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A APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA ÀS NOVAS ENTIDADES FAMILIARES

A APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA ÀS NOVAS ENTIDADES FAMILIARES

Cláudia Mara de Almeida Viegas

Thiago de Guerreiro Soares

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 A Família: do Patriarcalismo à Afetividade; 2.1 A Evolução Histórica do Instituto da Família; 2.2 As Configurações Familiares Pós-Contemporâneas; 2.2.1 Família Homoafetiva; 2.2.2 Família Monoparental; 2.2.3 Família Anaparental; 2.2.4 Família Poliafetiva; 2.3 Projeto de Lei do Estatuto da Família. 3 A Lei Maria da Penha; 3.1 A Lei Maria da Penha: Aspectos Históricos e Constitucionais; 3.2 A Violência e a Incidência da Lei Maria da Penha; 3.3 Medidas Protetivas de Urgência. 4 A Lei Maria da Penha e as Novas Configurações Familiares. 5 Conclusão. Referências.

 

1 Introdução          

O presente estudo tem por objetivo investigar a aplicação da Lei nº 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, nas demandas envolvendo as novas configurações familiares existentes na sociedade brasileira contemporânea.

Para tanto, utilizar-se-á da técnica bibliográfica para abordar os princípios informadores do Direito das Famílias, tais como isonomia, dignidade da pessoa humana e solidariedade familiar, tratando, ainda, do conceito de família e sua evolução ao longo do tempo, especialmente sob a égide da Constituição da República de 1988.

Importante, ainda, abordar a pluralidade familiar, como fundamento dos novos arranjos familiares, incluindo as famílias homoafetiva e anaparental, entre outras.

Ainda pertinente ao tema da família, realizou-se um breve estudo a respeito do Projeto de Lei nº 6.583/2013, que visa tratar do Estatuto da Família, em tramitação no Congresso Nacional. Em seu texto consta uma proposta de mudança do conceito de família no país, para que apenas as uniões entre um homem e uma mulher e os vínculos monoparentais sejam reconhecidos como tal.

Em seguida, realizar-se-á uma breve explanação acerca do caso da senhora Maria da Penha, episódio de repercussão interna e externa, que influenciou na criação da Lei nº 11.340, apontando seus aspectos relevantes e a eficácia prática das medidas protetivas.

Por fim, por meio de técnica bibliográfica e jurisprudencial, tratar-se-á da aplicação efetiva da Lei Maria da Penha nos contextos familiares, demonstrando o posicionamento dos Tribunais a respeito da violência doméstica e familiar, nas mais diversas configurações de uniões presentes no ordenamento jurídico pátrio.

2 A Família: do Patriarcalismo à Afetividade            

A Constituição Federal de 1988 trouxe ao ordenamento jurídico pátrio um novo modo de pensar – a cultura do humanismo e do respeito à dignidade da pessoa. O legislador, até então preocupado com o Estado, deslocou o seu olhar para o indivíduo e para a coletividade, garantindo direitos individuais e sociais, por meio de princípios fundamentais de aplicação e eficácia imediata.

Consoante Paulo Bonavides (1999, p. 237):

Os princípios constitucionais foram convertidos em alicerce normativo sobre o qual assenta todo edifício jurídico do sistema constitucional, o que provocou sensível mudança na maneira de interpretar a lei. Muitas das transformações são frutos da identificação de direitos humanos, o que ensejou um alargamento da esfera de direitos merecedores de tutela.”

Com o advento da Constituição da República, portanto, passou-se a integrar, no Estado Democrático de Direito, os princípios fundamentais da dignidade humana, isonomia, pluralidade familiar, dentre outros, os quais tiveram um papel unificador do sistema jurídico brasileiro.

Diante da nova realidade, os valores sociais, humanitários e individuais passam a ser o eixo principal também do Direito das Famílias, sendo obrigação do Estado promover a dignidade humana dos seus administrados.

Sendo a família o primeiro ambiente de socialização e estruturação de um indivíduo em qualquer sociedade, constituída por uma união selada pela vontade, pela afinidade e pela consanguinidade, na qual os membros que a compõem recebem os primeiros valores culturais e morais, que variam de acordo com a evolução histórica, mostra-se oportuno fazer um breve estudo histórico, para melhor entender a família hodierna.

2.1 A Evolução Histórica do Instituto da Família    

Descrever a família ao longo da história é fazer uma viajem no tempo para adquirir uma melhor compressão da origem deste instituto. Utilizar-se-á como ponto de partida a família na Antiguidade, descrevendo-se, posteriormente, a concepção romana, medieval e moderna, demonstrando toda a influência da Igreja Católica ao longo do processo de integração familiar até a construção do novo conceito de família.

Partindo do pensamento conceitual de família na Antiguidade, Dantas (1991, p. 4-5) afirma:

“(…) família aparece como a primeira forma de organização social que se tem notícia. Encontrou no culto religioso seu principal elemento constitutivo, muito valorizado nas sociedades primitivas e gradualmente diluído nas sociedades mais avançadas.”

Foi transmitida historicamente por cada período épico decorrente do processo evolutivo contínuo da humanidade. Nesta mesma linha de pensamento, Hironoka trata família como “uma entidade histórica, ancestral, mutável na exata medida em que mudam as estrutura e a arquitetura da própria história. Assim sendo, a história da família se confunde com a história da própria humanidade” (1999, p. 16).

Nota-se que o sentido familiar está diretamente ligado a essa evolução humana constante.

No segundo momento histórico, a família se apresenta em um contexto da Roma antiga, berço de uma filosofia patriarcal, onde o poder total desse grupo é emanado de um chefe, denominado Pater, sendo ele hierarquicamente superior a todos os membros pertencentes a este sistema familiar (DANTAS, 1991).

No início do século V, com o enfraquecimento de Roma, houve uma transmissão desse poder para a Corte da Igreja Católica romana. A partir de então, foi desenvolvido um novo sistema chamado Direito Canônico, o qual estruturava a religião católica em si como a principal norteadora religiosa para a família, tendo sua base de princípios, e quase todos os povos do mundo seguiam estes mandamentos (DANTAS, 1991).

A Igreja Católica em si tinha uma imposição marcante de seus dogmas, como o matrimônio, trazendo a família para o centro de discussão principal de seu poder. Neste sentido, os integrantes desses povos se viam inseridos, de forma cultural, moral e única, através do casamento, tendo a figura patriarcal como o único membro capaz conduzir a família, sempre ditados sobre as diretrizes religiosas da época (SIQUEIRA, 2010).

Ao passar pelo período feudal, fica bem claro que o Estado era caracterizado pelo senhor feudal e a família dependia dele para poder trabalhar em suas terras, tendo ali a sua única forma de sustento (SIQUEIRA, 2010).

Com o surgimento da Idade Moderna, o Estado Nacional se sobrepõe ao antigo regime feudal, trazendo, assim, uma proteção maior à família (SIQUEIRA, 2010).

No começo do século XVI, a Igreja Católica sofre um duro golpe com o surgimento da Reforma Protestante, quebrando um paradigma de exclusividade cristã com relação ao casamento, sendo o Estado o ente que asseguraria o direito ao casamento àqueles que não comungavam da religião católica (SIQUEIRA, 2010).

Ao longo da história, destacam-se, também, as Revoluções Industrial e Francesa, grandes marcos para o crescimento econômico, bem como para o surgimento embrionário dos novos modelos familiares (PEREIRA, 2003).

Por fim, chega-se ao século XX como o responsável pela grande evolução para o conceito de família, sendo amparado o surgimento do chamado Estado Laico, a revolução feminista e também a concepção de um casamento que buscasse sair de um enlace com intuito da reprodução, para o início de uma pluralidade familiar que trouxesse liberdade na sua formação (SIQUEIRA, 2010).

No Brasil, no primeiro momento, os portugueses trouxeram da Europa um modelo de família que foi denominado patriarcalismo brasileiro, no qual todos os membros daquele grupo familiar estavam sobre a batuta deste chefe patriarcal, que englobava, além da mulher, os filhos e os parentes e a obediência dos seus escravos (GONÇALVES, 2008).

Em todo o Brasil foi implantado este modelo conservador europeu com bases fortes na Igreja Católica Apostólica Romana, sendo que esta fazia uma imposição sobre a família que se tornava quase obrigatória (WALD, 2002 apud SIQUEIRA, 2010).

