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ÁREA DE CABIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS TEXTOS LEGAIS E NA PRÁTICA JUDICIÁRIA

ÁREA DE CABIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS TEXTOS LEGAIS E NA PRÁTICA JUDICIÁRIA

Nelson Monteiro Neto

SUMÁRIO: Introdução; 1 Embargos declaratórios e “erro de julgamento“; 2 Padrões de cabimento dos embargos de declaração; 3 Embargos declaratórios e pedido de reconsideração; 4 Embargos de declaração e o Código de 2015: identidade entre a jurisprudência e a lei; Conclusão.

 

INTRODUÇÃO

No tocante ao sistema do novo Código de Processo Civil, o operador do Direito tem ciência das hipóteses de cabimento dos embargos de declaração a que se refere o art. 1.022 do Código citado (obscuridade, contradição, omissão e erro material), bem como está cônscio da importância da jurisprudência sobre a admissibilidade de tal recurso, em hipótese não prevista na lei, tendo em vista os arts. 489, § 1º, nº VI, 926 e 927.

Este trabalho respeita ao cabimento dos embargos declaratórios. Nesta ocasião, pretendemos citar determinados aspectos importantes deste assunto, indicar exemplos concretos interessantes e apontar certas tendências nos fundamentos dos embargos de declaração.

De início, vamos fazer algumas observações acerca da admissibilidade ou não dos embargos declaratórios em caso de “erro de julgamento” (item 1). Após, convém examinar algumas outras decisões dos Tribunais Superiores, relativas a três padrões de cabimento dos embargos de declaração (item 2). Depois, vale a pena registrar um acórdão do Superior Tribunal de Justiça que diz respeito à impossibilidade dos embargos de declaração tidos como pedido de reconsideração (item 3). Logo em seguida, mencionaremos, resumidamente, o nosso próprio entendimento sobre a admissibilidade do recurso em estudo no sistema do novo Código de Processo Civil, em vigor a partir de 17 de março de 2016 (item 4). Por fim, cumpre formular algumas conclusões (último item).

1 EMBARGOS DECLARATÓRIOS E “ERRO DE JULGAMENTO

A seguir, citaremos duas decisões do Supremo Tribunal Federal quanto à ocorrência de “erro de julgamento” no pronunciamento embargado.

1.1 Convém fazer algumas observações sobre o acórdão dos Embargos de Divergência nos Embargos de Declaração nos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 194.662 (STF, Plenário, datado de 14.05.2015, por maioria de votos, Redator do Acórdão o Ministro Marco Aurélio, Diário da Justiça Eletrônico de 03.08.2015, p. 62).

O litígio, ao que consta, diz respeito à determinação do alcance de uma cláusula de certa convenção coletiva de trabalho (atinente ao reajuste salarial). Mas o que aqui interessa é o problema da admissibilidade dos embargos declaratórios.

Lê-se na respectiva ementa: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – ERRO DE JULGAMENTO – INADEQUAÇÃO – Os embargos de declaração não se prestam a corrigir erro de julgamento“.

Segundo o voto do primitivo Relator, Ministro Sepúlveda Pertence, acompanhado pela maioria dos integrantes do Plenário, são admissíveis os embargos de declaração caso se trate de decisão contendo “premissa equivocada” (o pronunciamento omitiu-se sobre a jurisprudência da época); enquanto isso, não é cabível o mencionado recurso (e sim o recurso de embargos de divergência) em caso de “erro de julgamento” (o pronunciamento contrariou a jurisprudência).

Esse mesmo magistrado assim se pronuncia sobre o ponto:

Premissa equivocada e erro de julgamento são coisas completamente distintas: enquanto a primeira pressupõe erro material ou desconsideração de um fato que, se considerado, teria alterado o resultado do julgamento – ou seja, verdadeira omissão que, quando suprida, induz obrigatoriamente à alteração do julgado -, o erro de julgamento se substantiva num vício na aplicação do direito – que, juntamente com o erro de procedimento, é o fundamento, ainda quando equivocado, dos recursos de efeito infringente da decisão recorrida.

Mais adiante, acrescenta o Relator: “Embargos de declaração não têm o condão de submeter o que decidido a novo julgamento“. E arremata:

Desse modo, conheço dos embargos de divergência e os recebo para anular o acórdão da Segunda Turma proferido no julgamento dos primeiros embargos de declaração e restabelecer o acórdão primitivo do julgamento do recurso extraordinário.

O erro de fato e o erro na aplicação de direito a fato estão incluídos no “erro de julgamento“, do mesmo modo que na decisão com “premissa equivocada“, e podem ser, em certas situações, corrigidos mediante os embargos de declaração, de acordo com o entendimento jurisprudencial, ainda quando não se trate de defeito típico.

Por sua vez, o Ministro Gilmar Mendes sustenta que, havendo evidente equívoco na decisão (ou, como diz, “equívoco manifesto” no pronunciamento), são admissíveis os embargos declaratórios. E conclui: “[…] ausentes a indispensável semelhança de bases fáticas e disparidade de conclusões, além de flagrante a jurisprudência contrária ao interesse do embargante, não conheço dos embargos de divergência“.

