AÇÃO REVOCATÓRIA NA LEI DE FALÊNCIAS
Henrique Coutinho Miranda Santos
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem o objetivo de estudar a ação revocatória à luz da Lei de Falências.
A ação revocatória funda-se no direito dos credores de revogarem ou anularem os atos praticados por seus devedores em prejuízo de seu crédito. Em outras palavras, o credor pode atacar os atos fraudulentos do devedor, ou seja, aqueles que colocam em risco o crédito daquele, por meio da ação revocatória.
HISTÓRIA
Remonta (a revocatória) ao direito romano, o qual, com a ação pauliana e o interdito restitutório, fornecia a possibilidade de recuperação dos bens saídos do patrimônio do devedor, quando não houvesse outras atividades perseguíveis ou suficientes para a satisfação do credor, quando na alienação o devedor tivesse tido a intenção de prejudicar os credores e o outro contraente tivesse tido consciência de tal intenção, consciência que para a impugnação dos atos a título gratuito sequer era requerida.
Na visão de Yussef Said Cahali, a ação pauliana do direito civil romano é preexistente à ação revocatória falimentar, tendo esta última inspiração naquela, embora tenha se especializado para o ramo do direito comercial. É por isso que ele afirma que a ação revocatória não é instituto autógeno, pois não teria surgido originalmente no âmbito comercial, mas sim se especializado a partir da ação pauliana do direito civil.
No direito medieval, a revocatória assume natureza de remédio complementar na execução coletiva.
FRAUDE CONTRA CREDORES NO DIREITO CIVIL E NO DIREITO FALIMENTAR
Ricardo José Negrão Nogueira fixa os pontos distintivos de uma e outra ação, sem perder de vista a derivação da revocatória na pauliana, o que para nós apresenta-se como uma síntese:
A derivação da segunda ação, hoje prevista no art. 130 da nova Lei Falimentar, às regras do direito civil não se fez sem alterações, podendo ser relacionadas, entre outras, as seguintes distinções:
(a) a legitimidade ativa é reconhecida a todos os credores, de forma indistinta (LF, art. 132), não se discriminado credores quirografários e portadores de garantias insuficientes dos demais (CC, art. 158 e § 1º), tampouco os anteriores e posteriores ao ato fraudulento (CC, art. 158, § 2º);
(b) a legitimidade passiva na Lei Falimentar (art. 133) é mais ampla que do Código Civil (art. 161);
(c) no instituto civil, o adquirente pode depositar o preço, permanecendo com o bem adquirido (art. 160), hipótese não contemplada pelo legislador falimentar que, contudo, oferece outras soluções para a resolução de contratos bilaterais (art. 117) e permite ao terceiro de boa-fé a restituição dos bens ou valores entregues ao devedor (art. 136);
(d) o fundamento da ação civil é a prática de atos prejudiciais (eventus damni) ao credor, como, por exemplo os realizados em estado de insolvência ou que levem o devedor à insolvência (CC, art. 158) e o da ação falimentar é a prática de atos com a intenção de prejudicar credores (consilium fraudis) e o efetivo prejuízo sofrido pela massa falida (art. 130).
ETIMOLOGIA
A palavra revocatória deriva do verbo revocar, significando chamar para trás, chamar novamente, mandar voltar. A ação tem o objetivo de tirar os efeitos de determinados atos praticados pelo devedor, tornando-os ineficazes em relação à massa falida ou invalidando-os.
A Lei 11.101/2005 regula a ação revocatória por ineficácia de ato no seu art. 129 e a ação revocatória por revogação de ato no seu art. 130.
Falando-se em ação revocatória, é requisito indispensável à existência de falência decretada. Se a sentença que decretou a falência estiver com seus efeitos suspensos, por decisão do segundo grau de jurisdição, o ajuizamento da ação revocatória está impedido. É por isso que a sentença que decreta a falência é tida como “condição de procedibilidade” (expressão do italiano Renzo Provincialli) para a ação revocatória.
DA INEFICÁCIA E DA REVOGAÇÃO DE ATOS PRATICADOS ANTES DA FALÊNCIA
O legislador contemplou nesta seção duas situações: 1. A ineficácia, que diz respeito aos efeitos do ato; 2. A revogação, que diz respeito à validade do ato
Eficácia é a capacidade de um ato produzir resultados na esfera jurídica das pessoas. O ato ineficaz não é nulo, pois pode vincular os agentes e ser válido perante estes; será, porém, ineficaz em relação a terceiros.
Os atos ineficazes seriam aqueles listados no art. 129 da Lei de Falências (Lei 11.101); por isso, os bens envolvidos podem ter seu retorno à massa falida determinado por decisão interlocutória, prolatada até de ofício. Já os atos nulos seriam aqueles previstos no art. 130, ou seja, atos praticados com fraude e que sempre exigiriam o ajuizamento de ação revocatória.
Para Manoel Justino Bezerra Filho, na realidade, o art. 129 contempla os casos de ineficácia objetiva (independe de fraude), enquanto que o art. 130 se refere aos casos de ineficácia subjetiva (há necessidade de prova da fraude).
Art. 129. São ineficazes em relação à massa falida, tenha ou não o contratante conhecimento do estado de crise econômico-financeira do devedor, seja ou não intenção deste fraudar credores.
A sentença que decreta a falência produzirá efeitos pretéritos, ex tunc, retroativos, alcançando atos realizados antes da quebra. Por meio dela, se reconhece que o devedor não se tornou insolvente no momento da decisão. Ao contrário, há o reconhecimento de que a insolvência é um processo gradual, anterior à sua discussão judiciária.