A evolução familiar no Brasil foi lenta e gradativa, sobretudo em face da promulgação do Código Civil de 1916, que manteve, em seu corpo legislativo, o patriarcalismo, no qual o homem continuava como chefe do grupo familiar, sendo protegidos no texto legal somente aqueles entes que faziam parte das relações familiares e, com isso, criando fortes barreiras à dissolução desta união conjugal (FARIAS; ROSENVALD, 2016).

Nota-se que o processo de evolução familiar no Brasil vem dotado de imensa carga conservadora ao longo dos anos, com extrema dificuldade de mudança devido a uma sociedade machista, oriunda dessa forma inicial de contexto familiar, que foi implantado pelos portugueses, com grande imposição religiosa.

A Constituição da República de 1988, portanto, foi um marco de libertação, amparando outros modelos de uniões familiares que não aquelas regidas pelo casamento, dando uma pluralidade de escolha e, consequentemente, mostrando respeito à dignidade de cada cidadão.

2.2 As Configurações Familiares Pós-Contemporâneas

O atual cenário familiar pátrio é redesenhado à luz da Constituição Federal de 1988, tendo em seu núcleo um pluralismo nas configurações familiares, bem como o afeto como sentimento orientador na condução desse pensamento.

A princípio, o meio mais adotado até então para formação das famílias era por meio do matrimônio, sobre o qual a Igreja tinha forte influência, sendo traçado pela moralidade, numa conduta de indivisibilidade do casal (homem e mulher), atribuído pela grande máxima de que “o que Deus uniu o homem não separa“, sendo este, até então, o modelo conservador e tradicional que detinha o aval da Igreja e o amparo do Estado.

Em harmonia com este conceito, os relacionamentos informais ou extraconjugais eram avaliados como obscuros e sofriam enorme discriminação social, além de não possuírem o aparo legal.

Com a dissolução dessas uniões informais, o Judiciário recebeu um grande número de processos, frutos de um novo olhar sobre as novas formas de relacionamento, obrigando-se, então, a criar soluções para os problemas decorrentes dessas separações, como, por exemplo, a garantia dos direitos dos filhos que não estavam amparados, por não serem advindos do casamento; a separação dos bens adquiridos no âmbito da união.

Para solucionar este problema social, o qual o Judiciário viu bater à sua porta, foi criada a chamada união estável, com vistas a garantir direitos e deveres aos indivíduos que conviveram sob essa forma de relacionamento, abrindo espaço para ampliação do novo modelo pluralista de família. Paulo Lôbo (2011, p. 205) sintetiza a família no contexto atual:

“(…) no momento em que o formato hierárquico da família cedeu à sua democratização, em que as relações são muito mais de igualdade e de respeito mútuo, e o traço fundamental é a lealdade, não mais existem razões morais, religiosas, políticas, físicas ou naturais que justifica a excessiva e indevida ingerência do Estado na vida das pessoas. A família identifica-se pela comunhão pela vida, de amor e de afeto no plano de igualdade, da liberdade, da solidariedade e da responsabilidade recíproca.”

Essa evolução familiar se perpetua diante de uma nova roupagem social, na qual o Estado se abre para amparar esse pluralismo familiar, trazendo em si um novo modelo eudemonista, no qual os indivíduos que pertencem a este grupo têm a felicidade como objetivo constante de um ideal de vida.

Trazendo a lume essa forma plural, propõe-se a apresentação, de maneira sucinta, de algumas das muitas formas de família que poderão surgir no contexto social atual.

2.2.1 Família Homoafetiva          

A relação homoafetiva representa uma quebra de paradigma nas relações homossexuais, diante de uma sociedade intolerante, fechada e contrária a qualquer forma de união que fuja do tradicional matrimônio entre homem e mulher. Maria Berenice Dias (2015, p. 272) descreve, de uma forma verdadeira, que:

A homossexualidade sempre existiu. Não é crime nem pecado; não é uma doença nem um vício. Também não é um mal contagioso, nada justificando a dificuldade que as pessoas têm de conviver com homossexuais. É simplesmente uma outra forma de viver. A origem não se conhece. Aliás, nem interessa, pois, quando se buscam causas, parece que se está atrás de um remédio, de um tratamento para encontrar cura para algum mal.”

Este grupo familiar ficou desamparado pelo Estado durante anos, tendo o legislador brasileiro simplesmente se omitido acerca da homoafetividade no país, suprimindo, assim, seus direitos individuais pelo simples fato de terem uma opção sexual diferente da maioria.

Depois de muita omissão, também por parte do Judiciário, esses direitos fundamentais começaram a ser respeitados, mais precisamente após o Supremo Tribunal Federal decidir, através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132/RJ e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.277/DF, sobre a união homoafetiva, reconhecendo-a como união estável, com iguais direitos e deveres constitucionais das uniões heterossexuais. Essa ADI é um marco muito importante na conquista dos direitos dos homossexuais, o que justifica a menção de parte dessa decisão, como segue:

“(…) PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO DAS PESSOAS EM RAZÃO DO SEXO, SEJA NO PLANO DA DICOTOMIA HOMEM/MULHER (GÊNERO), SEJA NO PLANO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CADA QUAL DELES. A PROIBIÇÃO DO PRECONCEITO COMO CAPÍTULO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. HOMENAGEM AO PLURALISMO COMO VALOR SOCIOPOLÍTICO-CULTURAL. LIBERDADE PARA DISPOR DA PRÓPRIA SEXUALIDADE, INSERIDA NA CATEGORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO INDIVÍDUO, EXPRESSÃO QUE É DA AUTONOMIA DE VONTADE. DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA. CLÁUSULA PÉTREA. O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por colidir frontalmente com o objetivo constitucional de promover o bem de todos. Silêncio normativo da Carta Magna a respeito do concreto uso do sexo dos indivíduos como saque da kelseniana norma geral negativa, segundo a qual o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido. Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da dignidade da pessoa humana: direito a autoestima no mais elevado ponto da consciência do indivíduo. Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade das pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e da privacidade constitucionalmente tuteladas. Autonomia da vontade. Cláusula pétrea.

  1. TRATAMENTO CONSTITUCIONAL DA INSTITUIÇÃO DA FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE QUE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO EMPRESTA AO SUBSTANTIVO ‘FAMÍLIA’ NENHUM SIGNIFICADO ORTODOXO OU DA PRÓPRIA TÉCNICA JURÍDICA. A FAMÍLIA COMO CATEGORIA SOCIOCULTURAL E PRINCÍPIO ESPIRITUAL. DIREITO SUBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. INTERPRETAÇÃO NÃO REDUCIONISTA. O caput do art. 226 confere à família, base da sociedade, especial proteção do Estado. Ênfase constitucional à instituição da família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por casais heteroafetivos ou por pares homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão ‘família’, não limita sua formação a casais heteroafetivos nem à formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. Família como instituição privada que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas, mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária relação tricotômica. Núcleo familiar que é o principal lócus institucional de concreção dos direitos fundamentais que a própria Constituição designa por ‘intimidade e vida privada’ (inciso X do art. 5º). Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos que somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Família como figura central ou continente, de que tudo o mais é conteúdo. Imperiosidade da interpretação não reducionista do conceito de família como instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil. Avanço da Constituição Federal de 1988 no plano dos costumes. Caminhada na direção do pluralismo como categoria sociopolítico-cultural. Competência do Supremo Tribunal Federal para manter, interpretativamente, o Texto Magno na posse do seu fundamental atributo da coerência, o que passa pela eliminação de preconceito quanto à orientação sexual das pessoas.
  2. UNIÃO ESTÁVEL. NORMAÇÃO CONSTITUCIONAL REFERIDA A HOMEM E A MULHER, MAS APENAS PARA ESPECIAL PROTEÇÃO DESTA ÚLTIMA. FOCADO PROPÓSITO CONSTITUCIONAL DE ESTABELECER RELAÇÕES JURÍDICAS HORIZONTAIS OU SEM HIERARQUIA ENTRE AS DUAS TIPOLOGIAS DO GÊNERO HUMANO. IDENTIDADE CONSTITUCIONAL DOS CONCEITOS DE ‘ENTIDADE FAMILIAR’ E ‘FAMÍLIA’. A referência constitucional à dualidade básica homem/mulher, no § 3º do seu art. 226, deve-se ao centrado intuito de não se perder a menor oportunidade para favorecer relações jurídicas horizontais ou sem hierarquia no âmbito das sociedades domésticas. Reforço normativo a um mais eficiente combate à renitência patriarcal dos costumes brasileiros. Impossibilidade de uso da letra da Constituição para ressuscitar o art. 175 da Carta de 1967/1969. Não há como fazer rolar a cabeça do art. 226 no patíbulo do seu § 3º. Dispositivo que, ao utilizar da terminologia ‘entidade familiar’, não pretendeu diferenciá-la da ‘família’. Inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico. Emprego do fraseado ‘entidade familiar’ como sinônimo perfeito de família. A Constituição não interdita a formação de família por pessoas do mesmo sexo. Consagração do juízo de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um legítimo interesse de outrem, ou de toda a sociedade, o que não se dá na hipótese sub judice. Inexistência do direito dos indivíduos heteroafetivos à sua não equiparação jurídica com os indivíduos homoafetivos. Aplicabilidade do § 2º do art. 5º da Constituição Federal, a evidenciar que outros direitos e garantias, não expressamente listados na Constituição, emergem ‘do regime e dos princípios por ela adotados’, verbis: ‘Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte’ (…).” (BRASIL, 2011)

Este julgado do Supremo Tribunal Federal (STF) veio trazer para a sociedade brasileira um grande avanço na luta contra o preconceito, permitindo que as pessoas tenham liberdade de escolha em relação a sua sexualidade sem serem alijadas pelo direito.

