AGRAVO INTERNO
Alexandre Freitas Câmara
O agravo interno é recurso que o CPC regula em seu art. 1.021. É cabível contra decisões monocráticas proferidas nos Tribunais, e permite que se garanta a colegialidade típica desses órgãos jurisdicionais. Neste estudo será examinado este recurso, analisando-se sua natureza, seu cabimento, seus efeitos e seu processamento.
1. Natureza jurídica
O agravo interno é tratado pelo CPC, de forma expressa, como recurso. É o que se verifica pela leitura do disposto no art. 994, III. É preciso, porém, verificar se é esta mesmo sua natureza.
É que ao tempo do CPC/1973 houve algumas decisões do Superior Tribunal de Justiça negando natureza recursal ao agravo interno. Foi o caso, por exemplo, do acórdão proferido no julgamento do AgRg no REsp 959.406/RJ, de que foi relator o Min. Humberto Martins.[1] Já na ementa desse acórdão se lê que o STJ teria “firm[ado] entendimento no sentido de que, para a interposição do agravo interno, previsto no art. 557, § 1º, do CPC [de 1973], não há necessidade de preparo, em vista de não possuir natureza propriamente de recurso”. Entendeu o STJ, naquele julgado, que o objetivo do agravo interno seria “apenas o encaminhamento para o colegiado do recurso obstado pelo relator, sem quaisquer ônus ou preparo”. Perceba-se que a negativa de natureza recursal ao agravo interno tem consequências relevantes, inclusive quanto à aplicabilidade a ele de regras sobre recolhimento de preparo e de deserção de recursos.
Apesar de no acórdão citado se ter dito que o STJ teria firmado entendimento afastando a natureza recursal do agravo interno, no âmbito da Corte a matéria sempre foi polêmica. Veja-se, por exemplo, que ao julgar os EDcl no AgRg no Ag 1.344.973/ES, relator o Min. Arnaldo Esteves Lima,[2] se afirmou expressamente – embora reconhecendo a divergência – que “[a] natureza recursal do agravo está expressamente reconhecida no art. 496, II, c.c. 557, § 2º, parte final, do CPC [de 1973]. Ademais, é de se reconhecer que não lhe falta quaisquer dos elementos que, segundo a doutrina, compõem o conceito de recurso: voluntariedade, adequação, previsão legal, finalidade e eficácia devolutiva ou de retratação”. E por isso, entendeu o Tribunal que “deve prevalecer o entendimento segundo o qual o agravo previsto no art. 557, § 1º, do CPC [de 1973] possui natureza recursal”.
A definição da natureza recursal (ou não) do agravo interno exige que se determine qual é o conceito de recurso. Pois aqui se adota a definição de recurso que vem da obra de José Carlos Barbosa Moreira: “recurso é o remédio voluntário idôneo a ensejar, dentro do mesmo processo, a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração da decisão judicial que se impugna”.[3] Em outros termos, o recurso é um mecanismo empregado por alguém para, por vontade própria, impugnar decisão judicial no mesmo processo em que proferida, e tendo por finalidade a produção de um dentre quatro resultados possíveis: a reforma (nos casos de error in iudicando), a invalidação (nos casos de error in procedendo), o esclarecimento (nos casos de obscuridade ou contradição) ou a integração (no caso de omissão) da decisão judicial impugnada.
Sendo esta a definição de recurso, não é difícil concluir que o agravo interno tem natureza recursal. Ele é interposto de forma voluntária, com o propósito de impugnar decisão judicial. Através da interposição do agravo interno provoca-se um prolongamento do mesmo processo em que a decisão agravada tenha sido proferida. Por fim, o agravo interno é mecanismo destinado a veicular pretensões de reforma ou invalidação da decisão impugnada. É, pois, e evidentemente, recurso, daí resultando a plena aplicabilidade, ao instituto aqui examinado, de toda a sistemática recursal brasileira.
