pobre, é sinal que o mesmo pode arcar com as despesas judiciais, não sendo reconhecido pobre na acepção jurídica do termo.
CONCLUSÃO
O Novo Código de Processo Civil, quanto às verbas de sucumbência e fixação de honorários advocatícios, representa um avanço para o exercício profissional da advocacia, notadamente ao fixar regras para os honorários devidos pela Fazenda Pública, prevendo honorários na fase recursal, uma vez que o aumento da atividade jurisdicional ensejará melhor remuneração aos profissionais, e ainda, por considerar que os honorários advocatícios têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial, um avanço que pode ser festejado pela classe dos advogados.