Referindo-se ao pronunciamento dos primeiros embargos de declaração, interpostos contra a decisão do recurso extraordinário, assim se expressa o Ministro Marco Aurélio (redator do acórdão dos embargos de divergência, em razão da aposentadoria do Ministro Sepúlveda Pertence e de haver sido o primeiro magistrado que acompanhou o voto do Relator): “[…] Se a Turma dissentiu de precedentes da Corte, o instrumental próprio à revisão pretendida não eram os declaratórios, mas os embargos de divergência, viabilizado – se procedente a óptica do dissenso, a demonstração do cabimento – o acesso ao Plenário“. Esse votante considera que o recurso de embargos de declaração só tem cabimento nas hipóteses previstas no Código de Processo Civil e prestigia o voto do Ministro Sepúlveda Pertence para fazer valer “o acórdão resultante da apreciação do extraordinário“.

Como se sabe, há tempos os Tribunais de segunda instância e os Tribunais Superiores (inclusive o Supremo Tribunal Federal), em não poucos processos, admitem (acertadamente) o manejo dos embargos declaratórios também na eventualidade de “erro de julgamento“, expressão empregada, de modo geral, por oposição à “erro de procedimento“.

Por sinal, os trabalhos que realizamos sobre o âmbito de admissibilidade dos embargos de declaração registram vários julgados em que o citado recurso mereceu provimento, com a correção de “erro de julgamento“, fora das hipóteses clássicas.

Note-se, a propósito, que o Ministro Teori Zavascki, em seu voto (vencido), afirma, com inteiro acerto, que o Supremo Tribunal, “em inúmeras situações – consideradas de ‘caráter excepcional’ -, deixou de lado a interpretação literal e estrita do art. 535 do CPC [de 1973], para o efeito de acolher embargos de declaração com efeitos infringentes, sempre que fosse necessário para corrigir equívocos relevantes no acórdão embargado“. Logo em seguida, S.Exa. traz à colação alguns precedentes a respeito. O magistrado julga relevante o aproveitamento dos fatos processuais (no que concerne aos embargos de declaração) e conclui pelo não conhecimento dos embargos de divergência.

O Ministro Luiz Fux, por seu turno, considera inadmissíveis os embargos de divergência e acompanha o voto do Ministro Teori Zavascki. Mais adiante, em diálogo com outros componentes do Plenário, S.Exa. faz menção ao sistema do novo Código de Processo Civil, afirmando que, inclusive, “há um dispositivo em que, se houver um julgamento contra a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, haverá a possibilidade de modificação desse julgamento em embargos de declaração para adequar, ao caso concreto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”.

Importa frisar que decidiu o STF, Plenário, por maioria de votos, julgar admissíveis os embargos de divergência, dar provimento ao recurso, para anular o acórdão dos primeiros embargos de declaração, e confirmar a decisão do recurso extraordinário. Afirmou-se que “os embargos de declaração não poderiam ser recebidos para a correção de erro de julgamento“. Entendeu o Ministro Relator que não cabiam embargos declaratórios contra a decisão do recurso extraordinário.

Não obstante o texto da ementa do acórdão, o entendimento jurídico do pronunciamento do STF, ao nosso ver, não tem aptidão para abolir a orientação jurisprudencial, consoante a qual, algumas vezes, é conveniente ou necessário o manejo dos embargos declaratórios, ainda quando se trate de erro na aplicação de direito a fato, em caso não previsto na lei, por economia processual, ou em virtude da inexistência de outro recurso para a obtenção de um resultado justo.

Cabe observar que, neste momento em que escrevemos (em meados de fevereiro de 2016), pendem de julgamento novos embargos declaratórios (fonte de informação: www.stf.jus.br).

1.2 Vamos tecer, agora, algumas considerações sobre a decisão do Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 607.201 (STF, 1ª Turma, de 17.09.2015, redigida pelo Ministro Marco Aurélio, publicada no Diário da Justiça Eletrônico de 22.09.2015, p. 96). 

O Ministro Relator deu provimento parcial ao recurso extraordinário (concernente ao aproveitamento de créditos de IPI) interposto pela União Federal. A empresa contribuinte, então, manifestou embargos declaratórios, mas sem êxito. Daí o agravo regimental, em que o prolator das decisões anteriores, ele próprio, e não o órgão colegiado, “reconsiderou” o pronunciamento dos embargos de declaração e, na sequência, deu provimento a estes embargos, para negar seguimento ao recurso extraordinário, ao contrário do que ocorrera na primitiva decisão.

Assim é que o magistrado apreciou, nos embargos declaratórios e não no agravo regimental, a impugnação feita pela empresa contribuinte.

Enquanto o Ministro Relator, no recurso extraordinário, reputou aplicável ao caso o entendimento jurídico adotado em outro processo e decidiu dar provimento parcial ao recurso extraordinário de que se trata, condenada a empresa contribuinte nas custas processuais e em honorários advocatícios, o mesmo prolator da decisão, nos embargos, afirmou que, segundo o acórdão do Tribunal de origem, o litígio “não alcança créditos decorrentes de fatos anteriores à vigência da Lei nº 9.779, de 1999“, de tal sorte que o mencionado precedente do Supremo Tribunal nada tem que ver com a hipótese em apreço, e, na sequência, invocou o Verbete nº 279 da súmula do STF (“Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário”), bem como salientou que, por tratar-se de interpretação de lei federal, não é caso de recurso extraordinário (Constituição da República, art. 102, nº III), para negar, afinal, seguimento ao extraordinário, interposto pela União.

Não existiu, na decisão do recurso extraordinário, um ou mais dos casos típicos dos embargos de declaração (obscuridade, contradição ou omissão), menos ainda erro material.