2. Cabimento
O art. 1.021 do CPC estabelece que o agravo interno seja cabível contra decisão proferida pelo relator. Sua leitura pode, então, gerar a impressão de que este recurso só pode ser empregado como meio destinado a impugnar decisões monocráticas, unipessoais, proferidas pelos relatores. Assim não é, porém, como se irá demonstrar.
Como cediço, tribunais são órgãos colegiados. Pois para que exerçam de modo eficiente à atividade jurisdicional é preciso que se designe um de seus integrantes para conduzir o feito, preparando-o para o julgamento. Pois este é o relator, a quem incumbe “dirigir e ordenar o processo no tribunal, inclusive em relação à produção de prova, bem como, quando for o caso, homologar autocomposição das partes” (art. 932, I, do CPC).
Ao relator incumbe proferir uma série de decisões unipessoais, monocráticas.[4] Algumas delas estão expressamente previstas no CPC, como é o caso da decisão que não conhece de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida (art. 932, III), da que nega provimento a recurso (art. 932, IV), da que dá provimento a recurso (art. 932, V), da que resolve o incidente de desconsideração da personalidade jurídica instaurado originariamente perante o tribunal (art. 932, VI), da que julga de plano conflito de competência (art. 955, parágrafo único), entre muitas outras. Também há casos expressos em disposições normativas contidas em outras leis, como é o caso da decisão que indefere a petição inicial de mandado de segurança de competência originária de tribunal (art. 10, § 1º, da Lei 12.016/2009). Outras decisões monocráticas podem ser proferidas pelo relator, porém, não obstante não haja expressado menção a elas em textos legais. É o caso, por exemplo, da decisão de saneamento e organização do processo da ação rescisória, já que esta segue no que couber, o procedimento comum (CPC, art. 970, in fine), só sendo de competência do órgão colegiado o julgamento final da causa (art. 973, parágrafo único, do CPC).
Pois contra decisão monocrática de relator é admissível agravo interno, por força do disposto no art. 1.021 do CPC, salvo expressa disposição em sentido contrário.[5] Tenha-se claro este ponto: só é irrecorrível a decisão unipessoal do relator se houver expressa previsão dessa irrecorribilidade, já que nesse caso a disposição especial (que afirma a irrecorribilidade da decisão) prevalecerá sobre a regra geral do art. 1.021 do CPC. É o que se dá, por exemplo, no caso da decisão do relator que solicita ou admite a intervenção de amicus curiae (art. 138 do CPC), ou da decisão do relator que, reputando ter havido justo impedimento, releva a pena de deserção de recurso (art. 1.007, § 6º, do CPC), ou, ainda, da decisão do relator de recurso especial que, reputando haver no mesmo processo recurso extraordinário que verse sobre questão prejudicial, determina o sobrestamento do julgamento e remete os autos ao STF (art. 1.031, § 2º, do CPC). Em todos esses casos, e em outros expressamente previstos em lei, a decisão unipessoal do relator é irrecorrível, não sendo, portanto, admissível a interposição do agravo interno.
De outro lado, não só as decisões monocráticas dos relatores são impugnáveis por agravo interno. Sobre o ponto, é sugestivo o disposto no art. 1.070 do CPC, por força do qual “[é] de 15 (quinze) dias o prazo para a interposição de qualquer agravo, previsto em lei ou em regimento interno de tribunal, contra decisão de relator ou outra decisão unipessoal proferida em tribunal”. A parte final do texto normativo aqui transcrito claramente indica a possibilidade de que não só o relator profira decisões monocráticas nos tribunais. E assim realmente ocorre, já que há casos em que incumbe ao Presidente ou Vice-presidente do tribunal prolatar decisões unipessoais impugnáveis por agravo interno.