Essa decisão, mesmo que em determinados aspectos possa chocar alguns dogmas religiosos, tem como principal objetivo demonstrar a laicidade do Estado, além de garantir direitos fundamentais para cada cidadão brasileiro, sem distinção, visando extirpar do seio social qualquer hipótese de segregação.

Na realidade, buscou-se, apenas, uma isonomia real de direitos e deveres constitucionais, de modo a respeitar a dignidade da pessoa humana, não apenas por uma imposição legal, mas por uma liberdade de escolha familiar.

2.2.2 Família Monoparental       

Este modelo familiar, como descrito no próprio nome, é constituído por apenas um dos genitores, ultrapassando, assim, aquele modelo único de família que dependia de um par para a constituição do núcleo. A origem deste modelo encontra-se em circunstâncias diversas, decorrentes das pessoas estarem descasadas, viúvas, entre outras.

Apesar de bem comuns na atualidade, o legislador se omitiu sobre as famílias monoparentais ao longo de décadas, sendo reparada tal injustiça apenas na década de 1980, quando ocorreu sua previsão legal, contida no art. 226, § 4º, da Constituição Federal de 1988, in verbis: “Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes” (BRASIL, 1988).

Este amparo trouxe uma segurança legal para aqueles que compunham esses grupos familiares, modelo cada vez mais crescente dentro do cenário brasileiro, demonstrando que a democratização do instituto de família veio para ficar.

2.2.3 Família Anaparental           

As famílias anaparentais ganham esta nomenclatura por tratar, na sua constituição, da convivência entre pessoas com vínculo de parentesco ou não, sem a figura de ascendente ou descendente, tendo como fator basilar a afetividade.

Dentro do novo cenário de famílias socioafetivas, a família anaparental se desenvolve pela falta do ente paterno e materno, tendo em sua composição a possibilidade de união entre irmãos ou de amigas, que convivem e compartilham suas experiências ao longo de suas vidas, sem a necessidade de construírem uma união tida como família clássica e tradicional.

Para que seja constituído esse modelo familiar, é preciso observar preceitos que norteiam essa nova conjuntura, os quais apresentam os mais variados arranjos familiares da atualidade e tem como pilares a vontade das partes de submeter-se a direitos e deveres, tendo um relacionamento que possa ser público e notório, contínuo e duradouro, com seus objetivos amparados no sentimento de afeto e cuidado entre a presença de seus membros.

Esta escolha passa pelo livre-arbítrio individual, tendo estas uniões se tornando cada vez mais comuns nas grandes metrópoles, se podendo, a título de exemplo, citar irmãos que venham morar no mesmo lar por circunstância diversa da vida, e ali tem formada sua identidade familiar, com direitos e deveres a serem seguidos.

                       

2.2.4 Família Poliafetiva  

Quando se fala em pluralidade das famílias, a poliafetiva surge como mais um modelo neste contexto contemporâneo, trazendo, em sua formação, a união afetiva de mais de duas pessoas, compondo uma relação conjugal conjunta, pautada pela honestidade e transparência. Tem em sua base fundamental o gênero descrito como poliamor, que se fundamenta em uma relação de liberdade sem que haja uma exclusiva fidelidade entre seus entes, concorrendo todos entre si.

A grande polêmica acerca desse modelo de família está no tocante ao respeito à monogamia, em face dos defensores da sua natureza como princípio. Todavia, entende-se a monogamia como um valor consolidado socialmente, um indicador jurídico familiar, que não impede a confirmação familiar poliamorista.

Os princípios da pluralidade familiar, da isonomia, da autonomia privada, bem como o conceito moderno de família instituído pela Lei Maria da Penha, permitem o reconhecimento da família poliafetiva, formada pela manifestação de vontade livre de seus membros, com o intuito de formar família baseado no afeto de seus membros.

Este tópico veio trazer, de forma resumida, algumas das diversas formas de arranjos familiares existentes na sociedade brasileira atual, demonstrando que a evolução do conceito do instituto da família é permanente e se movimenta para que sejam atendidos os anseios na formação familiar.

2.3 Projeto de Lei do Estatuto da Família     

A proposta do Projeto de Lei nº 6.583/2013, que vem tratar do Estatuto da Família, tem, contido no seu texto original, regras jurídicas que definem como “família” apenas a união entre uma mulher e um homem, seja dentro do casamento ou da união estável, ou, ainda, qualquer conjuntura de união que seja oriunda de seus pais ou descendentes (FERREIRA, 2013).

A instabilidade é a pedra de toque da pós-modernidade. Prova disso é que, ora se defende com afinco a dignidade humana e a pluralidade familiar constitucional como cláusula inclusiva eudemonista do Direito das Famílias, ora se lança um projeto de lei (Estatuto da Família – PL nº 6.583/2013), com caráter excludente, que considera como família apenas a entidade monogâmica formada por homem e mulher em matrimônio e união estável.

Na prática, o que se tem é uma clara afronta a princípios constitucionais básicos, trazendo para a democracia pátria um retrocesso imensurável, pois diferenciar um grupo familiar, reservando-lhe certos benefícios, seria segregar e tornar todas as outras famílias vulneráveis, deixando-as à margem da visão do Estado.

Tal discussão não será simples, pois o Estatuto da família encontra grande apoio nas bancadas políticas conservadoras, que se unem pelo sentimento machista, unitário e que tem cunho eleitoreiro para agradar a maioria.

Na defesa de uma decisão contramajoritária sobre o assunto em pauta, o Supremo Tribunal Federal, em 2011, já havia julgado sobre tema semelhante, vindo a posicionar-se pela vedação a qualquer tipo de diferenciação em que possam existir elementos que demonstrem descriminação sexual, religiosa, entre outras. O Ministro Luis Felipe Salomão manifestou seu posicionamento no REsp 1.183.378, de 25 de outubro de 2011, relatando que:

Não obstante a omissão legislativa sobre o tema, a maioria, mediante seus representantes eleitos, não poderia mesmo ‘democraticamente’ decretar a perda de direitos civis da minoria pela qual eventualmente nutre alguma aversão. Nesse cenário, em regra é o Poder Judiciário – e não o Legislativo – que exerce um papel contramajoritário e protetivo de especialíssima importância, exatamente por não ser compromissado com as maiorias votantes, mas apenas com a lei e com a Constituição, sempre em vista a proteção dos direitos humanos fundamentais, sejam eles das minorias, sejam das maiorias.” (BRASIL, 2011)

O STF, através dessa e de muitas outras decisões, também vem demonstrando a todos o seu verdadeiro papel de guardião da Constituição, decidindo e fundamentando questões polêmicas no país, as quais caberiam ao Poder Legislativo posicionar-se sobre a temática, mas este prefere se omitir, de maneira a não se indispor, não se mostrar contrário à maioria, garantindo, assim, por mais tempo, seu poderio e sua maior perpetuação no poder.

A discussão sobre o Estatuto da Família está apenas se iniciando e se torna um tema passível de muitas discussões, pois, na verdade, existem inseridas na sociedade atual correntes contrárias à união de pessoas que desejam relacionar-se com outras do mesmo sexo, ou mesmo de quaisquer outras formas de relação que não as mais tradicionais.

Assim, este estatuto surge como uma forma de se criar mecanismos políticos para, de alguma forma, tentar reverter decisão já pacificada do STF em favor de uma isonomia familiar de direitos e deveres.