O erro no julgamento consistiu em o prolator da decisão, no recurso extraordinário, considerar aplicável à espécie o entendimento jurídico firmado no Recurso Extraordinário nº 562.980, como se os créditos em debate (atinentes ao IPI) resultassem de operações realizadas em momento anterior à edição da Lei nº 9.779, de 1999, observando-se que, segundo consta, tais créditos se referem ao ano de 2000 (cf. a decisão do TRF da 4ª Região, que admitiu o extraordinário, datada de 09.06.2010), posteriores, destarte, ao advento do referido texto legal, que diz respeito exclusivamente às operações concretizadas após a edição da lei há pouco aludida.

Fica demonstrado, pois, que ocorreu o reexame da matéria, por via de embargos de declaração, em hipótese não enumerada no Código, mas admitida pela jurisprudência. O Ministro Relator, nos embargos, reformou a decisão para negar seguimento ao recurso extraordinário.

Note-se, ademais, que foi necessário o emprego dos embargos de declaração, uma vez que inexistia outro caminho para a solução justa no mesmo processo. De modo que não se reformou o acórdão do TRF da 4ª Região, consoante o qual a empresa contribuinte faz jus à compensação dos créditos referentes ao IPI em causa.

Foi nosso propósito, neste passo, registrar interessante exemplo concreto sobre a ampliação da área de cabimento dos embargos de declaração.

Em relação ao pronunciamento do Supremo Tribunal ora focalizado, julgou-se o recurso extraordinário (concernente ao problema dos créditos de IPI), e o Ministro Relator deu razão à recorrente, União Federal, por entender aplicável à hipótese determinado entendimento jurídico, adotado em outro processo. Porém, o mesmo magistrado, nos embargos, reconheceu que de maneira alguma influi na espécie sob exame o acórdão proferido pelo Plenário no julgamento do Recurso Extraordinário nº 562.980.

Desse ponto de vista, claro está que houve “erro de julgamento” na decisão embargada (sobre a questão dos créditos de IPI), observando-se que semelhante defeito do pronunciamento foi corrigido, mediante os embargos de declaração, fora das hipóteses clássicas. Uma vez que, em grau de recurso extraordinário, não é possível reexaminar fatos, e, além do mais, por tratar-se de interpretação de lei federal, decidiu-se, nessa ocasião, dar provimento aos embargos, oferecidos pela contribuinte, e, afinal, negar seguimento ao ex­traordinário, interposto pela União.

2 PADRÕES DE CABIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

Oportuno analisar algumas decisões dos Tribunais Superiores referentes a três padrões de cabimento desses embargos. As duas primeiras, citadas em 2.1 e 2.2, concernem à repercussão da jurisprudência por meio dos embargos declaratórios. A terceira decisão, aludida em 2.3, diz respeito a evidente equívoco no pronunciamento embargado. As seis últimas, citadas em 2.4 a 2.9, referem-se ao cabimento dos embargos de declaração em caso de erro de fato. Essas hipóteses, há pouco mencionadas, não previstas na lei, como se sabe, são admitidas na vida forense e constituem, já agora, padrões de cabimento do recurso de que se trata.

2.1 Embargos de declaração. Problema da prescrição da pretensão no tocante à cobrança de quantias correspondentes à “sobre-estadia de contêineres“. Importância da jurisprudência. Não ocorrência de prescrição.

STJ, Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 174.008, 3ª Turma, 01.10.2015, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Diário da Justiça Eletrônico de 08.10.2015, p. 1412.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entendeu que está prescrita a pretensão da autora no que tange à cobrança de importâncias correspondentes à chamada “sobre-estadia de contêineres“. Inconformada, a parte interpôs recurso especial, inadmitido no Tribunal de origem.

No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, o Ministro Relator conheceu do agravo em recurso especial, mas negou seguimento ao especial, baseando-se na consideração de que o acórdão de segundo grau está em consonância com a jurisprudência do STJ (pelo prazo prescricional de 1 ano), incidindo, pois, o Enunciado nº 83 da súmula dessa Corte Judiciária (“Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida“). Tal decisão monocrática foi confirmada pela 3ª Turma no julgamento do agravo regimental.

Entretanto, o mesmo órgão julgador, nos embargos de declaração, reformou o acórdão anterior, tendo em vista recentíssimo entendimento adotado pela 2ª Seção do STJ (favorável ao prazo prescricional de 5 ou 10 anos), graças ao qual, no presente caso, não está prescrita a pretensão da autora, ora embargante. Daí o provimento do recurso especial.

Não existiu no acórdão impugnado qualquer dos casos típicos dos embargos de declaração. Com efeito, a 3ª Turma, nos embargos, reformou a decisão recorrida em virtude da emissão de pronunciamento da 2ª Seção, em outro processo, a respeito do mesmo tema.

Na espécie, em última análise, teve influência decisiva o aludido dado jurisprudencial, de modo que, diante da situação atual da jurisprudência, que vai ao encontro da pretensão da recorrente (a que se refere o recurso especial), não ocorreu prescrição, e, destarte, prosseguirá o processo em primeiro grau de jurisdição.

2.2 STJ, Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.199.904, 1ª Turma, 24.11.2015, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ de 09.12.2015, p. 528/529.

A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no agravo regimental, em 06.08.2013, afirmou que o pensionista não precisa efetuar a restituição das importâncias recebidas (pagamentos feitos pela União Federal) em virtude de decisão judicial algum tempo depois revogada.

O órgão colegiado, nos embargos, em 24.11.2015, contudo, reformou o acórdão recorrido, com base na consideração de que a 1ª Seção dessa Corte Judiciária, em outro processo, em 12.02.2014, declarou que, uma vez revogado o pronunciamento atinente à tutela antecipada, é necessário que o pensionista devolva tais quantias, recebidas antes da revogação, de modo que o Colegiado acolheu os embargos declaratórios “para determinar a devolução dos valores percebidos, em razão da revogação da tutela antecipada” (voto do Ministro Relator).