Veja-se, por exemplo, o caso previsto no art. 1.030 do CPC, por força do qual incumbe ao Presidente ou Vice-presidente do tribunal recorrido proferir decisão monocrática acerca da admissibilidade de recurso especial ou extraordinário. Pois nos casos previstos nos incisos I e III desse artigo caberá agravo interno (art. 1.030, § 2º). Em outros termos, é impugnável por agravo interno a decisão unipessoal do Presidente ou Vice-presidente de tribunal que: (i) negar seguimento a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o STF não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do STF exarada no regime de repercussão geral; (ii) negar seguimento a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do STF ou do STJ, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos; (iii) sobrestar o recurso especial ou extraordinário que versar sobre controvérsia de caráter repetitivo ainda não decidida pelo STF ou pelo STJ, conforme se trate de matéria constitucional ou infraconstitucional.
Perceba-se, porém, que há decisões unipessoais proferidas no exercício do juízo de admissibilidade de recursos excepcionais que não são impugnáveis por agravo interno. É o caso da decisão do Presidente ou Vice-presidente de tribunal que encaminha o processo ao órgão julgador para realização do juízo de retratação, quando o acórdão divergir do entendimento do STF ou do STJ exarado nos regimes de repercussão geral ou de recursos repetitivos (art. 1.030, II); que selecionar o recurso como representativo de controvérsia constitucional ou infraconstitucional (art.1.030, IV); que admitir o recurso excepcional e o remeter ao STF ou ao STJ (art. 1.030, V). Estas decisões são todas irrecorríveis (ressalvado, apenas, o cabimento de embargos de declaração, os quais, nos termos do art. 1.022 do CPC, podem ser opostos contra qualquer decisão judicial). De outro lado, da decisão que, com base no disposto no inciso V do art. 1.030, não admite o recurso especial ou extraordinário, cabe agravo em recurso especial ou extraordinário (art. 1.030, § 1º, combinado com o art. 1.042, ambos do CPC).
Não só no CPC, porém, encontra-se referência a decisões unipessoais impugnáveis por agravo interno mas que não terão sido proferidas pelo relator. É o caso, por exemplo, do disposto no art. 15 da Lei de Mandado de Segurança (Lei 12.016/2009), que expressamente atribui ao Presidente do tribunal competência para decidir sobre o pedido de suspensão de segurança, afirmando ser cabível a interposição de “agravo” contra essa decisão. Tal “agravo”, evidentemente, só pode ser o agravo interno. Disposição semelhante se encontra, e.g., no art. 4º, § 3º, da Lei 8.437/1992.
Não só decisões monocráticas do relator, portanto, são impugnáveis por agravo interno. Também outras decisões unipessoais proferidas nos tribunais, pelos Presidentes ou Vice-presidentes, podem ser impugnáveis por essa mesma espécie recursal.
3. Efeitos
O agravo interno é recurso cuja interposição produz efeito devolutivo, mas não produz efeito suspensivo.
Quanto ao efeito devolutivo, deve ser destacado que a interposição do agravo interno acarreta a transferência, para o órgão colegiado integrado pelo magistrado prolator da decisão monocrática agravada, do conhecimento da matéria impugnada. Em outros termos, o agravo interno permite que o órgão colegiado reveja, por inteiro, a decisão monocrática recorrida.
De outro lado, porém, está-se aí diante de recurso desprovido de efeito suspensivo. Como sabido, o art. 995 do CPC estabelece de forma expressa que “[o]s recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso”. Não havendo qualquer disposição legal que expressamente atribua efeito suspensivo ao agravo interno, então se está, aí, diante de recurso que, ao menos a princípio, não é dotado de efeito suspensivo.
Este efeito, por óbvio, pode ser atribuído por decisão judicial, como o próprio art. 995 deixa claro. É preciso, porém, que o recorrente postule a concessão do efeito suspensivo ao relator (art. 995, parágrafo único, do CPC), a quem caberá verificar se estão presentes os requisitos legais para tanto: perigo de que da imediata produção de efeitos da decisão agravada resulte risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação e probabilidade de provimento do recurso.