O art. 129 prevê que os atos listados em seus incisos são ineficazes em relação à massa, ou seja, são ineficazes tenha ou não o contraente conhecimento do estado de crise econômico-financeira do devedor; seja ou não intenção deste fraudar credores. A ineficácia pode ser declarada de ofício pelo juiz, alegada em defesa ou pleiteada mediante ação própria ou incidentalmente no curso do processo.
Com a falência, deverá o juiz fixar o termo legal (art. 99, II da Lei 11.101/05), onde definirá um lapso temporal, tradicionalmente chamado de período suspeito, quando determinados atos do falido (que àquela época já demonstrava sinais de insolvência) são tidos como ineficazes perante a massa. Tais atos são os elencados no art. 129 da Lei de Falências. O termo legal poderá retroagir por no máximo noventa dias, segundo o que dispõe a lei, contados do pedido de falência, do pedido de recuperação judicial ou do primeiro protesto por falta de pagamento. O termo legal da falência, fixado pelo juiz na sentença declaratória ou por decisão interlocutória posterior, tem utilidade na definição da ineficácia de alguns atos praticados pela falida.
Por força do art. 129, o período que media o termo legal da falência e a sentença declaratória da quebra não deve ser compreendido como mero período suspeito, mas como período de insolvência presumida, entendendo o legislador que certos atos jurídicos, então realizados, são objetivamente ineficazes em relação à massa falida, ou seja, que também as pessoas envolvidas deverão participar do concurso de credores como resultado da declaração de ineficácia. A declaração da ineficácia não exige comprovação de fraude, decorrendo simplesmente da realização do negócio durante o termo legal.
Os atos da sociedade falida considerados ineficazes pela Lei de Falências não produzem qualquer efeito jurídico perante a massa. Não são atos nulos ou anuláveis, ressalte-se, mas ineficazes. Quer dizer, sua validade não se compromete pela lei falimentar. Não se trata de nulidade, mas apenas de ineficácia em relação à massa falida. Não se questiona a validade ou não do ato jurídico, nem sua licitude ou ilicitude. Apenas se retira o seu efeito perante a massa falida, que, assim, tem direito à restituição da prestação que foi realizada pelo empresário ou sociedade empresária cuja falência fora posteriormente decretada. A parte beneficiada dos atos listados nos incisos do art. 129 assume a mesma condição dos credores, visto o crédito que se constitui em face do falido.
Mas, é preciso se fazer uma ressalva. Como dito, o ato ineficaz independe de ser praticado com boa ou má-fé, ou seja, com ou sem intuito de fraudar credores. Os arts. 86 e 136 da Lei de Falências resguardam os contratantes de boa-fé, que terão direito à restituição dos bens ou valores entregues ao devedor.
Por isso, os atos referidos pela Lei de Falências como ineficazes diante da massa falida produzem, amplamente, todos os efeitos para os quais estavam preordenados em relação aos demais sujeitos de direito.
Os atos descritos nos incisos do art. 129 são ineficazes, porque prejudiciais aos credores da falida pela diminuição do ativo. As hipóteses são taxativas e o objetivo é tutelar o crédito dos credores reunidos em concurso na falência, evitando que a devedora falida favoreça um ou outro credor, segundo sua conveniência.
Art. 129: I – o pagamento de dívidas não vencidas realizado pelo devedor dentro do termo legal, por qualquer meio extintivo do direito de crédito, ainda que pelo desconto do próprio título;
O pagamento de dívidas não vencidas realizado pelo devedor dentro do termo legal, por qualquer meio extintivo do direito de crédito, ainda que pelo desconto do próprio título, é ineficaz perante a massa falida.
O que fulmina a eficácia do ato perante a massa falida é a circunstância de não ter a obrigação, à época do pagamento, o atributo da exigibilidade. Se não era exigível a dívida, e, ainda assim, a sociedade devedora pagou, então é necessário desconstituir os efeitos do ato e repetir à massa o montante pago, para que os recursos correspondentes possam atender ao objetivo do processo falimentar de tratamento paritário dos credores.
Art. 129: II – o pagamento de dívidas vencidas e exigíveis realizado dentro do termo legal, por qualquer forma que não seja a prevista pelo contrato;
Aqui, trata-se de dívida já vencida e exigível, cujo pagamento é feito por outra forma, que não a prevista no contrato. Exemplo: o devedor entrega bens em dação em pagamento de notas promissórias. A lei prevê a ineficácia do ato, de tal forma que o beneficiado pelo ato do devedor falido deverá repor à massa a coisa ou o valor recebido de forma diferente da prevista no contrato.
O pagamento de uma dívida por outro meio que não o contratualmente previsto foi tido pelo legislador como uma forma de o devedor privilegiar um determinado credor, em detrimento dos demais, por não lhe restar outra forma de satisfazer a obrigação como originalmente avençado. Por isso, o legislador impõe a ineficácia em relação à massa, para que o valor pago, ou o bem oferecido em dação em pagamento, retorne ao acervo da falida em benefício de todos os credores.