O Relator, embora contrário, em tal hipótese, à restituição das quantias citadas, entendeu aplicável à espécie o entendimento firmado pela 1ª Seção a respeito do mesmo tema. Mas o que mais interessa aqui é a demonstração do emprego dos embargos de declaração, para fazer valer, neste feito, a tese adotada pelo STJ em outro processo, ou seja, no Recurso Especial Representativo da Controvérsia nº 1.401.560.

Eis aí mais um exemplo concreto referente a determinado padrão de cabimento dos embargos de declaração, já aludido no comentário a acórdão intitulado “Segundos embargos de declaração em virtude da mudança de orientação do STF. Padrão de cabimento do recurso” (Revista de Processo, v. 251, jan. 2016 – fonte: Revista dos Tribunais Online).

2.3 STF, Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 781.513, 2ª Turma, 08.10.2015, pronunciamento do Rel. Min. Teori Zavascki, Diário da Justiça Eletrônico de 14.10.2015, p. 157-158.

Decidiu o Ministro Relator negar seguimento ao recurso extraordinário com base na consideração de que a matéria objeto de tal recurso não é idêntica a qualquer outra (inclusive à do Recurso Extraordinário nº 761.263, adiante aludido), a respeito das quais houve o reconhecimento da existência de repercussão geral do tema, argumentando que o entendimento adotado no acórdão do Tribunal de origem (TRF da 4ª Região) está em consonância com a jurisprudência do STF, “no sentido de que a declaração de inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 8.540/1992 (RE 363.852, Rel. Min. Marco Aurélio) não alcança os produtores rurais autônomos sem empregados“.

A empresa contribuinte, então, ofereceu embargos declaratórios e bateu na tecla da existência de repercussão geral do tema, alegando que “a decisão embargada incorreu em erro material, uma vez que a matéria debatida no recurso extraordinário é idêntica àquela cuja repercussão geral foi reconhecida na análise do RE 761.263 (Tema 723)“.

Lê-se no pronunciamento dos embargos de declaração: “2. Assiste razão à parte embargante. Embora a declaração de inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 8.540/1992 realmente não alcance a contribuição devida pelos segurados especiais, a legitimidade da exação por eles devida, objeto do presente recurso extraordinário, teve a repercussão geral reconhecida no exame do RE 761.263-RG (de minha relatoria, DJe de 14.05.2014, Tema 723)“. E acrescenta o Ministro Relator: “Assim, não merece subsistir a decisão embargada, devendo ser aplicada a sistemática da repercussão geral“.

Decidiu-se, nessa ocasião, dar provimento aos embargos declaratórios, “com efeitos infringentes, para determinar a devolução dos autos ao Tribunal de origem, para os fins do art. 543-B do CPC“.

É manifesto que não existiu no pronunciamento embargado qualquer dos casos típicos dos embargos de declaração (a saber, obscuridade, contradição ou omissão), e menos ainda “erro material” (como pareceu à embargante).

Não houve “erro material” na decisão embargada, engano este que, como se sabe, não influi no resultado do julgamento (cf. MONTEIRO NETO, Nelson. Âmbito dos embargos de declaração. Revista de Processo, v. 232, p. 185-220, jun. 2014).

O Ministro Relator, no recurso extraordinário, afirmou, com todas as letras, que inexiste reconhecimento de repercussão geral da matéria, enquanto, nos embargos, reformou o pronunciamento anterior, para declarar que houve, sim, o reconhecimento da existência de repercussão do tema, especificamente no que tange à legitimidade do tributo de que trata o recurso extraordinário.

De toda sorte, havendo evidente equívoco na decisão, quanto ao exame da existência de repercussão do tema, como condição de admissibilidade do recurso extraordinário que é, a jurisprudência, há bastante tempo, admite o emprego dos embargos de declaração, nada importando que não se trate de fundamento típico algum (Código de Processo Civil de 1973, art. 535; Código novo, art. 1.022).

A hipótese ora focalizada, em última análise, constitui um dos padrões de cabimento dos embargos de declaração que o órgão jurisdicional precisa levar em conta no tocante à admissibilidade do mencionado recurso.

2.4 Decisão da ação cível originária. Existência de erro de fato. Efeito modificativo do julgamento dos embargos declaratórios.

STF, Embargos de Declaração na Ação Cível Originária nº 1.610, Plenário, 05.11.2015, pronunciamento do Rel. Min. Teori Zavascki, DJ de 16.11.2015, p. 74/75.

A decisão embargada negou seguimento ao pedido formulado pelo Estado da Paraíba na ação cível originária proposta contra a União Federal, condenando o autor em honorários advocatícios. Daí os embargos de declaração.

No tocante ao fundamento dos embargos de declaração, assim se manifesta o Ministro Relator:

Com razão a [sic] embargante quanto ao apontado erro de fato, pois a causa de pedir tem a ver com o impedimento de assinatura de novos contratos de convênio decorrente da inscrição do autor no Cadastro Único de Convênios (CAUC), diante de irregularidades envolvendo convênios e contratos de re

Pouco adiante, prossegue S.Exa.: “[…] a demanda foi analisada com base em fatos estranhos à controvérsia (sanções por descumprimento de tetos máximos de despesas com pessoal previsto no art. 20, II, da LRF [Lei de Responsabilidade Fiscal]“.