A inconstitucionalidade desse projeto se faz presente pela própria maneira de separação de grupos familiares para obtenção de benefícios, exclusivos a este modelo de família segregado, no qual os indivíduos que não pertencem a essa “classe” seriam excluídos e teriam tratamento menos favorecido pelo simples fato de fazerem parte de uma minoria vulnerável.

Este “Estatuto da Família“, em síntese, traria ao país um retrocesso democrático e evolutivo na construção de uma sociedade menos preconceituosa e intolerante. A abordagem desse tema ainda terá que passar por uma discussão política, mas, principalmente, por uma análise jurídica que venha defender os direitos de todos os cidadãos, sem distinção de gênero, credo ou religião.

Mas nem tudo está perdido. O Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) traz uma esperança real para a consolidação da pluralidade familiar dentro do cenário nacional, apresentando o Projeto de Lei do Senado nº 470, de 2013, de autoria da Senadora Lídice da Mata (PSB/BA), que afirma que o objetivo da proposta “é reunir em um documento jurídico único todas as normas relacionadas ao tema, permitindo tornar a Justiça mais ágil e conectada com a realidade familiar brasileira“.

Dentre as medidas de suma importância apresentadas no projeto, vale ressaltar alguns pontos que se mostram de extrema relevância, como a inclusão de regulamentação para assegurar direitos e deveres a todos os membros dos núcleos familiares, buscando realizar uma inclusão efetiva das relações homoafetivas tendo uma nomenclatura de “convivência familiar“, além de trazer soluções para temas relevantes, como a paternidade socioafetiva, alienação parental, entre outros.

Por certo, a criação do “Estatuto das Famílias” vem ao encontro do pensamento moderno que acompanha o Direito Civil da atualidade, tendo em seu corpo normativo estatutos recentes, necessários e inovadores, como é o caso dos Estatutos do Idoso e da Criança e do Adolescente.

Dessa forma, entende-se que esse projeto, ao contrário daquele “Estatuto da Família“, reflete-se num marco evolutivo do Direito das Famílias no país, buscando, de tal maneira, acompanhar o dinamismo da formação das famílias, garantindo direitos e respeitando as diferenças dos indivíduos.

3 A Lei Maria da Penha   

No Brasil, historicamente, a mulher, infelizmente, ocupou um papel coadjuvante, sendo ela, por muito tempo, submissa ao seu marido, criando assim uma cultura errônea de que o homem, dentro da família, podia tudo e a mulher, além de ser mera espectadora, teria que suportar todas as situações a que era submetida. Com isso, a mulher, esposa ou companheira se tornava uma espécie de propriedade particular, podendo, então, o homem fazer o que bem entendesse.

Nesse contexto, a sociedade brasileira, culturalmente, se encontrava com uma venda nos olhos em relação à situação de violência doméstica, sendo esta uma prática corriqueira, que não gerava penalidades severas aos que a praticavam.

A impunidade, na verdade, era um dos principais motivos que impulsionavam o aumento constante da violência contra a mulher, tendo as vítimas uma total descrença na justiça. Devido a essa omissão do Poder Legislativo, inúmeras mulheres tornaram-se vítimas desse crime e, consequentemente, seus autores não eram punidos.

Diante desse cenário de abandono no Poder Legislativo, o caso da senhora Maria da Penha Maia Fernandes tomou contornos internacionais, se tornando uma quebra de paradigmas, levando a uma grande pressão externa para criação de penas mais rígidas contra os indivíduos que cometessem esse crime tão cruel, o qual, na maioria das vezes, ocorria no próprio seio familiar.

O caso em comento, tratado a seguir, deu origem a uma norma de grande importância, a Lei nº 11.340/06, que ficou conhecida como Lei Maria da Penha.

Nos tópicos que seguem, será feita uma breve abordagem desta Lei, comentando sobre sua promulgação, seus dispositivos mais relevantes, e o que ela propõe para efetivar a proteção das mulheres. Para tanto, mostra-se imprescindível uma abordagem sobre o tratamento da violência no âmbito da Lei Maria da Penha e as medidas protetivas cabíveis nesses casos.

3.1 A Lei Maria da Penha: Aspectos Históricos e Constitucionais       

Analisando os fatos, ao longo dos anos, fica demonstrada a fragilidade da mulher em face da violência praticada contra ela, exigindo-se, assim, a criação de uma lei que a amparasse de modo mais efetivo.

A despeito disso, o Brasil só veio posicionar-se verdadeiramente depois que a Organização dos Estados Americanos (OEA) exigiu do Estado brasileiro a imposição de medida indenizatória decorrente de total omissão e negligência do Poder Público com relação à situação da violência doméstica no país.

O caso que deu origem a esta intervenção e à Lei Maria da Penha foi um crime ocorrido nos anos 1980, sendo ele o precursor no amparo normativo no qual a mulher passou a ter um amparo legal contra a violência doméstica.

Este crime veio a ocorrer na década de 1980 e envolvia Maria da Penha Maia Fernandes e seu ex-marido, o qual, durante quase 20 anos, viveu impune. De forma explicativa, a ex-Ministra do Supremo Tribunal de Justiça, Eliana Calmon Alves (2006, p. 3), retrata, de forma sucinta, as peculiaridades do caso e quais os motivos originaram a Lei Maria da Penha:

Não se pode deixar de registrar o motivo que levou o legislador a nominar o novo instituto. Sim, porque a Lei Maria da Penha é mais do que um diploma legislativo. Trata-se de uma lei que congrega um conjunto de regras penais e extrapenais, contendo princípios, objetivos, diretrizes, programa, etc., com o propósito precípuo de reduzir a morosidade judicial, introduzir medidas despenalizadoras, diminuir a impunidade e, na ponta, como desiderato maior, proteger a mulher e a entidade familiar. Maria da Penha é uma professora universitária de classe média, casada com um também professor universitário, que protagonizou um simbólico caso de violência doméstica contra a mulher. Em 1983, foi vítima, por duas vezes, do seu marido, que tentou assassiná-la. A primeira vez com um tiro, que a deixou paraplégica, e, a segunda, por eletrocussão e afogamento. A punição pela Justiça só veio 20 anos depois, por interferência de organismos internacionais. Maria da Penha transformou dor em luta, tragédia em solidariedade, merecendo a homenagem de todos dando nome à lei que é, sem dúvida, um microssistema de proteção à família e à mulher.

O inquérito policial instaurado à época angariou provas suficientes para a incriminação do ex-companheiro da vítima, sendo este elemento fundamental para que o Ministério Público pudesse oferecer denúncia do crime. Maria Berenice Dias (2013, p. 16) relata como a justiça se posicionou em sua decisão em relação ao acusado:

Em 1991, o réu foi condenado pelo Tribunal do Júri a oito anos de prisão. Além de ter recorrido em liberdade ele, um ano depois, teve seu julgamento anulado. Levado a novo julgamento em 1996, foi-lhe imposta a pena de dez anos e seis meses. Mais uma vez recorreu em liberdade e somente 19 anos e 6 meses após os fatos é que foi preso. Em 28 de outubro de 2002, foi liberado. Depois de cumprir apenas dois anos de prisão.

É difícil acreditar que existia tamanha impunidade no país. Sem leis que pudessem amenizar o sofrimento e a angústia dessas vítimas, a justiça era inoperante. Foi necessária, então, a ocorrência de um caso de tamanha repercussão e revolta, exigindo interferência externa, para que fossem tomadas as medidas necessárias visando conter a prática desse tipo de crime no país.

Assim, em 7 de agosto de 2006, o então presidente em exercício no Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou a tão esperada Lei nº 11.340, intitulada Lei Maria da Penha, a qual trouxe importante evolução para o meio jurídico e social, traçando, já em seu art. 1º, a finalidade de sua criação, in verbis:

Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.” (BRASIL, 2006)

Em seus 46 artigos, a Lei Maria da Penha cria não só assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar, mas também implanta medidas protetivas e de amparo jurídico, visando maior proteção à vida da mulher.

3.2 A Violência e a Incidência da Lei Maria da Penha       

A Lei Maria da Penha tem, no seu escopo normativo, mais precisamente contido no seu art. 7º, as definições de violências contra a mulher, podendo ser física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Faz-se necessário, para melhor compreensão do tema, um breve detalhamento individual de cada um desses tipos de violência.

