AS FORMAS DE EXPROPRIAÇÃO DE BENS NO PROCESSO DE EXECUÇÃO
Emanuel Giendruczak Oliveira
A expropriação é o instituto jurídico que visa, para fins de satisfação do crédito do exequente, desapossar o executado de seus bens. Tal ato processual constitui a terceira fase da execução forçada, que, nas palavras de Elpídio Donizetti, trata-se do ato pelo qual o “Estado expropria bens do devedor, independentemente da vontade deste, para satisfazer o crédito exequendo”[1].
O mesmo doutrinador conceitua expropriação como “o ato pelo qual o Estado-juízo, para satisfação do direito de crédito, desapossa o devedor de seus bens, converte esses bens em dinheiro ou simplesmente transfere o domínio deles ao credor”[2].
Para Marinoni – Arenhart – Midiero, doutrinadores responsáveis pela obra: Novo Código de Processo Civil Comentado, a expropriação “é o conjunto de técnicas que visa a retirar o patrimônio do executado valores que sirvam para satisfação do exequente. Consiste na adjudicação (arts. 825, I, 876 e 877, CPC), na alienação por iniciativa particular ou em leilão público (arts. 825, II, e 879 e ss., CPC) ou na expropriação de frutos e rendimentos (art. 825, III e 866 – 869, CPC)”[3].
O art. 825 do Código de Processo Civil elenca as três espécies de expropriação de bens, quais sejam, a adjudicação, a alienação e a apropriação de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens, in verbis. Há doutrinadores que, inclusive, apontam quatro espécies ou formas expropriatórias, subdividindo a alienação em duas subespécies ou modalidades: por iniciativa particular e por leilão público.
Passamos à análise de cada uma dessas formas:
1. Da adjudicação de bens
A adjudicação, forma expropriatória constante no inciso I do art. 825, a qual o procedimento está elencado nos artigos 876 e 877 do CPC, é, conforme muito bem exposto pelo doutrinador Cândido Rangel Dinamarco, a “transferência do bem penhorado ao patrimônio do exequente, para satisfação do seu crédito”[4].
A adjudicação, conforme dispõe o art. 876, não necessita de momento especial para que seja perfectibilizada, i.e, realizada a penhora/avaliação/depósito do (s) bem (s) alvo da constrição, poder-se-á requerer sua adjudicação.
Os legitimados à adjudicação, conforme observam Marinoni – Arenhart – Midiero, constam no art. 889, incisos II a VIII do CPC. Havendo concorrência na pretensão do bem, o art. 876, § 6º, dispõe acerca da licitação a ser realizada entre os concorrentes, tendo preferência o cônjuge, descendente e ascendente, nesta exata ordem. O executado, observância ao princípio do contraditório, será intimado acerca da adjudicação, com fulcro no art. 876, §§ 1º e 3º do CPC.
O prazo para a lavratura do auto de adjudicação é de cinco dias, a contar da última intimação, conforme dispõe o art. 877, caput, do CPC. Lavrado o auto de adjudicação, devidamente assinado pelo magistrado, adjudicante e o escrivão e, caso presente, pelo executado, resta perfectibilizado o ato expropriatório (§ 1º do art. 877 do CPC). Munido da carta de adjudicação, do mandado de imissão de posse e da guia do imposto de transmissão pago, poderá o adjudicante proceder com a transferência do bem.
O artigo 878 traz à guisa a possibilidade de nova adjudicação caso frustradas as tentativas de alienação do bem, ocasião em que será realizada nova avaliação.
2. Da alienação
A alienação far-se-á por iniciativa particular ou em leilão judicial eletrônico ou presencial, conforme redação do art. 879 do CPC. Marinoni – Arenhart – Midiero destacam que a diferença básica consiste “na maior ou menor participação da estrutura judicial na alienação do bem. Enquanto na alienação por iniciativa particular a participação do juízo se limita a estabelecer os parâmetros da alienação, controlando eventuais desvios ou excessos, o leilão judicial ocorre perante a estrutura do próprio Estado-jurisdição”[5], podendo, este, ser presencial ou por meio eletrônico.
2.1. Alienação por iniciativa particular
Haroldo Lourenço entende que “a proposta de alienação por iniciativa particular visa a evitar a alienação em leilão judicial, dado que, geralmente, resta frustrada”[6].