Ante a informação prestada pela União, atinente ao mérito da postulação do autor, o Ministro Relator, nos embargos, por outro lado, declara que “houve perda do objeto da demanda“, de modo que “[…] resta desnecessário o exame das demais alegações ora apresentadas referentes ao mérito da controvérsia“.

E acrescenta o Relator: “Quanto ao mais, os honorários advocatícios devem ser suportados por quem deu causa à propositura da demanda: a União“.

Assim é que a decisão dos embargos declaratórios acolheu o recurso e extinguiu o processo sem julgamento do mérito, condenada a União Federal, não o Estado da Paraíba, em honorários advocatícios no montante de R$ 5.000,00.

Em última análise, o Ministro Relator, nos embargos, reconheceu que houve erro de fato no pronunciamento impugnado, hipótese que, já agora, claramente constitui um dos padrões de cabimento dos embargos de declaração [1].

Note-se, ademais, que o STF (Plenário, em 18.12.2015) negou provimento ao agravo regimental, interposto contra a decisão dos embargos em exame.

2.5 Se o órgão jurisdicional não compreendeu bem a pretensão da recorrente e julga questão não coincidente com a do recurso, existe, na decisão, erro de fato, corrigível mediante embargos declaratórios, por construção jurisprudencial.

STJ, Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1.416.232, 4ª Turma, 27.10.2015, Rel. Min. Raul Araújo, DJ de 25.11.2015, p. 1505/1506.

A decisão do agravo de instrumento entendeu que, no tocante ao recurso especial, não estão satisfeitos os requisitos atinentes à demonstração da divergência jurisprudencial. Lê-se em outro passo do pronunciamento: “No mérito, merece ser mantido o acórdão recorrido, ao consignar não serem aplicáveis os índices de correção relativos aos expurgos inflacionários dos Planos econômicos Bresser, Verão, Collor I e II à correção de diferenças de financiamento correspondente à Cédula de Crédito Rural. Verifica-se, pois, tratar-se de questões diversas, não havendo se falar na incidência dos mesmos índices para as mencionadas situações“. Nessas condições, o Ministro Relator negou provimento ao agravo de instrumento.

Tal decisão monocrática foi confirmada pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do agravo regimental. A litigante, então, manifestou embargos de declaração, sustentando que o órgão jurisdicional equivocou-se sobre a pretensão da parte. Segundo o relatório do acórdão dos embargos em foco, constam das razões da embargante os trechos a seguir expostos:

(a) […] não se controverte no Recurso Especial inadmitido acerca do direito “à correção de diferenças de financiamento correspondente à Cédula de Crédito Rural“, de modo que não se aplicam os precedentes invocados na decisão agravada pela completa dessemelhança com a matéria aqui tratada (fl. 333);

(b) […] necessário frisar que os expurgos inflacionários não são aplicados apenas em numerário depositado em caderneta de poupança, como ficou equivocadamente assentado no acórdão recorrido (fl. 334);

(c) […] a correção monetária é elemento essencial para ser garantido o direito à recomposição integral do patrimônio, uma vez que seu objetivo é repor a perda financeira sofrida pela moeda nacional num determinado período, evitando que os valores devidos ao vencedor da demanda se aniquilem pela redução real do poder aquisitivo do montante assegurado pelo julgado (fl. 336).

Diante disso, o Relator, nos embargos de declaração, assim se manifesta:

No exame atento das alegações recursais, observo que mostram-se plausíveis os argumentos trazidos pela ora embargante, suficientes a demonstrar erro de fato quanto às questões decididas na lide, as quais, na verdade, são referentes à aplicação de expurgos em relação à repetição de indébito decorrente de diferenças entre índices de correção monetária aplicados em contrato de cédula de crédito industrial.

E arremata: “Em virtude do exposto, acolho os embargos de declaração, com atribuição de efeitos infringentes, para dar provimento ao agravo de instrumento e determinar a subida do recurso especial para melhor exame“.

O exemplo concreto em tela mostra, novamente, que são admissíveis os embargos de declaração em caso de erro de fato, hipótese não prevista na lei (Código de Processo Civil de 1973, art. 535; Código novo, art. 1.022), mas reconhecida pela jurisprudência dos Tribunais Superiores.

2.6 STF, Embargos de Declaração nos Embargos de Divergência nos Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 526.000, 1ª Turma, 05.11.2015, pronunciamento do Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 13.11.2015, p. 137/138.

A decisão monocrática anteriormente referida deu provimento aos embargos de declaração em caso não previsto na lei (Código de Processo Civil de 1973, art. 535; Código novo, art. 1.022). É caso de erro de fato, hipótese admitida na realidade forense.

Ao contrário do que sustentou no pronunciamento impugnado, o Ministro Relator, nos embargos de declaração em foco, afirma que o entendimento contido no acórdão da 2ª Turma do STF (atinente à postulação de servidores públicos), proferido neste processo, não está em consonância com o entendimento chancelado pelo Plenário naquele acórdão mencionado pelos recorrentes. Daí o provimento dos embargos declaratórios para declarar admissíveis os embargos de divergência.

Assinale-se que os recorrentes apontaram como fundamento dos embargos de declaração a hipótese de erro de fato. O pronunciamento do Relator afirma que os embargantes têm razão no tocante ao cabimento dos embargos de divergência.

Na espécie, em certo sentido, o erro de fato consistiu em o pronunciamento impugnado não haver levado em consideração a circunstância de que há divergência entre a tese do acórdão da 2ª Turma e a da decisão do Plenário acerca da matéria.