O texto da Lei nº 11.304, no seu art. 7º, inciso I, enumera violência física contra mulher nos seguintes termos: “A violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal” (BRASIL, 2006). Tal dispositivo deixa clara a desnecessidade de averiguação de marcas no corpo da vítima, bastando tão somente o uso da força física contra ela, e que dessa agressão decorra um estresse crônico, originando problemas como dores múltiplas, distúrbios de sono. Tal circunstância já é suficiente para fazer valer a configuração do crime. Maria Berenice Dias (2013, p. 66) complementa:

É o que se chama de transtorno de estresse pós-traumático, que é identificado pela ansiedade e depressão a ponto de baixar ou reduzir a capacidade da vítima suportar os efeitos de um trauma severo. Como estes sintomas podem perdurar no tempo, independente da natureza da lesão corporal praticada, ocorrendo incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias ou incapacidade permanente para o trabalho, possível tipificar o delito como lesão corporal grave ou gravíssima, pela perpetuação da ofensa à saúde. (…)

Dessa maneira, com a referida Lei, a mulher tem sua dignidade física resguardada de forma ampla, contra qualquer tipo de violência física.

Outra modalidade de violência contra a mulher é a psicológica, contida no art. 7º, inciso II, da Lei Maria da Penha, in verbis:

Art. 7º (…)

II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação.” (BRASIL, 2006)

Em suma, a violência psicológica se caracteriza pela conduta do agente agressor que adota comportamentos que possam humilhar, ameaçar ou, de alguma forma, descriminar a vítima. Para que seja reconhecida a violência psicológica, o juiz não necessita de exame técnico ou pericial, bastando apenas que o magistrado julgue subjetivamente que os indícios apresentados pela vítima sejam suficientes para fundamentar a acusação contra o agressor.

Ainda no art. 7º, inciso III, tem-se a violência sexual contra a mulher, assim descrita:

Art. 7º (…)    

III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos.” (BRASIL, 2006)

Mesmo sendo apontada de maneira clara no texto de lei, a violência sexual no âmbito doméstico é pouco denunciada. Na maioria das vezes, o autor das agressões é o próprio companheiro, acreditando, assim, muitas mulheres que têm, na realidade, uma “obrigação conjugal” a cumprir, submetendo, dessa maneira, sua vontade, por medo, constrangimento ou, até mesmo, por vergonha de denunciar tais fatos ocorridos.

No art. 7º, inciso IV, a violência patrimonial é tratada assim:

Art. 7º (…)    

IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades.” (BRASIL, 2006).

A Lei, nesse tocante, estabelece uma obrigação ao agressor de devolução dos bens de importância patrimonial ou aqueles objetos de valor sentimental que, por algum motivo, os tenha sob a sua posse e retenção. Negando-se a entregar os devidos pertences da vítima, existe a possibilidade de enquadramento nos crime de furto, apropriação indébita, entre outros.

Por fim, no inciso V e último do art. 7º, consta a violência moral, “entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria” (BRASIL, 2006).

Nota-se que os delitos mencionados neste inciso já constam na lei penal brasileira, sendo que, quando esta violência ocorre no seio familiar, terá caráter de agravamento de pena.

Importa esclarecer que as condutas violentas realizadas contra a mulher no âmbito familiar podem se dar de forma isolada ou cumulativa.

Fato é que a mulher só relata a agressão quando não suporta mais a situação e deseja, de alguma forma, a cessação da violência vivida já há algum tempo. É como se, dentro do seu próprio lar, existisse um “monstro” e ela clamasse por socorro, sendo a denúncia a última esperança de respeito à sua dignidade.

3.3 Medidas Protetivas de Urgência   

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) realizou uma pesquisa levantando dados que apontam que, em 2015, ocorreu uma redução de 10{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} no número de casos de homicídios praticados contra a mulher, no âmbito familiar, em todo o país, tendo como fator preponderante o legado deixado pela Lei Maria da Penha, fator de inibição da prática desse tipo de crime. A pesquisa relata, também, que 98{76169b13dc8071a543622af38f43e06a70fe94f036afac6a80498da78c2dc5a6} dos entrevistados conhecem ou já ouviram falar de citada Lei, o que a torna uma lei de amplo conhecimento na sociedade brasileira (IPEA, 2015).

A Lei Maria da Penha, buscando um caráter de proteção à mulher vítima de violência doméstica, traz em seu bojo as chamadas medidas protetivas, a serem usadas como remédio para conter a crescente demanda em relação à violência de gênero, assegurando à mulher sua integridade física, psíquica, moral e, até mesmo, a sua vida.

Sérgio Ricardo de Souza (2009, p. 133) descreve as medidas protetivas como

“(…) espécies de medidas especialmente cautelares, que objetivam garantir principalmente a integridade psicológica, física, moral e material (patrimonial) da mulher vítima de violência doméstica e familiar, com vistas a garantir que ela possa agir livremente ao optar por busca de proteção estatal.

Enumeradas no art. 22 da Lei nº 11.340/06, as medidas possíveis são:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:      

I – suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003;          

II – afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III – proibição de determinadas condutas, entre as quais:      

  1. a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
  2. b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
  3. c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV – restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;         

V – prestação de alimentos provisionais ou provisórios.” (BRASIL, 2006)

Certo é que alguns pontos descritos na Lei podem gerar controvérsias e deverão ser abordados pelo juiz, casuisticamente. Todavia, o que se persegue é assegurar à mulher uma forma de conduzir sua vida de maneira mais rotineira possível, tentando fazer com que o agressor em potencial não tenha possibilidade de atentar contra a integridade física ou a própria vida da vítima. Essas medidas cautelares baseiam-se na existência de meros indícios, não havendo a necessidade de prova contundente, no contexto fático, para a ocorrência de violência familiar e doméstica.

A maior dificuldade encontrada para a efetivação das medidas protetivas está relacionada ao prazo de 48 horas para que possam entrar em vigor, uma vez que este lapso temporal pode custar a vida da vítima.

Outro ponto em que o Estado ainda mostra-se falho está relacionado à aplicação de uma fiscalização mais contundente, por parte da justiça, em detrimento daquelas vítimas que sofreram agressão e ainda continuam, de alguma forma, sofrendo ameaçadas. Tal falta de acompanhamento pelo órgão estatal não permite que o Estado saiba, por exemplo, se a distância determinada pelo juiz para que o agressor não se aproxime da vítima e seus familiares está sendo cumprida ou não.

Segundo Carla Matiello e Rafaela Tibola (2016):

O Estado ainda não possui estrutura para garantir a segurança e a vigilância pessoal da ofendida 24 horas por dia, mas isso seria o ideal. Uma das soluções para o grande índice de descumprimento das medidas protetivas de urgência seria o monitoramento eletrônico do agressor e da mulher vitimada, isso garantiria maior segurança e conforto às vítimas. Esse monitoramento eletrônico já está sendo utilizado por alguns poucos Estados do Brasil de maneira bastante tímida.”

Observa-se que, na prática, faltam mecanismos que efetivamente proporcionem uma legítima proteção à mulher. No Brasil, o Estado peca e se omite quanto à fiscalização protetiva, deixando de utilizar o eficaz monitoramento como uma forma de amenizar e inibir as ações dos potenciais agressores, visando, assim, garantir a efetivação das medidas protetivas em favor das mulheres.

Enfim, é inegável o legado que a Lei Maria da Penha trouxe para o ordenamento jurídico pátrio, contudo, também é clara a carência, ou mesmo a inércia, do governo para implementar medidas que possam efetivar, na prática, a segurança necessária, aquela que a Lei concede a todas as vítimas vulneráveis.

4 A Lei Maria da Penha e as Novas Configurações Familiares  

A sociedade brasileira contemporânea passou por uma evolução lenta e longa no decorrer de sua trajetória, tendo seu marco de crescimento, principalmente, a partir da Constituição da República de 1988, ocasião em que cada cidadão passou a exigir a convivência e o respeito às novas formas de configurações familiares, formadas de acordo com a vontade de cada indivíduo, dentro de uma visão eudemonista, em que o Estado somente atua como garantidor e legitimador do livre-arbítrio humano.

Numa ótica mais restritiva, o Estado, por sua vez, deparou-se com uma realidade de violência doméstica familiar, a qual atingia, precipuamente, as mulheres dentro de seus próprios lares, sem que seus agressores tivessem uma punição adequada ao cometimento daquele crime. E foi nesse contexto, depois de muito tempo omisso e sob grande pressão externa, que a Lei nº 11.304, intitulada Maria da Penha, entrou em vigor, visando coibir e punir os agressores no âmbito doméstico. A referida Lei foi assim denominada pelo então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em atenção ao caso emblemático de Maria da Penha Maia Fernandes, a quem quis render homenagem, por anos de luta contra a impunidade de seu ex-marido, que, durante período de convivência conjugal, agredia-a frequentemente.