A decisão que atribui efeito suspensivo ao agravo interno é pronunciamento judicial concessivo de tutela de urgência de natureza cautelar, já que se trata de medida judicial “provisória” de urgência e que não satisfaz a pretensão deduzida perante o Judiciário.[6] Essa medida se limita a assegurar para os recorrentes a efetividade do futuro resultado, por eles almejado, do julgamento do recurso. Frise-se aqui, também, que a decisão que atribui efeito suspensivo ao agravo interno não pode ser proferida de ofício, dependendo, sempre, de requerimento do interessado.
4. Processamento
O agravo interno é interposto por petição dirigida ao próprio prolator da decisão recorrida. O § 2º do art. 1.021, é certo, diz que a petição deve ser dirigida ao relator, mas nos casos em que a decisão agravada tenha sido proferida por Presidente ou Vice-presidente de tribunal é a este que a petição deverá ser encaminhada.
Exige o art. 1.021, § 1º, que “[n]a petição de agravo interno, o recorrente impugn[e] especificadamente os fundamentos da decisão agravada”. Esta é exigência que, a rigor, se põe para todos os recursos. Não é por outra razão, aliás, que o art. 932, III, do CPC permite ao relator proferir decisão monocrática de não conhecimento de recurso que “não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida”. No caso do agravo interno, porém, isto é ainda mais importante. É que ao tempo do CPC de 1973 se desenvolveu uma praxe de, interposto recurso a que se negasse seguimento por decisão monocrática, a parte interpunha agravo interno que era mera reprodução de seu recurso anterior. Pois esta praxe não pode ser mantida à luz do vigente Código de Processo Civil. Exige a lei processual que o agravo interno impugne de modo específico os fundamentos da decisão monocrática agravada. Pense-se, por exemplo, no caso de ter o relator negado provimento a um recurso, por decisão unipessoal, ao fundamento de que o recurso é contrário o determinado precedente do STJ produzido no julgamento de recurso especial repetitivo. Pois nesta hipótese caberia ao agravante, na peça de interposição do recurso, demonstrar que aquele precedente não poderia ter sido aplicado, ou por ser caso de distinção ou por já estar ele superado. No caso de a petição de agravo interno ser mera reprodução dos fundamentos da petição que ensejou a decisão agravada deverá o tribunal considerar inadmissível o agravo interno, dele não conhecendo.
O prazo de interposição do agravo interno é de quinze dias (art. 1.003, § 5º do CPC).[7] Este prazo, evidentemente, é contado levando-se em conta apenas os dias úteis (art. 219 do CPC). E no ato da interposição do agravo interno deverá ser comprovado, se for o caso, o recolhimento do preparo (art. 1.007 do CPC), sendo aqui inteiramente aplicável o regime estabelecido pelos parágrafos deste último dispositivo legal.
Interposto o agravo interno, deverá ser aberta vista dos autos ao agravado, que terá o prazo de quinze dias (úteis, evidentemente) para se manifestar, conforme estabelece o art. 1.021, § 2º, do CPC. Findo o prazo, tenham ou não sido oferecidas contrarrazões, os autos deverão ir à conclusão, para que o relator (ou o Presidente ou Vice-Presidente do tribunal, conforme o caso) decida se mantém a decisão ou se se retrata. Caso seja mantida a decisão, o recurso será levado a julgamento, com inclusão em pauta (art. 1.021, § 2º, do CPC).
O julgamento do agravo interno se faz necessariamente pelo órgão colegiado integrado pelo magistrado prolator da decisão monocrática agravada. Não se admite, aqui, o julgamento monocrático pelo relator, nem mesmo nos casos previstos no art. 932, III a V, do CPC. É que se fosse possível este julgamento monocrático ter-se-ia o próprio magistrado prolator da decisão recorrida apreciando o recurso, o que tornaria inócuo o recurso.