O ato ineficaz é o pagamento de dívida vencida por forma diversa da contratada. Se, no termo legal, vence uma duplicata, e a sociedade devedora quita-a mediante dação em pagamento, transferindo ao credor bens de seu ativo imobilizado, ela não cumpriu a obrigação vencida como houvera pactuado. Esse pagamento frustra o tratamento paritário, na medida em que os bens da sociedade empresária devedora representam a garantia de todos os credores, atendidas as preferências legais. Se esses bens são apartados do patrimônio social para satisfazer um único credor, compromete-se o objetivo do concurso falimentar. Jurisprudência:
“APELAÇÃO. FALÊNCIA. INEFICÁCIA. DAÇÃO EM PAGAMENTO DE IMÓVEL PARA QUITAÇÃO DE TÍTULO DE CRÉDITO (CHEQUES) FEITA NO TERMO LEGAL PELA SOCIEDADE DEVEDORA. INTELIGÊNCIA DO ART. 129, II, DA LEI Nº 11.101/2005. O SUBADQUIRENTE, MESMO DE BOA-FÉ, É ATINGIDO PELA DECLARAÇÃO DE INEFICÁCIA, QUE PODE SER REALIZADA “EX OFFICIO” PELO JUIZ. A INEFICÁCIA PODE SER DECLARADA MESMO QUE O ATO IMPUGNADO, ULTERIORMENTE, TENHA SIDO OBJETO DE SENTENÇA DE ADJUDICAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO, ACARRETANDO RESCISÃO DA SENTENÇA. O CONTRATANTE DE BOA-FÉ TERÁ DIREITO À RESTITUIÇÃO DOS BENS OU VALORES ENTREGUES AO DEVEDOR. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. APELO IMPROVIDO.” (TJSP – AC Nº 9104745-97.2008.8.26.0000 – RELATOR: PEREIRA CALÇAS – J. 22.11.11).
Art. 129: III – a constituição de direito real de garantia, inclusive a retenção, dentro do termo legal, tratando-se de dívida contraída anteriormente; se os bens dados em hipoteca forem objeto de outras posteriores, a massa falida receberá a parte que devia caber ao credor da hipoteca revogada;
Haverá de ser declarada ineficaz em relação à massa falida a constituição de direito real de garantia dentro do tempo legal, tratando-se de dívida contraída anteriormente.
O dispositivo também fala em direito de retenção, que não é direito real. Consiste o direito de retenção num meio de defesa outorgado ao credor, a quem é reconhecida a faculdade de continuar a deter a coisa alheia, mantendo-a em seu poder até ser indenizado pelo crédito.
Se houvesse a concessão de um direito de retenção, não teria qualquer validade perante a massa, certo que a decretação da falência suspende o exercício do direito de retenção sobre os bens sujeitos à arrecadação, os quais deverão ser entregues ao administrador judicial.
Com a constituição de garantia real para crédito que não a tinha, o credor aufere uma vantagem imediata: seu crédito passará ocupar local privilegiado no concurso de credores. Tal concessão fere a paridade entre credores e, por isso, será declarada ineficaz.
O direito real de garantia conferido em momento posterior significaria a intenção do devedor de favorecer um determinado credor, pois, de acordo com o art. 1.419 do Código Civil: “Nas dívidas garantidas por penhor, anticrese ou hipoteca, o bem dado em garantia fica sujeito, por vínculo real, ao cumprimento da obrigação”.
A lei quer coibir é a atribuição a credor quirografário de garantia que o promove a classe preferencial na ordem de classificação dos credores. O objetivo do concurso é possibilitar o tratamento paritário, que significa tratar igualmente os sujeitos de direito titulares de créditos de igual natureza. Se a concessão da garantia real é posterior à constituição da obrigação, frustra-se esse objetivo, já que um dos credores quirografários terá tratamento preferencial. Assim, impõe-se corrigir a distorção, subtraindo-se a eficácia dessa subversão das preferências.
A segunda parte do dispositivo prescreve que “se os bens dados em hipoteca forem objeto de outras posteriores, a massa falida receberá a parte que devia caber ao credor da hipoteca revogada”. Um imóvel pode ser objeto de mais de uma hipoteca, como ensina o art. 1.496 do Código Civil. A massa receberá primeiramente o valor correspondente à hipoteca ineficaz, e, subsequentemente, caso remanesça alguma sobra, esta caberá aos credores das hipotecas eficazes. Aplica-se à hipótese de dívida contraída durante o termo legal e garantida por hipoteca.
Exemplo: o empresário/falido contraiu uma dívida de 50 mil reais antes do termo legal e constituiu hipoteca em favor do credor dentro do período suspeito. Ulteriormente, dentro do mesmo período, o falido contraiu outra obrigação, valendo 30 mil reais, e a garantiu por meio de hipoteca. O imóvel foi alienado em leilão na fase de liquidação por 70 mil reais. Com a declaração de ineficácia da primeira hipoteca, a massa recolherá a importância de 50 mil reais, que caberia ao primeiro credor hipotecário. O saldo, 20 mil reais, irá para o segundo credor hipotecário, que ainda terá direito a receber 10 mil reais. Jurisprudência:
“FALÊNCIA – REVOCATÓRIA PENHOR CONSTITUÍDO NO PERÍODO SUSPEITO PARA GARANTIA DE DÍVIDA PREEXISTENTE INEFICÁCIA DO ATO RECONHECIDA ART. 129, III, DA LEI Nº 11.101/2005 VALOR A RESTITUIR EQUIVALENTE AO APURADO EM LAUDO DE VISTORIA EXISTENTE NOS AUTOS ARBITRAMENTO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDO RECURSO PROVIDO EM PARTE.” (TJSP – AC. Nº 0290064-63.2009.8.26.0000 – RELATOR ELLIOT AKEL – j. 26.07.11)
Art. 129: IV – a prática de atos a título gratuito, desde 2 (dois) anos antes da decretação da falência;
Na falência, o patrimônio do devedor é a garantia geral dos credores. Dessa maneira, para tutela dos direitos creditórios, torna-se ineficaz em relação à massa a prática de atos a título gratuito, desde dois anos antes da decretação da falência, por força do inc. IV, do art. 129, da Lei 11.101/2005. São atos gratuitos a doação, o comodato, o usufruto etc. Atos a título gratuito são os que importam transferência de direitos patrimoniais sem a respectiva contraprestação ao alienante.
Art. 129: V – a renúncia à herança ou a legado, até 2 (dois) anos antes da decretação da falência;
A renúncia à herança que decorre de sucessão, ou legado que existe em função de testamento, participa da noção de ato gratuito, implica em diminuição do ativo da devedora, em consequência, transgride o princípio segundo o qual o patrimônio desta constitui a garantia de seus credores.