A abordagem do presente artigo decorre da verificação da aplicação da Lei Maria da Penha num âmbito mais amplo, analisando, especialmente, a possibilidade de ela amparar todos os modelos familiares da atualidade (ou a maioria), sem distinção de gênero. Questiona-se, portanto, se tal norma é aplicável àquelas situações em que o homem é vítima de violência doméstica/familiar, como pode incidir nas relações homoafetivas. Pergunta-se: em relações íntimas e familiares de afeto, incide a Lei Maria da Penha, no caso em que uma mulher bate em um homem, ou um homem chega às vias de fato com outro homem, seu companheiro? E se uma mulher agride fisicamente seu irmão, incorrerá nas sanções desta Lei?

A matéria é controvertida e polêmica. De um lado, tem-se a corrente que defende a interpretação literal da norma protetora, pela qual a Lei somente incidiria nos casos em que a vítima fosse, necessariamente, mulher. Para esses doutrinadores, os homens devem recorrer aos juizados especiais ou às varas criminais, em casos de crimes com menor potencial ofensivo, como ameaça ou lesão corporal leve. Em caso de lesão grave, o Código Penal concederia proteção legal.

De outra banda, fundando-se nas bases do Estado Democrático de Direito, sobretudo no princípio da igualdade, doutrinadores realizam uma análise extensiva da norma, defendendo que a Lei nº 11.340/06 poderia ser aplicada em todas as situações de violência doméstica, pouco importando se a vítima é homem, mulher, ou a relação seja hétero, homossexual ou poliafetiva. Este último posicionamento é o que parece mais adequado.

Diante dessa visão ainda não consolidada, serão analisados alguns julgados sobre a temática, no tocante a esta nova roupagem familiar brasileira.

No que se trata da união homoafetiva, os Tribunais têm decidido no seguinte sentido:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CRIMES DE LESÃO CORPORAL E AMEAÇA. VIOLÊNCIA DE GÊNERO. RELAÇÃO HOMOAFETIVA. COMPETÊNCIA DO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 1. Havendo violência doméstica em um contexto de relação homoafetiva, presume-se aplicável a Lei Maria da Penha, com o intuito de preservar a integridade da vítima mulher, não podendo ser afastada de plano a legislação especializada por força dos arts. 2º e 5º, parágrafo único, da Lei nº 11.340/2014.” (Processo 20140020162973CCR/DF, Rel. Des. Jesuino Rissato, DJ 29.09.2014)

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. RELAÇÕES HOMOAFETIVAS. OFENDIDA MULHER. GÊNERO INDEPENDE DA ORIENTAÇÃO SEXUAL. COMPETÊNCIA DA VARA ESPECIALIZADA. 1. A Lei nº 11.340/06 destina-se a proteger a mulher de violência doméstica, não importa sua opção sexual, nem que envolva relações homoafetivas e a agressora seja outra mulher. 2. O art. 5º da Lei estabelece como âmbito de incidência a proteção da mulher na unidade doméstica, abrangendo os indivíduos que nela convivem ou qualquer relação de afeto, vínculo familiar, mesmo que não mais coabitem, independente da orientação sexual. A lei não é limitada pelo gênero do agressor, sua finalidade é sempre proteger a mulher, independente de opção sexual (parágrafo único do art. 5º). 3. Competente a Vara de Violência Doméstica exercida na Comarca pela Vara de Família. Conflito procedente.” (Processo 70036742047/RS, Rel. Ivan Leomar Bruxel, DJ 06.08.2010)

Nota-se que, em ambos os casos, entendem os julgadores como correta a aplicação da Lei nº 11.304/06, quando se trata de relação homoafetiva, independentemente da orientação sexual, não sendo limitada a lei ao gênero do agressor, mas, sim, ao da vítima, em razão de sua vulnerabilidade. Nos casos em tela, a punição prevista na Lei Maria da Penha foi aplicada à mulher agressora.

Nesse aspecto, importa ressaltar que a referida Lei Maria da Penha reconheceu expressamente a pluralidade de arranjos familiares verificada na sociedade atual, conforme disposto no art. 5º, II, in verbis:

Art. 5º (…)                

II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa. (…)           

Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.” (BRASIL, 2006)

Considerando-se que a Lei Maria da Penha é explícita ao reconhecer a proteção a toda e qualquer família unida por laços naturais, por afinidade ou por vontade, independentemente da orientação sexual, inadmissível se mostra afastar a aplicação da Lei nº 11.340/06. Não há como negar a nova tendência da família baseada na afetividade, sendo certo que a convivência entre pessoas e pela reciprocidade de sentimentos deve seguir uma proteção isonômica.

O fato é que, até o advento da Lei Maria da Penha, era enorme a resistência do legislador brasileiro em enfrentar a questão da união homoafetiva, sobretudo considerando que o Código Civil de 2002 nada versou a respeito. No entanto, num momento histórico para a sociedade em geral, o Supremo Tribunal Federal, em julgamento da ADPF 132 e da ADI 4.277, quebrou paradigmas e, finalmente, reconheceu a união homoafetiva como uma entidade familiar – formada por pessoas do mesmo sexo – detentora de direitos e deveres equiparados à união estável entre homem e mulher, nos termos do art. 226, § 3º, da Constituição brasileira e do art. 1.723 do Código Civil. Restou clara para a sociedade, então, a não discriminação às entidades familiares contemporâneas.

Segundo Maria Berenice Dias, “a Lei Maria da Penha, de modo expresso, enlaça ao conceito de família as uniões homoafetivas“. Acrescenta que “o parágrafo único do art. 5º reitera que independem de orientação sexual todas as situações que configuram violência doméstica e familiar” (DIAS, 2010, p. 44) e arremata:

A partir da nova definição de entidade familiar, trazida pela Lei Maria da Penha, não cabe mais questionar a natureza dos vínculos formados por pessoas do mesmo sexo. Ninguém pode continuar sustentando que, em face da omissão legislativa, não é possível emprestar-lhes efeitos jurídicos.” (DIAS, 2010, p. 47)

Desse modo, perfilha-se ao entendimento de que, na ocorrência de violência doméstica em um contexto de relação homoafetiva, aplica-se a Lei Maria da Penha, com o intuito de preservar a integridade da vítima homem ou mulher, por força do princípio da igualdade e dos arts. 2º e 5º, parágrafo único, da Lei nº 11.340/06.

No contexto da família anaparental, têm-se os seguintes posicionamentos:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CONFLITO DE COMPETÊNCIA ENTRE O DR. JUIZ DE DIREITO DA 4ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SANTA MARIA E A DRA. JUÍZA DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DAQUELA COMARCA, SUSCITADO PELO PRIMEIRO. Versa o presente conflito sobre a definição da competência, na Comarca de Santa Maria, para processar e julgar o delito de ameaça, envolvendo irmãos que coabitam no mesmo local. Tenho que razão assiste ao juízo suscitado. Isso porque a vítima, mulher, sofreu ameaça proferida pelo seu irmão, do qual é curadora, eis que o mesmo sofre de esquizofrenia, caracterizada a ofensa à mesma, praticado por homem, fato ocorrido no âmbito familiar, situação que se amolda ao art. 5º da Lei nº 11.340/06 – Lei Maria da Penha:

 ‘Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:        

I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;  

II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade, formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;  

III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.’