O presente exemplo concreto de maneira alguma configura algum dos casos típicos dos embargos de declaração (obscuridade, contradição ou omissão, ou, ainda, erro material). Existiu, na decisão impugnada, erro de fato. No julgamento destes embargos, então, sim, partiu-se da premissa de que há divergência entre o entendimento adotado pela 2ª Turma e o chancelado pelo Plenário, para concluir que é cabível o recurso de embargos de divergência.

2.7 Existência de erro de fato, e não erro material, na decisão embargada. Efeito modificativo do julgamento dos embargos de declaração.

STF, Embargos de Declaração no Agravo Regimental na Suspensão de Liminar nº 610, Plenário, 07.10.2015, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ de 23.11.2015, p. 70.

Alegou-se, nos embargos de declaração, que existiu, na decisão recorrida, erro material, “na medida em que foram relatados elementos processuais que não guardam relação com o caso dos autos” (do relatório da decisão em foco). Além disso, a recorrente apontou vários outros defeitos do pronunciamento embargado.

Aludindo ao acórdão do agravo regimental, contra o qual interpôs-se recurso de embargos de declaração, assim se manifesta o Ministro Relator: “Naquela assentada, ao introduzir o tema, argumentei fazendo referência a situações que reputei já ter anteriormente analisado“. Após citar as “situações” a que fez menção, acrescenta: “Tendo em vista que tal referência pode ter influenciado os Pares a acompanhar o meu entendimento, acredito que o mais prudente seja reconhecer a existência de erro material substancial e tornar sem efeito o acórdão prolatado no julgamento do agravo regimental na suspensão de liminar“. Nesses termos, o STF, Plenário, deu provimento aos embargos de declaração para invalidar o acórdão recorrido.

A decisão do agravo regimental, em certo sentido, adotou falsa premissa (atinente a “situações” a que fez referência o Ministro Relator). Isso, contudo, não configura “erro material substancial” (no dizer do Relator), mas, sim, erro de fato (sobre as noções de “erro material” e “erro de fato“, cf. MONTEIRO NETO, Nelson. Op. cit., p. 185-220).

O erro de fato não está escrito na lei (CPC de 1973, art. 535; CPC de 2015, art. 1.022) como um dos casos típicos dos embargos de declaração (obscuridade, contradição ou omissão, ou, ainda, erro material), mas, inquestionavelmente, é hipótese reconhecida pela jurisprudência.

2.8 Se o órgão jurisdicional afirma, erroneamente, inexistir nos autos processuais instrumento de mandato e, por conseguinte, nega seguimento ao agravo regimental, então esse erro de fato pode ser corrigido mediante os embargos de declaração.

STF, Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 857.805, 1ª Turma, 11.11.2015, pronunciamento do Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 17.11.2015, p. 67.

O Ministro Relator, no pronunciamento embargado, declarou que “o agravante não se faz representar por causídico devidamente constituído“. E ainda: “A subscritora do agravo regimental […] não possui, nos autos, os indispensáveis poderes“. Nesses termos, S.Exa. negou seguimento ao recurso.

Sobrevieram embargos de declaração pelos quais o recorrente “sustenta a existência de erro material no ato atacado, porquanto a subscritora do regimental teria sido regularmente constituída por meio de documentos constantes dos autos físicos do agravo de instrumento” (da decisão em exame).

Diante disso, após a obtenção de informações a respeito, no sentido da existência de tal documento nos autos do agravo de instrumento, o Ministro Relator assim se expressa: “Ante o quadro, conheço dos declaratórios e acolho o pedido neles formulado para emprestar efeito modificativo à decisão impugnada e dar sequência ao regimental“.

Em nossa opinião, é caso de erro de fato, e não de “erro material“. Com efeito, o pronunciamento embargado não levou em consideração a existência do instrumento de mandato nos autos do agravo de instrumento; por outras palavras, considerou inexistente um acontecimento que, na verdade, ocorreu, o da juntada da procuração aos autos processuais.

2.9 Há erro de fato, e não omissão, no pronunciamento que extingue o processo sem resolução do mérito, entendendo erradamente que a pretensão do autor, na ação de mandado de injunção em pauta, é idêntica à de uma outra, proposta pelo mesmo litigante, já julgada. O recurso de embargos de declaração é meio apropriado para corrigir erro de fato, hipótese aceita como legítima pela jurisprudência.

STF, Embargos de Declaração no Mandado de Injunção nº 4.005, 1ª Turma, 17.11.2015, pronunciamento do Rel. Min. Edson Fachin, DJ de 19.11.2015, p. 74/75.

Lida-se com ação de mandado de injunção concernente a alegado direito à aposentadoria especial no tocante a determinados servidores públicos.

A decisão embargada, redigida pelo primitivo Relator, Ministro Ricardo Lewandowski, extinguiu o processo sem julgamento do mérito, com base na consideração de que “esta causa é repetição do MI 876/DF“, já julgado.

Daí os embargos de declaração, nos quais o recorrente sublinha que, no mandado de injunção em tela, a matéria vertente não se identifica com à do processo anterior.

À vista disso, o atual Relator, Ministro Edson Fachin, assim se pronuncia: “Emerge do feito possível inexistência de identidade entre os MIs 876 e 4005, razão pela qual o feito comporta análise de mérito, a fim de não pairar dúvida diante da suposta omissão“.

Isto significa que o órgão jurisdicional, nos embargos, afirma que não são idênticas as pretensões do autor, contidas nos citados processos, ao contrário do que sustentou o pronunciamento impugnado.