Na sessão de julgamento, que deverá ser designada através da inclusão do recurso em pauta (art. 1.021, § 2º, do CPC), não será admissível sustentação oral, já que foi vetado o inciso VII do art. 937 (que previa a sustentação oral em agravo interno originário de apelação, recurso ordinário, recurso especial ou recurso extraordinário). É possível, porém, que o tribunal preveja em seu regimento interno algum caso de sustentação oral em agravo interno, assim como pode haver previsão neste sentido em outra lei (art. 937, IX). De todo modo, não se pode deixar de registrar que nos casos de agravo interno contra decisão de relator que extingue – com ou sem resolução de mérito – processo de ação rescisória, mandado de segurança ou reclamação, será admissível a sustentação oral das razões das partes, por força da expressa previsão do art. 937, § 3º, do CPC.
Após a oportunidade para a sustentação oral, serão proferidos os votos, iniciando-se pelo do relator. Este não pode, em seu voto, “limitar-se à reprodução dos fundamentos da decisão agravada para julgar improcedente o agravo interno”. Esta regra é, a rigor, diretamente relacionada com a exigência de que o agravante impugne de modo específico os fundamentos da decisão recorrida, não se limitando a reproduzir suas manifestações anteriores. Ora, se o agravante precisa apresentar um arrazoado específico para o agravo interno, não se limitando a reproduzir manifestações anteriores, também não pode ser admitido que o relator se limite a reproduzir a decisão agravada, sendo necessário que ele aprecie os argumentos especificamente apresentados pelo recorrente. Aliás, não fosse assim e o voto do relator não atenderia ao disposto no art. 489, § 1º, IV, do CPC.
Sendo o agravo interno declarado, por deliberação unânime, manifestamente inadmissível ou improcedente, deverá o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenar o agravante a pagar ao agravado multa a ser fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa (art. 1.021, § 4º, do CPC), multa esta cujo depósito é requisito de admissibilidade de qualquer outro recurso pela mesma parte (art. 1.021, § 5º, do CPC, que expressamente ressalva a Fazenda Pública e o beneficiário de gratuidade de justiça, que só têm de depositar o valor da multa no final do processo). Impende aqui ter claro que não é o mero fato de ser inadmissível ou improcedente o agravo interno que leva automaticamente à imposição dessa multa. Apenas no caso de ser o recurso manifestamente inadmissível ou manifestamente improcedente que a sanção deverá incidir. Pense-se, por exemplo, no caso de se ter interposto agravo interno contra um acórdão (fenômeno, aliás, bastante comum na prática). Trata-se, aí, de caso evidente de agravo interno manifestamente inadmissível, em que a multa deve ser aplicada.
Vale ressaltar aqui que existe decisão do Superior Tribunal de Justiça, proferida através da técnica de julgamento dos recursos especiais repetitivos (mas ainda ao tempo da vigência do CPC de 1973) em que se estabeleceu que não deve ser considerado manifestamente inadmissível ou improcedente o agravo interno interposto com o objetivo de exaurir as instâncias ordinárias e viabilizar o acesso às instâncias recursais excepcionais.[8] É preciso, porém, ter o cuidado de não se achar que basta ao agravante declarar formalmente na petição de interposição do recurso que o interpõe “com o objetivo de esgotar a instância ordinária” para que se tenha uma espécie de salvo-conduto capaz de impedir a imposição da multa. É preciso examinar o conteúdo do agravo interno para que se verifique se não há mesmo, ali, algum fundamento que justifique qualificar-se o recurso como manifestamente inadmissível ou manifestamente improcedente.
Importante ainda ter claro que a imposição da multa exige uma fundamentação específica, em que se deverão justificar os motivos pelos quais o órgão colegiado considera manifestamente inadmissível ou manifestamente improcedente o agravo interno, sob pena de nulidade deste capítulo do acórdão.