O art. 7º da mesma Lei, por sua vez, enumera e conceitua as diversas formas de violência doméstica contra a mulher, entre elas a ameaça, prevista no inciso II do referido artigo, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional, dentre outros. Ademais, como bem demonstrado nos autos, a ameaça foi cometida pelo irmão contra irmã, o que se qualifica como violência de gênero, expressando a posição de dominação do homem e subordinação da mulher. Nesse contexto, sendo a vítima mulher e tendo o fato ocorrido no âmbito familiar, entre irmãos, entende-se perfeitamente caracterizado delito sob a tutela da Lei Maria da Penha. Portanto, não há dúvida de que a competência para o processo e o julgamento do expediente instaurado para apurar a prática dos delitos é do Juizado da 4ª Vara Criminal da Comarca de Santa Maria. Nessa conformidade, desacolho o presente conflito negativo de jurisdição e declaro competente para o processamento do feito o juízo suscitante. Conflito desacolhido.” (TJRS, Conflito de Jurisdição 70057970592, Segunda Câmara Criminal, Rel. José Antônio Cidade Pitrez, j. 24.04.2014, publ. 02.06.2014)

CONFLITO DE JURISDIÇÃO. LESÃO PRATICADA POR IRMÃO CONTRA IRMÃ. INCIDÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA. COMPETÊNCIA DA 2º VARA CRIMINAL DA COMARCA DE URUGUAIANA. A Lei nº 11.340/06 foi editada visando coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher (…).” (Processo 70067074815/RS, Relª Rosaura Marques Borba, DJ 26.11.2015)

CONFLITO DE JURISDIÇÃO. CONFLITO DE JURISDIÇÃO. JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. PRIMEIRA VIOLÊNCIA ENTRE IRMÃOS. AMEAÇA ESPECÍFICA CONTRA IRMÃ. INCIDÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA. Não é necessário que exista relação conjugal para incidência da Lei Maria da Penha. Basta que haja alguma espécie de violência doméstica ou familiar para ser ofertada à vítima, mulher, a proteção mais ampla estabelecida pela legislação especial. Na espécie, houve, em tese, ameaça direcionada especificamente à vítima realizada por seu irmão, com o qual reside. Não há óbice para incidência da Lei nº 11.343/06.” (Processo 70067787077/RS, Rel. Diogenes Vicente Hassan Ribeiro, DJ 02.03.2016)

Os julgados supramencionados demonstram que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul vem se posicionando no sentido de que não há necessidade de existir relação conjugal para a aplicação da Lei Maria da Penha, bastando apenas à constatação da violência doméstica ou familiar, em razão do gênero da vítima, para aplicação da lei.

Em sendo assim, a violência cometida no âmbito da família anaparental – por um irmão contra uma irmã – qualifica-se como violência de gênero, sobretudo em face da posição de dominação do homem e subordinação da mulher, se caracterizando, perfeitamente, um delito sob a tutela da Lei Maria da Penha.

Dessa forma, além dos vínculos familiares homoafetivos, também encontram amparo na Lei nº 11.340/06 os fatos violentos havidos entre irmãos, desde que a vítima seja uma mulher.

No que se refere à família monoparental, os Tribunais têm tratado da seguinte forma:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. MAUS-TRATOS PRATICADOS POR FILHO EM FACE DE MÃE IDOSA. INCIDÊNCIA DA LEI ‘MARIA DA PENHA’ (LEI Nº 11.340/06). Caso em concreto em que se apura a prática de crime de maus-tratos promovido por filho contra mãe idosa. A competência, no caso, se estabelece em razão da violência de gênero e da natureza do fato delituoso (ocorrido no âmbito doméstico e do convívio afetivo), e não só diante da condição de idosa da ofendida. Incidência das disposições da Lei nº 11.340/06.” (Processo 70065169302/RS, Rel. Victor Luiz Barcellos Lima, DJ 09.11.2015)

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CONFLITO DE COMPETÊNCIA ENTRE DRA. JUÍZA DE DIREITO DO JUIZADO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR E O DR. JUIZ DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DO FORO REGIONAL DO PARTENON, AMBOS DA COMARCA DE PORTO ALEGRE, SUSCITADO POR ESTE ÚLTIMO. Versa o presente conflito sobre a definição da competência, na Comarca de Porto Alegre, para processar e julgar o delito de ameaça e lesão corporal, envolvendo filho e sua genitora, no âmbito familiar. Tenho que razão assiste ao juízo suscitante. Isso porque a vítima, mulher, sofreu ameaça e agressão proferidas pelo próprio filho, caracterizada a ofensa à integridade física de mulher, praticada por homem, fato ocorrido no âmbito familiar, situação que se amolda ao art. 5º da Lei nº 11.340/06 – Lei Maria da Penha: ‘Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade, formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação’. O art. 7º da mesma Lei, por sua vez, enumera e conceitua as diversas formas de violência doméstica contra a mulher, entre elas a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal. Ademais, como bem demonstrado nos autos, a agressão foi cometida contra a mãe, o que se qualifica como violência de gênero, expressando a posição de dominação do homem e subordinação da mulher. Nesse contexto, sendo a vítima mulher e tendo o fato ocorrido no âmbito familiar, envolvendo filho contra mãe, entende-se perfeitamente caracterizado delito sob a tutela da Lei Maria da Penha. Portanto, não há dúvida de que a competência para o processo e o julgamento do expediente instaurado para apurar a prática dos delitos é do Juizado de Violência Doméstica e Familiar. Nessa conformidade, acolho o presente conflito negativo de jurisdição e declaro competente para o processamento do feito o juízo suscitado, Juizado da Violência Doméstica e Familiar da Comarca de Porto Alegre. Conflito acolhido.” (Processo 70054881321/RS, Rel. José Antônio Cidade Pitrez, DJ 11.11.2015)

As decisões, nesses casos, asseguram à mãe, vítima de violência doméstica realizada pelo próprio filho, as medidas cabíveis estabelecidas na Lei Maria da Penha. Por certo, em ambos os exemplos acima, não se têm elementos suficientes para afirmar que se trata de uma família monoparental, contudo, as decisões, sem dúvida, podem ser utilizadas, por analogia, àquele molde familiar, haja vista as similaridades das circunstâncias.

Dentre a gama de modelos familiares abordados neste estudo, a poliafetividade ainda não foi tratada pelos Tribunais, todavia, esse fenômeno familiar já é uma constante no cenário social, havendo muitas pessoas que aderem a esta forma de relacionamento e muitos têm sido os registros junto aos cartórios de todo o Brasil.

Por certo, se houver uma mulher envolvida nessa modalidade de família, qualquer violência ou ameaça em razão do seu gênero deverá ser apreciada sob a égide da Lei Maria da Penha. Por outro lado, inexistindo mulheres envolvidas, os Tribunais devem considerar a vulnerabilidade da vítima e o âmbito em que o delito se deu – familiar ou não.

No entanto, as dificuldades são muitas, haja vista que inúmeros magistrados ainda defendem a aplicação restritiva da Lei Maria da Penha apenas à mulher e argumentam:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. DECLINAÇÃO DA COMPETÊNCIA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. VÍTIMA HOMEM. RELAÇÃO HOMOAFETIVA. O homem não pode ser sujeito passivo de violência doméstica no âmbito da Lei nº 11.340/06 (entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça). Além disso, no caso concreto, não está evidenciada a vulnerabilidade da vítima. Impossibilidade de prevalência da competência do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Remessa dos autos ao Juizado Especial Criminal. Evidente que, quando uma nova lei ingressa no ordenamento jurídico, ela irradia os seus efeitos para além das situações previstas no novo diploma legal. A partir desta percepção, tem-se que alguns ‘princípios’ introduzidos pela Lei Maria da Penha podem ser aplicados a situações outras, visando à proteção dos indivíduos em relações em que se verifique, por exemplo, vulnerabilidade, de modo a justificar, eventualmente, medidas de proteção. Não é possível, reitera-se, adotar regimes de competência, mas apenas aplicar os princípios de proteção. Recurso desprovido.” (TJRS, RSE 70057112575, Rel. Diogenes Vicente Hassan Ribeiro, DJ 07.08.2014) (grifos do autor)

PEDIDO DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS PROTETIVAS FEITO PELO HOMEM. INDEFERIMENTO CORRETO E MANTIDO. INCOMPETÊNCIA DO JUIZADO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça já resolveu questão semelhante à dos autos, afirmando que a competência para as situações similares àquela reclamada pelos recorrentes não é do Juizado da Violência Doméstica, porque não se aplica aos casos a Lei Maria da Penha. Disseram: ‘(…) não configura hipótese de incidência da Lei nº 11.340/06, que tem como objeto a mulher numa perspectiva de gênero e em condições de hipossuficiência ou vulnerabilidade. Sujeito passivo da violência doméstica objeto da referida Lei é a mulher. Sujeito ativo pode ser tanto o homem quanto a mulher, desde que fique caracterizado o vínculo de relação doméstica, familiar ou de afetividade, além da convivência, com ou sem coabitação (…)’. Decisão. Recurso desprovido. Unânime.” (Processo 70064015407, Rel. Sylvio Baptista Neto, DJ 13.05.2016)

Nos termos supra, o homem que figura como agente passivo nas situações de violência doméstica não é amparado pela Lei Maria da Penha, haja vista o objeto dessa norma, qual seja proteger a mulher na sua condição de vulnerabilidade, em razão do seu gênero.

