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ACORDO DE SÓCIOS E ACIONISTAS

ACORDO DE SÓCIOS E ACIONISTAS

Rénan Kfuri Lopes

 

            O acordo de sócios e acionistas está previsto no art. 118 da Lei 6.404/76 e art. 1.053, parágrafo único do Código Civil.

            Este documento traz consigo regras próprias, internas e específicas que muitas vezes não podem ser tratadas no contrato social ou estatuto [estes últimos de natureza pública]; por versar questões privadas, particulares que exigem privacidade. O acordo tem plena eficácia/validade na sociedade e entre os sócios/acionistas vinculando quem o assinar.

            Interessante que previamente os sócios e acionistas, conversem e debatam as matérias a serem inclusas, sendo relevante a assistência por um advogado empresarial para formatar o documento e esclarecer o que está de acordo ou contra o contrato social/estatuto, evitando que não fuja da legalidade.

            Não raras vezes o acordo mantém a “sociedade saudável” num cenário de equilíbrio entre os sócios, mantendo o bem comum e a boa relação num contexto expressado pela maioria dos sócios, sobrepondo eventual ponderação individualista.

            O acordo de sócios na sociedade limitada, embora não tenha uma regulamentação específica no Código Civil, pode ser aplicado desde que no contrato social tenha uma cláusula especial no sentido que será utilizada supletivamente as normas da lei especial de regência da Sociedade Anônima, Lei n. 6.404 de 15.12.1976, conforme a dicção permissiva no parágrafo único do art. 1.053 do Código Civil.[1]

            O documento confeccionado de acordo de sócios/acionistas será arquivado na sede da empresa ou no escritório do advogado. A vantagem de se guardar internamente é que o concorrente não vai saber acerca das deliberações privadas definidas, que se de conhecimento de terceiros, podem de alguma forma, prejudicar os interesses da empresa.

            Exemplos práticos que aplicamos nos acordos de sociedade, sem exaurir as possibilidades:

–          determinar as atribuições, quem vai gerir/administrar, se um sócio ou acionista ou um terceiro portador de qualificação e conhecimento mais adequados para o negócio. Estabelece-se um prazo para a gestão e regras de quórum para destituição[2];

–          estabelecer um quórum especial geral ou específico, não inferior ao legal, para deliberar determinadas matérias, exemplos, venda de imóveis, distribuição de lucros[3] e cessão de carteiras;

–          estabelecer regras para aquisição de quotas ou ações dos sócios retirantes, dando preferência em igualdade a todos os sócios remanescentes. Concebe-se um prazo para o sócio interessado manifestar seu interesse. Ninguém se pronunciando, possibilita a venda para os sócios interessados ou para terceiros;

–          cláusula de tag along que confere segurança ao acionista minoritário na hipótese dos sócios majoritários alienarem o controle da empresa, o minoritário poderá obrigar que suas quotas/ações também sejam vendidas, por exemplo, pelo mesmo preço e em condições semelhantes às demais[4];

–          cláusula drag along determina que o quotista/acionista minoritário tem o dever de alienar suas ações, caso o majoritário decida vender sua parte. O procedimento permite que o majoritário não dependa de ninguém para alienar a empresa e ao mesmo tempo pode oferecer aos minoritários a garantia que terão a venda feita no mesmo procedimento, por valores e condições equivalentes, que deverão ser minimamente definidas em contrato[5].

            Para dar maior equilíbrio sugere-se que nos acordos estejam presentes concomitantemente as cláusulas de tag along e de drag along;

–          cláusula de lock up, um determinado sócio ou acionista de importância para a empresa, como um fundador ou que tenha relevância para os negócios, não poderá vender suas quotas ou ações para um terceiro por certo período de tempo; terá de obedecer às restrições previstas no acordo[6];

–          cláusula de standstill period que busca, em regra, impedir que os sócios/fundadores diminuam suas quotas em percentual muito pequeno, o que influenciará diretamente na responsabilidade e nos riscos que esses sócios possuem junto ao negócio;

–          cláusula de confidencialidade é uma restrição incluída que determina a proibição dos partícipes revelar informações que só elas terão acesso, mantendo o sigilo, sob pena de reparação civil[7];

–          estabelecer que em caso de venda das quotas/ações seja feita uma prévia  avaliação por um profissional especializado, como forma de transmitir segurança aos sócios quanto à realidade do valor de mercado;

–          em caso de sucessão ou incapacidade de sócio, seguirá a regra legal ou indique alguém para assumir o lugar; criação de um caixa ou contratar um seguro para dar suporte ao pagamento dos haveres para os herdeiros ou curador do interditado;

–          prever que só os sócios/acionistas com competência especializada no nicho de atividade/objeto social poderão trabalhar para a sociedade, com direito a receber pró-labore;

–          o sócio retirante poderá ou não prestar serviços à concorrente; e em caso negativo por qual prazo/anos estará impedido[8]; regular um prazo para o pagamento das quotas ou ações de forma a não impactar as finanças da sociedade[9];

–          inserir cláusula de dissolução de controvérsias que se dará através de procedimentos extrajudiciais de mediação ou arbitramento especializados[10].

 

[1] CC, Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima.

[2] É importante estabelecer as obrigações que cada sócio terá de cumprir, facilitando identificar até que ponto as pessoas estão interessadas no resultado do negócio.

[3] Criar critérios para a distribuição pelo número de quotas ou em especial para determinado sócio; optar por estabelecer determinado percentual como reserva no caixa.

[4] Trazendo para um caso prático, podemos pensar em um acionista que possui 20% de uma empresa. Na hipótese dos detentores de 80% das ações venderem o controle para uma multinacional e o acionista minoritário não desejar permanecer do negócio, ele poderá forçar que a multinacional compre seus 20% pelo mesmo valor e nos mesmos termos que comprou os demais 80%. Caso os acionistas minoritários desejem permanecer com suas ações, concordem com o novo controle ou recebam propostas melhores, eles não precisarão exercer seu direito.

[5] Para exemplificar, suponhamos que uma empresa tenha recebido aporte de um investidor em troca de 10% das ações, mas manteve seu sócio fundador no controle do negócio. Posteriormente, o acionista majoritário e administrador da companhia recebeu uma oferta extremamente vantajosa para vendê-la para uma grande empresa, que deseja ter a totalidade das ações. Nesse caso, a cláusula de drag along impede que a negociação não aconteça ou tenha entraves em função do investidor minoritário. Ele necessariamente terá que vender seus 10%.

[6] Pode-se criar uma meta como condição a ser atingida para a retirada.

[7] De forma direta, em tese, aquele que tem 5% de uma empresa tem menor preocupação com o sucesso do empreendimento que aquele com 30%, por exemplo.

[8] Justifica-se, pois se é qualificado e tem informações privilegiadas da operacionalidade e dos contratantes, evidente que se transmitidos ao concorrente trará prejuízos à sociedade.

[9]  Estabelecer uma carência para o pagamento das quotas ou ações de forma justa, sem, contudo, descapitalizar a empresa.

[10] Viável para fugir da morosidade e muitas das vezes defronte a falta de especialidade do Poder Judiciário.