Caso seja provido o agravo interno, a decisão monocrática poderá ser anulada (quando o órgão colegiado considerar ter havido algum error in procedendo, como não estar fundamentada) ou reformada (quando houver error in iudicando, como no caso de se ter decidido com base em precedente vinculante não aplicável ao caso). Nesta última hipótese, a decisão colegiada substituirá a decisão monocrática recorrida, nos termos do disposto no art. 1.008 do CPC.
Referências:
CALAMANDREI, Piero. Introduzione allo studio sistematico dei provvedimenti cautelari. Opere giuridiche. Nápoles: Morano, 1983. Volume IX.
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2014. Volume 3.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
SILVA, Ovídio Baptista da. Do processo cautelar. Rio de Janeiro: Forense, 1996.
[1] Publicado no DJ de 20/2/2008.
[2] Publicado no DJ de 04/08/2014
[3] MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil [de 1973], p. 207.
[4] O CPC emprega tanto a expressão “decisão unipessoal” (arts. 1.024, § 2º e 1.070) como “decisão monocrática” (arts. 1.011, I e II, 1.024, § 2º e 1.026, § 1º).
[5] Há, porém, entendimento diverso, que pode ser encontrado em algumas decisões proferidas pelo TJRS, no sentido de não ser cabível agravo interno contra o pronunciamento unipessoal do relator que (i) não tenha conteúdo decisório; (ii) verse sobre os efeitos do recurso principal; (iii) envolva pedido de tutela provisória recursal quando a mesma já tenha sido examinada em primeira instância. Confira-se, por todas, a decisão proferida no julgamento do Agravo Interno n. 0193138-63.2016.8.21.7000, rel. Des. Irineu Mariani, DJ de 29/6/2016. Registre-se, aqui, que no primeiro daqueles casos (pronunciamento sem conteúdo decisório) realmente não cabe o agravo interno, mas por se tratar de mero despacho, irrecorrível na forma do art. 1.001 do CPC. Nos demais casos, porém, o agravo interno é admissível.
[6] Emprega-se aí o adjetivo provisória em razão da utilização, no texto normativo do CPC, da expressão tutela provisória como gênero que engloba a tutela de urgência satisfativa, a tutela de urgência cautelar e a tutela da evidência. Melhor seria, porém, considerar que a tutela cautelar não é propriamente provisória, mas temporária. Neste sentido, SILVA, Ovídio Baptista. Do processo cautelar, pp. 78-83. Sobre a distinção entre provisoriedade e temporariedade, consulte-se CALAMANDREI, Piero. Introduzione allo studio sistematico dei provvedimenti cautelari. Opere giuridiche, p. 168. Escrevi sobre o tema ainda ao tempo do CPC/1973: CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, pp. 27-30.
[7] O prazo para interposição do agravo interno será sempre de quinze dias, ainda que haja lei específica fixando outro prazo. É o que resulta do art. 1.070 do CPC, verbis: “[é] de 15 (quinze) dias o prazo para a interposição de qualquer agravo, previsto em lei ou em regimento interno de tribunal, contra decisão de relator ou outra decisão unipessoal proferida em tribunal”. Assim, por exemplo, é de quinze dias o prazo de interposição do agravo interno previsto no art. 15 da Lei do mandado de segurança (Lei 12.016/2009), ainda que o texto normativo ali fale em cinco dias. Registre-se, porém, que há decisão do STF (proferida no HC 134554, rel. Min. Celso de Mello), entendendo que em matéria processual penal continua a vigorar o prazo de cinco dias para o agravo interno previsto no art. 39 da Lei 8.038/1990 para os processos que tramitam perante STJ ou STF. Parece acertado o entendimento, que reputa haver prazo distinto para o agravo interno em matéria penal, interpretando o CPC de modo a considerar que ele só se aplica ao agravo interno que se interpõe em processos de natureza civil.
[8] STJ, REsp 1.198.108/RJ, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 17.10.2012.