O administrador judicial ou os demais legitimados para a ação revocatória pode intervir no processo de inventário, como se tal renúncia não houvesse ocorrido, e requerer o que for a bem da defesa da massa falida.
Art. 129: VI – a venda ou transferência de estabelecimento feita sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo existentes, não tendo restado ao devedor bens suficientes para solver o seu passivo, salvo se, no prazo de 30 (trinta dias), não houver oposição dos credores, após serem devidamente notificados, judicialmente ou pelo oficial do registro de títulos e documentos;
O estabelecimento, complexo organizado dos bens para o exercício da atividade empresarial, é a base patrimonial da empresa, podendo ser objeto unitário de direitos e negócios jurídicos, translativos ou constitutivos, que sejam compatíveis com sua natureza, entre os quais a transferência, ou trespasse. O contrato que tenha por objeto a alienação do estabelecimento só produz efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial; contudo, se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em 30 dias, a partir de sua notificação (art. 1.145 do CC). O art. 129, VI da Lei de Falências prevê ser ineficaz em relação à massa a venda ou a transferência de estabelecimento feitas sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo existentes, não tendo restado bens suficientes para solver o passivo, salvo se, no prazo de 30 dias, não houver oposição dos credores, após serem devidamente notificados, judicialmente ou pelo oficial do registro de títulos e documentos.
Aqui, independe de ter o ato ocorrido dentro ou fora do termo legal.
Sustenta a doutrina majoritária que, mesmo que não haja trespasse do estabelecimento, mas ocorra alienação de bens relevantes para o exercício da atividade empresarial, diminuindo significativamente o aviamento do estabelecimento, pode-se aplicar o inciso em estudo, como suporte da decretação de ineficácia. Jurisprudência:
“FALÊNCIA. DETERMINAÇÃO, PELO JUÍZO UNIVERSAL, DO CANCELAMENTO DOS REGISTROS DECORRENTES DA VENDA DE BENS DE SÓCIOS EFETUADAS DENTRO DO TERMO LEGAL. ART. 52, III, DO DECRETO-LEI 7.661/45. INEFICÁCIA E NULIDADE QUE PODEM SER RECONHECIDAS DE OFÍCIO PELO JUIZ. AGRAVO DE INSTRUMENTO, MANIFESTADO CONTRA DECISÃO QUE ISTO DETERMINA, DESPROVIDO.” (TJSP – AI Nº 0153688-65.2012.8.26.0000; RELATOR CESAR CIAMPOLINI – J. 02.07.13).
“TODA VENDA DE IMÓVEL, QUE INUTILIZE O ESTABELECIMENTO E DESEQUILIBRE O PATRIMÔNIO DO DEVEDOR, TORNANDO-O INSOLVENTE, ‘A FORTIORI’ CAI SOB O VETO LEGAL, A CUJO TRANSVIO SE LIGA, COMO CONSEQUÊNCIA, A INEFICÁCIA RELATIVA DO ATO, PERANTE OS CREDORES E A FUNÇÃO EXECUTÓRIA FALIMENTAR.” (TJSP – AC Nº 84.479-1; RELATOR CÉSAR PELUSO – J. 11.04.89).
Art. 129: VII – os registros de direitos reais e de transferência de propriedade entre vivos, por título oneroso ou gratuito, ou a averbação relativa a imóveis realizados após a decretação da falência, salvo se tiver havido prenotação anterior.
Em relação aos registros e averbações imobiliárias realizadas após a decretação da falência, o art. 129 os qualifica de ineficazes, salvo a existência de prenotação anterior.
Tal dispositivo deve ser examinado à luz da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015), mais especificamente quanto ao art. 215, o qual diz: “São nulos os registros efetuados após sentença de abertura da falência, ou do termo legal nele fixado, salvo se a apresentação tiver sido feita anteriormente”.
Prevalece a lei especial para falências, de acordo com decisão do Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial 241.319/RJ (j. 06.06.2002) 157. Na ocasião, o Superior Tribunal de Justiça afiançou que a Lei de Registros Públicos (do ano de 1973) não revogou o Decreto-Lei 7.661/1945, cujo art. 52, VII era semelhante ao atual art. 129, VII, da Lei 11.101/1945. No julgado, consignou-se que o ato de registro dentro do termo legal, mas antes da sentença decretatória de falência, é eficaz.
Art. 129: Parágrafo único. A ineficácia poderá ser declarada de ofício pelo juiz, alegada em defesa ou pleiteada mediante ação própria ou incidentalmente no curso do processo.
Tratando-se de ineficácia prevista nos incisos do art. 129, poderá ela ser declarada de ofício pelo juiz. Tal decisão é recorrível por meio de agravo. A ineficácia também pode ser alegada em defesa (exemplo: a massa falida afirma a ineficácia do negócio para se defender de pedido de restituição), ou levantada como matéria incidental no processo.
O parágrafo único ainda fala de “ação própria”, que é a ação revocatória.
ATOS PREVISTOS NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Art. 131. Nenhum dos atos referidos nos incisos I a III e VI do art. 129 desta Lei que tenham sido previstos e realizados na forma definida no plano de recuperação judicial será declarado ineficaz ou revogado.