O fundamento da decisão de descabimento do mandado de injunção foi o de que “esta causa é repetição do MI 876/DF“. Não existiu, no pronunciamento, omissão a que alude o art. 535 do Código de Processo Civil de 1973 (ou Código novo, art. 1.022).

Não sendo idênticas as pretensões do autor, na atual e na anterior ação de mandado de injunção, mas, mesmo assim, a decisão afirma que “esta causa é repetição do MI 876/DF” e conclui pelo descabimento do mandado de injunção em pauta. Então, o defeito desse pronunciamento judicial configura erro de fato, e não omissão (ao contrário do que se diz nos embargos).

Quanto ao mérito da causa, o órgão jurisdicional, nos embargos, invoca alguns julgados do STF, Plenário, em sentido contrário à pretensão do autor, para negar seguimento ao mandado de injunção em foco.

O histórico dos embargos de declaração revela que esse recurso também é empregado, há muito tempo, em casos não previstos no Código de Processo Civil (como, por exemplo, o erro de fato).

Foi nosso propósito, em última análise, demonstrar, mais uma vez, que os embargos de declaração também são admissíveis em caso não elencado na lei, mas reconhecido pela jurisprudência dos Tribunais Superiores e dos Tribunais de segunda instância [2].

Reiteramos que, sobretudo levando-se em conta o sistema do novo Código de Processo Civil, é útil estabelecer-se um conjunto de “padrões de cabimento dos embargos de declaração” (expressão por nós proposta), relativo a hipóteses não enumeradas na lei, mas admitidas pela jurisprudência.

3 EMBARGOS DECLARATÓRIOS E PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO

Os embargos de declaração não podem ser recebidos como pedido de reconsideração. O oferecimento dos embargos declaratórios a tempo interrompe o prazo de interposição de outro recurso.

Eis aí a tese jurídica do acórdão unânime da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, de 01.12.2015, no julgamento dos Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 168.637, relatado pelo Ministro Raul Araújo, publicado no Diário da Justiça Eletrônico de 16.12.2015, p. 2609.

Note-se que o objeto do recurso especial de que se trata consiste na alegação de que o oferecimento dos embargos declaratórios, em primeiro grau de jurisdição, interrompeu o prazo de interposição do agravo de instrumento, ante o preceituado pelo art. 538, caput, do Código de Processo Civil de 1973 (disposição que corresponde à do art. 1.026, caput, do novo Código), ao contrário do que sustentou o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que declarou intempestivo o agravo de instrumento.

Enquanto o acórdão da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no agravo regimental, afirmou que é aplicável à espécie a tese adotada pelo STJ, consoante a qual “os aclaratórios opostos com a mera finalidade de reconsideração da decisão embargada não interrompem o prazo para a interposição de outros recursos“, acórdão ulterior, desse mesmo órgão colegiado, nos embargos de declaração, invoca recentíssimo precedente (acórdão da Corte Especial) e sublinha que os embargos declaratórios não podem ser recebidos como pedido de reconsideração, de modo que incide na hipótese vertente a regra do art. 538, caput, do Código de 1973 (“Os embargos de declaração interrompem o prazo para a interposição de outros recursos, por qualquer das partes“).

Lê-se no voto do Ministro Relator, nos embargos de declaração em foco:

A questão tratada nos autos, embora objeto de controvérsia nas Turmas desta Corte Superior, foi solvida no julgamento do REsp 1.522.347/ES, de minha relatoria, afetado à Corte Especial, no qual se firmou o entendimento de que o “recebimento dos aclaratórios como pedido de reconsideração padece de, ao menos, duas manifestas ilegalidades, sendo a primeira a ausência de previsão legal para tal sanção subjetiva e a segunda a ‘não interrupção do prazo recursal’, aniquilando o direito da parte embargante e ignorando a penalidade objetiva, estabelecida pelo legislador no parágrafo único do art. 538 do CPC.”

Em outra oportunidade, acentuamos que “existe omissão quando o que o órgão judicial deixou de dizer sobre a questão seria capaz de influir no conteúdo da decisão[3].

A 4ª Turma, no agravo regimental, decidiu sobre o problema da pretensa infração ao art. 538, caput, do Código de Processo Civil e declarou que, conforme a jurisprudência do STJ da época, se os embargos declaratórios são recebidos como pedido de reconsideração, não interrompem o prazo de interposição de outros recursos. Eis aí o fundamento da decisão. Nessa ordem de considerações, nenhum outro argumento acerca da questão poderia repercutir no resultado do julgamento e, portanto, não houve, no acórdão recorrido (agravo regimental), omissão.

O que ocorreu foi que, depois do acórdão do agravo regimental (21.08.2014) e da interposição dos embargos declaratórios (06.10.2014), o Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial, ao julgar o Recurso Especial nº 1.522.347, em 16.09.2015, firmou o entendimento de que os embargos de declaração não podem ser recebidos como pedido de reconsideração, e, destarte, incide, na hipótese ora focalizada, a regra do art. 538, caput, do Código de Processo Civil de 1973 (CPC de 2015, art. 1.026, caput).

O precedente judicial que a 4ª Turma, nos embargos, resolveu seguir, portanto, foi o mencionado acórdão da Corte Especial.

É caso, nesse contexto, não de omissão, mas, na verdade, de superveniente acontecimento relativo à jurisprudência, que já agora constitui um dos padrões de cabimento dos embargos declaratórios. Em razão do provimento do recurso especial, deverá o Tribunal de origem apreciar as questões suscitadas no agravo de instrumento.