Não há como concordar com tal argumento simplório. Veja-se bem: ante a igualdade constitucional entre os gêneros – homens e mulheres -, o homem não pode se encontrar em estado de vulnerabilidade? O homem não precisa de medidas protetivas?

Luiz Flávio Gomes (2009) aduz que

(…) parece-nos acertado afirmar que, na verdade, as medidas protetivas da Lei Maria da Penha podem (e devem) ser aplicadas em favor de qualquer pessoa (desde que comprovado que a violência teve ocorrência dentro de um contexto doméstico, familiar ou de relacionamento íntimo). Não importa se a vítima é transexual, homem, avô ou avó, etc. Tais medidas foram primeiramente pensadas para favorecer a mulher (dentro de uma situação de subordinação, de submetimento). Ora, todas as vezes que essas circunstâncias acontecerem (âmbito doméstico, familiar ou de relacionamento íntimo, submissão, violência para impor um ato de vontade, etc.), nada impede que o Judiciário, fazendo bom uso da Lei Maria da Penha e do seu poder cautelar geral, venha em socorro de quem está ameaçado ou foi lesado em seus direitos. Onde existem as mesmas circunstâncias fáticas deve incidir o mesmo direito.”

Diante da pluralidade familiar e da possibilidade de aplicação da Lei Maria da Penha no âmbito da família, torna-se notória a divergência de opiniões da aplicação da referida Lei, principalmente quando a lide apresenta no seu polo passivo um homem.

Contudo, levando a efeito a igualdade constitucional entre homens e mulheres, dúvidas não restam de que a Lei nº 11.340/06 deve ser aplicada indistintamente a homens e a mulheres, pois tal posição se compatibiliza com a essência da própria lei, que é combater a violência de gênero.

O que se pode afirmar, por hora, é que o Judiciário ainda não tem admitido a aplicação dos dispositivos da Lei Maria da Penha a fim de protegê-los da incidência da violência doméstica.

5 Conclusão          

O presente artigo teve por escopo verificar a possibilidade de efetiva aplicação da Lei Maria da Penha, criada para amparar as demandas de violência doméstica e familiar, às novas configurações familiares da sociedade contemporânea, nas quais nem sempre figuram como parte o homem e a mulher.

Restou demonstrado que a família evoluiu, impulsionando o legislador constituinte a inserir no texto constitucional de 1988 a igualdade entre os cônjuges, as liberdades, as garantias da mulher, bem como a pluralidade familiar, já vivenciada pela sociedade pós-moderna, em virtude da notória existência de novas espécies familiares, baseadas na afetividade.

Diante desse contexto, discorreu-se sobre algumas espécies de famílias reconhecidas pela doutrina do Direito das Famílias, demonstrando que o Estatuto da Família (PL nº 6.583/2013), em discussão no Congresso Nacional, já nasce morto, ante a sua evidente inconstitucionalidade.

Evidenciou-se que a mulher, no Brasil, ao longo do tempo, sempre teve seus direitos tardiamente reconhecidos pelo Estado, razão pela qual surgiu a necessidade de uma intervenção externa para sua proteção. Seguindo essa perspectiva, sobreveio no ordenamento jurídico brasileiro a Lei Maria da Penha, com o objetivo de afastar e punir a nefasta violência doméstica familiar, que assombra boa parte das mulheres brasileiras.

O legislador levou em conta a hipossuficiência física e histórica da mulher, demonstrando um problema enraizado na cultura do brasileiro, segundo o qual a mulher era tratada como um objeto e, por isso, recebia um tratamento à mercê do homem, que, por sua vez, se achava no direito de agir como bem entendesse em relação a ela. A referida Lei pretendeu tratar da matéria, distinguindo o gênero por sua real fragilidade, resguardando, assim, o amparo, por meio da criação de medidas de proteção, não importando em qual contexto familiar a vítima se encontre.

No primeiro momento, a lei não incluiu homens, transexuais e outros de gênero masculino no seu conteúdo, notadamente pelo caráter de urgência de sua criação, que visava sanar os abusos do homem, que, na maioria das vezes, era o principal agressor, independentemente de sua condição de marido, pai, irmão ou companheiro.

Importa ressaltar que a Lei Maria da Penha não foi concebida por ato de benevolência do Estado, mas, sim, em face de sua inoperância em conceder garantias de segurança às vítimas de violência, tendo sido necessária, inclusive, a intervenção da Organização dos Estados Americanos (OEA) para exigir que o Estado brasileiro assegurasse os Direitos Humanos, firmados e assegurados nos tratados internacionais, nos quais o Brasil é signatário. Todavia, muito ainda precisa ser feito no que diz respeito à proteção da mulher.

Observou-se que, não obstante a Lei Maria da Penha tenha ampliado o conceito de família, reconhecendo proteção a toda e qualquer família unida por laços naturais, por afinidade ou por vontade, independentemente da orientação sexual, não deixou explícito o amparo a todos os modelos de famílias constantes na realidade do país, circunstância que tem levado os Tribunais à aplicação restritiva da norma.

Por óbvio, reconhece-se que o ordenamento jurídico brasileiro não é capaz de resolver todos os problemas e inovações sociais que venham a sua porta.

Entretanto, nem tudo está perdido. Demonstrou-se, por meio de análise jurisprudencial, que com base numa interpretação constitucional da norma é possível ampliar a incidência da Lei Maria da Penha, com vistas a amparar a mulher, vítima de violência doméstica, em razão de sua vulnerabilidade, independentemente do gênero do agressor.

Defendeu-se, também, a aplicação da Lei Maria da Penha às famílias anaparentais, ao fundamento de que a igualdade constitucional entre homens e mulheres é suficiente para reconhecer a aplicação da Lei nº 11.340/06 indistintamente a homens e a mulheres, pois tal posição se compatibiliza com a essência da própria lei, que é combater a violência de gênero.

Lado outro, considerando o objetivo de aplicar a Lei Maria da Penha às novas entidades familiares, deparou-se, ainda, com o entrave do “Estatuto da Família“, PL nº 6.583/2013, que pretende restringir o conceito de família aos casamentos e às uniões estáveis entre homens e mulheres e seus filhos. Constatou-se que o Estado brasileiro adotou um caráter discriminatório da família, ao longo da história, sendo prova disso o “Estatuto da Família“, que tramita no parlamento, projeto com cunho visivelmente político, apoiado pelas bancadas conservadoras, religiosas, o qual concede uma visão restritiva da família, com enorme carga machista, em flagrante afronta à Constituição e à pluralidade familiar, real e presente no país.

Cabe lembrar que a Constituição brasileira estabeleceu sua laicidade, circunstância que impede a criação de lei embasada somente no caráter da religião e dos bons costumes. Tal ato, como já frisado, viola gravemente a pluralidade familiar e o direito de escolha do indivíduo, sobretudo quanto à forma de criação do seu núcleo familiar, ferindo de morte o princípio da dignidade da pessoa humana, valor supremo da República brasileira.

Diante da realidade explicitada, o que se pretende é contribuir para que a política do país trate seus cidadãos de forma a incluí-los, nos termos do “Estatuto das Famílias“, tal como sugere os Juristas do IBDFAM, PL nº 470/2013, em curso no Senado Federal. O aludido Projeto traz disposições que reconhecem a família plural, de acordo com o dinamismo social latente na sociedade, abarcando todos os modelos familiares baseados na afetividade.

Em sendo assim, não há como conceber a efetivação do Estatuto da Família, como entrave na conquista de direitos das novas famílias reconhecidas pela sociedade.

Na realidade, impõe-se verificar a real necessidade de cada uma das famílias, de forma a criar mecanismos de políticas públicas de conscientização das pessoas contra a violência doméstica familiar, reconhecendo, por outro lado, severas punições aos infratores, independentemente de gênero ou orientação sexual. Para tanto, o Poder Legislativo brasileiro precisa sair da sua inércia e omissão, de forma a encarar assuntos tão sérios e de tamanha relevância social, que incomodam e trazem insegurança e sensação de impunidade no país.

Não há como ignorar que a isonomia e a pluralidade familiar estão consagradas no Estado Democrático de Direito brasileiro, e, nesse passo, cabe aos operadores do Direito analisar a situação da violência familiar doméstica de forma ampla, criando mecanismos de proteção que abarquem todas as espécies de família existentes no Brasil.

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