O art. 131 veda a declaração de ineficácia dos atos previstos nos incisos I, II, III e VI do art. 129, se os mesmos foram previstos e realizados na forma definida no plano de recuperação judicial. Relembrando:
Art. 129:
I – o pagamento de dívidas não vencidas realizado pelo devedor dentro do termo legal, por qualquer meio extintivo do direito de crédito, ainda que pelo desconto do próprio título;
II – o pagamento de dívidas vencidas e exigíveis realizado dentro do termo legal, por qualquer forma que não seja a prevista pelo contrato;
III – a constituição de direito real de garantia, inclusive a retenção, dentro do termo legal, tratando-se de dívida contraída anteriormente; se os bens dados em hipoteca forem objeto de outras posteriores, a massa falida receberá a parte que devia caber ao credor da hipoteca revogada;
VI – a venda ou transferência de estabelecimento feita sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo existentes, não tendo restado ao devedor bens suficientes para solver o seu passivo, salvo se, no prazo de 30 (trinta) dias, não houver oposição dos credores, após serem devidamente notificados, judicialmente ou pelo oficial do registro de títulos e documentos;
O ato não será declarado ineficaz nessas situações. Trata-se de exceção à regra do art. 129.
O artigo traz uma hipótese em que a falência foi decretada após a homologação do plano de recuperação judicial; portanto, se o falido realizou os atos previstos nos incisos supracitados a fim de cumprir o definido no plano de recuperação, sobrevindo, porém, falência, não poderá, em tese, ser o ato declarado ineficaz ou revogado, visto a permissão judicial de que dispunha o falido.
Mesmo que o ato esteja previsto no plano de recuperação judicial, caso ele seja praticado e, posteriormente, haja convolação da recuperação judicial em falência, constatando-se que o ato foi praticado com intenção de prejudicar credores e em virtude de conluio fraudulento entre o devedor e o terceiro, o ato poderá ser revogado na via da ação revocatória.
AÇÃO REVOCATÓRIA POR FRAUDE
Art. 130. São revogáveis os atos praticados com a intenção de prejudicar credores, provando-se o conluio fraudulento entre o devedor e o terceiro que com ele contratar e o efetivo prejuízo sofrido pela massa falida.
Ineficácia vs. Revogabilidade
O legislador optou por qualificar como ineficazes algumas situações em que a investigação sobre a fraude é irrelevante, pois ela é presumida juris et de jure (art. 129), e como revogáveis outras situações em que a prova da fraude é essencial (art. 130).
Relevância da intenção de fraudar credores prova do conluio
Pela simples leitura do artigo acima mencionado fica evidente que é indispensável a comprovação do elemento subjetivo consistente no conluio fraudulento entre o devedor e o terceiro que com ele contratar.
Ricardo José Negrão Nogueira afirma que a matéria não encontra solução única na doutrina: “Há os que entendam que basta o simples conhecimento de que o ato causa ou possa causar prejuízo aos demais credores”. É a posição de Pontes de Miranda.
Em outra linha encontram-se aqueles que entendam haver distinção entre as condutas do devedor falido e do terceiro que com ele contratar, exigindo do primeiro a intenção de prejudicar, e do segundo ciência dessa vontade. É a posição de Rubens Requião.
Já o Professor Carlos Roberto Claro sustenta: “(…) no que se refere ao terceiro contratante, basta tenha ele conhecimento do estado de insolvência do devedor”. Não carece o efetivo conluio fraudulento entre o devedor e o terceiro, bastando à ciência deste quanto ao estado de insolvência daquele. É a posição de Mario Sérgio Milani.
Manuel Justino Bezerra Filho nos adverte que “tanto o devedor quanto o terceiro devem ter agido com fraude ao praticar o ato, do que se verifica que, se o terceiro não agiu fraudulentamente, o negócio não pode ser objeto de revocatória, permanecendo válido e eficaz”.
Meios de prova da fraude
Os meios de prova da fraude são: confissão, documento, testemunhas, presunção, pericia, bem como todos os demais moralmente legítimos (art. 212 do CC e art. 332 do CPC).
Vejamos as lições de Manuel Justino Bezerra Filho “No caso, a prova de fraude é indispensável e, no campo da prova, todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos são hábeis, na forma do estipula o art. 332 do CPC. Sempre é necessário lembrar que, para os participantes do conflito, devem ser oferecidas garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório, indispensáveis para que se possa encontrar na sentença o resultado justo.”
Efetivo prejuízo à massa falida
O efetivo prejuízo a massa falida passou a ser requisito para a obtenção da procedência da ação revocatória, diferentemente do que ocorria no regime anterior, cujo art. 53 não previa tal requisito. Por isso conclui-se que se trata de inovação da lei sob comento. Jurisprudência.
“APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO – AÇÃO REVOCATÓRIA – ARREMATAÇÃO JUDICIAL DE BENS QUE INTEGRAVAM O PATRIMÔNIO DA MASSA FALIDA, ANTERIORMENTE À DECRETAÇÃO DA QUEBRA, POR EMPRESA CONSTITUÍDA, VIA OFFSHORE COMPANY SITUADA NO URUGUAI, VINCULADA AOS SÓCIOS DAQUELA – CONSILIUM FRAUDIS EVIDENCIADO, COM FLAGRANTE PREJUÍZO AOS CREDORES – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA – VALOR ARBITRADO A TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS QUE SE REVELA INSUFICIENTE – RECURSO PROVIDO E REMESSA DESPROVIDA. “SÃO REVOGÁVEIS OS ATOS PRATICADOS COM A INTENÇÃO DE PREJUDICAR CREDORES, PROVANDO-SE O CONLUIO FRAUDULENTO ENTRE O DEVEDOR E O TERCEIRO QUE COM ELE CONTRATAR E O EFETIVO PREJUÍZO SOFRIDO PELA MASSA FALIDA”, “AINDA QUE PRATICADO COM BASE EM DECISÃO JUDICIAL” (ARTIGOS 130 E 138 DA LEI N. 11.101/2005). “[…] É IRRELEVANTE A ÉPOCA EM QUE FOI PRATICADO, PRÓXIMA OU DISTANTE DA DECRETAÇÃO DA FALÊNCIA” (COELHO, FÁBIO ULHOA. COMENTÁRIOS À LEI DE FALENCIAS E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS. ED. 8. SÃO PAULO: SARAIVA, 2011, P. 470). O ARBITRAMENTO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NAS CAUSAS DESPROVIDAS DE CUNHO CONDENATÓRIO, COMO A AÇÃO REVOCATÓRIA SOB ANÁLISE, DE NATUREZA DECLARATÓRIA/CONSTITUTIVA, DEVE OBSERVAR O DISPOSTO NO ART. 20, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.” (TJ-SC – AC: 20120861326 SC 2012.086132-6 – RELATOR: CID GOULART, J: 22.07.2013).