4 EMBARGOS DE DECLARAÇÃO E O CÓDIGO DE 2015: IDENTIDADE ENTRE A JURISPRUDÊNCIA E A LEI

Convém, agora, expor, em resumo, o nosso entendimento acerca do âmbito de cabimento dos embargos de declaração ante o sistema do novo Código de Processo Civil, em vigor a partir de 17 de março de 2016.

Lê-se no comentário a acórdão, por nós redigido, intitulado “Embargos de declaração. Problema da fixação dos honorários advocatícios. Existência de erro de fato. Importância da jurisprudência no Código de Processo Civil de 2015“, a sair na Revista de Processo, v. 252, fevereiro de 2016:

O que se quis dizer, enfim, é que, na vigência do Código de Processo Civil de 2015, o órgão julgador tem de levar em conta não apenas o texto do art. 1.022, mas também a jurisprudência, no que tange ao cabimento dos embargos de declaração. Estes embargos, no sistema do Código novo, serão cabíveis tanto nas hipóteses previstas na lei (art. 1.022) quanto nos casos a que se refere a jurisprudência (argumento extraído dos arts. 489, § 1º, nº VI, 926 e 927).

Sob o regime do Código de 2015, portanto, os embargos declaratórios são cabíveis não só nas hipóteses previstas no art. 1.022 (obscuridade, contradição, omissão e erro material), mas também nos casos admitidos na prática judiciária (exemplos: erro de fato; superveniente acontecimento relativo à jurisprudência; evidente equívoco na decisão).

No ano de 1976, notável processualista assim se pronunciou sobre o papel da jurisprudência: “[…] no Brasil, a jurisprudência, a despeito de sua importância prática, não tem força vinculativa equiparável à da lei[4].

Correta a observação transcrita à luz do direito positivo da época (ano de 1976). Porém, à vista do Código de 2015, é exato afirmar que, a partir da sua entrada em vigor, a jurisprudência tem força vinculativa equiparável à da lei, ou seja, daí em diante, há identidade entre a força vinculativa da jurisprudência e a da lei.

Nesse contexto, já agora não é preciso que o legislador inclua no Código outras hipóteses dos embargos de declaração, admitidas há bastante tempo na prática judiciária, uma vez que, conforme exposto, sob o regime do Código de 2015, a jurisprudência tem força vinculativa equiparável à da lei quanto, inclusive, aos casos de cabimento destes embargos.

A este propósito, eis aqui outros trechos do comentário a acórdão, já aludido: “Jurisprudência significa os entendimentos jurídicos adotados pelos órgãos competentes, no âmbito do Judiciário, sobre determinados temas“. E ainda: “Os entendimentos jurídicos adotados pelos Tribunais, convém frisar, dizem respeito não só ao direito material, mas também ao direito processual“.

Por isso, é inegável a importância da identificação dos “padrões de cabimento dos embargos de declaração” (v., por exemplo, nosso comentário a acórdão, já mencionado, e também um outro trabalho, antes referido, sob o título “Segundos embargos de declaração em virtude da mudança de orientação do STF. Padrão de cabimento do recurso“).

Ainda no tocante à admissibilidade dos embargos de declaração, as expressões “jurisprudência“, “enunciado de súmula” e “precedente” (a que se refere o Código novo) se identificam, e essas possibilidades são vinculativas. A primeira das expressões citadas, no fundo, abrange as duas últimas, razão pela qual, quanto a isso, geralmente mencionamos apenas a classe: jurisprudência.

CONCLUSÃO

Não obstante o acórdão do Supremo Tribunal Federal citado em 1.1, o “erro de julgamento” pode, em não poucos processos, ser corrigido mediante os embargos de declaração (exemplo: decisão aludida em 1.2).

Relativamente à admissibilidade dos embargos de declaração, no sistema do Código de 2015, é muito importante a identificação dos padrões de cabimento de tal recurso (ver alguns exemplos concretos citados no item 2).

Não há lugar para o recebimento de embargos de declaração como pedido de reconsideração. É exato o entendimento jurídico adotado pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça a respeito, aludido no item 3.

No que concerne ao cabimento dos embargos de declaração, está fora de dúvida que, sob o regime do novo Código, é admissível o recurso em estudo, tanto nos casos previstos no art. 1.022 quanto à luz dos arts. 489, § 1º, nº VI, 926 e 927, nas hipóteses reconhecidas pela jurisprudência (ver o item 4 deste trabalho).

[1] “Consideramos como ‘padrões de cabimento dos embargos de declaração’ certas hipóteses não previstas na lei (vigente Código de Processo Civil [de 1973], art. 535; novo Código, art. 1.022), mas aceitas pela jurisprudência (exemplos: erro de fato; evidente equívoco na decisão; superveniente acontecimento relativo à jurisprudência).” (trecho de comentário a acórdão, por nós redigido, sob o título “Segundos embargos de declaração em virtude da mudança de orientação do STF. Padrão de cabimento do recurso”, já citado no texto)

[2] Sobre o oferecimento dos embargos declaratórios, em primeiro grau de jurisdição, fora das hipóteses clássicas, cf. MONTEIRO NETO, Nelson. Embargos de declaração e apelação condicional. Revista de Processo, v. 245, p. 245-253, jul. 2015.

[3] Trecho do artigo intitulado “Âmbito dos embargos de declaração”, já aludido no texto.

[4] MOREIRA, José Carlos Barbosa. As bases do direito processual civil. In: Temas de Direito Processual (Primeira Série). 2. ed. São Paulo, 1988. p. 3/15.