Tal alienação constitui faculdade do exequente, a qual será realizada por sua própria iniciativa ou por intermédio de corretor ou leiloeiro público credenciado pelo órgão judiciário.
O momento de sua realização dar-se-á, à semelhança da adjudicação, depois de finda a avaliação.
O preço mínimo será fixado pelo magistrado (§ 1º do art. 880 do CPC). Além do preço, o juízo fixará o prazo para que seja efetivada a alienação do bem a qual, caso frustrada, será submetida à forma judicial, conforme preceitua o art. 881 do CPC.
Será perfectibilizada a referida alienação por termo nos autos, assinado pelo magistrado, exequente e adquirente e, caso presente, pelo executado (§ 2º do art. 880 do CPC).
2.2. Alienação por leilão judicial
Marinoni – Arenhart – Midiero atribuem a essa técnica alienatória o caráter residual em relação às formas supramencionadas. No CPC/15 não há diferenciação no que se refere à hasta ou leilão público, constituindo ambos o mesmo ato a qual tem como objetivo a efetividade da alienação. Ademais, o art. 882, caput, do CPC trás à banda as técnicas de realização do leilão judicial, sendo, preferencialmente, por meio eletrônico.
Os artigos 882 e 884 dispõe acerca do local da realização do leilão judicial presencial: no local a ser designado pelo magistrado (§ 3º do art. 882) sendo, preferencialmente, o lugar de situação da coisa, art. 884, II, do CPC. Será o leiloeiro indicado pelo magistrado, art. 883 do CPC, a qual terá sua comissão fixada pelo juiz na decisão que nomeá-lo para a realização do ato, art. 884 do CPC.
Igualmente, incumbirá ao leiloeiro o ônus estabelecido no art. 884 do Código de Processo Civil.
São legitimados para oferecerem lances no leilão judicial todos àqueles que estiverem na livre administração dos seus bens, exceto aqueles constantes no rol taxativo do art. 890 do CPC, quais sejam: i) os tutores, dos curadores, dos testamenteiros, dos administradores ou dos liquidantes, quanto aos bens confiados à sua guarda e à sua responsabilidade; ii) os mandatários, quanto aos bens de cuja administração ou alienação estejam encarregados; iii) o juiz, do membro do Ministério Público e da Defensoria Pública, do escrivão, do chefe de secretaria e dos demais servidores e auxiliares da justiça, em relação aos bens e direitos objeto de alienação na localidade onde servirem ou a que se estender a sua autoridade; iv) os servidores públicos em geral, quanto aos bens ou aos direitos da pessoa jurídica a que servirem ou que estejam sob sua administração direta ou indireta; v) os leiloeiros e seus prepostos, quanto aos bens de cuja venda estejam encarregados; vi) os advogados de qualquer das partes.
O artigo 891 explicita que não será aceito lance que ofereça preço vil. Tal instituto merece digressão. Marinoni – Arenhart – Midiero ressaltam que “não existem critérios legais para aferição do que pode ser considerado preço vil”[7].
Assim, considera-se preço vil o lance correspondente ao valor mínimo estabelecido pelo magistrado na decisão que deferiu/determinou a realização da hasta pública, devidamente publicado no edital que versa sobre a realização da solenidade, conforme o parágrafo único do artigo 891 do Codex.
Realizada a solenidade e não estabelecida forma de pagamento do lance vencedor pelo magistrado, deverá, imediatamente após a hasta, ser depositado o respectivo valor nos autos do processo de execução, artigo 892 do CPC.
Poderá o exequente arrematar o bem, contudo, caso arremate o bem por valor superior ao de seu crédito, deverá depositar o excedente nos autos, sob pena de tornar nula a arrematação, conforme redação do art. 892 do CPC.
Acerca da arrematação ainda, dentre os diversos institutos jurídicos que envolvem o leilão judicial, cumpre referir que poderá o executado remir o bem hipotecado caso ofereça valor igual ao superior ao maior lance oferecido na hasta, com fulcro no art. 902 do CPC.
Perfectibilizar-se-á a arrematação do bem quando da assinatura do auto de arrematação pelo magistrado, arrematante e leiloeiro, conforme dispõe o art. 903 do CPC, que ainda trás à guisa as situações que constituem invalidade da arrematação e as hipóteses de desistência por parte do arrematante, in verbis:
Art. 903. Qualquer que seja a modalidade de leilão, assinado o auto pelo juiz, pelo arrematante e pelo leiloeiro, a arrematação será considerada perfeita, acabada e irretratável, ainda que venham a ser julgados procedentes os embargos do executado ou a ação autônoma de que trata o § 4º deste artigo, assegurada a possibilidade de reparação pelos prejuízos sofridos.