LEGITIMIDADE E PRAZO PARA AJUIZAMENTO DA AÇÃO REVOCATÓRIA
Art. 132. A ação revocatória, de que trata o art. 130 desta Lei, deverá ser proposta pelo administrador judicial, por qualquer credor ou pelo Ministério Público no prazo de 3 (três) anos contado da decretação da falência.
Pela leitura do referido artigo percebe-se que a legitimidade para propositura da ação revocatória é concorrente entre o administrador judicial, ministério público ou qualquer credor.
Questão importante que deve ser analisada é se o administrador judicial pode ser responsabilizado no caso de decadência do direito de propor a ação revocatória. Segundo as lições de Mario Sérgio Milani “O administrador judicial não poderá ser responsabilizado no caso de decadência do direito de propor a ação revocatória, tendo em vista que a legitimação ativa é concorrente entre ele e qualquer credor e o ministério público”.
Recomendação aos juízes
Ricardo Tapendino recomenda aos juízes: “a fim de evitar conluios entre falido e um credor, ou entre estes, é aconselhável que o juiz, ao despachar a inicial mande intimar o administrador judicial, para que este querendo intervenha. A sugestão, que pode desgostar os mais formalistas, reveste-se de cunho prático e salutar, e em nada agride a lei”.
Prazo para propositura da ação revocatória
O prazo é de três anos contado da decretação da falência.
Natureza jurídica do prazo
O prazo de três anos para ajuizamento da ação revocatória é decadência por isso não sofre interrupção.
A LEGITIMIDADE PASSIVA NA AÇÃO REVOCATÓRIA
Art. 133. A ação revocatória pode ser promovida:
I – contra todos os que figuram no ato ou que por efeito dele foram pagos, garantidos ou beneficiados;
II – contra os terceiros adquirentes, se tiverem conhecimento, ao se criar o direito, da intenção do devedor de prejudicar os credores
III – contra os herdeiros ou legatários das pessoas indicadas nos incisos I e II do caput deste artigo.
Questão de suma importância para o estudo do instrumento processual em análise é identificar aquelas pessoas que podem figurar no polo passivo da relação jurídica, ou seja, contra quem irá se pleitear a revogação dos atos celebrados durante o termo legal (art. 99 da lei 11.101/05), nas demais situações presentes no art. 129 da mesma lei, como também em qualquer outro ato indicativo de fraude contra credores.
Lembrando que o termo legal é aquele período de tempo determinado pelo juiz no momento da decretação da falência, cuja retrotração não pode ultrapassar 90 dias contados a partir do pedido da falência, do pedido de recuperação ou do primeiro protesto por falta de pagamento, em que todos os negócios jurídicos firmados pelo falido serão considerados suspeitos e poderão ser contestados pelos credores e revogados se for constatado que houve algum tipo de fraude.
A partir da leitura do dispositivo legal supratranscrito fica esclarecido que há necessidade de provar a fraude do terceiro adquirente (terceiro em relação à massa e à empresa falida). Se o terceiro adquirente não agiu com má-fé (não sabia da fraude), a ação revocatória, se promovida, será julgada improcedente, sendo necessário sempre tutelar o direito do terceiro que agiu com boa-fé e que, por isso mesmo, não pode ser prejudicado.
Cumpre mencionar também, que os tribunais também são cautelosos em relação aos efeitos suportados por aquele que recebe o bem de quem recebera do devedor. A posição do STJ é que se devem resguardar os direitos daquele que, não tendo adquirido o bem do devedor, não agiu de má-fé. A boa-fé do adquirente sucessivo deve realmente ser resguardada. Importantíssimo ressaltar que a boa ou má-fé, tanto do adquirente sucessivo do bem, quando a do adquirente direito, deve ser comprovada em cada caso concreto, não havendo nenhuma fórmula genérica que se encaixe em todas as situações.
Situação interessante é que o terceiro adquirente, se tiver agido de má-fé (conhecimento da intenção fraudulenta), será também réu da ação. Nesse ponto, o prof. Manoel Justino Bezerra Filho diz: “Observe-se, assim, a porta aberta que aparentemente a Lei deixa à impunidade, bastando que o devedor de conluie com qualquer pessoa para vender, p. Ex, bem imóvel: esta pessoa providencia para vender imediatamente esse bem imóvel para terceiro de boa-fé e, dessa forma, o bem não será arrecadado pela massa. Ou seja, o devedor conluiado com um terceiro de má-fé vale-se da boa-fé de outro terceiro para convalidar o ato fraudulento”.
Se, porém, tratar-se de ato previsto no art. 129, mesmo o terceiro adquirente de boa-fé será alcançado e o bem será arrecadado, pois, nesse caso, o negócio não produz efeitos para a massa, independentemente da boa ou má-fé dos intervenientes. Nesse caso, aquele que agiu de boa-fé poderá, se quiser, se valer dos mecanismos indenizatórios para que não tenha seu patrimônio desfalcado indevidamente pelo fraudador.
PROCEDIMENTO DA AÇÃO REVOCATÓRIA
Art. 134. A ação revocatória correrá perante o juízo da falência e obedecerá ao procedimento ordinário previsto na Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil.
De acordo com o artigo 134 da Lei 11.101/2005, a ação revocatória segue o rito ordinário.
Só se falará em procedimento sumário caso o valor da causa não exceda a sessenta salários mínimos.
Faz-se a distribuição por dependência (art. 253, do CPC), mantendo-se a sistemática do juízo universal e indivisível da falência, com a atuação dos princípios da vis attractiva e da par conditio creditorum.
No processo ordinário da revocatória falencial pode haver o julgamento antecipado da lide (art. 330, CPC), com a distinção de que sendo a ação do art. 129 da Lei 11.101/2005, dispensada a pretensão probatória e irrelevante perquirir a boa-fé, o juiz está autorizado ao julgamento antecipado da lide nos termos do art. 330, I, do CPC.
No entanto, a ação revocatória falimentar do art. 130 requer dilação probatória, logo, a ela não se aplica o julgamento antecipado da lide, sob pena de cerceamento de defesa.
Termo Legal.
Art. 99. A sentença que decretar a falência do devedor, dentre outras determinações: […]
II – fixará o termo legal da falência, sem poder retrotraí-lo por mais de 90 (noventa) dias contados do pedido de falência, do pedido de recuperação judicial ou do 1º (primeiro) protesto por falta de pagamento, excluindo-se, para esta finalidade, os protestos que tenham sido cancelados;
O termo legal é um prazo, espaço ou período de tempo, aferível por critérios objetivos da lei. A data inicial do prazo é atingida pelo critério da Lei e a data final é a data da sentença decretatória de falência. Nesse lapso temporal, os atos praticados que diminuam o patrimônio da falida são ineficazes em relação à massa.
De acordo com o dispositivo referido, o dia inicial da contagem do período de tempo do termo legal obedece aos seguintes critérios:
a) Decretação da falência com base no art. 94, I e II (a inadimplência se encontra provada via título executivo): o juiz pode retrotrair o prazo do termo legal em até noventa dias contados do primeiro protesto válido por falta de pagamento;
Exemplo: Primeiro protesto por falta de pagamento: 31/03/2006.
Retrotrair no máximo noventa dias: 01/01/2006.
Sentença decretatória da falência: 01/04/2009.
Termo legal: de 01/01/2006 a 01/04/2009.
b) Decretação de falência com base no art. 94, III (atos que geram a presunção de insolvência) e art. 105 (autofalência): o juiz pode retrotrair o prazo de tempo do termo legal, no máximo, em até noventa dias contados da distribuição do pedido de falência;
Exemplo: Distribuição do pedido de falência: 31/03/2006.
Retrotrair no máximo noventa dias: 01/01/2006.
Sentença decretatória da falência: 01/04/2009.
Termo legal: de 01/01/2006 a 01/04/2009.
c) Pedido de recuperação judicial ou extrajudicial convolada em falência (art. 61, § 1º): o juiz pode retrotrair o prazo de tempo do termo legal, no máximo, em até noventa dias contados da distribuição do pedido de recuperação.
Exemplo: Distribuição do pedido de recuperação: 31/03/2006.
Retrotrair no máximo noventa dias: 01/01/2006.
Sentença decretatória da falência: 01/04/2009.
Termo legal: de 01/01/2006 a 01/04/2009.
Lembramos, ainda, que o juiz é quem define o período do termo legal na sentença que decreta falência. O termo legal não pode retrotrair por mais de 90 de noventa dias, porém pode retrotrair menos, por decisão do juiz. Por ser o termo legal fixado na sentença que decreta a falência, diz o professor Gladston Mamede que “[…] o recurso cabível é o agravo de instrumento (não há qualquer fundamento que justifique a modalidade de agravo retido), dirigido diretamente ao tribunal competente, devendo ser interposto em dez dias […]”, de acordo com os arts. 522 e 524 do CPC.
O agravo de instrumento contra a sentença que decreta a falência terá efeito meramente devolutivo, mas o relator poderá atribuir efeito suspensivo (arts. 527, III, e 558, CPC) ou poderá deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz a sua decisão (art. 527, III, CPC).
RETORNO DOS BENS À MASSA FALIDA
Art. 135. A sentença que julgar procedente a ação revocatória determinará o retorno dos bens à massa falida em espécie, com todos os acessórios, ou o valor de mercado, acrescidos das perdas e danos.
Parágrafo único. Da sentença cabe apelação.
A sentença que julgar procedente a ação revocatória determinará o retorno dos bens à massa falida em espécie (ou seja, do próprio bem), com todos os acessórios, ou, caso isso não seja possível, o valor de mercado, acrescidos das perdas e danos.
Se os bens objeto da revocatória foram revendidos a terceiro de boa-fé sofreram perecimento ou deterioração, evidentemente, não poderão ser restituídos em espécie. Então, o réu deverá indenizar a massa mediante pagamento do valor de mercado equivalente, acrescido das perdas e danos.
Esclareça-se, por oportuno, que há casos em que a sentença revocatória não determina a restituição, justamente por ser ela descabida, como, por exemplo, na revogação de remissão de dívida ou revogação de uma garantia real outorgada.
Os efeitos da declaração de ineficácia prevista no art. 129 são, praticamente, os mesmos efeitos decorrentes da procedência da ação revocatória do art. 130, vale dizer, a decisão declaratória determinará o retorno dos bens à massa falida em espécie (ou seja, do próprio bem), com todos os acessórios, ou o valor de mercado. O acréscimo das perdas e danos depende de ação própria, inclusive para sua liquidação.
Por fim, ressalte-se que o recurso interponível é o de apelação, que será recebida em ambos os efeitos.