1º Ressalvadas outras situações previstas neste Código, a arrematação poderá, no entanto, ser:
I – invalidada, quando realizada por preço vil ou com outro vício;
II – considerada ineficaz, se não observado o disposto no art. 804;
III – resolvida, se não for pago o preço ou se não for prestada a caução.
2º O juiz decidirá acerca das situações referidas no § 1º, se for provocado em até 10 (dez) dias após o aperfeiçoamento da arrematação.
3º Passado o prazo previsto no § 2º sem que tenha havido alegação de qualquer das situações previstas no § 1º, será expedida a carta de arrematação e, conforme o caso, a ordem de entrega ou mandado de imissão na posse.
4º Após a expedição da carta de arrematação ou da ordem de entrega, a invalidação da arrematação poderá ser pleiteada por ação autônoma, em cujo processo o arrematante figurará como litisconsorte necessário.
5º O arrematante poderá desistir da arrematação, sendo-lhe imediatamente devolvido o depósito que tiver feito:
I – se provar, nos 10 (dez) dias seguintes, a existência de ônus real ou gravame não mencionado no edital;
II – se, antes de expedida a carta de arrematação ou a ordem de entrega, o executado alegar alguma das situações previstas no § 1º;
III – uma vez citado para responder a ação autônoma de que trata o § 4º deste artigo, desde que apresente a desistência no prazo de que dispõe para responder a essa ação.
6º Considera-se ato atentatório à dignidade da justiça a suscitação infundada de vício com o objetivo de ensejar a desistência do arrematante, devendo o suscitante ser condenado, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos, ao pagamento de multa, a ser fixada pelo juiz e devida ao exequente, em montante não superior a vinte por cento do valor atualizado do bem.
3. Da expropriação de frutos e rendimentos de coisa móvel ou imóvel
Por fim, a expropriação de frutos e rendimentos de coisa móvel ou imóvel tem como pilares os princípios da menor onerosidade ao executado (art. 805 do CPC), bem como o princípio da utilidade. Tal forma de penhora, nas palavras de Marinoni – Arenhardt – Mitidiero, “só terá a preferência como técnica processual executória se não houver outro meio mais idôneo – ainda que mais gravoso ao executado – para a realização do direito do exequente”[8], tendo em vista que o princípio da menor onerosidade não poderá superar o princípio da efetividade.
Assim, poderá o exequente extrair tantos frutos quanto bastem para a satisfação do seu crédito. O que interessa não é o bem em si, mas os frutos que dele advém.
A eficácia da referida penhora dar-se-á, para bens móveis, no momento da publicação da decisão que concedê-la, se tratando de bens móveis. No que tange a bens imóveis, se dará a partir da averbação da penhora no ofício imobiliário, junto ao registro público.
Para extração dos referidos frutos e sua administração, nomeará o juiz o respectivo administrador-depositário, à semelhança do estabelecido na legislação falimentar, contudo, com menores formalidades. Pode, inclusive, ser o exequente investido de tal tarefa, desde que concorde esteja o executado, princípio do contraditório, conforme estabelece o artigo 869 do Código de Processo Civil.
Após a nomeação do administrador, deverá este apresentar proposta dando conta acerca do percentual a ser extraído, bem como do tempo necessário para a satisfação do crédito (§ 2º do artigo 869 do CPC).
Conclusão
O Código de Processo Civil, a fim de garantir maior efetividade ao Processo de Execução, trouxe à baila os institutos acima listados e explicados. É de se destacar que, além da satisfação do crédito, o Processo de Execução coaduna os princípios do contraditório e da menor onerosidade ao executado, assim, servindo também como instrumento de pacificação social.
[1] DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 22ed. São Paulo: Atlas, 2019. p. 1152.
[2] DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 22ed. São Paulo: Atlas, 2019. p. 1151.
[3] ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel; MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 932.
[4] DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2004. V. VI.
[5] ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel; MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 936.
[6] LOURENÇO, Aroldo. Processo Civil Sistematizado. 4ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018. p. 897.
[7] ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel; MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 944.
[8] ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel; MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 926.