CONTRATANTE DE BOA-FÉ, RESTITUIÇÃO DE BENS OU VALORES E PERDAS E DANOS
Art. 136. Reconhecida a ineficácia ou julgada procedente a ação revocatória, as partes retornarão ao estado anterior, e o contratante de boa-fé terá direito à restituição dos bens ou valores entregues ao devedor.
1º Na hipótese de securitização de créditos do devedor, não será declarada a ineficácia ou revogado o ato de cessão em prejuízo dos direitos dos portadores de valores mobiliários emitidos pelo securitizador.
2º É garantido ao terceiro de boa-fé, a qualquer tempo, propor ação por perdas e danos contra o devedor ou seus garantes.
SEQUESTRO DOS BENS EM POSSE DE TERCEIROS
Art. 137. O juiz poderá, a requerimento do autor da ação revocatória, ordenar, como medida preventiva, na forma da lei processual civil, o sequestro dos bens retirados do patrimônio do devedor que estejam em poder de terceiros.
O artigo em questão prevê que o autor da ação revocatória pode requerer ao juiz, como medida preventiva, o sequestro dos bens que estejam em poder de terceiros.
Segundo Humberto Theodoro Jr.:
Sequestro é a medida cautelar que assegura futura execução para a entrega da coisa e que consiste na apreensão de bem determinado, objeto do litígio, para lhe assegurar a entrega, em bom estado, ao que vencer a demanda.
Sendo assim o sequestro pode ser definido como uma medida cautelar com a finalidade de garantir que o bem a que ele é aplicado seja, de qualquer forma, danificado.
O sequestro difere do arresto recai sobre um bem determinado, já o arresto pode atingir qualquer bem que possa garantir futura execução de obrigação de dinheiro.
O requisito para a medida cautelar de sequestro é o periculum in mora, pois caso o processo tenho uma longa duração, poderá frustrar a recuperação, pela massa, dos bens indevidamente saídos do patrimônio do falido.
Portanto, com a ação revocatória, poderá o autor pleitear ao juiz o sequestro dos bens em posse de terceiros devido ao negócio impugnado, sob forma preventiva, desde que obedecidos os pressupostos processuais.
INEFICÁCIA OU REVOGAÇÃO DO ATO PRATICADO COM BASE EM DECISÃO JUDICIAL
Art. 138. O ato pode ser declarado ineficaz ou revogado, ainda que praticado com base em decisão judicial, observando o disposto no art. 131 desta Lei.
Parágrafo Único. Revogado o ato ou declarada sua ineficácia, ficará rescindida a sentença que o motivou.
O Art. 138 da Lei de Falencias nos remete ao fato de que qualquer ato que tenha sido praticado em decorrência de decisão judicial poderá ser declarado ineficaz ou revogado, ressalvada as exceções expostas no art. 131, ou seja, os atos realizados seguindo o plano de recuperação judicial. Ainda que essa decisão se estenda a terceiro de boa fé, pela interpretação maior do artigo, poderá ser revogada.
Pontes de Miranda diz: “O que a nova sentença faz é declarar a ineficácia relativa, isto é, ineficácia em relação à massa aos credores concursais, ou de constituir a eficácia do ato jurídico revogando (não a eficácia de decisão entre o devedor e o adquirente, ou entre o devedor e os sucessores do adquirente, porque essa não ia até o autor ou os autores da nova ação)”.
Para o Professor Sebastião José Roque, deve-se tomar muita cautela quanto a este artigo, pois podemos nos deparar com a delicada situação de pagamento, por parte do devedor, com um bem da massa falida através de uma decisão judicial, que é ato válido, legal e perfeito e produz efeitos perante terceiros. Ele questiona como ficaria a situação do terceiro de boa fé, que já pagou pela aquisição do imóvel. Ele também questiona a possibilidade da sentença de um juiz rescindir a sentença de outro juiz, violando assim o princípio da autonomia. Ou seja, poderia um juiz expedir uma sentença válida, legal, perfeita e ela ser revogada por outro magistrado? Por causa disso, o ilustríssimo professor interpreta o artigo acreditando que se refere a uma decisão tomada pelo mesmo juiz, não se estendendo a outro magistrado. Mesmo assim, contesta a disposição legal. Mas essa é uma posição isolada na doutrina. Jurisprudência:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO – HIPOTECA – DAÇÃO EM PAGAMENTO – TERMO LEGAL – DESNECESSIDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO REVOCATÓRIA, TENDO EM VISTA DISPOSIÇÃO EXPRESSA DO PARÁGRAFO ÚNICO, DO ART. 129, DA LEI Nº 11.101/05 – POSSIBILIDADE DE RESCISÃO DA SENTENÇA QUE HOMOLOGOU A QUITAÇÃO A DÍVIDA POR MEIO DE DAÇÃO EM PAGAMENTO – ART. 138, DA LEI Nº 11.101/05.” (TJSP – AI Nº 0270793-97.2011.8.26.0000 – RELATOR: ROBERTO MAC CRACKEN – J. 02.10.12).
BIBLIOGRAFIA
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BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova Lei de Recuperação e Falencias Comentada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. São Paulo: Saraiva, 2005.
MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: falência e recuperação de empresas, vol. 4 – 5. Ed. – São Paulo: Atlas, 2012.
MILANI, Mario Sérgio. Lei de recuperação judicial, recuperação extrajudicial e falência comentada São Paulo, Malheiros, 2011.
ROQUE, Sebastião José. A Lei de Recuperação Judicial Exige Certos Esclarecimentos. Universo Jurídico, Juiz de Fora, ano XI, 10 de jan. De 2006.
SARTORI, Hotans Pedro. Dos efeitos retrospectivos da sentença declaratória da falência na Lei nº 11.101/2005. Estudo comparativo com o Decreto-Lei nº 7.661/1945. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 727, 2 jul. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/6946>. Acesso em 20 de outubro de 2013.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 53. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012.